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sábado, 30 de abril de 2016

Desenvolvimento Sustentável: Uma discussão ambiental e social

Desenvolvimento Sustentável:
Uma discussão ambiental e social

Carla Montefusco de Oliveira

  • As discussões em torno da temática da sustentabilidade surgem a partir da necessidade de se repensar uma interação fundamental à existência humana - a relação homem/ natureza – e fazendo isso sob bases distintas daquelas que se valem da idéia de que o crescimento econômico é sinônimo de progresso social. 
Nesse sentido, já na década de 1960, faziam-se visíveis as desastrosas conseqüências de um modelo de desenvolvimento balizado por uma racionalidade exclusivamente econômica, de modo que, notava-se desde esse período
"o desgaste de um modelo de crescimento econômico implementado no pós-guerra. Este previa um rápido crescimento através de investimento de capital e exploração de recursos naturais, com vistas a favorecer apenas um modelo econômico. Não havia, portanto, preocupação explícita em relação à poluição ou a desequilíbrios ambientais. Este modelo esgotou-se quando o meio ambiente não fornecia mais recursos que pudesse ser explorados sem provocar danos diretos ao ser humano. A reflexão e a busca por um novo modelo econômico fez-se então imprescindível.” ( Wirth et al, 2006: p. 02)
Em conseqüência da ampliação dos debates sobre os riscos da degradação do meio-ambiente, no ano de 1972 ocorrem dois fatos representativos no âmbito das discussões acerca das políticas de desenvolvimento, a saber: a publicação dos pesquisadores do Clube de Roma intitulada “Os Limites do Crescimento” e a Conferência de Estocolmo sobre ambiente humano. 
  • Dado continuidade às reflexões em tela, e como resultado do trabalho da Comissão Mundial (da ONU) sobre Meio- Ambiente e Desenvolvimento (UNCED), no ano de 1987 tem-se a divulgação do Relatório de Brundtland, apresentando um conjunto de medidas a serem realizadas em nível internacional para a promoção de um modelo sustentável de desenvolvimento (Brüseke; 1995: p.29).
 E é justamente nessa perspectiva presente do documento de Brundtland, também conhecido como Nosso Futuro comum, que surge formalmente o conceito de Desenvolvimento Sustentável - DS.2 
como tal, o conceito nasce formalmente em 1987 com o Informe da Comissão Brundtland, com o objetivo de esboçar uma resposta ao agravamento e à globalização da crise ecológica. De fato, em sua formulação geral – “um desenvolvimento que responda às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras para satisfazer suas próprias necessidades” – expressa uma aspiração que não pode gerar maiores discrepâncias (Murphy; 1995: p. 106).
Embora o documento Nosso Futuro Comum tenha colocado na cena mundial a imperativa necessidade de revisão dos modelos de desenvolvimento adotados pela humanidade até então, a definição de sustentabilidade que nele está posta acaba por permitir inúmeras interpretações do conceito, de forma que, “ao adentrar na discussão do ‘desenvolvimento sustentável’, entra-se no campo ideológico-político, mesmo que embasado sobre uma reflexão científica.” (Leroy; 1997: 251) 
  • Em assim sendo, o presente artigo se propõe, ainda que de maneira introdutória, a discutir os diversos elementos que envolvem os debates contemporâneos em torno da sustentabilidade, bem como as possibilidades das demandas por Desenvolvimento Sustentável se traduzirem em ações sociais efetivas.
Desenvolvimento Sustentável: 
Em tempos de globalização possibilidades e limites:
  • O paradigma capitalista contemporâneo, que vem se consolidando mais firmemente desde o fim da década de 1960, tem suas bases calcadas principalmente nas tecnologias de ponta, na supervalorização do capital financeiro, no avanço das telecomunicações, no aumento da produtividade, na flexibilização dos modos de produção, de acumulação e das relações de trabalho e na internacionalização econômica. 
Caracterizando-se por múltiplas dimensões, a internacionalização econômica, também denominada globalização, vai além da diluição de limites entre o nacional e o internacional, e atinge todo o modo de relacionamento entre os distintos países, povos e culturas. 
  • Nesse processo, as grandes corporações empresariais passam a buscar inserção em diversos países, de acordo com interesses de comercialização de seus produtos e/ ou de barateamento dos custos de produção. As novas bases produtivas, agora centradas na flexibilização, em contraposição às rígidas bases características do modo fordista de produzir, emergem carregadas de processos que objetivam, acima de tudo, “reinventar” e inovar os modos de produzir. 
Nesse contexto, a reestruturação produtiva e adoção de formas toyotistas de organização da produção passarão a representar um instrumento chave para o alcance da denominada vantagem competitiva das empresas nos mercados nacionais e internacionais; e a adoção de sistemas flexíveis de produção tornar-se-á condição primeira para a “sobrevivência” das empresas diante das necessidades de uma produção customizada, de alta qualidade e sem grandes estoques. 
"O desenvolvimento da produtividade econômica elimina massivamente empregos de baixa e média qualificação, produzindo desemprego estrutural. As sociedades desenvolvem um processo de dualização: os incluídos (que podem ir da quase totalidade da população em países com nível educacional muito alto, até minorias ínfimas em países de baixa internacionalização) e os excluídos da economia globalizada." (Viola; 1997, p. 65)
O desenrolar do processo de globalização, torna ainda mais evidente a relação indissolúvel entre as questões econômicas, políticas, sociais e ambientais, de tal modo que, refletir sobre perspectivas de desenvolvimento na contemporaneidade implica, invariavelmente, em reflexões que analisam o problema do desenvolvimento sob a ótica multifacetada dos elementos que o perpassam, bem como sob a visão dos diversos atores sociais nele envolvidos
"Até recentemente, o planeta era um grande mundo no qual as atividades humanas e seus efeitos estavam nitidamente confinados em nações setores (energia, agricultura, comércio) e amplas áreas de interesse (ambiental, econômico, social). Esses compartimentos começaram a se diluir. Isto se aplica em particular às várias “crises” globais que preocuparam a todos, sobretudo nos últimos 10 anos. Não são crises isoladas: uma crise ambiental, uma crise do desenvolvimento, uma crise energética. São uma só." (Nosso Futuro Comum; 1991: p. 04-05)
Dessa forma, o direcionamento dado ao crescimento econômico na atualidade acaba por revelar-se insustentável. 
  • O descompasso existente entre a utilização e a preservação dos recursos naturais disponíveis no vasto ecossistema mundial gera uma profunda desarmonia na relação homem/ natureza e esse tipo de “desenvolvimento” econômico alicerçado na degeneração dos recursos naturais reflete em problemas sócioambientais de grande magnitude. 
É justamente em meio a esse cenário que se faz mister o envolvimento de componentes do poder público, da iniciativa privada e, também, da sociedade civil na discussão, proposição e implantação de formas alternativas de desenvolvimento, ou seja, modelos de desenvolvimento pautados na idéia de sustentabilidade da própria vida.
"Sustentabilidade significa a possibilidade de se obterem continuamente condições iguais ou superiores de vida para um grupo de pessoas e seus sucessores num dado ecossistema (...) O conceito de sustentabilidade equivale à idéia de manutenção de nosso sistema de suporte da vida (...) (Cavalcanti; 1995, p. 165). 
Vê-se, pois, que construir modelos de desenvolvimento que respeitem os limites naturais presentes no meio-ambiente, assim como as necessidades da humanidade como um todo, e não apenas de pequenas parcelas de “indivíduos privilegiados”, vai muito além do simples progresso econômico e toca na urgência de preocupação com a construção de relações sociais éticas e que primem pela interlocução dos diversos segmentos sociais. 
Torna-se imprescindível, então, a adoção de uma perspectiva multidimensional das ações sociais e ambientais, que “(...) envolva economia, ecologia e política ao mesmo tempo. Isso, no fundo, é o ponto de partida da teoria do desenvolvimento sustentável.” (Bruseke; 1995: 37) 
Além disso, é fundamental que as reflexões e ações relativas ao DS considerem a noção de democratização, já que atores sociais distintos têm projetos sociais também diversos, o que coloca na cena, inclusive, a necessidade de considerar o desenvolvimento como uma construção primeiramente local/ regional. 
  • E nessa idéia de local/ regional se precisa considerar, que apesar de alguns dos “ritos e imposições globalizantes” seguirem firmes na tentativa de homogeneizar o mundo, as diferenças entre países e continentes se reafirma cotidianamente; são diferenças de história, de construção dos processos civilizatórios, culturais e políticos, e, como não poderia deixar de ser, de posição econômica no cenário mundial. 
Em meio à dinâmica supracitada, se apresenta com altíssimo grau de inviabilidade cogitar o desenvolvimento sustentável como um empreendimento global único, até porque encarar o modo de desenvolvimento dos países considerados já desenvolvidos como modelo acabaria por reafirmar a noção ideológica de que crescimento industrial e econômico gera, necessariamente, melhoria da qualidade de vida da população como um todo. 3 
  • De experiências bem sucedidas advindas de espaços 4 locais pode-se entrar num movimento de disseminação de alternativas de sustentabilidade, sendo estas organizadas e geridas a partir das necessidades e possibilidades próprias de cada espaço.

Desenvolvimento Sustentável:
Uma discussão ambiental e social

Desenvolvimento Sustentável: 
Entre a realidade e a utopia:
  • A situação sócio-ambiental da humanidade na atualidade requer uma revisão nas estratégias que enfocam o desenvolvimento. O crescente aumento dos números da pobreza e os alarmantes índices de devastação do meio-ambiente são apenas os sinais mais evidentes de que o curso da história necessita de novos rumos. 
Na busca pela construção de rumos alternativos para a história os construtos das concepções e práticas de desenvolvimento sustentável têm se apresentado presentes em organismos internacionais, instituições de caráter público e até mesmo em empresas privadas. Entretanto, faz-se relevante salientar que a idéia do desenvolvimento sustentável tem sido incorporada por grupos e propostas distintas, ou seja, mantendo relação com o conceito geral de DS
[...] acumularam-se inúmeras e diferentes propostas de ação, que vão desde as promovidas pelo ecologismo radical e os movimentos verdes, nos quais o alento utópico é inegável, até as preconizadas pela terapia neoliberal, que delegam a solução dos problemas ambientais aos mecanismos do mercado (...) a idéia de DS provocou a generalizada adesão de um espectro cada dia mais amplo de atores colocados nas mais diversas posturas ideológicas.(Mattos; 1997: 106).
Em sendo de suma relevância para a orientação das ações de cunho ambiental e social, o conceito desenvolvimento sustentável implica na reflexão sobre o fato de que não é qualquer taxa de crescimento econômico que deve ser perseguida, pois é preciso pensar antes se há possibilidade de sustentabilidade (Furtado; 1974).
  • Sendo assim, será que se pode considerar como viável, no seio das concepções que defendem, por exemplo, a primazia do mercado sobre os demais segmentos sociais, uma defesa efetiva e concreta da preservação ambiental e da preservação da própria vida humana? 
Sem sombra de dúvidas a questão acima posta carece de profunda análise, pois no quadro de referência social atual não se pode tratar exatamente como coerente a relação entre os valores sociais de competitividade e individualidade, tão fortemente propagados, com a sustentabilidade da vida
"o problema da insustentabilidade não está apenas no desenvolvimento, é preciso reconhecer que o nosso modo de vida se tornou insustentável, e este é muito mais difícil de mudar, pois implica [...] aperfeiçoamento individual e coletivo simultaneamente" (Ramos apud Gonçalves; 2005: p. 05).
A fragilidade de valores humanos volvidos para a cooperação e preocupação com as gerações futuras, assim como a pouca existência de políticas sociais constantemente avaliadas e continuamente ajustadas a novas necessidades emergentes acaba por dificultar a construção de perspectivas de desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, urge, em primeira instância, a disseminação insistente da idéia de respeito humano, bem como da crença de que os seres humanos, em suas aspirações por desenvolvimento, são capazes de construir um mundo para além dos desígnios da técnica e da economia.
"É preciso iniciar um aprendizado individual e coletivo que nos leve a outras formas de manifestação concreta da nossa natureza e que possibilite uma perspectiva de mudança em nosso modo de viver"(Gonçalves; 2005: p.05). 
As frustrações decorrentes dos modelos tradicionais de desenvolvimento intensamente adotados pela humanidade após a Segunda Guerra Mundial, alerta para a positividade do conceito de desenvolvimento sustentável 5 . O Banco Mundial, a UNESCO e outras entidades de proeminência internacional já adotaram o DS como marca de uma filosofia que busca combinar eficiência econômica com justiça social e prudência ecológica (Bruseke; 1995). Nessa dimensão,
"Mesmo que os resultados obtidos sejam ainda insatisfatórios, o que estamos vivendo é o início da construção de uma história, talvez a única possível, marcada por derrotas e por vitórias, que inexoravelmente continuará incorporando novos capítulos, diante de cujo conteúdo os governos não terão outra alternativa senão aprofundar suas respostas. Além de seus alcances utópicos, a idéia de DS transformou-se em uma verdadeira estratégia de sobrevivência e, como tal, está sendo percebida em uma escala que se amplia incessantemente"(Mattos; 1997: 123)
No que tange à aplicação dos pressupostos e ações que incorporam a noção de desenvolvimento sustentável, vale salientar, pois, que apesar das dificuldades encontradas para sua operacionalização, a sustentabilidade expressa hoje um caminho, longo é bem verdade, e uma perspectiva de futuro para a reinvenção das estratégias de progresso social predominantemente adotadas até então. 
  • Em certa medida a idéia de desenvolvimento sustentável pode, então, ser considerada como utópica, mas as utopias são capazes de guiar novos projetos de vida, nova idéias de sociedade e rumos bem mais humanos para os tempos vindouros.
Considerações Finais:
  • As questões ambientais e sociais presentes na sociedade atual fazem do desenvolvimento sustentável um conceito fundamental para se pensar formas de atender as necessidades da humanidade no presente, sem comprometer as possibilidades de as gerações futuras terem suas necessidades de sobrevivência também satisfeitas (Nosso Futuro Comum; 1991). 
Desse modo, a dimensão de sustentabilidade deve estar presente nas diversas esferas da sociedade, indo desde a preservação de recursos naturais, passando pela defesa da democracia e pela garantia da própria vida humana. 
  • Em assim sendo, a efetivação concreta do desenvolvimento sustentável não depende apenas de cartas de intenção que congreguem relevantes organizações internacionais governamentais e/ ou não governamentais, mas depende, sobretudo, de um compromisso de toda a humanidade com ações embasadas pela idéia de defesa do bem comum
Referencias:

BOURDIEU, Pierre. Meditações Pascalianas. Tradução Sérgio Miceli. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 2001.
BRUSEKE, Franz Josef. O Problema do desenvolvimento sustentável. In 
CAVALCANTI, Clovis (org.) Desenvolvimento e natureza: estudos para uma sociedade sustentável. São Paulo: Cortez; Recife – PE: Fundação Joaquim Nabuco, 1995.
CAVALCANTI, Clóvis. Sustentabilidade da economia: paradigmas alternativos de realização econômica. In 
CAVALCANTI, Clovis (org.) Desenvolvimento e natureza: estudos para uma sociedade sustentável. São Paulo: Cortez; Recife – PE: Fundação Joaquim Nabuco, 1995. 
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso Futuro Comum. Tradução de: our common future. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1991. 
FREY, Klaus. A dimensão político- democrática nas teorias de desenvolvimento sustentável e suas implicações para a gestão local. Ambiente e Sociedade. n. 9, Campinas, 2001. Disponível em www.scielo.br. Acesso em 20 de outubro de 2006. 
GONÇALVES, Daniel Bertoli. Desenvolvimento sustentável: o desafio da presente geração. Revista espaço acadêmico, N. 51, Agosto de 2005. disponível em www.espaçoacademico.com.br; acesso em 06/ 09/ 2006. 
HALL, Anthony. O Papel das ONGs na resolução de conflitos para o desenvolvimento sustentável. In 
BECKER, Bertha K. e MIRANDA, Mariana. A Geografia política do desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997. 
LEROY, Jean- Pierre. Da comunidade local às dinâmicas microrregionais na busca do desenvolvimento sustentável. In 
BECKER, Bertha K. e MIRANDA, Mariana. A Geografia política do desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997. 
MATTOS, Carlos A. de. Desenvolvimento sustentável nos territórios da globalização. Alternativa de sobrevivência ou nova utopia? In 
BECKER, Bertha K. e MIRANDA, Mariana. A Geografia política do desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997. 
ROHDE, Geraldo Mário. Mudanças de paradigma e desenvolvimento sustentado. in 
CAVALCANTI, Clovis (org.) Desenvolvimento e natureza: estudos para uma sociedade sustentável. São Paulo: Cortez; Recife – PE: Fundação Joaquim Nabuco, 1995. 
VIOLA, Eduardo. Globalização, democracia e sustentabilidade: as novas forças sociopolíticas transnacionais. In 
BECKER, Bertha K. e MIRANDA, Mariana. A Geografia política do desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997. 
WIRTH, Loli G. et all. Desenvolvimento Sustentável: histórico, conflitos e perspectivas. Artigo do Laboratório de Políticas Públicas e Planejamento Educacional da Faculdade de Educação, 
UNICAMP – SP, disponível em www.cori.unicamp.br, acesso em 06/09/2006.

Desenvolvimento Sustentável:
Uma discussão ambiental e social

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Um estudo de desenvolvimento sustentável do nordeste semi-árido

Um estudo de desenvolvimento sustentável do nordeste semi-árido

Antônio R. Magalhães

  • O ciclo de políticas voltadas para o desenvolvimento do Nordeste, iniciadas com o GTDN Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste, no final da década de 50, parece dar sinais de exaustão neste final de século. 
A fase dos planos diretores da Sudene, dos incentivos fiscais e dos programas de desenvolvimento rural integrado se extingue com a última experiência de grande envergadura, o PAPP Programa de Apoio ao Pequeno Produtor Rural. Junto com as políticas, também as instituições se enfraqueceram e perderam o fôlego para sua própria renovação. 
  • O Nordeste se encontra hoje sem uma estratégia de consenso, capaz de viabilizar ação política orientada para o desenvolvimento. 
As condições para um novo ciclo de políticas de desenvolvimento regional sujeitam-se às características especiais dos anos 90: 
  • O retorno do Brasil ao regime democrático, criando espaço para um amplo processo participativo na sociedade; 
  • A preocupação com a restauração do planejamento de longo prazo, que pode viabilizar-se com o desejado alcance da estabilidade econômica; 
  • O retorno da preocupação com as desigualdades regionais e sociais, materializado no Congresso Nacional com o Relatório Beni Veras sobre Desigualdades Regionais e, no nível da sociedade, com a Campanha pela Cidadania e Contra a Fome; 
  • A emergência do conceito de desenvolvimento sustentável, a partir do Relatório Brundtland e da Rio-92. 
Em 1992, os participantes da Conferência Internacional sobre Impactos Climáticos e Desenvolvimento Sustentável de Regiões Semi-Áridas (ICID) propuseram a adoção de políticas de desenvolvimento sustentável como a saída apropriada para as regiões semi-áridas. 
  • A partir de um processo participativo envolvendo organizações governamentais e não-governamentais, conduzido inicialmente por uma ONG, tornou-se possível a reunião de esforços para elaboração de estudo e proposta de política de desenvolvimento sustentável do Nordeste, com destaque para a região semi-árida. 
A principal preocupação diz respeito à incorporação do conceito de desenvolvimento sustentável ao processo de planejamento do desenvolvimento regional.

Planejando o Desenvolvimento Sustentável
  • Há inúmeras definições de desenvolvimento sustentável. Isso não impede que exista unanimidade em torno da idéia básica por trás do conceito, ou seja, desenvolvimento com eqüidade social intra-geração e entre gerações. 
O mesmo não é verdade, contudo, em relação à operacionalização do conceito. Todos são favoráveis ao desenvolvimento sustentável, mas pouco se aprendeu sobre como promovê-lo e, particularmente, como introduzi-lo em nível do planejamento nacional, regional ou local. 
  • Não há metodologias disponíveis para o planejamento do desenvolvimento sustentável. Evidentemente, trata-se de um conceito novo, que ainda não teve tempo de incorporar-se ao corpo das doutrinas de desenvolvimento econômico e planejamento. 
É ainda mais recente o interesse dos economistas pelo tema. Embora crescente esse interesse, a maioria dos economistas e dos políticos que tratam da questão do desenvolvimento ainda vêem com desdém ou desconfiança a idéia de sustentabilidade. 
  • Essa aparente falta de interesse pode ter algumas explicações: Primeiro, idéias novas geralmente levam algum tempo para seu pleno amadurecimento e aceitação. 
Se isso é verdade, deve-se esperar algum tempo até que o novo conceito seja plenamente incorporado; Segundo, o conceito de desenvolvimento sustentável surgiu a partir da preocupação com os problemas ambientais e os problemas globais, estando fortemente presente o viés ambiental. 
  • A maioria das pessoas, mesmo as mais esclarecidas, ainda pensam desenvolvimento sustentável como assunto exclusivo dos ambientalistas. Em boa medida, a corrente principal da política econômica continua ignorando a questão; 
Terceiro, a crise e as transformações econômicas dos anos 80 e início dos 90 fizeram diminuir o prestígio da atividade de planejamento em geral, tornando ainda mais difícil a introdução de novas dimensões no processo de planejamento. 
  • Para efeito deste trabalho, utilizamos uma definição operacional para desenvolvimento sustentável, capaz de permitir sua incorporação aos procedimentos do processo de planejamento.  A definição adotada é a seguinte: Desenvolvimento sustentável é o que tem capacidade de permanecer ao longo do tempo. 
Em outras palavras: é o desenvolvimento durável, em todas as suas dimensões. Além do aspecto global, destacamos quatro dimensões: 
  • Econômica: relativa à capacidade de sustentação econômica dos empreendimentos. Este é um conceito bem desenvolvido pelos economistas; 
  • Social: diz respeito à capacidade de incorporar as populações marginalizadas, reduzindo desequilíbrios sociais que desestabilizam a sociedade; 
  • Ambiental: relativa à necessidade de conservação dos recursos naturais e da capacidade produtiva da base física; e 
  • Política: relacionada com a estabilidade dos processos decisórios e das políticas de desenvolvimento. Outras dimensões podem ser acrescentadas. 
Por exemplo, a dimensão cultural, relativa à capacidade de preservação dos valores que asseguram a identidade cultural de um povo e permitem a introdução de novos valores necessários para dar suporte às transformações sociais e econômicas. 
  • Embora simplificadora, a definição acima mantém os ingredientes comuns às várias definições de desenvolvimento sustentável: qualifica o crescimento econômico, sujeitando-o à necessidade de manutenção, a longo prazo, da produtividade dos recursos naturais e conservação da base física do planeta; fortalece a idéia de eqüidade, tanto interpessoal (sustentabilidade social), como intertemporal (sustentabilidade ambiental). Desenvolvimento Sustentável para o Nordeste: o Projeto Áridas
O objetivo do Projeto Áridas é contribuir para criar um novo paradigma para o planejamento do desenvolvimento do Nordeste brasileiro. 
  • Nos últimos 45 anos, o desenvolvimento do Nordeste foi orientado pelo que podemos chamar hoje de paradigma do GTDN: um conjunto de orientações de caráter estratégico que foi internalizado pelos planejadores regionais e influenciou as políticas, planos e programas de desenvolvimento feitos ou adotados no Nordeste a partir da criação da SUDENE, em 1959. 
A doutrina GTDN foi um grande sucesso pela influência que teve e continua tendo entre os acadêmicos e planejadores. As políticas que nela se fundamentaram, entretanto, não deram os frutos esperados. Vivemos hoje uma situação de crise de identidade da política regional, pelo envelhecimento do paradigma do GTDN e pelo não surgimento de um substituto. 
  • Os paradigmas não se estabelecem apenas por causa do esforço intelectual ou político de um conjunto de pessoas. Resultam de um processo de transformação social que muitas vezes acontece à revelia dos governantes ou das elites intelectuais. 
Quando existe consciência, contudo, de que um processo de transformação social se encontra em andamento, é possível por meio de amplo esforço intelectual, político e de participação, exercer influência sobre esse processo e explicitar, e até mesmo influenciar, o novo paradigma. 
  • Foi assim em 1958, quando o GTDN se inseriu no processo de transformação social no Nordeste e conseguiu produzir uma resposta lógica aos anseios da época. 
As condições estavam criadas: as demandas das lideranças regionais, tendo à frente a igreja; as condições políticas nacionais, com Juscelino Kubitschek disposto a apoiar uma nova política para o Nordeste; o trabalho político-intelectual desenvolvido por Celso Furtado e sua equipe no GTDN e na Sudene; a mobilização política em torno da nova proposta. Pode ser assim agora, quando o velho paradigma se encontra em declínio e novas idéias surgem, enquanto se fortalecem as demandas sociais. 
  • A situação não é, entretanto, tão simples como em 1958. A sociedade se tornou mais complexa. Não temos a liderança de um Celso Furtado e de um Juscelino Kubitschek. As instituições envelheceram. Não há proposta hegemônica que tenha apelo suficiente para garantir viabilidade política. Por outro lado, o processo democrático não deixa mais espaço para soluções impostas de cima para baixo. 
De positivo, há o fato de que as oligarquias tradicionais se enfraqueceram, particularmente em alguns estados. Isso permitiu o surgimento de algumas experiências bem-sucedidas, em nível de estados e de municípios, de implementação de políticas públicas modernas. 
  • Como em 1958, entretanto, quando foi preciso combater as idéias das elites agrárias do Nordeste, ainda agora essas elites se colocam como obstáculo para a modernização das políticas de desenvolvimento regional. 
A contribuição do Projeto Áridas está em buscar organizar esforços para explicitar os anseios da sociedade nordestina e, paralelamente, propiciar a verbalização de alternativas para uma nova fase de políticas de desenvolvimento regional. 
  • Em suma, colocar-se como instrumento para a construção do novo paradigma, procurando perceber e ao mesmo tempo influenciar, ainda que modestamente, na direção do processo social do qual resultará a consolidação de um corpo de idéias e princípios que fundamentarão as políticas regionais no futuro. A idéia de procurar influir no processo social pode parecer pretensiosa, e talvez o seja. 
Não se trata, contudo, de mudar o processo social, mas de procurar entendê-lo e oferecer alternativas que tenham uma força lógica e que possam ser, a partir desse momento, introduzidas como elementos do próprio processo. 
  • A idéia básica por trás do Projeto Áridas é que a explicitação de uma estratégia de desenvolvimento sustentável para a região pode se constituir num elemento importante para canalizar e disciplinar os diversos elementos, nem sempre convergentes, do processo social que questiona o paradigma atual mas ainda não conseguiu identificar o seu substituto. 
De modo específico, o objetivo é de propor uma Estratégia de Desenvolvimento Sustentável para a região. Duas características são inerentes à idéia de sustentabilidade, nas suas diversas dimensões: a visão de longo prazo e a participação da sociedade. Arcabouço metodológico 
  • O processo de elaboração da estratégia percorre dois caminhos paralelos, que freqüentemente se confundem: o do trabalho técnico, mediante esforço de um conjunto de pessoas incumbidas da preparação das propostas; o processo político-participativo, por meio do envolvimento de diversos segmentos representativos da sociedade. 
O caminho político envolve o esforço organizado de promoção da participação ativa da sociedade nas diversas fases do trabalho, por meio de seminários, workshops e reuniões específicas, ou da participação direta nos grupos técnicos
  • O trabalho de participação realimenta constantemente o caminho técnico e deve continuar após a conclusão dos estudos e propostas. 
O caminho técnico se desenvolve em quatro grandes fases, que compõem a moldura metodológica do trabalho: 
  1. Primeiro, a análise de sustentabilidade atual do desenvolvimento do Nordeste, considerando as dimensões econômicas, sociais, ambientais e políticas. 
  2. Segundo, a simulação da sustentabilidade futura, com base em cenários tendenciais. 
  3. Terceiro, a explicitação de cenário desejado de desenvolvimento sustentável. 
  4. Quarto, a elaboração da estratégia propriamente dita. 
Tanto em relação à sustentabilidade atual como no tocante à sustentabilidade futura, será feita análise de vulnerabilidade ao problema das variações climáticas e particularmente às secas que afetam a região. No caso da sustentabilidade futura, essa análise inclui a hipótese de mudança climática global, cujos efeitos poderão ser mais intensos em regiões marginais como o semi-árido nordestino. 
  • A questão da vulnerabilidade assume papel central, tanto em termos das diversas análises como no tocante às propostas de estratégias específicas. Um outro elemento importante da análise diz respeito ao exame das lições das experiências de políticas de desenvolvimento realizadas até hoje, particularmente no tocante à explicação das causas de sucesso e de insucesso. 
A incorporação desse conhecimento será útil não apenas na elaboração da proposta de estratégia geral, mas particularmente na definição das políticas setoriais. De modo simplificado, o arcabouço metodológico obedece ao seguinte raciocínio: 
  • Partindo da análise de sustentabilidade atual, da vulnerabilidade às variações climáticas e outras crises ambientais e do conhecimento das lições de sucesso e insucesso das políticas de desenvolvimento, constrói-se um cenário tendencial para permitir a simulação da situação de sustentabilidade no futuro, bem como da futura vulnerabilidade ao clima. 
O cenário tendencial leva em conta a situação atual, as tendências e o conhecimento disponíveis sobre as mudanças em andamento. Mostra para onde a região está caminhando, se tudo continua como está. Em seguida, constrói-se um cenário desejado, através de consulta organizada à sociedade. 
  • O cenário desejado leva em conta os anseios da sociedade e também as possibilidades de sua realização a partir de uma nova estratégia de desenvolvimento sustentável. 
Da comparação dos três cenários o atual, o tendencial e o desejado é possível, de modo participativo, definir caminhos para uma nova estratégia capaz de desviar o atual caminho de insustentabilidade para um outro em direção ao cenário desejado. 
  • Na prática, esse arcabouço metodológico será operacionalizado através de nove tarefas, comuns a todas as atividades.
Em primeiro lugar, as condições de sustentabilidade atual da região nordestina são pouco satisfatórias. Do ponto de vista econômico, a economia do interior é altamente vulnerável às crises climáticas. Mesmo em tempos normais, não gera renda suficiente para sustentar sua população. 
  • Em nível microeconômico, muitos empreendimentos sobrevivem à custa de subsídios governamentais. Sob o aspecto social, os indicadores são dramáticos, ao mostrarem as condições de pobreza da maioria da população. As migrações rurais-urbanas e inter-regionais indicam que a região não oferece condições de sustentabilidade social. 
As grandes desigualdades sociais mostram uma situação insatisfatória. No tocante à questão ambiental, a contínua perda de produtividade da terra, a exaustão de recursos naturais não-renováveis e diminuição dos depósitos de água subterrânea são indicadores de insustentabilidade. 
  • Os processos de desertificação em várias regiões mais vulneráveis refletem as condições de uso insustentável dos solos, da vegetação, dos recursos hídricos e da biodiversidade. As atividades humanas e suas conseqüências sobre o uso do solo e da água são causa de grande pressão sobre esses recursos. 
Globalmente, as condições do desenvolvimento atual do Nordeste não são de sustentabilidade. Em segundo lugar, podemos especular sobre como será a sustentabilidade no futuro. Partimos de três situações conhecidas: Primeiro, a base física é dada; 
  • Segundo, os processos de uso do solo e da água atualmente utilizados, em sua maior parte, não são sustentáveis, e não há razão para supor que passem a sê-lo no futuro, com base nas tendências e no conhecimento atual; 
Terceiro, a população é crescente, assim como suas atividades, sendo também crescente a pressão sobre a base de recursos. Podemos supor que as condições de sustentabilidade serão ainda menos satisfatórias no futuro, com todas as suas conseqüências para a população. É preciso, com urgência, reverter essa tendência.
  • Organização A organização para elaboração do Áridas foi construída de forma espontânea, por adesão das várias instituições federais e estaduais, governamentais ou não, a partir de um esforço de promoção capitaneado por uma organização nãogovernamental. Durante dois anos foram realizados diversos seminários, reuniões e contatos, com a participação de grande número de representantes de instituições nacionais e estrangeiras. 
A partir das adesões voluntárias das várias instituições, chegou-se a uma espécie de consórcio informal que reúne órgãos do governo federal, dos estados e instituições internacionais ou estrangeiras. Cada instituição define independentemente a sua participação no projeto. 
  • O Áridas conta com dois grupos de equipes. Uma equipe regional, incumbida de realizar os estudos e elaborar a estratégia geral para a região. E uma equipe para cada estado participante, encarregada de elaborar a proposta específica para o respectivo estado. 
As equipes regional e estaduais interagem continuamente, para assegurar a coerência metodológica do processo. A equipe regional é composta por uma coordenação geral, localizada na Secretaria de Planejamento da Presidência da República, em Brasília, e por sete Grupos de Trabalho, a saber: 
GT I - Recursos Naturais e Meio Ambiente
GT II - Recursos Hídricos
GT III - Desenvolvimento Humano
GT IV - Organização do Espaço
GT V - Economia, Ciência e Tecnologia
GT VI - Políticas de Desenvolvimento
GT VII - Interação com a Sociedade Cada Grupo de Trabalho se incumbe de um conjunto de estudos básicos, em relação aos quais se realizam todas as tarefas do Áridas. 
Os estudos compreendem as principais áreas ou temas relativos a cada assunto do grupo respectivo. 
O GT I elabora estudos básicos sobre: clima, solos, água, vegetação, biodiversidade, zoneamento agro-econômico e ecológico. 
  • O GT II estuda as questões relativas às disponibilidades e usos de recursos hídricos, inclusive no tocante à política de águas. O GT III cobre os temas de população, educação, saúde, saneamento, emprego, pobreza. 
O GT IV estuda a organização do espaço, os sistemas de produção agrícola irrigada e de sequeiro, a agroindústria, os processos de ocupação do espaço urbano. O GT V cobre as áreas de macroeconomia, desenvolvimento endógeno, infra-estrutura de transportes e energia, segurança alimentar e financiamento de desenvolvimento. 
  • O GT VI avalia as políticas de desenvolvimento regionais, estaduais e municipais, bem como as políticas comunitárias. Este Grupo também analisa várias experiências exitosas de desenvolvimento em nível municipal e comunitário, inclusive a cargo de organizações não-governamentais. 
O GT VII desenvolve os estudos de participação e de cenarização. Complementarmente aos estudos, um conjunto de eventos procura reunir um maior número de pessoas, entre especialistas, policy-makers e representantes da sociedade civil, para alargar a contribuição para o conhecimento do assunto e para a formulação das propostas. 
  • O Áridas regional conta com três órgãos colegiados: um Conselho Superior formado pelos dirigentes das Instituições Federais, Estaduais e da Sociedade Civil que de alguma forma participam ou apóiam o trabalho; um Comitê Regional constituído pelas instituições que de alguma forma aportam recursos ao projeto; e um Comitê Técnico composto pelo Coordenador Geral, os Coordenadores dos Grupos de Trabalho e dos Estados e Representantes Técnicos das Instituições participantes. 
No nível dos estados, cada estado definiu uma forma específica de organização do trabalho, que no geral procura seguir o modelo regional. Integração ascendente O caminho técnico segue um conjunto de etapas. 
  • O fato de que as diversas atividades obedecem às mesmas tarefas possibilita a integração ascendente das etapas, mediante agregação de dados e informações e, eventualmente, da construção de indicadores agregados. 
A primeira fase corresponde à elaboração dos estudos básicos, seguindo as nove tarefas. Na segunda fase, uma primeira agregação se faz no nível de cada Grupo de Trabalho. A terceira fase corresponde à agregação do relatório geral do Projeto Áridas. 
  • Na quarta fase é elaborada a estratégia geral de desenvolvimento sustentável para a região. Na quinta fase são propostas as políticas, programas, projetos, atividades, ações legais e institucionais específicas.

Um estudo de desenvolvimento sustentável do nordeste semi-árido

A estratégia geral:
  • A elaboração da Estratégia Geral é a quarta fase do Projeto. Incorpora, além dos resultados dos Estudos, as recomendações recolhidas no processo de participação. Esta questão é essencial para a construção da viabilidade política. 
Como ficou claro antes, a proposta de Estratégia não deve ser exógena à sociedade. Ao contrário, deve ser uma proposta alicerçada no processo social que condiciona o entendimento da questão nordestina atualmente, e nas perspectivas desse processo a partir dos cenários construídos de forma participativa. 
  • Apesar dessas considerações, alguns aspectos já despontam como prováveis componentes da estratégia. Evidentemente, a preocupação com a sustentabilidade, a perspectiva de longo prazo e o compromisso com a participação da sociedade são características inerentes. 
Há três aspectos relevantes que deverão fazer parte da estratégia: 
  1. A idéia de desenvolvimento endógeno; 
  2. A descentralização para o município e a comunidade; e 
  3. O novo papel do governo. 
A idéia de desenvolvimento endógeno se fundamenta na mobilização da capacidade de iniciativa local, estadual ou regional. 
  • Em vez do investimento exógeno, que muitas vezes produz o enclave desvinculado da realidade regional, freqüentemente destruindo atividades locais e depredando o meio ambiente, o investimento endógeno mobiliza recursos locais, cria mais empregos e produz mais efeitos de cadeia na economia regional. 
A partir da mobilização da iniciativa local, quer do setor público, quer do setor privado e da comunidade, como motor para o desenvolvimento regional ou local, torna-se possível alavancar recursos externos à região. No tocante à descentralização para o município e a comunidade, esta parece ser uma tendência que merece ser estimulada. 
  • As políticas sociais, em particular, são mais custo-efetivas quando coordenadas em nível local, com a participação comunitária. A participação local é capaz de encontrar formas criativas e baratas para resolver problemas que, vistos de Brasília ou da capital do estado, se tornam muito mais complexos. 
Para isso, deveria existir uma única estratégia de política social executada no nível do município e da comunidade, somando, entretanto, todos os recursos estaduais, federais e municipais. Da mesma forma, estratégias relativas ao desenvolvimento local deveriam ser consolidadas, coordenadas e executadas em nível local, somando os recursos das várias fontes. 
  • As experiências mostram que, quando isso ocorre, torna-se possível obter resultados muito significativos em questões relevantes como a educação, a saúde e a criação de empregos. Particularmente, o Áridas deverá desenvolver métodos para implementação de políticas de desenvolvimento sustentável em nível local e municipal, incluindo modelos de gestão participativa. 
A questão da redefinição do papel do governo é fundamental neste momento, no contexto do Brasil. De um lado, há uma crise nas instituições públicas brasileiras, cujas causas não cabe discutir aqui. De outro, há uma mudança no tocante à capacidade do Estado federal e dos estados federados de serem agentes diretos do processo de investimento. 
  • Em qualquer hipótese, o Estado federal, estadual ou municipal conserva um grande poder indutor do desenvolvimento. Esse papel pode ser multiplicado, entretanto, se o Estado for usado para alavancar recursos e iniciativas do setor privado e da sociedade em geral, em vez de concentrar-se apenas em investimentos públicos diretos. 
A idéia de reinvenção do governo, como vem sendo discutida no Brasil e em outros países, deve ser inserida como estratégia fundamental para a promoção do desenvolvimento sustentável. 
Do ponto de vista de conteúdo, as políticas serão agrupadas em três grandes grupos: 
  1. O primeiro, relativo à necessidade de conservação e uso racional da base física; 
  2. O segundo, relativo ao aperfeiçoamento da qualidade física e intelectual da população; 
  3. O terceiro, relativo às estratégias econômicas e sociais e aos processos de ocupação e uso do solo. 
Pela primeira vez uma estratégia de conservação da natureza e uma política de recursos hídricos abrangente (não apenas de construção de açudes e poços) são colocadas no contexto de uma política de desenvolvimento regional. 
  • No tocante ao desenvolvimento humano, a estratégia mostrará a urgência de resolver-se no Nordeste a questão da educação, particularmente da educação básica. Para que as crianças de hoje tenham, quando atingirem a idade de entrar no mercado de trabalho, pelo menos a formação do primeiro grau completo, é necessário que a sociedade brasileira implemente de imediato a grande prioridade da educação.
Este exemplo mostra a importância de pensar-se o longo prazo: não apenas para definir metas para o futuro, mas para indicar com clareza as prioridades do presente. O mesmo é válido para a questão de saúde, de nutrição, de saneamento, de combate à pobreza. 
  • No tocante às atividades econômicas e sociais, várias políticas serão orientadas para viabilizar o aproveitamento de oportunidades com base na mobilização da capacidade de iniciativa da região, segundo a estratégia de desenvolvimento endógeno antes mencionada. 
Um dos maiores desafios é o de identificar estratégias sustentáveis para reestruturar as políticas de desenvolvimento rural, em particular da agricultura, pecuária e agroindústria. Preocupação especial diz respeito à definição de estratégias de desenvolvimento comunitário e o papel dos pequenos produtores. 

Considerações Finais:
  • O Projeto Áridas faz parte de um esforço colaborativo de várias instituições federais, estaduais, internacionais e não-governamentais. Em nível federal incluem-se a Secretaria de Planejamento da Presidência da República, a SUDENE, a EMBRAPA, o IBGE, o IPEA, o Banco do Nordeste, a Secretaria de Irrigação, a CODEVASF. 
Em nível estadual, os governos do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Sergipe e Bahia. Em nível internacional, o Banco Mundial, o IICA e o HARC Centro de Estudos Avançados de Houston, Texas. 
  • Em nível não governamental, a Fundação Esquel Brasil. Outras instituições poderão agregar-se, uma vez que a participação é voluntária. Para viabilizar os estudos, o financiamento provém das instituições participantes, quer em termos de contribuição técnica, quer no financiamento dos estudos ou eventos específicos. 
A maior parte dos estudos se realiza no âmbito do PAPP Programa de Apoio ao Pequeno Produtor, que conta com financiamento do Banco Mundial. Espera-se que o Projeto Áridas contribua para a identificação de estratégias específicas para o apoio aos pequenos produtores e para o desenvolvimento comunitário, que se constituem em áreas de atuação do PAPP.

Referências Bibliográficas:

FURTADO, Celso (1985). A fantasia organizada. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 
GTD Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (1977). Uma Política para o Desenvolvimento do Nordeste . In: 
VERSIANI, Flávio Rabelo & BARROS, José Roberto Mendonça de (orgs.). Formação econômica do Brasil: a experiência da industrialização. São Paulo, Saraiva. Série 
ANPEC. HOLANDA, Nilson (1993). Sustainable development: concepts, theories and implications for planning . Anais da ICID, vol. II. Fortaleza, Fundação Esquel, 
BNB. MAGALHÃES, Antonio R. (org.) (1992). Desenvolvimento e meio ambiente no semi-árido: discursos e exposições especiais. 
ICID Conferência Internacional sobre Impactos de Variações Climáticas e Desenvolvimento Sustentável em Regiões Semi-Áridas. Declaração de Fortaleza . Brasília, Fundação Esquel Brasil, Senado Federal. 
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SCHMANDT, Jürgen & CLARKSON, Judith (orgs.). The regions and global warming: impacts and response strategies. Nova York, Oxford University Press. 
______, BEZERRA NETO, Eduardo & PANAGIDES, Stahis (1993). Projeto Áridas: políticas de desenvolvimento sustentável no Nordeste. Brasília, SEPLAN-IICAESQUEL (mimeo)
ROSENBERG, Norman J. & CROSSON, Pierre R. (1993). Understanding regional scale impacts of climate change and climate variability: application to a region in North America with climates ranging from semi-arid to humid . In: Anais da ICID, vol. II. Fortaleza, Fundação Esquel/
BNB. TENDLER, Judith (1993). New lessons from old projects: the workings of rural development in northeast Brazil. Washington, Banco Mundial. 
VERAS, Beni (senador) (1993). Desequilíbrio econômico inter-regional brasileiro: uma política espacial para o desenvolvimento nacional equilibrado. Brasília, Congresso Nacional Comissão Especial Mista (Parecer do Relator).

Um estudo de desenvolvimento sustentável do nordeste semi-árido

quinta-feira, 28 de abril de 2016

Responsabilidade Ambiental das Empresas brasileiras: Realidade ou Discurso ?

A Braskem, empresa brasileira da área de petroquímica, anunciou em setembro deste ano a produção do primeiro polietileno (plástico verde) a partir do etanol de cana-de-açúcar

Responsabilidade Ambiental das Empresas brasileiras: 
Realidade ou Discurso ?
Dália Maimon
O impacto do setor industrial na deterioração ambiental é significativo, ainda que se tenha reduzido nos últimos vinte anos. A indústria dos países desenvolvidos (PDs) vem contribuindo com, aproximadamente, 1/3 do PNB, enquanto as externalidades negativas têm sido proporcionalmente maiores.
No que tange à poluição do ar, o ramo industrial é responsável por 40 a 50% das emissões de óxidos de enxofre, 50% do efeito estufa e 25% das emissões de óxidos de azoto. No que se refere à poluição da água, a indústria contribui com 60% da demanda bioquímica de oxigênio e de material em suspensão e 90% dos despejos tóxicos na água.
Quanto ao lixo, o setor industrial descarrega 75% do lixo orgânico (OCDE, 1992). Os impactos da indústria sobre o meio ambiente são desiguais entre os diferentes ramos de atividades, uma vez que a poluição é condicionada pela matéria-prima e pela energia utilizada no processo de produção e, ainda, pela intensidade de incorporação de tecnologias limpas.
Estimativas recentes indicam que apenas 12% dos estabelecimentos industriais dos PDs, concentrando 20% do valor adicionado, são responsáveis por 2/3 do total da poluição industrial (OCDE, 1992). As indústrias vêm procurando incorporar os efeitos negativos da atividade econômica, as externalidades, dentre suas responsabilidades internas.
Em termos gerais 1 , pode-se afirmar que, até a década de 70, as empresas dos PDs limitavam-se a evitar acidentes locais e cumprir normas de poluição determinadas pelos órgãos governamentais de regulação e controle poluía-se para depois despoluir. O comportamento ambiental da firma baseava-se na maximização de lucros no curto prazo, sendo função do mercado de produtos e insumos e da reação à regulamentação.
Esta estratégia reativa significava investimentos adicionais na compra de equipamentos de depuração, acarretando necessariamente custos crescentes e o repasse destes para o preço dos produtos.
Desta forma, por muito tempo, argumentava-se sobre a incompatibilidade entre a responsabilidade ambiental da empresa e a maximização de lucros e entre a política ambiental e o crescimento da atividade econômica de um país. 
Fonte: Baumol & Oates, 1979. 

  • Uma fase de transição ocorreu durante os dois choques de petróleo, em 1973 e 1979. O aumento do preço das commodities resultou em inovações tecnológicas poupadoras de energia e de matéria-prima. 
As indústrias, que estavam sendo pressionadas para incorporar equipamentos de despoluição, aproveitaram a ocasião para repensarem seus processos de produção. O consumo total de energia do setor industrial passou de 40%, em 1970, a 34%, em 1985, enquanto sua participação no PNB se manteve constante (Institut de l'Enterprise, 1991). 
  • Na década de 80, uma nova realidade sócio-ambiental vem se consolidando e implicando na mudança de postura das empresas que acabam descartando velhas perspectivas e práticas reativas ao meio ambiente. 
A responsabilidade ambiental passa, gradativamente, a ser encarada como uma necessidade de sobrevivência, constituindo um mercado promissor um novo produto/serviço a ser vendido diferenciando a política de marketing e de competitividade. 
  • Alguns fatores contribuíram para essa mudança de comportamento: Em primeiro lugar, a opinião pública tem estado muito sensível às questões ambientais. Isto afeta os negócios de duas formas: na sabotagem dos consumidores e investidores às empresas que poluem o meio ambiente e na expansão dos mercados de produtos environment friendly. 
Em segundo lugar, a expansão do movimento ambientalista que vem adquirindo uma considerável experiência técnica e organização política, seja no endosso de produtos ecológicos, seja na elaboração e avaliação dos EIAS/RIMAS, ou na difusão de tecnologias alternativas etc. 
  • Esses dois fatores conscientização da população e a expansão do movimento ambientalista têm repercutido numa maior pressão aos órgãos de regulação no que tange ao controle e monitoramento da poluição e na consolidação de um aparato institucional e legal da política ambiental. 
Em terceiro lugar, a disponibilidade e difusão de inovações tecnológicas (processos e produtos) que reduzem ou eliminam a poluição. Finalmente, a globalização da ecologia tem resultado em pressões e ingerências internacionais, mesmo em países onde a conscientização não é tão acirrada. 
  • Vale citar a tentativa de introdução do dumping social e ambiental nas recentes negociações do GATT. Fonte: J. F. Tomer, 1992. O comportamento ético-ambiental não é, ainda, a regra, mesmo nos PDs. 
Pesquisas efetuadas junto às empresas da Comunidade Européia concluem que a responsabilidade ambiental nem sempre faz parte da estratégia das empresas, a não ser que estas recebam sinais claros e positivos do mercado. 
  • Os custos e os aspectos mercadológicos são, ainda, os fatores decisivos na mudança de estratégia. Assim, o pior dos poluidores pode se tornar o modelo de virtude ambiental, desde que aspectos técnico-econômicos e mercadológicos apontem para esta direção (Cramer et al., 1990). 
A Institucionalização da Responsabilidade Ambiental:
  • Da interação de atores externos e internos à firma é que resulta sua política ambiental. A depender do ramo da empresa haverá uma maior interface com a variável ecológica. Isto resulta em arranjos institucionais distintos, seja propriamente em nível da atividade/responsabilidade, seja na interação desta com as demais funções organizacionais. 
A resposta das empresas a essas pressões internas e externas assume basicamente três linhas de ação: adaptação à regulamentação ou exigência do mercado, incoporando equipamento de controle da poluição nas saídas, sem modificar a estrutura produtiva e o produto; adaptação à regulamentação ou exigência do mercado, modificando os processos e/ou produtos (inclusive embalagem). 
  • O princípio é de prevenir a poluição, selecionando matérias-primas, desenvolvendo novos processos e/ou produtos; antecipação aos problemas ambientais futuros, ou seja, assumindo um comportamento proativo e de excelência ambiental. O princípio é de integrar a função ambiental no planejamento estratégico da empresa. 
Estas distintas linhas de ação definem a percepção e responsabilidade ambiental das empresas, influindo nas funções e estruturas específicas internas à firma. A presença e freqüência destas são indicadores da estratégia da firma. 
  • Na ex Alemanha Ocidental, somente 20% das indústrias médias e grandes não têm departamento/divisão de meio ambiente, enquanto na França, apenas 20 empresas das grandes firmas são dotadas desta função (Institut de l'Enterpritse, 1991). 
Adicionalmente, os setores químico, de petróleo e farmacêutico, onde os acidentes ecológicos são mais freqüentes, foram os primeiros a incorporar o meio ambiente no programa institucional. A função ambiental na empresa tem por atividade/responsabilidade controlar a performance interna e externa da regulação ambiental: treinamento e informação do pessoal; mensuração das emissões, do lixo industrial, dos produtos e processos nocivos; elaboração de planos de emergência; manter contacto com a comunidade órgãos governamentais, vizinhança, entidades ambientalistas e público em gera; tentar influenciar a estratégia política da firma desde o lançamento de uma nova planta, novo produto e/ou política de R&D da empresa. 
  • Cabe ressaltar que a grande maioria das empresas se concentra na primeira e segunda funções supracitadas. A função ambiental específica assume distintas formas e funções no organograma da empresa: desde uma coordenação global de uma holding os comitês, departamentos em nível do staff associados ou não ao planejamento estratégico, departamento de meio ambiente vinculado ao de marketing ou, simplesmente, uma divisão de controle da poluição na linha de produção. Inicialmente, a função ambiental da empresa ficava alocada no departamento de Segurança e Trabalho, e por esta origem, em muitas firmas registramos Departamentos de Segurança e Ecologia.
As Auditorias Ambientais: 
  • No intuito de conhecer seus pontos vulneráveis, algumas empresas introduziram, voluntariamente, as auditorias ambientais cujos resultados não podem ser divulgados externamente. 
A auditoria ambiental é um instrumento de gestão que compreende uma avaliação sistemática, documentada, periódica e objetiva sobre a organização, a gestão e os equipamentos ambientais, visando auxiliar a resguardar o meio ambiente, facilitando a gestão do controle das práticas ambientais e avaliando a compatibilidade com as demais políticas da empresa. 
  • A auditoria ambiental iniciou-se, voluntariamente, na segunda metade da década de 70, em várias empresas americanas tais como General Motors, Olin e Allied Signal. Nos países desenvolvidos, a maior freqüência das auditorias ambientais deve-se à exigência das companhias de seguro, em face da maior incidência de acidentes e da respectiva indenização. 
Estes acidentes são decorrentes principalmente do processo de produção, de transporte e e/ou de armazenamento do produto e do lixo industrial. Alguns acidentes como o de Seveso, Bhopal, Chernobyl e Basel tiveram repercussão internacional em face das conseqüências penosas em termos de mortes humanas, degradação da flora e da fauna e magnitude das indenizações envolvidas. 
  • Estatísticas coletadas durante vinte cinco anos pelo Major Hazard Incident Data Service registram, até 1986, 2.500 acidentes industriais, sendo que mais da metade (1.419) ocorreu entre 1981 e 1986. A Tabela 1 indica acidentes de grande risco selecionados segundo a periculosidade (25 mortos, e/ou 125 feridos, e/ou 10 evacuações). 
Estes acidentes têm sua origem no transporte ou armazenamento de substâncias tóxicas do setor químico, e na produção de energia, em particular, nas usinas nucleares e nas plataformas marítimas. Observa-se que a freqüência destes acidentes vem diminuindo nos países da OCDE e aumentando no resto do mundo. 
  • Cabe observar, entretanto, que cresce o número de acidentes com indenização superior a 10 milhões de dólares: um na primeira metade dos anos 70 e sete na segunda metade dos anos 80. Até 1984, os EUA eram o líder de acidentes de grande risco. 
As auditorias ambientais estão sendo introduzidas mais freqüentemente nos países industrializados, tais como o Canadá, a Holanda, a Grã-Bretanha e os Estados Unidos. Na Suécia, em 1987, um comitê governamental propôs que 4 mil empresas sejam obrigadas a um Relatório Ambiental anual submetido à Autoridade de Inspeção. Esta proposta foi implantada em 1989. 
  • A grande vantagem das auditorias é que estas permitem que as empresas tenham maior cuidado com o processo de produção identificando as áreas de risco, apontando vantagens e desvantagens e encorajando melhorias contínuas. 
Neste sentido, as auditorias induzem à utilização de tecnologias limpas, prudente utilização de recursos, matéria-prima e lixo industrial e à identificação de perigos e riscos potenciais. Os resultados das auditorias ambientais não podem ser divulgados. 
  • Algumas empresas, entretanto, utilizam as auditorias como um instrumento de comunicação interna e externa da empresa. Tal é o caso da Hydro Ontario, no Canadá, que publica, anualmente, junto com o balanço da empresa os resultados da Auditoria Ambiental. 
O Ecobusiness:
  • O ecobusiness tem sido pouco estudado e designa uma gama de produtos cuja demanda cresce com a difusão da consciência ecológica. O setor privado deixa de considerar o meio ambiente como somente um adicional de custo, passando a vislumbrar lucros com a criação e difusão de novos produtos e mercados. 
Sob a mesma designação de ecobusiness classificam-se a indústria de equipamento de depuração, as empresas de serviço de despoluição do ar e da água, a reciclagem de lixo, o controle de ruídos, e uma extensa lista de produtos que são vendidos a partir de sua imagem ecológica. 
  • O setor de despoluição é o mais oligopolizado do ecobusiness, concentrado em poucas e grandes companhias. Neste setor estão incluídas as companhias de serviços públicos urbanos (abastecimento e despoluição da água, coleta e reciclagem de lixo), despoluição de óleos e de indústria química. 
As empresas de consultoria em meio ambiente envolvem cem empresas internacionais, a grande maioria de pequenas empresas privadas. Estas assistem aos agentes poluidores em vários projetos, tais como: desenho de facilidades de controle de poluição, consultorias relativas à regulamentação ambiental, projetos de engenharia, assentamento, auditorias ambientais, análise de risco, assistência para obtenção de licença de poluição etc.
  • As empresas de serviços de análise analisam a composição físico-química da água e dos resíduos sólidos de amostras, para avaliar o conteúdo e extensão da poluição. Somente no continente americano do norte há mais de mil firmas de laboratório de análise que competem fortemente entre si. 
A dinâmica de cada um desses subsetores do ecobusiness é completamente distinta. A incorporação das tecnologias limpas vai depender, entre outros fatores, da taxa de investimento da indústria, da sua capacidade de autofinanciamento e do desenvolvimento tecnológico. 
  • O setor de depuração está associado à maior demanda de serviços urbanos ou de gestão territorial (despoluição de bacias hidrográficas) e do orçamento público. Finalmente, os ecoprodutos são dependentes das novas preferências dos consumidores por produtos verdes , pois a maior consciência ambiental vem repercutindo na modificação do conceito de qualidade do produto, que agora precisa ser ecologicamente viável. 
As perspectivas são promissoras, uma vez que em dez anos a expectativa é de dobrar o faturamento de US$ 300 bilhões. A grande parcela é ocupada pelo continente americano do norte, onde somente os EUA detêm 40% do total do mercado. 
  • A Europa está em segundo lugar com 78 bilhões, liderada pela Alemanha. Na Ásia, o país mais significativo é o Japão. Os mercados latino-americano e africano são inexpressivos, denotando que o ecobusiness é, ainda, um negócio do Primeiro Mundo. 
Este setor é ainda liderado pelas tradicionais prestadoras de serviço coletivo de depuração da água e reciclagem de lixo. Em primeiro lugar, está o líder francês, a Générale des Eaux, seguida da Waste Management, empresa americana de tratamento de lixo. 
  • Embora, em 1989, o mercado europeu de controle de poluição somasse US$ 33 bilhões, (51% destinavam-se ao tratamento de água, 27% à despoluição do ar, 17% à manipulação de resíduos e 5% à descontaminação do solo), só aparece na tabela a ABB Flakt, pois na sua absoluta maioria as firmas produtoras de equipamentos de despoluição são de pequeno e médio porte. 
Com o crescimento do mercado, observa-se, no entanto, um forte movimento de concentração devido à aquisição de firmas estabelecidas no setor de bens de capital. A firma sueca ABB Flakt, com faturamento de US$ 2,8 bilhões, é uma grande exceção, operando em 33 países. 
  • Outros negócios estão sendo realizados, mostrando que os eco-produtos são um mercado promissor. Após consultar a população de 22 países ricos e pobres, uma recente pesquisa de mercado elaborada pelo Instituto Gallup indica que, em 20, os problemas ambientais foram considerados prioritários vis-à-vis a questão do crescimento econômico. 71% dos brasileiros pesquisados também assim pensam. 
Do total dos entrevistados, 53% disseram estar dispostos a pagar um preço mais alto pela proteção do meio ambiente. Os que não concordaram com esta alternativa foram os habitantes da Rússia, Filipinas, Japão, Polônia e Turquia (Globo, 5.5.1992). 
  • Esta sensibilidade ambiental já se traduziu em maiores vendas. Recente estudo americano concluiu que, no primeiro semestre de 1990, 9,2% dos produtos introduzidos no mercado eram anunciados como verdes , enquanto, em 1985, estes constituíam apenas 0,5%. 
Por sua vez, o mercado francês de ecoprodutos somava, em 1989, US$ 6 bilhões dólares, o que corresponde a 1% do consumo familiar, com expectativa de crescimento, o que passa a ser interessante do ponto de vista empresarial. Para subsidiar e atender esta nova demanda do consumidor, surgiram vários programas de endosso ecológico que pode ser fornecido por órgãos públicos ou privados. 
  • A eco-compatibilidade dos produtos passa a ser uma informação adicional ao preço na escolha da cesta de consumo. As experiências pioneiras de endosso da ecologicidade do produto, através do selo verde, são a alemã, a canadense e a americana. O Ange Bleu, garantido por uma companhia governamental alemã, foi introduzido em 1978 e já alcança 3.600 produtos. 
A experiência canadense Choix écologique , lançada em 1988 e efetivada em 1991, é um pouco mais rigorosa: uma comissão analisa todo o ciclo de vida de um produto desde sua fabricação até sua eliminação. Até junho de 1992 somente quatorze produtos ganharam tal aval. 
  • Nos EUA os selos ecológicos (Green Cross e Green Seal) são endossados por ONGs ecológicas. O endosso ecológico atende a vários objetivos: melhorar as vendas ou imagem dos produtos, sensibilizar os consumidores para os distintos efeitos ambientais de produtos da mesma categoria, oferecer, cada vez mais, informações fidedignas e exatas sobre a composição dos produtos, forçar os fabricantes a assumir a responsabilidade por seus produtos. 
E finalmente, melhorar a qualidade ambiental, uma vez que os consumidores passam a demandar produtos ecocompatíveis.

Empresas de diferentes setores que têm trabalhado nessa causa com seriedade e comprometimento têm colhido excelentes resultados de negócios e de posicionamento, e não estamos falando apenas de companhias de outros países. Organizações brasileiras também têm se destacado por sua “atuação sustentável”.

O Meio Ambiente e as Empresas no Brasil:
  • A incorporação da variável ambiental nas empresas brasileiras foi descompassada em relação àquela ocorrida nos PDs. Em Estocolmo, a posição ambiental da delegação brasileira era defensiva, sob o argumento de que a pior poluição é a da pobreza. 
Os nossos ministros chegaram a convidar empresas a aqui se instalarem, alegando que o Brasil queria indústrias e que tinha um grande espaço para ser poluído (Maimon, 1992). Assim, na década de 70, a abundância de recursos naturais e a ausência de uma política de controle ambiental foram fatores de atração aos investimentos nos setores de mineração, química, construção naval, que já sofriam restrições nos países de origem. 
  • Estas acarretavam custos crescentes da despoluição que atingiam entre 2,03% e 2,89% do preço final. Apesar dos dois choques de petróleo, não se modificou a concepção do crescimento econômico brasileiro no que tange ao aproveitamento racional dos recursos naturais e do meio ambiente. 
Agia-se como se estes fossem bens livres e sem valor econômico e social. A crise energética, que para muitos países, tais como o Japão, significou uma busca de processos de produção poupadores de recursos naturais e energéticos, acarretou, entre nós, a pesquisa de fontes alternativas de energia, e não repercutiu na racionalização de sua utilização. 
  • As empresas, por incentivo do governo, mudaram seu perfil de consumo energético, mas os subsídios à utilização de novas fontes pouco incentivaram a redução da demanda de energia no seu todo (Tolmasquim, 1992). 
O recurso a novas fontes, em particular o Pro-Álcool e a expansão das hidrelétricas, não levou em conta a deterioração ambiental, mas fatores econômicos de preços relativos dos insumos energéticos e de escassez de divisas. 
  • O Pro-Álcool, o mais bem-sucedido programa de substituição a partir da biomassa no mundo, não integrou a questão ecológica, casualmente teve efeitos positivos na poluição atmosférica, mas repercussões negativas nas zonas de produção (Sachs et al., 1989). 
Identicamente, argumentava-se que a energia hidrelétrica era limpa, pois diminuía, consideravelmente, as emissões atmosféricas. Entretanto, esqueceu-se de avaliar os impactos da construção de hidrelétricas como a de Balbina. 
  • Na década de 80, consolidou-se o aparato institucional e legal da política ambiental, o movimento ambientalista expandiu-se e aumentaram as pressões ecológicas externas. Entretanto, a recessão atravessada pela economia brasileira não estimulou novos investimentos em equipamentos de despoluição e/ou mudanças de processos. 
Neste período, ganharam maior participação na estrutura industrial brasileira, inclusive em termos do comércio exterior, os setores de bens intermediários (minerais não-metálicos, metalurgia, papel e celulose e química) reconhecidos por suas potenciais externalidades negativas (Torres, 1993). 
  • A partir de 1991, as empresas passaram a se pronunciar mais intensivamente sobre suas responsabilidades ambientais. Isto se deve, por um lado, ao debate sobre a modernidade, introduzido pelo governo Collor, que difundiu juntamente com as práticas de liberalismo econômico as de qualidade total. 
E por outro, à preparação e realização da Conferência da UNCED no Rio de Janeiro que mobilizou os empresários em distintos fóruns. Os principais fóruns são o Business Council for Sustainable Development, ligado ao movimento empresarial internacional liderado por Stephan Schmidheiny. Neste mesmo espírito, foi criada, em 1991, a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável que soma vinte associados e um capital inicial de 4 milhões de dólares. 
  • A referida Fundação tem por objetivo intermediar órgãos financiadores, como o Banco Mundial, e o setor privado, no que tange à avaliação de projetos que ponham em risco o meio ambiente. Já fazem parte a Gazeta Mercantil, a Vale do Rio Doce, Caemi, Varig, Mannesmann, Papel Simão, Ripasa e Aracruz. 
Esse comportamento das empresas atende à crescente demanda do seu ambiente externo. Segundo uma pesquisa de opinião elaborada no ABC, 46% dos entrevistados atribuíram às empresas os problemas ambientais. 
  • A União e os estados são percebidos como menos implicados, o que não é o caso dos municípios. A pesquisa revela que para os entrevistados os problemas de poluição são sobretudo de gestão local e associados a fontes estacionárias
Determinantes da responsabilidade ambiental:
  • A pesquisa pioneira de Maimon (1991) junto a 86 empresas brasileiras indica que, tal como nos PDs, a responsabilidade ambiental nas empresas é desigual. Os fatores que determinam a maior ou menor performance ambiental são a política dos órgãos de regulação e a pressão da comunidade local e internacional. 
Prevalece, ainda entre nossos empresários, uma atitude reativa e uma ideologia de antagonismo entre a proteção ambiental e crescimento econômico da empresa. A responsabilidade ambiental restringe-se a atender às normas de poluição e aos Relatórios de Impacto Ambiental (RIMAS), cujas exigências são diferenciadas nos diversos estados. 
  • A legislação referente às auditorias ambientais está sendo regulamentada pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, prevendo a obrigatoriedade das auditorias, tal como ocorre com os RIMAS. Entretanto, a pressão da população local, que sofre os efeitos da poluição, e a pressão do movimento ecológico internacional têm sido mais importantes na fiscalização das empresas. 
Os órgãos fiscalizadores estaduais estando despossuídos de recursos técnicos e humanos necessários à gestão e avaliação dos impactos ambientais, à exceção dos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, e o retardamento na regulamentação da Constituição de 1988, rica em matéria ambiental, vêm inibindo a eficiência da ação fiscalizadora. Inserção internacional 
  • As empresas com performance ambiental são aquelas de maior inserção internacional, uma vez que neste ambiente a sensibilização dos problemas ambientais vem implicando uma maior pressão dos acionistas, consumidores e/ou órgãos de financiamento para uma nova postura empresarial. 
Cabe destacar-se alguns tipos de empresas: as de exportação de produtos derivados de recursos florestais, minerais e animais selvagens; as empresas multinacionais que, por exigência de seus acionistas e consumidores, acabam melhorando sua relação com o meio ambiente; as que dependem de financiamento de bancos internacionais, que exigem relatório de impacto ambiental para a obtenção de recursos; e as empresas da região amazônica que vêm sendo pressionadas pelo movimento preservacionista internacional. 
  • As empresas exportadoras de recursos naturais ou de seus derivados vêm sofrendo pressão dos importadores que exigem certificados de origem. Este é o caso da indústria de celulose, madeira e de mineração. Aqui, vale citar as ações de empresas como a Vale do Rio Doce, que tem investimentos previstos de US$ 3,5 bilhões para os próximos dez anos, destinados à recuperação de 3,5 milhões de hectares de áreas degradadas pela mineração. 
A Aracruz e a Riocell (ex-Borregaard), que exportam papel e celulose, explicitam nos seus folders a distância que estão situadas em relação à Amazônia, para afastar qualquer dúvida dos importadores quanto à proveniência da madeira. 
  • A revista Newsweek causou sérios problemas para a Riocell quando, por equívoco, publicou que esta utilizava madeira proveniente da referida região (Veja, 10.7.1991). As empresas de grandes projetos de infra-estrutura, em particular a Eletrobrás, tiveram que se adaptar às novas regras exigidas pelo Banco Mundial, a partir de 1988, para o financiamento dos novos investimentos. 
Como é sabido, o Banco começou a condicionar seus empréstimos à apresentação dos RIMAS e dos projetos de mitigação, extremamente rígidos no que se refere à construção de hidrelétricas na Amazônia. Origem do capital A origem do capital (nacional/privado, multinacional ou público) não é o fator determinante da responsabilidade ambiental, mas resultante da maior ou menor pressão internacional e dos órgãos de regulação. 
  • O comportamento do setor elétrico e da Vale do Rio Doce não traduz as práticas das empresas do setor público, principalmente aquelas ligadas à Segurança Nacional. Como a fiscalização e o controle ambiental são praticados por órgãos estaduais, observou-se uma relativa impunidade nas empresas estatais. 
Não se verificou uma ativa interdição de siderúrgicas ou petroquímicas pertencentes ao setor público que são altamente poluidoras. As raríssimas exceções foram a interdição do terminal da Petrobrás da Baia da Ilha Grande, em 1989, que, após uma série de acidentes de lançamento de petróleo ao mar, estava inviabilizando a atividade turística da região de lazer da alta burguesia do Rio e de São Paulo, Angra dos Reis. Nesta mesma região, a desativação de Angra II também merece ser lembrada. 
  • A região de Duque de Caxias não teve a mesma sorte, o que sugere que a pressão do movimento ambientalista local foi determinante. Algumas empresas multinacionais, e mesmo aquelas que foram atraídas para o Brasil pela inocuidade de nossa política ambiental, por sofrerem pressão de seus investidores e consumidores nos países de origem, se vêem compelidas a implementar programas ambientais. 
A British Petroleum, que assumiu uma imagem verde na Europa, sofreu fortes pressões para abandonar suas atividades de mineração pouco ecológicas no Brasil. Sua concorrente brasileira Shell tem sua política ambiental definida pela holding internacional, adotando normas de poluição mais rígidas que as da legislação brasileira. 
  • A Rhodia, a subsidiária do grupo Rhône Poulenc, teve que arcar com o passivo ambiental da fábrica de pentaclorofenato de sódio o pó da china <197>, adquirida em 1976 em Cubatão. A Rhodia tornou-se herdeira de 60 mil toneladas de depósitos clandestinos destes resíduos venenosos, que foram denunciados pela população. Somente o incinerador utilizado na queima do pó custou 16 milhões de dólares, enquanto a unidade de Cubatão não atinge um faturamento anual de US$ 500 mil. 
A incorporação da proteção ambiental nas empresas multinacionais se dá mais facilmente, uma vez que suas filiais podem ir em busca de recursos financeiros e técnicos necessários para a incorporação de tecnologias limpas e às experiênciais de gestão disponíveis nos países de origem. 
  • Cabe ressaltar, entretanto, que a incorporação da responsabilidade ambiental nas empresas multinacionais localizadas no Brasil é defasada em relação ao país de origem do capital. Localização 
A localização da empresa é, também, fator determinante de responsabilidade ambiental. As empresas poluidoras localizadas perto de importantes centros urbanos tiveram que mudar sua relação com o meio ambiente. 
  • A Caemi, mineradora de ferro-gusa e localizada a 800 metros de um dos bairros mais nobres de Belo Horizonte, deixou de explorar 40 milhões de toneladas de ferro no valor de 800 milhões de dólares, por pressão da população. 
Estabeleceu um limite de 100 metros de rebaixamento da Serra do Curral e está construindo no antigo campo de mineração um centro comercial, um bairro residencial e um lago. Em Cubatão, denominado Vale da Morte, um grande programa de melhoria do meio ambiente foi implantado entre 1985 e 1991. US$ 350 milhões foram investidos em equipamentos antipoluição e outros US$ 800 milhões em conservação e reflorestamento. 
  • Os resultados foram bastante estimulantes: redução de 72% da poluição atmosférica, de 97% dos metais pesados e de 93% dos resíduos orgânicos. Apesar deste enorme investimento, em julho de 1991, 23 empresas tiveram que interromper suas atividades por 24 horas, em função de inversão térmica. 
O prejuízo foi de 4 milhões de dólares (Financial Times, 10.7.1991). Por sua vez, os empresários da região amazônica são aqueles que sofrem a maior pressão internacional sobre suas atividades poluidoras. 
  • Não há indícios claros que esta pressão tenha se traduzido em mudanças efetivas no comportamento das empresas, mas a retórica está cada vez mais rica. O documento Carta para o Desenvolvimento Sustentável da Amazônia , publicado por diversos órgãos empresariais da região, ilustra até que ponto chegou a posição defensiva dos empresários, que se viram compelidos a se adaptar ao discurso do desenvolvimento sustentado, do zoneamento sócio-econômicoecológico, do aproveitamento das potencialidades regionais, visando assegurar tanto às gerações presentes, quanto futuras, melhor participação na riqueza gerada etc. 
Ao mesmo tempo, insistem na questão da soberania nacional, da efetiva e concreta viabilidade de instalação de indústrias de produtos naturais, florestais, minerais e de pesca, para o incentivo à implantação de agroindústria etc. 
  • O confronto da performance da Aracruz e da Borregaard, ambas no ramo de papel e celulose, é um bom indicador da importância da pressão do movimento ecológico. Estas empresas têm vários pontos em comum: criadas na mesma época para aproveitamento dos recursos florestais para suprir o mercado internacional de papel e celulose, em declínio nos países nórdicos. 
Controle acionário nacional para a Aracruz e norueguês para a Borregaard, ainda que o vice-presidente da primeira seja, também, norueguês. O acesso à tecnologia é praticamente o mesmo. A performance ambiental da Aracruz, apontada nacional e internacionalmente como a empresa exemplo na racionalidade de utilização dos recursos naturais, contrasta com a performance da Borregaard, cuja poluição da água e do ar no rio Guaíba culminaram com seu fechamento em 1973, graças ao enérgico desempenho do grupo ambientalista local liderado por José Lutzemberg, secretário de Meio Ambiente do governo Collor. 
  • Ecobusiness Recentemente, vem se observando no Brasil, tal como no resto do mundo, que o ecobusiness está em expansão, em particular na indústria de cosméticos (Boticário), alimentação (produtos naturais), reciclagem de lixo e no marketing das empresas. 
O marketing ecológico foi introduzido, pela primeira vez, em 1990, pela São Paulo Alpargatas na venda de camisas ecológicas. Esta foi sua campanha de maior retorno de vendas. A SOS Mata Atlântica, por sua vez, associou-se à Aqualongo na venda de camisetas do projeto Tamar. 
  • A Atlantis também lançou uma campanha de óleo verde que economiza a gasolina e o álcool. Com a aproximação da Eco-92, este movimento foi se intensificando. Um setor em grande expansão é o dos meios de comunicação escrita e falada. A intensidade da participação da imprensa brasileira é inédita no mundo. 
Os jornais de grande circulação dedicam uma página diária à Ecologia/Meio ambiente, chegando o Jornal do Brasil a publicar um caderno por semana. A Gazeta Mercantil, um jornal destinado quase que exclusivamente a empresários, publica, desde 1989, uma matéria diária sobre questões relacionadas às empresas e meio ambiente. A Rede Globo de Televisão tem um programa semanal, ainda que fora do horário nobre, sobre ecologia

Conclusão:
  • A onda neoliberal que induz à adoção de mecanismos e instrumentos de mercado para a proteção do meio ambiente faz ressaltar o importante papel do movimento ambientalista seja na denúncia e fiscalização das questões ambientais, seja no apoio à população nas auditorias públicas, seja no endosso da ecologicidade dos produtos verdes. 
Apesar do otimismo no engajamento das empresas em relação à responsabilidade ambiental, ficam pendentes algumas questões que merecem maior reflexão. Em primeiro lugar, uma questão metodológica: como distinguir a retórica da empresa da implementação efetiva em relação à responsabilidade ambiental, qual é o descompasso entre a riqueza do discurso e a ação? Para tal devem se intensificar as pesquisas de estudo de caso em empresas. 
  • Em segundo lugar, há evidências da incompatibilidade relativa em termos da dinâmica de expansão da produção e das vendas das empresas e uma racionalização planetária do consumo e da utilização das matérias-primas. A sociedade de consumo, com seu viés sobre a obsolescência planejada, introdução de novos produtos, consumo conspícuo, tem sido precondição da expansão das vendas das empresas. 
O ecobusiness não atingiu, ainda, o vigor necessário para poder substituir esse dinamismo. Finalmente, uma questão redistributiva quanto à globalização dos custos ambientais num planeta onde o desenvolvimento econômico e social é desigual e onde a capacitação das empresas de responder às questões ambientais é também diferenciada. 
  • O ritmo de incorporação de ecotecnologias vai depender do preço dos recursos naturais e da efetividade das políticas de controle, mas também da capacitação da empresa e do ramo industrial em relação à dinâmica de inovações tecnológicas e financeiras necessárias à implementação da nova atividade. Quem deverá pagar pelo ônus ao meio ambiente? As empresas dos países desenvolvidos e/ou dos países em desenvolvimento? Quais os mecanismos de financiamento?
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Além de enfrentar a crise, as empresas brasileiras terão mais um desafio pela frente. Segundo especialistas, ações de sustentabilidade social e ambiental estão sendo cada vez mais consideradas nas decisões de investidores.