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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Espaços públicos e práticas participativas na gestão do meio ambiente no Brasil

Espaços públicos e práticas participativas 
na gestão do meio ambiente no Brasil

Pedro Roberto Jacobi
Professor Associado da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo.
  • O objetivo deste texto é de aprofundar a reflexão em torno das dimensões da participação e das possibilidades de ampliação da cidadania na gestão do meio ambiente.
O desafio que nos colocamos é de analisar, de um lado, os impactos de práticas participativas que apontam, a partir da manifestação do coletivo para uma nova qualidade de cidadania, que institui o cidadão como criador de direitos para abrir novos espaços de participação sociopolítica, e, de outro, os aspectos que configuram as barreiras que precisam ser superadas para multiplicar iniciativas de gestão que articulam eficazmente a complexidade com a democracia.
  • Existe uma crescente necessidade de entender as ambigüidades dos processos sociais e os arranjos possíveis, mas, principalmente, os limites nas experiências que inovam na gestão ambiental.
A análise focaliza o fortalecimento do espaço público e a abertura da gestão pública à participação da sociedade civil na elaboração de suas políticas públicas; e, também, aborda a sempre complexa e contraditória institucionalização de práticas participativas inovadoras que marcam rupturas com a dinâmica predominante.
  • Os temas aqui desenvolvidos estão organizados de forma a introduzir o leitor no universo de questões que, apesar da sua multiplicidade, centram-se na associação entre cidadania, democracia participativa, governabilidade e sustentabilidade.
Participação e espaço público:
  • Na América Latina, a luta pela conquista de espaços para aumentar a participação social é, sem dúvida, um dos aspectos mais desafiadores para análise sobre os alcances da democracia. As experiências de deliberação participativa, desde o início dos anos 1980, no Brasil, estão associadas à capacidade que os movimentos sociais tiveram de explicitar demandas relacionadas principalmente com a distribuição de bens públicos e também, em menor escala, na formulação de políticas públicas. Parafraseando Eder Saber, "quando novos personagens entraram em cena", definiu-se um ponto de inflexão, no qual se amplia a participação popular na esfera pública e a conquista de direitos de cidadania.
Os novos arranjos participativos são reforçados a partir da Constituição de 1988, destacando-se o desenvolvimento de práticas que abrem espaço para a democracia participativa (Santos & Avritzer, 2002; Dagnino, 2002). A revitalização da sociedade civil, desde meados da década de 1980, reflete-se no aumento do associativismo e na presença dos movimentos sociais organizados que se explicitam na construção de espaços públicos que pressionam pela ampliação e democratização da gestão estatal (Avritzer, 2002, Costa, 2002). 
  • Na década dos 90, a participação nas suas diversas dimensões é amparada e institucionalizada dentro dos marcos das democracias representativas. A participação popular transforma-se no referencial de ampliação de possibilidades de acesso dos setores populares dentro de uma perspectiva de desenvolvimento da sociedade civil 1 e de fortalecimento dos mecanismos democráticos, mas também para garantir a execução eficiente de programas de compensação social no contexto das políticas de ajuste estrutural e de liberalização da economia e de privatização do patrimônio do Estado.
A participação minimalista (Tanaka, 1995) aponta para o fato de que existe um déficit de participação e de constituição de atores relevantes, o que pode redundar em crescente fator de crise de governabilidade 2 e de legitimidade. A insatisfação pela deterioração ou a falta de melhoria nos níveis de qualidade de vida, sem canais efetivos onde estes possam ser explicitados, pode conduzir à erosão da titulariedade dos atores relevantes expressa em fenômenos como a volatilidade eleitoral e o desvirtuamento de propostas de gestão pautadas no aprofundamento das práticas democráticas. Poucas são, de fato, as experiências de gestão municipal que assumem uma radicalidade democrática na gestão da coisa pública, assim como ampliam concretamente o potencial participativo. 
  • A análise dos processos existentes está permeada pelos condicionantes da cultura política, tanto do Brasil como do resto dos países da América Latina, marcados por tradições estatistas, centralizadoras, patrimonialistas e, portanto, por padrões de relação clientelistas, meritocráticos e de interesses criados entre Sociedade e Estado. Entretanto, estes condicionantes não têm sido necessariamente um fator impeditivo para a emergência de uma diversidade de formas de participação dos setores populares, onde embora freqüentemente muitas se situem no escopo das práticas no contexto das tradições anteriormente descritas, outras as contradizem abertamente.
A possibilidade de alterar a institucionalidade pública está associada às demandas que se estruturam na sociedade, e a esfera pública representa a construção da viabilidade ao exercício da influência da sociedade nas decisões públicas assim como coloca uma demanda de publicização no Estado. O que está em jogo é a necessidade de atualização dos princípios ético-políticos da democracia, onde o fortalecimento do tecido associativo potencializa o fortalecimento da democracia no resto das esferas da vida social. Segundo Putnam (1994), as práticas sociais que constroem cidadania representam a possibilidade de constituir-se num espaço privilegiado para cultivar a responsabilidade pessoal, a obrigação mútua e a cooperação voluntária. 
  • As práticas sociais que lhe são inerentes relacionam-se com a solidariedade e no encontro entre direitos e deveres. A ampliação da esfera pública tem colocado uma demanda à sociedade em termos de obter uma maior influência sobre o Estado, tanto como sua limitação, assumindo que a autonomia social supõe transcender as assimetrias na representação social, assim como modificar as relações sociais em favor de uma maior auto-organização social.
O fortalecimento da sociedade civil coloca em xeque as críticas em torno da distinção Estado/sociedade civil.3 A constituição de esferas públicas alternativas simultaneamente com a ampliação do espectro de problemas tratados publicamente estão associadas à emergência de novos atores coletivos, como é o caso do movimento ambientalista e ecologista. 
  • Segundo Bobbio (1987) a contraposição entre duas dinâmicas "estatalização da sociedade" e "socialização do Estado se dá "através do desenvolvimento de diversas formas de participação dentro das opções políticas, do crescimento das formas de organização de massa que exercem direta ou indiretamente algum poder político, onde a expressão "Estado social" pode ser entendida não só no sentido de Estado que permeou a sociedade, mas também no sentido de Estado permeado pela sociedade". Os dois processos representam, segundo o autor, "as duas figuras do cidadão participante e do cidadão protegido que estão em conflito entre si às vezes na mesma pessoa. Assim, "sociedade e Estado atuam como dois momentos necessários, separados mas contíguos, distintos mas interdependentes, do sistema social em sua complexidade e em sua articulação interna" (Bobbio, 1987).
Avritzer (1993) desenvolve sua análise em torno da abordagem habermasiana centrada no tema da esfera pública como caixa de ressonância dos problemas a serem organizados pelo sistema político. Para Habermas, segundo Avritzer "as sociedades modernas se estruturam através de dois princípios societários distintos: a lógica estratégica do sistema que organizaria o mercado e o Estado e a lógica da racionalidade comunicativa que leva à organização da solidariedade e da identidade no interior do mundo da vida. A disputa do espaço social nos pontos de encontro entre sistema e mundo da vida constituiria, segundo Habermas, a disputa política fundamental das sociedades contemporâneas".
  • Para Habermas, as sociedades modernas têm uma imagem multifacetada, onde a relação entre si de dois subsistemas diferenciados (Estado e mercado) que operam a partir de lógicas diferentes, e a relação entre cada um dos subsistemas 4 e o mundo da vida 5 constituem o ponto focal de indissociáveis tensões (Arato & Cohen, 1994).
A esfera pública é apontada por Habermas como ponto de encontro e local de disputa entre os princípios divergentes de organização da sociabilidade e os movimentos sociais se constituiriam nos atores que reagem à reificação e burocratização dos domínios de ação estruturados comunicativamente, defendendo a restauração das formas de solidariedade postas em risco pela racionalização sistêmica (Avritzer, 1993).
  • Para Arato & Cohen (1994), "o entendimento das dimensões relevantes do mundo da vida, enquanto sociedade civil, é necessário para que seja alcançada a dupla tarefa da democracia radical autolimitada, a aquisição pelo público de influência sobre o Estado e a economia; a institucionalização dos ganhos dos movimentos sociais dentro do mundo da vida". Segundo estes autores, a questão política consiste em como introduzir espaços públicos no Estado e nas instituições econômicas, sem abolir os mecanismos reguladores da ação estratégica e estabelecendo uma continuidade com uma rede de comunicação social composta de movimentos sociais, associações e esferas públicas". Arato & Cohen (1994) defendem, portanto, uma estratégia política dual, simultaneamente institucional e extra-institucional. 
A possibilidade de alterar a institucionalidade pública está associada às demandas que se estruturam na sociedade, e a esfera pública representa a construção da viabilidade ao exercício da influência da sociedade nas decisões públicas assim como coloca uma demanda de publicização no Estado. O que está em jogo é a necessidade de atualização dos princípios ético-políticos da democracia, onde o fortalecimento do tecido associativo potencializa o fortalecimento da democracia no resto das esferas da vida social.

A construção de espaços participativos no Brasil:
  • A redefinição das relações entre Estado e sociedade civil,6 no Brasil, no final dos anos 70, implica a constituição, com muitos percalços, de uma esfera societária autônoma. A cidadania regulada 7 "constitui seletivamente os atores beneficiados pelo processo de modernização econômica, atores que, de acordo com os planejadores estatais, seriam capazes de trocar a cidadania social e civil pelo papel de membros de uma sociedade de consumo despolitizada" (Avritzer, 1994).
O advento da sociedade civil brasileira está indissoluvelmente vinculado não apenas à emergência de movimentos sociais, mas, conforme Avritzer (1994), ao "processo pelo qual atores sociais modernos e democráticos surgiram, adquiriram uma nova identidade democrática e passaram a pressionar o Estado e o sistema político a se adaptarem a uma nova concepção acerca da moderna institucionalidade democrática".
  • Os atores sociais que emergem na sociedade civil após 1970, à revelia do Estado, criaram novos espaços e formas de participação e relacionamento com o poder público. Estes espaços foram construídos, tanto pelos movimentos populares como pelas diversas instituições da sociedade civil que articulam demandas e alianças de resistência popular e lutas pela conquista de direitos civis e sociais. Muitos movimentos apontam, a partir da reposição do coletivo, para uma qualidade diferenciada de participação na gestão da coisa pública, onde a representação não resume todo o esforço de organização. Os movimentos tornam manifesta uma identidade que se concretiza a partir da construção coletiva de uma noção de direitos que, relacionada diretamente com a ampliação do espaço de cidadania, dá lugar ao reconhecimento público das carências.
O fato diferenciador destas transformações é, segundo Melucci (1994), o fortalecimento de novas instituições, as mudanças no relacionamento do quadro de pessoal com os usuários, a nova mentalidade sobre a gestão da coisa pública enquanto aspectos constitutivos de uma nova cultura política.
  • O processo de construção da cidadania é perpassado por paradoxos, na medida em que se explicitam três dinâmicas concomitantes: o reconhecimento e a construção das identidades dos distintos sujeitos sociais envolvidos, o contexto da inclusão das necessidades expressas pelos distintos sujeitos sociais e a definição de novas agendas de gestão, notadamente no que se refere à extensão dos bens a amplos setores da população. Esta noção de cidadania está estruturada a partir de uma definição legal dos direitos e deveres que a constituem.8
No Brasil, a reflexão em torno da cidadania 9 centra-se em torno dos obstáculos à sua extensão, decorrentes da cultura política tradicional, e nas perspectivas da sua transformação.
  • Esta noção de cidadania ativa, que se distingue outorgada pelo Estado com a idéia moral do favor e da tutela (daquela cidadania passiva), está fortalecida pela Constituição de 1988, implicando o reconhecimento da complementariedade entre a representação política tradicional e a participação popular diretamente exercida (Benevides, 1994). A nova dimensão da cidadania inclui, de um lado, a constituição de cidadãos enquanto sujeitos sociais ativos, e, de outro lado, para a sociedade como um todo, um aprendizado de convivência com esses cidadãos emergentes que recusam permanecer nos lugares que lhes foram definidos social e culturalmente (Dagnino, 1994).
No contexto da transição pós-democrática no Brasil, e por força das pressões de uma sociedade civil mais ativa e mais organizada, foram sendo criados novos espaços públicos de interação, mas principalmente de negociação. Nesse contexto, a participação social emerge principalmente como referencial de rupturas e tensões e as práticas participativas associadas a uma mudança qualitativa da gestão assumem visibilidade pública e repercutem na sociedade.
  • As transformações político-institucionais e a ampliação de canais de representatividade dos setores organizados para atuarem junto aos órgãos públicos, enquanto conquista dos movimentos organizados da sociedade civil, mostram a potencialidade de constituição de sujeitos sociais identificados por objetivos comuns para transformar a gestão da coisa pública, configurando a construção de uma nova institucionalidade.
O surgimento de políticas públicas pautadas pelo componente participativo, está relacionado com as mudanças na matriz sociopolítica através de um maior questionamento sobre o papel do Estado como principal agente indutor das políticas sociais.10 A noção de participação é pensada principalmente pela ótica dos grupos interessados e não apenas da perspectiva dos interesses globais definidos pelo Estado. O principal desafio que se coloca é de construir uma ordem societária baseada na articulação da democracia política com a participação social, representada por uma maior permeabilidade da gestão às demandas dos diversos sujeitos sociais e políticos. Essa perspectiva abre a possibilidade de buscar a articulação entre a implantação de práticas descentralizadoras e uma engenharia institucional que concilia participação com heterogeneidade, formas mais ativas de representatividade. Cabe observar os sempre permanentes e tensos vínculos entre representação e participação.
  • A participação social se enquadra no processo de redefinição entre o público e o privado, dentro da perspectiva de redistribuir o poder em favor dos sujeitos sociais que geralmente não tem acesso. Cunill Grau (1991) define dois campos interpretativos da participação. De um lado, aqueles que a associam com a democratização tendo como referência o fortalecimento do espaços de socialização, de descentralização do poder e de crescente autonomização das decisões, portanto, enfatizando a importância de um papel mais autônomo dos sujeitos sociais. O outro enfoque aborda a participação a partir da criação de espaços e formas de articulação do Estado com os sujeitos sociais, configurando um instrumento de socialização da política, reforçando o seu papel enquanto meio para realizar interesses e direitos sociais que demandam uma atuação pública (Cunill Grau, 1991).
Na última década, as formas de participação mais recorrentes estão centradas principalmente na criação de novos canais e mecanismos de relação entre a sociedade civil e a esfera pública (Dagnino, 2002). Esta nova esfera pública, que incide sobre o Estado, com ou sem suporte da representação política tradicional, é constituída por uma construção democrática e participativa que abre o Estado a um conjunto de organizações sociais admitindo a tensão política como método decisório, e diluindo, na medida do possível, as práticas autoritárias e patrimonialistas que também prevalecem na esfera urbana.
  • O principal exemplo está nos diferentes tipos de conselhos gestores de políticas públicas saúde, educação, assistência social , que apontam para a existência de um espaço público de composição plural e paritária entre Estado e sociedade civil de natureza deliberativa. Considerando-se que praticamente em todos os municípios do país existem conselhos de saúde e de educação, tem-se um importante contingente de cidadãos e cidadãs envolvidos em práticas participativas co-responsabilizadoras. 
Apesar dos conselhos gestores representarem arranjos institucionais inovadores, a grande indagação está relacionada com a capacidade de traduzir-se em práticas inovadoras e de uma efetiva democratização nos procedimentos de gestão dos assuntos públicos. Pesquisas mostram que os encontros entre Estado e Sociedade têm sido afetados negativamente por uma grande recusa do Estado em partilhar o poder de decisão (Tatagiba, 2002).
  • A efetiva participação da população nos processos decisórios, como é o caso do Orçamento Participativo em funcionamento em mais de 100 municípios no Brasil, vem se constituindo como um mecanismo ampliado de engajamento da sociedade na gestão das políticas públicas. Isto explicita um esforço crescente de institucionalização da possibilidade de atendimento das demandas em bases negociadas. Trata-se de processar demandas e pressões e de implementar mecanismos formais que contemplem, tanto os setores organizados e mobilizados estimulando sua adequação à institucionalidade respeitando a autonomia e a auto-organização, como o envolvimento dos setores desorganizados. Este processo de inovação social é definido por Avritzer (2002) como uma inovação entendida como uma prática societária de negociar abertamente o acesso a bens públicos que se torna um desenho participativo institucionalizado, por ele denominado de "públicos participativos". 
A radicalização da democracia que alarga os direitos de cidadania no plano político e social começa a substituir práticas das elites e o seu particularismo por formas ampliadas de discussão e tomada de decisão. Assim, neste processo de gestão através do ingresso da cidadania organizada na máquina do Estado, os participantes podem conhecer seu funcionamento e seus limites. Isto estimula a construção de uma relação de co-responsabilização e de disputa, visando produzir consensos cada vez mais qualificados.
  • As experiências dos Orçamentos Participativos estão diretamente vinculadas com a capacidade que as administrações locais têm de criar canais legítimos de participação, combinando elementos da democracia representativa e de democracia participativa. Trata-se de experiências que se multiplicaram, representando em torno de 140 experiências entre 1997 e 2000 (Ribeiro & Grazia, 2003) enquanto referência da adoção de um processo participativo, baseado no conceito de esfera pública não estatal que incide sobre o Estado, com ou sem o suporte da representação política tradicional. Nesse contexto, a participação adquire uma linguagem e uma prática de ruptura com o corporativismo territorialmente determinado, com ênfase numa lógica presidida por uma abordagem universal da cidade, criando para os setores populares, uma opção viável e altamente competitiva de participação política alternativa às práticas clientelistas. 
A distribuição das obras emerge de uma relação contratual previamente estabelecida através de um regulamento que determina as regras básicas de negociação interna de cada região da cidade e entre regiões, dificultando o clientelismo. Mas, apesar da sua repercussão positiva, também devem ser mostrados os seus limites, e estes residem, segundo os analistas, nas contradições associadas às dificuldades de ampliar a participação e a dependência em relação às autoridades municipais para estruturar a dinâmica de funcionamento (Navarro, 1999).
  • A efetiva participação da população nos processos decisórios, como é o caso Orçamento do Participativo, que tem se constituído como um mecanismo ampliado de engajamento da sociedade na gestão das políticas públicas, requer um esforço crescente de institucionalização da possibilidade de atendimento das demandas em bases negociadas. Trata-se de processar demandas e pressões e de implementar mecanismos formais que contemplem, tanto os setores organizados e mobilizados estimulando sua adequação à institucionalidade respeitando a autonomia e a auto-organização, como de envolvimento dos setores desorganizados. 
O Orçamento Participativo está legitimado e consta da agenda pública como mola propulsora do processo decisório da ação governamental. Isto está sendo construído dentro de uma lógica que não está apenas permeada pelo imediatismo e pelo utilitarismo, mas por uma radicalização da democracia que, alargando os direitos de cidadania no plano político e social, constrói efetivamente novas relações entre governantes e governados. Este processo de gestão através do ingresso da cidadania organizada na máquina do Estado, possibilita conhecer seu funcionamento e seus limites e estimula a construção de uma relação de co-responsabilização e de disputa, visando produzir consensos cada vez mais qualificados.
  • Embora o Orçamento Participativo apresente grandes variações nos seus resultados, trata-se de uma instituição inovadora que tem o potencial de afetar os cidadãos, a administração pública e a política de forma variada. Apresenta um potencial de promover educação pública, deliberação e resolução de disputas através do debate público. Assim, no Orçamento Participativo, "a gramática tem dois elementos: distribuição justa de bens públicos e negociação democrática do acesso a esses bens entre os próprios atores sociais (Santos & Avritzer, 2002).

Espaços públicos e práticas participativas 
na gestão do meio ambiente no Brasil

Participação da sociedade civil na gestão ambiental:
  • Na política ambiental é importante destacar também o surgimento e fortalecimento de numerosos conselhos, consultivos e deliberativos como parte componente, em várias áreas e em todos os níveis (federal, estadual e municipal) com a participação ativa de representantes de ONGs e movimentos sociais. As instâncias de gestão que agregam estes atores são os conselhos de meio ambiente, os comitês de bacias e as áreas de proteção ambiental (APAs). Entretanto, freqüentemente, são instâncias bastante formais, sem poder influenciar no processo decisório, e onde a representação assume muitas vezes caráter bastante contraditório.
Os conselhos de meio ambiente, órgãos integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), instituído pela Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81), são espaços públicos que definem parâmetros de gestão da coisa pública, que deliberam sobre normas, padrões e regulamentos ambientais. Estes conselhos são colegiados representativos dos diversos setores do governo (federal, estaduais, municipais) e da sociedade civil que lidam direta ou indiretamente com o meio ambiente. 
  • O CONAMA faz parte da estrutura básica do Ministério como órgão consultivo e deliberativo do Sistema, sendo composto de Plenário e Câmaras Técnicas, com representação de diferentes setores do governo e da sociedade civil. Suas atribuições são: estudar e propor diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e para os recursos naturais; estabelecer normas e critérios para licenciamento de atividades poluidoras; determinar a realização de estudos sobre as alternativas e possíveis conseqüências ambientais de projetos públicos ou privados; decidir como última instância sobre multas ou penalidades; submeter propostas referentes à concessão de incentivos e benefícios fiscais e financeiros visando à melhoria da qualidade ambiental.
O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) aprovou, desde 1981 até 2002, mais de 280 resoluções que têm impacto na gestão ambiental (BID, 2002, p. 64). A criação do SISNAMA e do CONAMA incentivaram significativamente a participação da sociedade civil nas atividades de proteção ambiental e promoveram importantes mudanças no desenvolvimento da legislação ambiental. Representantes da sociedade civil participam praticamente de todas as decisões em todos os conselhos e comitês gestores do Ministério.
  • O sistema ambiental colegiado está implementado no Brasil, e isto representa uma efetiva possibilidade de internalizar a questão ambiental nas políticas estaduais e municipais, quando existentes. Nos conselhos estaduais e naqueles municípios que também os implantaram, os resultados têm sido muito desiguais, com significativas diferenças entre regiões, sendo que na maioria dos casos, existe ainda uma prevalência das decisões definidas pela presença muitas vezes majoritária da representação governamental, o que aumenta em muito o poder de manipulação dos consensos e dos resultados, e quanto mais ampla a representação dos diversos segmentos, maior a legitimidade das decisões.
Apesar de ter passado durante os últimos anos por duas grandes dificuldades, a falta de recursos financeiros e o refluxo pós-Rio 92, as ONGs ambientalistas têm exercido um papel relevante em muitos conselhos estaduais e municipais. A partir de 1992 algumas redes e coalizões se estruturam com o objetivo de enfrentar tanto em nível nacional como regional, conforme os objetivos e questões em pauta, temas críticos que demandam organização, articulação e mobilização. Entram em pauta de forma cada vez mais significativa a discussão do modelo de desenvolvimento, a necessidade do aprofundamento das análises sobre o quadro socioambiental existente, a identificação dos principais impactos ambientais e sociais e a articulação das entidades civis no plano local e internacional.
  • Outra forma de gestão colegiada e deliberativa são os Comitês de Bacias Hidrográficas, integrados por representantes do governo estadual, municipal e membros de entidades e organizações da sociedade civil. O seu início ocorre no Estado de São Paulo com a aprovação da Lei 7.663/91 que cria inicialmente dois comitês de bacias hidrográficas com composição tripartite (Estado, municípios e sociedade civil). A gestão de bacias hidrográficas assume crescente importância no Brasil, à medida que aumentam os efeitos da degradação ambiental sobre a disponibilidade de recursos hídricos. A Lei Federal nº 9.433, de 1997, estabelece os novos procedimentos a serem adotados na gestão da água, sobressaindo-se que o gerenciamento da água deverá ser realizado por bacia hidrográfica e que a água passa a ter valor econômico.
Ao longo da década de 90, a União e a maioria dos Estados aprovaram leis que reorganizaram o sistema de gestão de recursos hídricos. O novo sistema reconhece a água como bem econômico, preconiza uma gestão integrada e descentralizada dos usos múltiplos da água, e requer negociações entre órgãos de diferentes níveis de governo (federal, estadual e local), usuários e a sociedade civil organizada. O processo de negociação ocorre em nível de bacia hidrográfica, através de organizações de bacias. Esses colegiados deliberam sobre as atividades e políticas públicas que possam afetar a quantidade e a qualidade das águas em suas circunscrições. 
  • Têm o poder de cobrar pelo uso da água através de seus braços executivos, as agências de bacia, e de decidir sobre a alocação dos recursos arrecadados. A efetivação do processo de gestão em bacias hidrográficas, de acordo com a nova lei, ainda é embrionária, e a prioridade dos organismos de bacia é na criação dos instrumentos necessários para a gestão.
O sistema é inovador, tanto no Brasil como internacionalmente. Rompe com práticas profundamente arraigadas de planejamento tecnocrático e autoritário, devolvendo poder para as instituições descentralizadas de bacia. Os alcances das experiências têm sido desiguais, destacando a constituição de organismos colegiados de tomada de decisão. Estima-se atualmente em mais de uma centena o número de comitês de bacias instalados no país, notadamente nas regiões Sudeste e Sul, na sua maioria estruturados no âmbito estadual, entretanto mostram avanços quanto ao engajamento no processo decisório. Até 2003, mais de uma década após a aprovação da primeira lei das águas no país, nenhum sistema foi operacionalizado por completo.
  • A lógica do colegiado permite que os atores envolvidos atuem, em princípio, tendo um referencial sobre seu rol, responsabilidades e atribuições no intuito de neutralizar práticas predatórias orientadas pelo interesse econômico ou político. A dinâmica do colegiado facilita uma interação mais transparente e permeável no relacionamento entre os diferentes atores envolvidos - governamentais, empresariais e usuários. Isto limita as chances de abuso do poder, entretanto não necessariamente da manipulação de interesses pelo executivo. Isto dependerá, principalmente da capacidade de organização dos segmentos da sociedade civil. Outros riscos são sensivelmente atenuados, como, por exemplo, a captura da instituição por interesses específicos, que contrastam com a sua finalidade coletiva.
Entretanto, a composição dos Comitês tem sido objeto de diversos questionamentos, sobretudo pela imprecisão do conceito "participação". Na última década, o termo "abordagem participativa" passou a fazer parte dos discursos governamentais, de ONGs e de diferentes agências internacionais de desenvolvimento. Mas o conceito de participação pode implicar diversos significados, nem sempre explicitados. Os questionamentos em relação a um uso indiferenciado do conceito de abordagem participativa têm aumentado, sobretudo na bibliografia sobre desenvolvimento sustentável. 
  • A interveniência de fatores não apenas técnicos, mas também de caráter político, econômico e cultural, tornam o processo muito mais complexo, e o estilo de gestão que tende a prevalecer obedece a uma lógica sociotécnica. Entretanto, não se deve pressupor que a boa vontade dos peritos/técnicos pode levar a diluir magicamente as relações de poder que estabelecem com setores leigos. Estas relações de poder não desaparecem, mas passam a ser trabalhadas e negociadas conjuntamente entre leigos e peritos. Assim, a gestão colegiada tende a definir uma dinâmica que permite que os atores integrem e ajustem suas práticas tendo como base uma lógica de negociação sociotécnica que substitui uma concepção tecnocrática visando ajustar interesses e propostas nem sempre convergentes e articulados para um objetivo comum.
O maior problema com o qual se têm defrontado muitos comitês, é o fato de os diversos atores envolvidos na dinâmica territorial terem visões do processo e dos objetivos que, pelo fato de serem divergentes, dificultam a busca de soluções que parecem mais equitativas. O espírito presente numa negociação em bases sociotécnicas é marcado pela negociação entre diferentes, e parte da premissa das assimetrias na situação dos atores, tanto em termos econômicos, sociais e políticos. 
  • A grande questão que se coloca é quanto à capacidade de negociação e de estabelecer pactos. Dada a complexidade do processo e as dificuldades de se consolidar um parâmetro de cidadania ambiental, os limites estão dados pela prevalência de lógicas de gestão que ainda centram, na maioria dos casos, uma forte prevalência do componente técnico como referencial de controle do processo.
O princípio da gestão descentralizada, integrada, colegiada e participativa, ainda está no seu início, e os entraves são significativos e diferenciados. A possibilidade efetiva de mudança do paradigma e os desafios que se apresentam para a implementação de práticas participativas estão intimamente relacionados com o papel dos gestores e a lógica dos "sistemas peritos" (Giddens, 1992). Existe uma certa ambigüidade na legislação, que por um lado abre os espaços para a participação da sociedade civil, mas supõe um certo acesso às informações técnicas. 
  • Observa-se que, apesar dos avanços, a Lei nº 9.433/97 coloca em primeiro plano a importância do corpo técnico-científico e do conhecimento por ele produzido nas relações de força no interior dos espaços decisórios da bacia, o que limita o envolvimento da comunidade nas atividades dos Comitês. Assim, mantém o poder decisório entre os que detêm o conhecimento técnico-científico. As mudanças em curso representam uma possibilidade efetiva de transformação da lógica de gestão da administração pública nos Estados e municípios, abrindo um espaço de interlocução muito mais complexo e ampliando o grau de responsabilidade de segmentos que sempre tiveram participação assimétrica na gestão da coisa pública.
O que cabe registrar, é que a existência dos Comitês de Bacias estabelece uma mudança, também, quanto ao relacionamento entre Estado e Sociedade Civil, na medida em que as regras do jogo voltam-se mais para o uso da água e passam a articular um número maior de atores no processo decisório.
  • No IV Encontro de Comitês de Bacias, em 2002, os participantes confirmaram que desde a implantação do modelo dos Comitês priorizou-se a auto-afirmação de entidades representativas de corporações profissionais que ajudaram a implementar o próprio modelo e que podem continuar mantendo-se como representantes da sociedade civil, e reproduzindo o monopólio dos peritos na gestão dos recursos hídricos. Isto seria devido à falta de informações disponíveis ou ao predomínio da informação técnica sobre a importância do Comitê, o que geraria pouco interesse da comunidade para participar, obrigando algumas vezes ao preenchimento de vagas não só por peritos mas também por outros setores pouco representativos.
Avanços na gestão compartilhada: 
Do meio ambiente e principais desafios:
  • Os complexos e desiguais avanços revelam que estas engenharias institucionais, baseadas na criação de condições efetivas para multiplicar experiências de gestão participativa que reforçam o significado da publicização das formas de decisão e de consolidação de espaços públicos democráticos, ocorrem pela superação das assimetrias de informação e pela afirmação de uma nova cultura de direitos. Estas experiências que denominamos inovadoras, fortalecem a capacidade de crítica e de interveniência dos setores de baixa renda através de um processo pedagógico e informativo de base relacional, assim como a capacidade de multiplicação e aproveitamento do potencial dos cidadãos no processo decisório.
O principal resultado da implementação dos conselhos de meio ambiente, que constituem mais de 500 no nível estadual e milhares no nível municipal, é a sinergia que se cria, apesar das tensões e contradições entre representantes de governo e diferentes segmentos da sociedade criadas tanto por excesso de burocracia e a complexidade de muitos procedimentos que desestimulam a participação dos cidadãos. Além disso é sempre bom reforçar o fato de que as desigualdades econômicas e a pressão política valorizam excessivamente o papel de alguns atores em detrimento de outros. Assim, nos conselhos freqüentemente ocorre uma inibição de alguns agentes quando outros se diferenciam pelo seu poder econômico e/ou político em processos de tomada de decisão e consulta (Furriela, 2002).
  • Em muitos casos, os CONSEMAs e CONDEMAs se transformam em órgãos majoritariamente controlados pelo Executivo. Isto coloca em questão a governança ambiental, na medida em que existe pouca cooperação em nome de interesses compartilhados, reduzindo a possibilidade de um efetivo confronto entre interesses conflitantes. Um dos grandes fatores limitantes é a irregularidade da participação, com a troca freqüente de atores no desenrolar das análises.
A contribuição dos espaços deliberativos é fundamental para o fortalecimento de uma gestão democrática, integrada e compartilhada. A ampliação destes espaços de participação cidadã favorece qualitativamente a capacidade de representação dos interesses e a qualidade e eqüidade da resposta pública às demandas sociais. Essas experiências demonstram a importância do exercício da participação civil nos conselhos ambientais, assim como os de educação, saúde, assistência social, habitação, enquanto espaços de questionamento não apenas da forma do processo decisório do Estado, mas também das relações entre Estado e Sociedade Civil no campo das políticas públicas.
  • O grande desafio é que esses espaços sejam efetivamente públicos, tanto no seu formato quanto nos resultados. A dimensão do conflito lhes é inerente, como à própria democracia. Assim, os espaços de formulação de políticas onde a sociedade civil participa, marcados pelas contradições e tensões, representam um avanço na medida em que publicizam o conflito e oferecem procedimentos discussão, negociação e voto e espaço para que seja tratado de forma legítima. 
A criação de condições para uma nova proposta de sociabilidade deve ser crescentemente apoiada em processos educativos orientados para a "deliberação pública". Esta se concretizará principalmente pela presença crescente de uma pluralidade de atores que, através da ativação do seu potencial de participação terão cada vez mais condições de intervir consistentemente e sem tutela nos processos decisórios de interesse público, legitimando e consolidando propostas de gestão baseadas na garantia do acesso à informação, e na consolidação de canais abertos para a participação que, por sua vez, são pré-condições básicas para a institucionalização do controle social. 
  • Não basta assegurar legalmente à população o direito de participar da gestão ambiental, estabelecendo-se conselhos, audiências públicas, fóruns, procedimentos e práticas. O desinteresse e freqüente apatia da população quanto à participação é generalizada, resultado do pequeno desenvolvimento de sua cidadania e do descrédito nos políticos e nas instituições.
Essas considerações só poderão ser colocadas em prática a partir de um processo de aprendizagem que implica a reorganização das relações entre o setor privado, o governo e a sociedade civil. Isto implica mudanças no sistema de prestação de contas à sociedade pelos gestores públicos e privados, mudanças culturais e de comportamento. Dependemos de uma mudança de paradigma para assegurar uma cidadania efetiva, uma maior participação e a promoção do desenvolvimento sustentável.
  • A participação assume um papel cada vez mais relevante na denúncia das contradições entre os interesses privados e os interesses públicos na construção de uma cidadania ambiental que supere a crise de valores e identidade e proponha uma outra, com base em valores de sustentabilidade. Isto potencializa a ampliação da consciência ambiental e sua tradução em ações efetivas de uma população organizada e informada de maneira correta, que está preparada para conhecer, entender, reclamar seus direitos e também para exercer sua responsabilidade. 
Pessoas cidadãs críticas e conscientes compreendem, se interessam, reclamam e exigem seus direitos ambientais junto ao setor social correspondente e, por sua parte, estão dispostas a exercer sua responsabilidade ambiental. Uma sociedade civil se organiza e participa da direção de sua própria vida, e isto permite que as pessoas adquiram um poder político e a capacidade de produzir mudanças. Isto reforça a necessidade de identificar os papéis e as responsabilidades dos diversos atores diante de temas ambientais e também a necessidade de construir consensos em torno deles. À medida que o Estado terá, cada vez mais, que dar respostas em relação ao desenvolvimento sustentável, os cidadãos devem ser parte integrante de uma visão comum de longo prazo.
  • Os mecanismos de participação aumentaram nos últimos 10 anos, mas ainda não fazem diferença. Apesar de terem se democratizado, os mecanismos são mal aproveitados pela população, como no caso das audiências públicas. Em geral, a população aproveita a disponibilidade dos mecanismos de forma contraditória, a partir de uma visão imediatista, mas o aproveitamento é muito limitado, até porque a grande maioria da população não tem conhecimento sobre os mecanismos existentes, e como poderiam ser aproveitados para pressionar o governo.
Existem mais possibilidades de participação, mas com a falta de credibilidade e a falta de continuidade administrativa que ainda prevalece, a população perdeu a noção da consistência das políticas e do seu alcance.
  • É necessário incrementar os meios e o acesso à informação, assim como o papel indutivo que o poder público deve ter na oferta de conteúdos informacionais e educativos. Emergem assim, indagações quanto aos condicionantes de processos que ampliem as possibilidades de alteração do atual quadro de degradação socioambiental.
Assim, é preciso pensar a questão da sustentabilidade para reforçar políticas socioambientais que se articulem com as outras esferas governamentais e possibilitem a transversalidade. A implementação de ações implica não somente uma articulação sociopolítica, mas também um acordo quanto aos procedimentos de disseminação pública tanto através de campanhas públicas de informação quanto de mecanismos orientados para a constituição de um esforço comunitário para estimular e consolidar um eficiente e consistente processo de participação. Para tanto, torna-se essencial o estímulo aos diversos atores sociais abertamente motivados, visando multiplicar informações, decodificá-las e superar os níveis de desinformação e desinteresse das pessoas, através de um crescente processo de implementação de políticas públicas pautadas por uma lógica de co-responsabilização.
  • Melhor acesso à informação e o incremento de participação social têm promovido mudanças de atitude que favorecem o desenvolvimento de uma consciência ambiental coletiva e de um envolvimento crescente da sociedade civil nos espaços deliberativos onde pensamentos plurais se apresentem e os conflitos ganhem visibilidade.
O reforço destas práticas, no debate e na deliberação no interior dos espaços de formulação de políticas ambientais, contribui para a construção de uma sociedade mais comprometida com a constituição do interesse público e para um maior engajamento de atores relevantes na definição de políticas ambientais centradas no interesse público.

Notas:
  1. Para Hegel "a sociedade civil representa o primeiro momento de formação do Estado, o Estado jurídico-administrativo, cuja tarefa é regular relações externas, enquanto o Estado propriamente dito representa o momento ético-político, cuja tarefa é realizar a adesão íntima do cidadão à totalidade de que faz parte, tanto que poderia ser chamado de Estado interno ou interior"(cf. Bobbio, 1987, p. 42).
  2. Adotamos o conceito sistematizado por Mello (1995, p. 30) que qualifica o modo de uso da autoridade política formato institucional dos processos decisórios, definição do mix público/privado nas políticas, questões de participação e descentralização, mecanismos de financiamento das políticas e do escopo global dos programas (focalizados versus universalistas).
  3. Para uma reflexão aprofundada em torno dos diversos enfoques, ver Santos (1996, p. 117-120).
  4. Trata-se do econômico, que se organiza em torno da lógica estratégica do intercâmbio que permite a comunicação através do código positivo da recompensa, e do administrativo, que se organiza em torno da lógica estratégica do poder que permite a comunicação através do código negativo da sanção (Avritzer, 1993, p. 215-216).
  5. O conceito habermasiano de mundo da vida contém três componentes estruturais distintos: a cultura, a sociedade e a personalidade. Na medida em que estes atores se entendem mutuamente e concordam sobre a sua condição, eles partilham uma tradição cultural e por meio das regras e normas estabelecidas pelos atores se internalizam orientações valorativas, adquirem-se novas competências para o agir cotidiano, no movimento e fora dele, e desenvolvem-se identidades individuais e sociais. A reprodução de ambas as dimensões do mundo da vida envolve processos comunicativos de transmissão da cultura, de integração social e de socialização. A diferenciação estrutural do mundo da vida se dá por intermédio da emergência de instituições especializadas na reprodução de tradições, solidariedades e identidades (Arato & Cohen, 1994, p. 153 ).
  6. Para Habermas, a sociedade civil constitui uma dimensão do mundo da vida assegurada institucionalmente por um conjunto de direitos que a pressupõem, ao mesmo tempo que a diferenciam das esferas da economia e do Estado (Arato & Cohen, 1994).
  7. Para uma reflexão em torno da questão, cf. Santos, W. G. (Cidadania e Justiça, 1979).
  8. Há dois eixos centrais do debate ideológico, teórico e político: a natureza dos sujeito e o conteúdo dos direitos. O primeiro refere-se à visão liberal-individualista e o segundo à existência de direitos universais e à relação entre direitos humanos, civis, políticos, econômico-sociais e coletivos. (Jelin, 1994, p. 43)
  9. Para um aprofundamento da noção de cidadania, ver Maria V. Benevides (1991). A autora aponta o caminho da democracia semidireta como meio de recuperar a soberania popular: a associação da democracia representativa com mecanismos de democracia direta.
  10. A estratégia proposta pela CEPAL, em documentos publicados nos anos 80, reconhece a necessidade de adequar o Estado aos desafios de uma nova estratégia de inclusão nos processos sociopolíticos dos cidadãos na qualidade de cidadãos plenamente participativos, (Cunill Grau, 1991).
Referências bibliográficas:

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Espaços públicos e práticas participativas 
na gestão do meio ambiente no Brasil

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Conceitos de educação e de promoção em saúde_Mudanças individuais e mudanças organizacionais

Conceitos de educação e de promoção em saúde: 
Mudanças individuais e mudanças organizacionais

Nelly Martins Ferreira Candeias 
Departamento de Prática de Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP - Brasil
  • Confusões entre os termos educação em saúde e promoção em saúde têm provocado desentendimentos e afetado a qualidade de discussões técnicas que dizem respeito a intervenções sociais na área de saúde pública. Essas distorções conceituais ocorrem mais freqüentemente nos países em desenvolvimento. Para eliminar algumas delas é preciso conhecer, em primeiro lugar, o significado dos conceitos envolvidos 9. Para isso, pode-se recorrer a duas das definições operacionais mais amplamente aceitas por especialistas que atuam nessas áreas, ambas propostas por Green e Kreuter 11.
Entende-se por educação em saúde quaisquer combinações de experiências de aprendizagem delineadas com vistas a facilitar ações voluntárias conducentes à saúde. A palavra combinação enfatiza a importância de combinar múltiplos determinantes do comportamento humano com múltiplas experiências de aprendizagem e de intervenções educativas. 
  • A palavra delineada distingue o processo de educação de saúde de quaisquer outros processos que contenham experiências acidentais de aprendizagem, apresentando-o como uma atividade sistematicamente planejada. Facilitar significa predispor, possibilitar e reforçar. Voluntariedade significa sem coerção e com plena compreensão e aceitação dos objetivos educativos implícitos e explícitos nas ações desenvolvidas e recomendadas. Ação diz respeito a medidas comportamentais adotadas por uma pessoa, grupo ou comunidade para alcançar um efeito intencional sobre a própria saúde.
Define-se promoção em saúde como uma combinação de apoios educacionais e ambientais que visam a atingir ações e condições de vida conducentes à saúde. Combinação refere-se à necessidade de mesclar os múltiplos determinantes da saúde (fatores genéticos, ambiente, serviços de saúde e estilo de vida) com múltiplas intervenções ou fontes de apoio. Educacional refere-se à educação em saúde tal como acima definida. Ambiental refere-se a circunstâncias sociais, políticas, econômicas, organizacionais e reguladoras, relacionadas ao comportamento humano, assim como a todas as políticas de ação mais diretamente relacionadas à saúde. 
  • Utiliza-se aqui para fazer referência àquelas forças da dinâmica social, que incidem sobre uma situação específica e que vão muito além do estudo do ambiente físico ou dos serviços médicos destinados à população. Dizem respeito àqueles fatores ambientais que também precisam ser considerados no planejamento de atividades de promoção em saúde. Note-se que essa se diferencia dos outros dois maiores componentes da saúde pública por fixar a engenharia do meio ambiente à proteção em saúde e a administração no ambiente médico aos serviços de prevenção para a saúde.
A expressão condições de vida permite que a definição de promoção em saúde ultrapasse os limites daqueles fatores estritamente comportamentais, observáveis em geral durante o relacionamento interpessoal que ocorre no âmbito do nível local, para prender-se a uma teia de interações muito mais complexa, constituída pela cultura, por normas e pelo ambiente socioeconômico, cada um deles se associando com o significado histórico mais amplo do que se convencionou denominar de estilo de vida 11.
  • Essas duas definições enfatizam os objetivos e esclarecem os propósitos da educação em saúde e da promoção em saúde. Ao fazê-lo, permitem distinguir com mais propriedade tipos de programas, de atividades e de procedimentos, que passam a ser melhor caracterizados por propostas que, dependendo das circunstâncias, poderão ser de natureza educacional ou de natureza promocional. Ambas procuram sempre contribuir para o alcance de melhores níveis de saúde da população focalizada.
Na prática, a educação em saúde constitui apenas uma fração das atividades técnicas voltadas para a saúde, prendendo-se especificamente à habilidade de organizar logicamente o componente educativo de programas que se desenvolvem em quatro diferentes ambientes: a escola, o local de trabalho, o ambiente clínico, em seus diferentes níveis de atuação, e a comunidade, compreendida aqui como contendo populações-alvo que não se encontram normalmente nas três outras dimensões. Por constituir apenas uma parte de um conjunto de atividades, é óbvio tratar-se de uma atividade-meio.
  • O projeto intitulado Delineamento do Papel Profissional dos Educadores de Saúde, patrocinado pelos U.S. Centers for Disease Control, nos Estados Unidos, representa até o momento o esforço mais expressivo para identificar tecnicamente os elementos que caracterizam a prática da educação em saúde 8,12. 
Esse projeto fundamentou-se em trabalhos anteriores, apresentados por comissões nacionais, organizadas com vistas a especificar o conteúdo e os padrões de programas de treinamento profissional. No Brasil, o estudo mais significativo que se fez, a respeito desse mesmo assunto, foi sobre o papel profissional dos educadores de saúde das Secretarias da Saúde do Estado e da Prefeitura de São Paulo 4,5,13. Antes de sua realização, sempre com o patrocínio da OPAS/OMS, desenvolveu-se um Seminário em Itu, no qual participaram educadores de saúde do Estado e da Prefeitura de São Paulo. 
  • Compareceram a esse encontro Lawrence W. Green e Helen Cleary, especialista responsável pelo estudo que, nos Estados Unidos, atingiu as várias comissões já mencionadas. As recomendações desse Seminário e os resultados desse estudo foram divulgados em reuniões internacionais, realizadas em Houston e em Helsinski, assim como em artigos publicados*5,13. Resumidamente, o estudo realizado no Brasil mostra que todas as competências técnicas, identificadas e aceitas por profissionais nos Estados Unidos, corresponderam inteiramente ao modo de pensar e de atuar de seus colegas brasileiros. No estudo realizado em São Paulo nada foi proposto no sentido de cancelar ou acrescentar.
No momento, a principal preocupação dessa área de ação não é mais a inexistência de um campo específico de conhecimento técnico-científico, como sucedeu nos primórdios da educação em saúde no Brasil (l925), mas a incapacidade política de implantar atividades educativas racionalmente planejadas 1,2,3,6,7. A experiência junto à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo deu a oportunidade de analisar as políticas de ação referentes aos programas existentes. Verificou-se que a palavra educação, freqüentemente mencionada nos documentos oficiais, não passava de uma abstração incômoda. 
  • Nunca expressou uma proposta séria das autoridades administrativas que, em geral, tendiam a fundamentar suas ações no modelo biomédico de intervenção, com ênfase na doença e não na saúde. Sabe-se, entretanto, que a abordagem biomédica representa apenas uma das cinco formas de intervenção social no cenário da saúde pública, sendo as outras: a abordagem da mudança de comportamento, a abordagem educativa, a abordagem centralizada no cliente e a abordagem societária, cada qual buscando a consecução de determinados objetivos e, para tanto, recorrendo a pressupostos teóricos e conceituais e a especialistas provenientes de vários campos de conhecimento científico. O planejamento se realiza, portanto, de acordo com a lógica circunstancial das necessidades específicas que emergem em diferentes ambientes.
Muitos são os princípios e os conceitos que fundamentam a prática da educação em saúde e da promoção em saúde. Sem cair em armadilhas reducionistas, a educação em saúde (não confundir com informação em saúde) procura desencadear mudanças de comportamento individual, enquanto que a promoção em saúde, muito embora inclua sempre a educação em saúde, visa a provocar mudanças de comportamento organizacional, capazes de beneficiar a saúde de camadas mais amplas da população, particularmente porém não exclusivamente, por meio da legislação.

Conceitos de educação e de promoção em saúde: 
Mudanças individuais e mudanças organizacionais

  • As atividades de educação em saúde têm utilizado o esquema de planejamento proposto por Green e Kreuter 11, PRECEDE (o mais amplamente aplicado em várias partes do mundo) e, dentro dele, durante o desenvolvimento de programas educativos na fase do diagnóstico administrativo, modelos como o CAHP (conhecimentos, atitudes, habilidades e práticas da população-alvo), crenças em saúde, oportunidades de aprendizagem, entre outros. 
Todo esse conjunto teórico-prático diz respeito a um aqui-agora, que se prende basicamente a programas de saúde em desenvolvimento, já se disse, em locais de trabalho, em escolas, em ambientes clínicos ou na comunidade. As atividades educativas, como meio de alcançar determinados fins, representam uma parte do conjunto de atividades dos programas de saúde que, conforme a natureza do problema, exigem um grau maior ou menor desse tipo de ações técnicas. Contudo, todos eles precisam, muito embora nem sempre se reconheça, da colaboração de um especialista . 
  • Note-se que do ponto de vista da educação em saúde, o ambiente de trabalho e aqueles que nele atuam têm muito a ver com os objetivos propostos por essa forma de intervenção.Os profissionais se relacionam diretamente com pessoas que já frequentam ou que se pretende que venham a frequentar determinados programas.
As ações que dizem respeito às atividades da promoção em saúde são bastante distintas. Seus objetivos afastam-se das pressões cotidianas do aqui e agora de programas de saúde pública, buscando a participação de outras pessoas, cuja atuação se processa fora do espaço tradicional onde os programas são em geral implementados. Por essa razão, não poderiam se prender apenas ao esquema teórico PRECEDE e àqueles modelos acima referidos, CAHP, crenças em saúde, oportunidades de aprendizagem, entre outros. 
  • Acompanhando essa emergente necessidade de reformulação da atuação profissional, Green e Kreuter 11 buscaram justificar a complementação do espaço técnico apresentado no esquema PRECEDE 9, mediante o esquema PROCEDE. Ao fazê-lo definiram e classificaram as novas propostas de atuação técnica da educação e da promoção em saúde, explicando a diferença dos objetivos dessas duas subpartes de uma mesma, porém mais completa, intervenção social. Também estudaram as razões históricas e epidemiológicas que as justificaram a partir do século XIX.
O fato é que, em qualquer sistema de saúde, não se pode conceber o planejamento da política de ação, sem antes considerar as premissas do planejamento educativo em cada uma das duas vertentes acima referidas - educação e promoção em saúde. Se isso ocorrer, a prática subseqüente será equivocada e, portanto, ilógica no que diz respeito às necessidades da população-alvo que se pretende alcançar 1.
  • Do ponto de vista da evolução histórica de todo esse processo educativo, o Seminário realizado em 1991 em Sundsvall, na Suécia, tornou mais evidentes os mecanismos de intervenção que podem ser utilizados na prática da promoção em saúde. Com o objetivo de passar da teoria à prática, o modelo HELPSAM-Health Promotion Strategy Analysis Model, descreve sete estratégias a considerar quando se recorre a esse tipo de abordagem 14. 
São elas: desenvolvimento de políticas de ação, regulamentos em saúde (leis e normas), reorientação de organizações (institucionalização de novas atividades), advocacia (aumento do interesse público), alianças e mediações (informação e comunicação), fatores que possibilitam o comportamento em saúde e, finalmente, mobilização e aumento do poder mediante a participação e o envolvimento ativo. Cada uma deve ser definida em função dos seguintes elementos: tipo de enfoque, atores, alvos e níveis de arena, procedimentos/instrumentos e resultados esperados.
  • O modelo HELPSAM representa um valioso instrumento analítico para identificar as estratégias acessíveis e outros elementos essenciais à implementação de ações concretas no que diz respeito à promoção em saúde. Oferece uma visão panorâmica sobre a combinação de diferentes estratégias, mostrando que, além das medidas mais diretamente relacionadas ao componente educativo de programas de saúde, outras precisam ser concomitantemente planejadas, desenvolvidas e avaliadas. 
Essas assumem um caráter político muito mais intenso do que aquele que caracteriza a educação em saúde, exigindo o estudo mais cauteloso dos locais onde se encontram pessoas com poder de decisão no que se refere ao sistema de saúde, identificação de lobbies corporativistas, contatos com outros profissionais que não aqueles que em geral se encontram nos serviços de atendimento, familiaridade com modelos de atuação provenientes de áreas de conhecimento multidisciplinar e outras formas às vezes muito mais veladas de trabalhar.
  • Por tudo isso, torna-se necessário conhecer com mais cuidado os paradigmas que fundamentam as duas principais definições sobre os conceitos de educação e promoção em saúde, apresentados no início deste trabalho. É preciso verificar, também, se as atividades dos especialistas em saúde têm como principal foco o objetivo de provocar mudanças pessoais, justificáveis do ponto de vista das recomendações científicas na área de saúde, o que ocorre em determinados ambientes, já se disse, ou se buscam aqueles objetivos politicamente mais ambiciosos e arriscados, que visam a introduzir mudanças organizacionais/estruturais mais amplas no sistema de saúde.
Talvez seja esse o ponto mais essencial para distinguir a natureza técnico-científica das atividades de cada um. Muitos profissionais tentam atuar concomitantemente em ambas as dimensões - mudança do comportamento individual e mudança do comportamento organizacional para a saúde, porém o custo-benefício de esforços tão diversificados é questionável. Em geral, não podem deixar de limitar suas atuações de acordo com os cargos e funções que desempenham nas agências de saúde ou em outras instituições a elas relacionadas.
  • O mesmo ocorre no ambiente acadêmico. Os estudos refletem os temas que mais condizem com as preferências pessoais dos pesquisadores, sejam aqueles de natureza educativa ou promocional. Em ambos os casos é preciso definir os conceitos com clareza e fixar os limites do campo de análise, particularmente quando se discutem filosofias de trabalho de interesse para a teoria e para a prática da saúde pública, o que nem sempre ocorre em nosso meio. Isso pode levar à divulgação ingênua de atividades sem valor técnico-científico. Mais grave ainda, pode levar à aceitação de uma história deformada pelo descuido e pela desinformação que, mesmo quando não se tenha a intenção, acaba por prejudicar a prática e, lamentavelmente, a própria imagem da saúde pública.
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Conceitos de educação e de promoção em saúde: 
Mudanças individuais e mudanças organizacionais

domingo, 12 de fevereiro de 2017

Uso de agrotóxicos em cana-de-açúcar na bacia do Rio Corumbataí e o risco de poluição hídrica

Uso de agrotóxicos em cana-de-açúcar na bacia 
do Rio Corumbataí e o risco de poluição hídrica

Eduardo Dutra de Armas
Regina Teresa Rosim Monteiro
Centro de Energia Nuclear na Agricultura, Universidade de São Paulo, CP 96, 13400-970 Piracicaba - SP
Armando Valler Amâncio 
Rui Marcos Lopes Correa 
Miguel Antonio Guercio
Escritório de Defesa Agropecuária, Coordenadoria de Defesa Agropecuária, Piracicaba - SP
  • Ao longo dos anos, a agricultura mundial cresceu em produtividade e área cultivada, acompanhada pelo uso intenso de agrotóxicos, que também sofreram grandes evoluções. Muitas moléculas novas surgiram, com características físico-químicas que propiciam funcionalidades diferenciadas e comportamentos ambientais distintos, com grandes alterações nos perfis toxicológicos e ecotoxicológicos, fruto dos avanços tecnológicos e pressões ambientalistas.
O Brasil apresenta um dos maiores mercados na área de proteção de plantas. Em 1998, o volume de insumos fitossanitários consumidos colocou o país no 2º lugar mundial 1, movimentando, em 2003, cifras da ordem de 3,1 bilhões de dólares 2. O estado de São Paulo é o maior consumidor de agrotóxicos no Brasil, representando, segundo dados do SINDAG2, 18,64% do valor comercializado no país em 2003.
  • O estado de São Paulo é responsável por 58% da produção nacional de cana-de-açúcar 3, que representa 14,73% do uso do solo rural do estado 4. A cultura da cana-de-açúcar respondeu, em 2002, por 11,5% das vendas de agrotóxicos no Brasil, atrás somente da soja. Em 2003, a cultura representou 8,0% das vendas, ocupando a 4ª posição, movimentando 251 milhões de dólares 2.
O cultivo de cana-de-açúcar abrange a quase totalidade do território estadual, sendo que a região de Piracicaba foi considerada, por muitos anos, a maior produtora. Nos últimos anos tem-se vislumbrado um deslocamento da cultura, vindo a concentrar-se essencialmente no eixo central-norte, composto principalmente pelas regiões dos Escritórios de Desenvolvimento Rural (EDR) de Orlândia, Barretos, Catanduva, Jaboticabal, Ribeirão Preto, Araraquara, Jaú, Assis, Limeira e Piracicaba. Dos 40 EDRs que compõem o estado, os de Piracicaba e Limeira ocuparam o 7º e 9º lugar em produção de cana-de-açúcar, no ano de 20025.
  • Grande parte da regional de Limeira e parte da regional de Piracicaba são abrangidas pela sub-bacia hidrográfica do rio Corumbataí, integrante da bacia hidrográfica do rio Piracicaba, onde o cultivo de cana-de-açúcar é a principal atividade agrícola. Além disso, o rio que atravessa esta bacia e que lhe empresta o nome é responsável pelo abastecimento de vários municípios.
No entanto, com a intensificação do uso da água do rio Corumbataí, principalmente pelo município de Piracicaba, devido ao comprometimento da qualidade de outros mananciais, tem-se vislumbrado, nos últimos anos, uma crescente preocupação com o gerenciamento deste corpo hídrico. Sendo assim, o objetivo deste trabalho segue em consonância com vários estudos desenvolvidos nesta bacia, uma vez que o diagnóstico do uso de agrotóxicos no cultivo da cana-de-açúcar nesta área é ferramenta primordial para um gerenciamento adequado das atividades agrícolas, otimização dos processos de monitoramento de resíduos e caracterização espaço-temporal de exposição.
  • A definição dos agrotóxicos com probabilidade de atingirem o corpo d'água é normalmente efetuada com base em índices de particionamento, considerando as propriedades físico-químicas e persistência ambiental, como GUS6 e LEACH7. Porém, o alto custo das análises químicas para o monitoramento constante de todos os produtos empregados ou daqueles prováveis de atingirem o corpo d'água requer uma caracterização temporal do uso destes na área em estudo, de modo a se atingir eficiência econômica e técnica no monitoramento. 
Este levantamento serve de base para definição de estratégias de monitoramento de pesticidas na calha principal do rio Corumbataí, no projeto de Políticas Públicas financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, que visa a avaliação da qualidade da água deste rio. Além disso, a indisponibilidade deste tipo de diagnóstico para as condições brasileiras configura este levantamento como inédito e de extrema importância para o direcionamento de pesquisas de monitoramento e comportamento de pesticidas nas regiões produtoras de cana-de-açúcar no estado de São Paulo.

Parte Experimental:
Área de estudo:
  • A sub-bacia do rio Corumbataí (Figura 1) abrange uma área de 1710 km2, sendo integrante da bacia do rio Piracicaba, que compreende a 1ª zona hidrográfica da rede hídrica do estado de São Paulo, Brasil 8. O principal manancial é o rio Corumbataí, com 170 km de extensão, nascendo no município de Analândia e desembocando no rio Piracicaba, no município de mesmo nome. O cultivo de cana-de-açúcar totaliza 43663,16 ha, o que representava 25,57% da área da bacia em 1999, segundo IPEF 9.

Procedimento investigativo:
  • O levantamento dos agrotóxicos empregados na cultura da cana-de-açúcar nesta sub-bacia foi fundamentado em dois procedimentos investigativos: diagnóstico qualitativo, baseado em entrevista com os principais fornecedores de insumos da região e diagnóstico quantitativo, baseado na tabulação dos produtos aplicados e relatados ao Escritório de Defesa Agropecuária da Regional Piracicaba/ Coordenadoria de Defesa Agropecuária/Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.
Na sub-bacia do rio Corumbataí encontra-se a Usina Costa Pinto (22º 38' 09" S, 47º 41' 03" O), uma das doze unidades do Grupo Cosan, considerado um dos maiores produtores mundiais no setor de açúcar, álcool e derivados, com capacidade de moagem anual de aproximadamente 4 milhões de t de cana e área cultivada em torno de 26000 ha, englobando a produção de outras bacias hidrográficas. Esta empresa foi selecionada como unidade investigativa para o diagnóstico quantitativo (Figura 1) devido a sua representatividade na sub-bacia, tendo incorporado várias usinas da região ao longo dos anos. Além disso, muitos produtores fornecem sua produção para ser beneficiada nesta usina.
  • Foram selecionados quatro anos para tabulação de dados mensais, de janeiro de 2000 a dezembro de 2003. Os volumes de produtos formulados consumidos mensalmente foram recalculados para volumes de ingredientes ativos, com base no Compêndio de Defensivos Agrícolas 10,11, software Agrofit9812 e no Sistema de Informações sobre Agrotóxicos 13. Os valores mensais foram somados de modo a expressar a distribuição do consumo anual de agrotóxicos, bem como a distribuição no período completo de estudo. A distribuição temporal dos principais agrotóxicos também foi avaliada para determinar a ocorrência de padrões de consumo anual.
Para cada ingrediente ativo, foram levantados, em bancos de dados internacionais, parâmetros indicativos do comportamento ambiental destas moléculas, como meia-vida no solo (t1/2), coeficiente de sorção normalizado pelo conteúdo de carbono orgânico no solo (Koc), solubilidade em água (Ws) e pressão de vapor (Vp). Também foram identificadas as classes toxicológicas dos ingredientes ativos e suas respectivas marcas comerciais, de acordo com a classificação brasileira. A dosagem média aplicável de cada ingrediente ativo foi calculada com base nas recomendações das marcas comerciais para a cultura da cana-de-açúcar.
  • O "Groundwater Ubiquity Score – GUS"6, que avalia a lixiviabilidade de moléculas e a possibilidade de encontrá-las em águas subterrâneas, e o "Leaching Index – LEACH"7, que descreve a mobilidade e o potencial de poluição de águas subterrâneas e superficiais, foram calculados para cada composto, de acordo com as equações
GUS = log10(t1/2) x [4 - log10(Koc)]
onde t1/2 é a meia-vida no solo (dias) e Koc, o coeficiente de partição em carbono orgânico (L kg-1)
LEACH = (Ws x t1/2) / (Vp x Koc)
onde Ws é a solubilidade em água (mg L-1) e Vp, a pressão de vapor (MPa).
Resultados e Discussões:
  • Na Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo encontram-se registrados 63 ingredientes ativos (i.a.) formulados em 173 marcas comerciais para a cultura da cana-de-açúcar, distribuídos da seguinte maneira: 132 herbicidas (40 i.a.), 29 inseticidas (15 i.a.), 5 fungicidas (4 i.a.), 5 reguladores de crescimento (2 i.a.), 1 feromônio e 1 adjuvante 14.
O levantamento efetuado resultou em uma lista de 24 ingredientes ativos (Tabela 1) formulados isoladamente ou em misturas, totalizando 39 marcas comerciais, empregados no período de quatro anos na sub-bacia do rio Corumbataí e distribuídos em 15 grupos químicos, sendo o grupo das triazinas representado por três produtos, enquanto os demais compreendem uma ou duas moléculas. Ao longo dos anos, o uso de triazinas na cana-de-açúcar, principalmente atrazina, tem tido grande expressão.
  • Todos os ingredientes ativos e marcas comerciais empregados encontram-se registrados para a cultura da cana-de-açúcar, seja no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, seja na Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Observa-se que no período de 2000 a 2003 houve utilização declarada de apenas herbicidas nesta unidade investigativa (Usina Costa Pinto). O diagnóstico qualitativo não evidenciou diferença significativa entre os produtos aplicados na unidade investigativa e aqueles empregados por outros produtores da bacia, comprovando a representatividade desta unidade na área em estudo. O consumo de outras classes de agrotóxicos é esporádico e em volume muito reduzido.
A distribuição dos agrotóxicos na cultura da cana-de-açúcar, de acordo com as classes, é bastante heterogênea. De acordo com Ferreira 15, no Brasil, não houve consumo de acaricidas e fungicidas no período de 1997 a 1999. O consumo de inseticidas aumentou de 7,6 para 12,5% neste período, enquanto que os herbicidas apresentaram uma redução de 85,9 para 82,2%. Os produtos enquadrados como outros (antibrotantes, reguladores de crescimento, óleo mineral e espalhantes adesivos) responderam por 6,55, 8,03 e 5,29% dos agrotóxicos consumidos na cultura nos anos de 1997, 1998 e 1999, respectivamente. Além disso, com a expansão do controle biológico, muitas áreas reduziram significativamente o uso de inseticidas.
  • Dos ingredientes ativos utilizados, observou-se o predomínio de moléculas de classe toxicológica III, representando 66,7% do número total de ingredientes empregados, enquanto que as classes I, II e IV são representadas por 8,3; 20,8 e 4,2%, respectivamente (Tabela 1). Se tomarmos por base a classificação toxicológica das 39 marcas comerciais utilizadas, a distribuição sofre grande alteração, por conta das misturas ou das formulações, de modo que as classes I, II, III e IV são representadas por 12,8; 23,1; 38,5 e 25,6% do número total de marcas empregadas.
Também se observa o uso de produtos com meia-vida variando de 24 a 1320 dias, o que reflete persistência ambiental bastante diferenciada para os produtos empregados nesta bacia. Baseando-se na classificação de persistência do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais – IBAMA 21, 16,7; 16,7; 29,2 e 37,5% dos i.a. são classificados como não-persistentes, persistência reduzida, persistência média e persistência alta, respectivamente. Além disso, muitos produtos apresentam baixa tendência de adsorver ao solo (baixo Koc), repercutindo em uma propensão de atingir os corpos d'água em função da mobilidade elevada.
  • Para determinar o potencial de lixiviação dos produtos empregados nesta sub-bacia, os índices GUS e LEACH foram calculados (Tabela 1). De acordo com o índice GUS, dos 23 produtos calculados (exceto isoxaflutol, por falta de parâmetros para o cálculo), dois ingredientes ativos são classificados como não-móveis (GUS < 1,8), três como potencialmente móveis (1,8 < GUS > 2,8) e 18 como móveis (GUS > 2,8), podendo percolar no solo e atingir águas subterrâneas. O índice LEACH, expresso em escala logarítmica para permitir comparação com o índice GUS, não resulta em classes de mobilidade, mas descreve a tendência de lixiviação a medida que o valor aumenta. Observa-se que ambos os índices definem tendências de particionamento similares, porém não idênticas, resultando em um ranqueamento químico não-homogêneo, uma vez que são baseados em propriedades diferentes (Figura 2).


  • Os herbicidas glifosato e paraquate, considerados não-móveis pelo índice GUS, apresentaram valores elevados para LEACH em virtude de suas altas solubilidades e reduzidas pressões de vapor. Trifluralina e pendimetalina (móveis pelo índice GUS) apresentaram os menores valores de índice LEACH, devido à baixa solubilidade. Excluídos estes quatro agrotóxicos, grande correlação foi verificada entre os índices (R2 = 0,727; P(R2=0) = 0,0009433). A definição dos produtos a serem incluídos em um programa de monitoramento deverá ser embasada em outros aspectos que também determinam a probabilidade de atingirem o corpo d'água, como dosagem utilizada, volume e freqüência de seu uso na bacia hidrográfica, bem como o risco associado a sua presença, definido pela classificação toxicológica.
Avaliando-se o consumo total de agrotóxicos na sub-bacia do rio Corumbataí no período de quatro anos (Figura 3a), observa-se que o glifosato representou 19,88% dos produtos utilizados, seguido da atrazina, ametrina, 2,4-D, metribuzim, diurom e acetocloro, com 14,53; 14,39; 10,63; 9,43; 7,87 e 7,82%, respectivamente. Os demais produtos responderam isoladamente por menos de 5% do volume consumido e, conjuntamente, por 15,45% do volume de agrotóxicos empregados no período.


Uso de agrotóxicos em cana-de-açúcar na bacia 
do Rio Corumbataí e o risco de poluição hídrica

  • O herbicida 2,4-D apresentou maior freqüência de uso no período, sendo empregado em 43 dos 48 meses. Contudo, observa-se que o volume consumido não apresenta relação direta com a freqüência de uso. O herbicida imazapir, apesar do baixo volume consumido, é o 2º produto mais freqüentemente utilizado, em 39 dos 48 meses considerados. Comportamento semelhante é observado para isoxaflutol, sulfentrazona e imazapique. Já o herbicida acetocloro apresentou baixa freqüência, sendo empregado em apenas 9 meses no período, mas em volume que o coloca na 7ª posição. Se considerarmos o principal objetivo deste levantamento, que é o suporte na definição de moléculas a serem monitoradas em águas superficiais, a freqüência de uso tem tanta importância quanto o volume de produtos aplicados.
Observa-se no entanto, uma variação anual no consumo de agrotóxicos. No ano de 2000, o uso do herbicida glifosato prevaleceu sobre os demais, vindo a ocupar o 3º lugar em 2003 (Figura 3b), devido a uma redução no seu consumo, acompanhado pelo aumento do uso de ametrina e acetocloro.


  • A atrazina foi um dos agrotóxicos com maior variação anual de consumo. Em 2000, o seu baixo consumo colocou-o na 10ª posição, vindo a ocupar o 1º lugar nos dois anos seguintes, caindo para a 8ª colocação em 2003. Atrazina é um herbicida pré-emergente, muito empregado nos anos de renovação de áreas de cana. Obviamente, a intensidade do plantio de novas áreas é regulada pelo mercado sucro-alcooleiro. O baixo consumo deste herbicida no ano 2000 pode estar associado ao baixo valor da cana-de-açúcar, álcool e açúcar no ano de 1999, conforme dados do Instituto de Economia Agrícola 22. A nova queda em 2003 pode estar associada à substituição deste agrotóxico por outros de menor impacto ambiental (prática adotada em outras regiões do estado de São Paulo) e, também, com a elevação do preço deste insumo 23.
O consumo de ametrina foi semelhante nos 4 anos, com uma pequena ascensão em 2003, vindo a ocupar a 2ª posição. Os herbicidas 2,4-D e metribuzim apresentaram pouca variação anual, ocupando a 4ª-5ª e 3ª-5ª posição, respectivamente. O herbicida diurom apresentou um padrão de declínio de consumo ao longo dos quatro anos, saindo da 2ª posição em 2000 para a 7ª em 2003. O herbicida acetocloro começou a ser empregado em 2002, vindo a ocupar o 1º lugar em consumo em 2003. 
  • O uso de acetocloro, molécula relativamente recente, tem sido incentivado em outros países, como substituto da atrazina, devido à menor tendência de lixiviação e persistência ambiental. O herbicida pendimetalina foi empregado somente nos anos de 2001 e 2002, ocupando a 7ª e 6ª posição, respectivamente. O consumo de herbicidas contendo MSMA foi reduzindo a partir de 2001. Imazapir foi consumido em baixos volumes durante os 4 anos, mas com frequências variando de 8 a 12 meses/ano. Os demais produtos não apresentaram grande expressão em volume consumido e freqüência de uso no período avaliado.
A Figura 4 relaciona o volume consumido dos agrotóxicos no período de quatro anos com os dois índices de particionamento, a dosagem média aplicada e a classificação toxicológica. Os produtos consumidos em maior quantidade no período são também aplicados em maior dosagem e com tendências bastante distintas de mobilidade. De modo geral, observa-se que os produtos de maior mobilidade são empregados em menor dosagem e consumidos em menor quantidade, o que reduz o risco de exposição dos corpos hídricos. Porém, alguns destes produtos são enquadrados nas classes I e II, como sulfentrazona, trifloxissulfurom sódico, tebutiurom, paraquate (LEACH) e imazapique (GUS).


  • Para melhor atender ao planejamento estratégico de monitoramento de resíduos de agrotóxicos na calha principal do rio Corumbataí, foi realizada uma avaliação da distribuição mensal do uso individual de agrotóxicos nesta sub-bacia e os resultados podem ser observados nas Figuras 5 e 6.
Observou-se um padrão de consumo sazonal para os herbicidas atrazina, glifosato e isoxaflutol. Os herbicidas atrazina e isoxaflutol são empregados de abril a novembro. Glifosato apresenta um período de consumo que se estende de setembro a junho. A observação deste padrão é de grande importância na redução de custos analíticos no monitoramento destas moléculas, vindo-se a concentrar as amostragens nas épocas de maior uso.
  • Os demais produtos não apresentaram um padrão sazonal de consumo definido. Alguns são consumidos ao longo do ano, mas com um período de maior utilização, como é o caso da ametrina, do 2,4-D e do imazapir, cujos consumos aumentam no final do ano e início do ano seguinte. Outros produtos são esporadicamente empregados e englobam, principalmente, aqueles cujos volumes são insignificantes frente aos demais.
Obviamente, os autores não pretendem considerar este levantamento como uma caracterização do uso de agrotóxicos na cultura da cana-de-açúcar em nível nacional, uma vez que as peculiaridades regionais têm que ser consideradas. É notório que o consumo de agrotóxicos é regulado pela incidência de pragas, mas também pelo valor do produto e os aspectos culturais. A aceitabilidade de novos produtos por parte dos agricultores, principalmente os pequenos e médios, é um aspecto que deve ser considerado e, provavelmente, explica o uso de apenas 24 ingredientes ativos no período de quatro anos, dentro de um contingente de 63 moléculas registradas para a cultura no estado de São Paulo.

Conclusões:
  • Os herbicidas representam a classe de agrotóxicos mais empregada na cultura da cana-de-açúcar, sendo que, no período de avaliação, foram os únicos produtos de uso declarado na unidade investigativa, representando significativamente o uso de agrotóxicos na sub-bacia do rio Corumbataí. Os herbicidas glifosato, atrazina, ametrina, 2,4-D, metribuzim, diurom e acetocloro representaram aproximadamente 85% do volume total de produtos consumidos de janeiro de 2000 a dezembro de 2003, sendo importante o seu monitoramento nos corpos hídricos. 
Outros herbicidas também devem ser considerados apesar do baixo volume, como imazapir, pela grande freqüência de uso e, sulfentrazona, trifloxissulfurom sódico, paraquate, tebutiurom e imazapique, pela toxicidade e alta mobilidade. É notório que dentre os 24 ingredientes ativos identificados nesta área, alguns apresentaram consumo indistinto ao longo do ano, enquanto outros apresentaram padrão sazonal de aplicação, o que permite um planejamento estratégico do monitoramento de resíduos nos corpos hídricos, de modo a otimizar custos e garantir a qualidade do processo de avaliação de exposição.

Referências:
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Uso de agrotóxicos em cana-de-açúcar na bacia 
do Rio Corumbataí e o risco de poluição hídrica