sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

O que é um intelectual ?

Ciência, Ética e Sustentabilidade
Desafios ao novo século

Arminda Eugenia Marques Campos
Roberto S. Bartholo Jr.
Edições UNESCO Brasil
Um lago evapora e, pouco a pouco, vai se esgotando. Mas quando dois lagos estão unidos, eles não secam tão facilmente, pois um alimenta o outro. O mesmo ocorre no campo do conhecimento. O saber deve ser uma força revigorante e vitalizadora. Isso só é possível quando há um intercâmbio estimulante com amigos afins, em cuja companhia se possa debater e procurar aplicar as verdades da vida. I-Ching: o livro das mutações, Hexagrama 58 — Alegria, comentário à imagem
Apresentação:
  • As universidades surgidas na Europa do século XII foram, em sua organização e em seus métodos de ensino, uma criação original dos latinos medievais. 
A organização e os conteúdos de seus currículos, no entanto, foram em boa parte “importados”, por meio de traduções para o latim de conhecimentos filosóficos e científicos greco-árabes, com os temas filosóficos aportados pelas traduções influenciando a caracterização de um novo tipo de homem, que terá, nas universidades, o domicílio do exercício de seu ofício vocacional. 
  • É um evento pleno de conseqüências portadoras de um futuro. Nosso futuro. O futuro de uma civilização que fez da ciência e da tecnologia a condição de possibilidade de um novo mundo.
Os primórdios da universidade:
  • Um traço importante na genealogia de nosso “Novo Mundo” é a “linhagem” das instituições produtoras de conhecimento. Para isso, nossa atenção vai ser centrada na genealogia das nascentes universidades no contexto da Europa Medieval cristianizada. A partir do século VII, aproximadamente, as atividades de ensino na cristandade latina mantinham-se, quase que em sua totalidade, sob a alçada da Igreja, em particular vinculadas a mosteiros. 
A finalida de do ensino não era mais, como no mundo romano, manter a uniformidade cultural nos diversos pontos do império e preparar para a vida pública, mas dotar a Igreja de membros capacitados a preservar e compreender as Escrituras e textos doutrinários e a participar da administração eclesiástica.
  • Cerca de quatro séculos mais tarde, com a revitalização das cidades, as escolas monásticas começaram a perder influência em favor de escolas urbanas, ligadas a igrejas e a catedrais, em geral. Esse tipo de escola não surgiu no século XI; já existia, em alguns lugares, há bastante tempo. Nesse período, no entanto, elas aumentaram em número, tamanho e importância e passaram a ter maior continuidade. 
Esse aumento respondia à aguda consciência da necessidade de um clero secular melhor preparado, capaz de desempenhar tarefas mais complexas e com uma compreensão mais profunda do próprio cristianismo, assim como ao crescente engajamento, nos estudos, de pessoas sem interesse na carreira eclesiástica.
  • Inicialmente, os professores das escolas episcopais costumavam ser integrantes do capítulo da Igreja, mas o crescimento do número de interessados em aprender, em particular no século XII, levou à necessidade de delegar parte do ensino a pessoas externas ao capítulo. 
Esses “professores agregados” ensinavam em dependências das igrejas ou catedrais e, num momento posterior, puderam manter escolas independentes, mediante a concessão de uma licença especial, que seria chamada licentia docendi e que, a princípio, só tinha valor no território em que o outorgante havia até então tido monopólio sobre o ensino. 
  • Surgiram, assim, várias escolas sem vínculos diretos com uma igreja ou um capítulo, a partir da reunião entre professores e alunos interessados em seu ensinamento, os quais eram, freqüentemente, responsáveis pela remuneração do professor e pelo paga mento do que fosse necessário, como o aluguel do local onde ocorriam as aulas. A próxima transformação no quadro da instrução foi a reunião dos participantes no ensino em associações e a união das escolas, que resultariam, no século XIII, nas universidades.
O estabelecimento dessas associações decorria não apenas do crescimento do número de professores e alunos, mas principalmente da consciência crescente, entre eles, de que constituíam um grupo particular e partilhavam necessidades específicas. Decorria do surgimento e fortalecimento, em seu meio, de um espírito de corpo reforçado, com freqüência, por eventos que despertavam reações coletivas. 
  • Não eram as escolas ou cursos que se reuniam: continuavam consistindo na reunião de um professor e seus alunos, com sua própria forma de conduzir o ensino; continuavam, de certa forma, concorrentes; passavam a integrar uma “federação”.
Eram as pessoas que se agrupavam, de modo similar às que estabeleceram outras associações típicas do ambiente urbano da época, como as corporações de ofícios e as confrarias de mercadores. O objetivo era defender seus interesses e reivindicar o que julgavam ser suas prerrogativas, inclusive no que dizia respeito à regulamentação do ensino e ao controle de abusos praticados por alunos ou professores. Ao longo do século XIII, essas corporações e a organização do ensino foram sendo gradativamente regulamentados, dando origem a um novo tipo de instituição.
  • As “antepassadas” das universidades haviam mantido, com poucas adaptações, o modelo de educação da Antiguidade tardia romana, não apenas quanto a métodos, mas também quanto a conteúdo, ainda que inicialmente seus programas se restringissem a uma parcela reduzida do conteúdo original. Com o passar do tempo, essa parcela foi sendo aumentada, nas escolas monásticas e episcopais, com a busca e o intercâmbio de textos na própria rede de bibliotecas dos mosteiros. 
Isso levava à ampliação e ao aprofundamento das disciplinas ensinadas e a algumas tentativas, de início tímidas, de retomar a modesta cultura filosófica disponível como fonte de instrumentos de pesquisa e interpretação das Escrituras e da doutrina. Criava-se, com isso, uma expectativa e uma demanda por mais textos.
  • A partir do século XII, o material disponível ampliou-se consideravelmente. Intensificou-se a exploração e a difusão dos recursos disponíveis em latim e iniciou-se o movimento de tradução de textos, principalmente a partir do árabe, nas regiões sendo tomadas aos muçulmanos (Península Ibérica e Sicília). Grande parte dos conhecimentos filosóficos e científicos do legado grego havia sido traduzida para o árabe, estudada e desenvolvida por pensadores islâmicos.
As traduções possibilitaram, assim, o encontro não só com material produzido por autores antigos, mas também com os comentários e desdobramentos produzidos por pensadores do mundo islâmico.

A acolhida da filosofia:
  • Os conhecimentos — nos ramos da filosofia, do direito, da medicina e de várias ciências — postos em circulação elos movimentos descritos anteriormente, foram de extrema importância para os integrantes das primeiras universidades.
Coube a eles a tarefa de absorver esses conhecimentos, o que realizaram, por vezes, com avidez e em geral com satisfação. Houve não apenas uma gradativa introdução de novos elementos nos programas de estudos: as concepções de ciência e a sistematização das áreas do conhecimento oriundas do aristotelismo foram tomadas como base dos currículos elaborados pelas universidades.
  • O acolhimento e a digestão desse corpo filosófico, com destaque para o peripatetismo greco-árabe, foram realizados, em graus e perspectivas diferentes, por integrantes dos cursos de artes liberais e de teologia. 
O primeiro era um curso preparatório para os demais (teologia, medicina e direito), e seu programa, que anteriormente abrangera as artes liberais tradicionais do mundo antigo, modificou-se, ao longo do período de estabelecimento das universidades, para enfatizar o estudo da filosofia, tomada, então, como sinônimo do aristotelismo recém-descoberto. 
  • No campo da teologia, houve a elaboração das grandes sínteses teológicas que caracterizaram o século XIII, produzidas a partir da integração, da avaliação ou da rejeição de elementos da filosofia peripatética, que foi o grande impulso para sua produção.
Essas transformações não ocorreram sem divergências e conflitos, que opuseram por vezes integrantes da faculdade de artes e da faculdade de teologia ou de uns e outros com a hierarquia da Igreja. Uma das divergências mais polêmicas diria respeito à teoria aristotélica sobre a alma, o intelecto e o processo de conhecimento. A interpretação dessa teoria e de comentários a ela feitos por Averróis, associada à de parte da ética aristotélica realizada por professores da faculdade de artes, levou a concepções bastante controversas.
  • Afirmava que o intelecto seria único e separado dos indivíduos, não sendo forma substancial do corpo. Considerava, ao mesmo tempo, que o intelecto constituiria a porção fundamental e melhor do homem. A conseqüência que se podia tirar era a de que o mais nobre do ser humano não estaria ligado ao corpo, mas apenas agiria no indivíduo, sendo único para toda a espécie humana. 
Era a chamada doutrina do monopsiquismo, que negava a existência de almas imortais individuais, o que ia totalmente contra a antropologia cristã. Essa e outras teorias tidas como vinculadas em excesso, e em detrimento da verdade cristã, ao pensamento peripatético, sofreram várias censuras oficiais ao longo da segunda metade do século XIII.

Nas esquinas da cidade: 
Novos horizontes da organização da cultura nas escolas monacais:
  • As tarefas ligadas ao ensino não eram as únicas ocupações dos monges por elas responsabilizados. Não eram valorizadas por si mesmas nem definiam vocações. Algo similar acontecia com os integrantes do clero secular que ensinavam nas escolas catedrais. Para eles, também o ensino era uma tarefa entre outras. A transformação mais notável ocorreu no século XII, nas escolas urbanas que então surgiam ou se fortaleciam.
Nelas o ensino de conhecimentos profanos ganhava um espaço maior, visando qualificar não apenas o clero, mas também leigos que desempenhariam funções fora da Igreja. O próprio aumento da importância e do âmbito do ensino criava a necessidade de maior especialização e dedicação. Alguns de seus professores começaram a se caracterizar especificamente por suas atividades docentes e por sua qualificação em executá-las, e a se profissionalizar, recebendo uma remuneração específica pelo ensino que proporcionavam.
  • A tendência à especialização e à profissionalização cresceria nas universidades, corporações formadas justamente por pessoas caracterizadas por seus vínculos com o estudo, seja como professores seja como estudantes. A vida intelectual tornava-se um ofício, “pelo qual se é remunerado, e que tem suas técnicas, seu aprendizado e sua corporação” (Paul, 1973: 276). 
Nelas a maior parte dos professores, ainda que pudessem desempenhar tarefas além das docentes, definiam-se por serem professores e especialistas. 
  • Além disso, boa parte do ensino tinha como finalidade exatamente preparar para ensinar. O desempenho de atividades docentes era uma das finalidades do aprendizado — além de ser um dos meios através do qual ocorria.
O reconhecimento da condição de especialistas ficava explícito, por exemplo, quando se buscava o conjunto de doutores ou alguns entre eles, a fim de obter sua opinião — tida como fundada, como qualificada — sobre um determinado assunto. Isso acontecia em relação aos diversos cursos universitários — direito canônico ou romano, medicina, artes ou teologia. 
  • Nesse último domínio, a transformação foi mais notável, uma vez que o corpo de mestres em teologia passou a ser reconhecido na Igreja como tendo autoridade para elaborar doutrina em matéria de fé, o que deixava de ser exclusividade dos concílios. Os universitários eram reconhecidos como tendo um valor e uma função específicos para pelo menos parte da sociedade, em razão de seu conhecimento, de sua qualificação.
As escolas urbanas e suas sucessoras, as escolas universitárias, tinham uma ligação bem maior do que as monásticas com o contexto em que se encontravam e suas necessidades.
  • O número de leigos entre os alunos cresceu, principalmente nas universidades. O ensino se ampliava, proporcionando formação de profissionais que exerceriam funções fora da estrutura eclesiástica.  Mesmo a Igreja passava a ter necessidade de maior diversidade de quadros, por ter ganhado, nesse mesmo período, uma estrutura bastante centralizada e complexa, com uma burocracia mais ampla.
Do clérigo ao intelectual
  • Foi em razão dessas ligações que Le Goff apontou o surgimento da figura do intelectual, como tipo sociológico, como um dos aspectos do desenvolvimento urbano e das transformações econômicas, sociais e políticas ocorridas nas cidades florescentes dos séculos XII e XIII. 
Escolheu o termo intelectual, embora ele não fosse utilizado na época, principalmente com o sentido hoje corrente, por não encontrar entre os usados na época um que melhor conviesse para diferenciá-lo do clérigo e designar “os que fazem do pensar e do ensinar seu pensamento uma profissão”, caracterizados pela “aliança entre a reflexão pessoal e sua difusão através do ensino” (Le Goff, 1993:18). 
  • Abelardo seria a primeira grande figura de intelectual nitidamente distinta dos eruditos dos meios monásticos.
A existência do intelectual teria resultado da divisão de trabalho ocorrida nos ambientes urbanos. Seria mais um dos ofícios especializados surgidos nesse período de “redescoberta do homo faber”, em que o homem se afirmava “como um artesão que transforma e cria” (Le Goff, 1993: 54):
“É como um artesão, como um profissional comparável aos demais citadinos, que se sente o intelectual urbano do século XII. Sua função é o estudo e o ensino das artes liberais. Mas o que é uma arte? Não é uma ciência, é uma técnica. Arte é a especialidade do professor, assim como o têm as suas o carpinteiro ou o ferreiro. [...] Arte é toda atividade racional e justa do espírito, aplicada tanto à produção de instrumentos materiais como intelectuais: é uma técnica inteligente do fazer. [...] Assim o intelectual é um artesão [...]” (Le Goff, 1993: 57).
Além de artífice e produtor de conceitos, o intelectual seria ainda como um comerciante, fazendo circular idéias como aquele fazia circular mercadorias e sendo por isso remunerado.
“As cidades são centros de irradiação na circulação dos homens, tão plenas de idéias como de mercadorias, lugares de trocas, mercados e encruzilhadas do comércio intelectual” (Le Goff, 1993: 25).
Além disso, o intelectual teria consciência de suas peculiaridades e do papel a assumir: jamais, “antes da época contemporânea, esse meio foi tão bem delimitado, nem alcançou mais nítida consciência de si mesmo que na Idade Média” (Le Goff, 1993: 18). 
  • Essa consciência se daria pela identificação com os ofícios, com sua função de profissional e de citadino. 
A formação das universidades espontâneas — associações de iguais, semelhantes em muitos aspectos às corporações de ofícios ou às confrarias de mercadores — seria um sinal dessa consciência.
Jacques Le Goff (1993) vê, no entanto, o intelectual rapidamente trair a si mesmo, apesar da consciência de suas características, por não saber vencer as ambigüidades em que se encontrava, por não se comprometer o suficiente com a consciência que tinha de si mesmo. O intelectual
“[...] que conquistou seu lugar na cidade se mostra entretanto incapaz, face às alternativas que se abrem diante dele, de escolher as soluções do futuro. Dentro de uma série de crises que se poderiam denominar de crescimento, e que são os sinais da maturidade, ele não sabe optar pelo rejuvenescimento, e se instala nas estruturas sociais e nos hábitos intelectuais nos quais submergirá” (Le Goff, 1993: 60).
Urbi et orbi
  • Comprometer-se adequadamente com “as soluções do futuro” seria reforçar a identificação com os profissionais leigos burgueses (Le Goff, 1993: 64), ultrapassar as ambiguidades de sua situação, da corporação à qual pertenciam. Le Goff (1993) ressalta as contradições da corporação universitária. 
A primeira delas seria seu caráter eclesiástico: não se encontrou melhor meio de garantir a autonomia da nova associação senão reafirmando sua sujeição à jurisdição eclesiástica. 
  • “Nascidos de um movimento que tendia à laicidade, eles pertenciam à Igreja, mesmo quando procuram institucionalmente sair dela” (Le Goff, 1993: 64).
Embora as escolas tenham se desenvolvido como mais uma instituição nova surgida nas cidades, a Universidade “ultrapassou o quadro urbano onde se formou”. A corporação universitária não tinha, como as demais, “o monopólio sobre o mercado local. Sua área é a cristandade”.
  • Ela tinha um caráter universal, internacional, por atrair estudantes de várias partes e, no caso das instituições mais importantes, conceder uma licença válida em toda a parte. A defesa dos interesses de seus integrantes levava-a mesmo “a se opor — às vezes violentamente — aos citadinos, tanto no plano econômico quanto no jurídico e político” (Le Goff, 1993: 64).
Outra fonte de contradição seria as formas de subsistência dos universitários. Nem todos os professores viviam de salários, pagos por seus alunos ou pelos poderes civis. 
  • Boa parte deles, assim como dos alunos, viviam de benefícios ou prebendas, muitas vezes ligados a funções ou cargos sem nenhuma ligação com o ensino. As escolhas ocorriam em função das circunstâncias, das possibilidades existentes. Essa situação ia contra a afirmação deliberada do intelectual “como um trabalhador, como um produtor”. 
O afastamento do mundo dos demais trabalhadores, que iria minar “as bases da condição universitária” (Le Goff, 1993: 86), teria sido reforçado pela oposição entre trabalho manual e trabalho intelectual mantida pela escolástica. Além disso, a remuneração por “privilégios” acentuava o caráter eclesiástico do ensino.
  • Os intelectuais teriam, pela incapacidade de ultrapassar essas contradições, reforçado a vinculação com a Igreja e o Estado, deixando de se tornar os “intelectuais orgânicos” das classes produtoras urbanas surgidas no mesmo movimento que eles.
Ao fim dessa evolução profissional, social e institucional, havia um objetivo: o poder. Os intelectuais medievais não escapam ao esquema gramsciano, na verdade muito genérico, mas operacional. 
  • Em uma sociedade ideologicamente controlada muito de perto pela Igreja e politicamente cada vez mais enquadrada por uma dupla burocracia — a laica e a eclesiástica (...) —, os intelectuais da Idade Média são, antes de tudo, intelectuais “orgânicos”, fiéis servidores da Igreja e do Estado. As universidades se tornam cada vez mais celeiros de “altos funcionários” (Le Goff, 1993: 9)
A perfeita felicidade:
  • A perspectiva sociológica de consideração do surgimento dos intelectuais medievais, de que o livro  Os intelectuais na Idade Média, de Le Goff, é o principal marco, considera esse fenômeno no quadro do fortalecimento das escolas urbanas e da criação das universidades, em meio às transformações do meio urbano dos séculos XII e XIII. 
Vê o aparecimento dos “profissionais do pensamento” em suas relações com a instituição universitária que se estabelecia e organizava e com a sociedade em que ela se instalou.
Nossa visão sobre esse fenômeno se enriquecerá se analisarmos o nascimento do ideal intelectual, como propõe De Libera em Penser au moyen âge. Sua posição é que “os intelectuais medievais afirmaram eles mesmos sua diferença” e “representaram eles mesmos sua singularidade, é essa representação, essa consciência de si, essa ‘estima’, ou melhor, essa auto-avaliação que deve ser, no presente, estudada”.
Em suma, devemos tentar “entender a reivindicação da intelectualidade como tal” (De Libera, 1991: 11).
  • Desde essa perspectiva, o aparecimento do intelectual medieval se caracterizaria pelo ressurgimento de um ideal ético antigo, concorrente ao cristão. Isso teria ocorrido, em particular, entre os aristotélicos radicais da faculdade de artes da universidade de Paris, a partir das sétima e oitava décadas do século XIII. 
Foram eles que mais buscaram uma identidade própria, que os distinguisse dos modelos anteriores de professores, qualificando-se como filósofos. Não se quer dizer com isso que tal grupo tenha tido o monopólio da filosofia na universidade medieval. 
  • O pensamento filosófico não ficou restrito às faculdades de artes. Foi amplamente desenvolvido nas faculdades de teologia, não fazendo sentido falar em oposição razão e fé em relação aos conflitos intra-universitários do século XIII: pode-se falar, no máximo, em modalidades diferentes de exercício da razão.
Os artistas heterodoxos parisienses desejaram se distinguir atribuindo-se a si mesmos, explicitamente, uma identidade por meio da exaltação da vida filosófica, como um novo e diferenciado estilo de vida. 
“Esse movimento, que podemos denominar ‘aristocratismo intelectualista’ nasceu da familiaridade com textos filosóficos greco-árabes, ao mesmo tempo que reativava certas postulações, certos desejos que eram buscados antes dele [Siger de Brabante], em particular na época de Abelardo” (De Libera, 1991: 23).
No livro La philosophie, théorie ou manière de vivre? Les controverses de l’Antiquité à la Renaissance, Domanski destaca a tendência, entre os artistas heterodoxos parisienses, de se considerar a filosofia de maneira não apenas teórica, como instrumento conceitual, mas também como modo de vida.
  • Um componente do aspecto prático da filosofia seria a ética, concebida não apenas como ciência, mas como “ética realizada, uma ciência dos costumes não apenas teórica, mas também praticada’, encarnada por assim dizer, nos costumes do filósofo, uma arte de viver exercida por si mesma” (Domanski, 1996: 11). 
O encontro entre a filosofia e o cristianismo teria conduzido a um questionamento do aspecto prático da filosofia, da ética realizada pelos filósofos (Domanski, 1996: 23-29). 
  • A cristianização da filosofia incluiu a negação ou redução de sua vertente prática, uma vez que se considerava que o modo de viver perfeito era ditado pelo próprio cristianismo; a fonte da moral e da ética eram as verdades reveladas do Evangelho, cuja vivência integral de virtudes dependia da graça divina.
A tendência predominante, no século XII e na escolástica do século XIII, seria dar à filosofia um caráter simplesmente “teórico” e “científico”, de forma ainda mais radical que no início do cristianismo: “o adepto da filosofia não era senão um leitor e um comentador dos escritos de Aristóteles” (Domanski, 1996: 49-50). 
A tendência predominante era a de considerar que
“[...] o papel de um filósofo se limita a comentar, explicar e, eventualmente, desenvolver a verdade descoberta pela razão natural e contida nos escritos de Aristóteles. [...] Desse ponto de vista, os problemas éticos situam-se no mesmo plano que todos os demais e [...] a filosofia prática, como filosofia, logo, como pesquisa científica, não difere de modo algum de todos os outros ramos. Uma moralidade ativa, uma ética praticada, tudo isso pertence a uma outra ordem” (Domanski, 1996: 50-51).
  • Nesse quadro, a corrente dos artistas heterodoxos parisienses do século XIII seria uma das exceções ao movimento principal, por atribuir “à filosofia uma autonomia completa, sem considerá-la como simples propedêutica à doutrina cristã”, estando, portanto, “mais inclinada que as outras correntes a aproveitar esses elementos metafilosóficos do aristotelismo que se relacionavam com a vida filosófica como moral praticada” (Domanski, 1996: 70). 
Desde essa perspectiva o filósofo, vivendo conforme a natureza humana, seria o verdadeiro virtuoso, por ter condições de distinguir corretamente as virtudes dos vícios. Nele, todas as funções e ações inferiores estariam ordenadas 
“à função suprema e à ação mais elevada: isto é, a especulação sobre a verdade e sua fruição, em particular a verdade primeira” (Domanski, 1996: 72-73).
Ciência, Ética e Sustentabilidade
Desafios ao novo século

O legado peripatético árabe
  • O espírito racional de Aristóteles, suas concepções sobre o conhecimento, sobre seus diferentes domínios e métodos, foram fundamentais para o surgimento da universidade e a formulação do novo modelo de professor surgido nos meios urbanos, para a consciência das peculiaridades do homem dedicado de modo expresso à transmissão do conhecimento e para a valorização de sua ocupação.
Mas devemos considerar que o ideal do filósofo na Idade Média não teria surgido sem legado dos peripatéticos do mundo islâmico e sua leitura do aristotelismo, integradora a concepções neoplatônicas. 
  • A contribuição dos autores muçulmanos foi fundamental para a formulação do ideal de vida filosófica defendido pelos artistas parisienses da segunda metade do século XIII. Segundo A. de Libera este ideal entrelaçou dois motivos desenvolvidos por pensadores islâmicos: a idéia de um crescimento progressivo do saber e a de uma ascese intelectual.
O primeiro motivo já se encontrava presente nos textos de Al-Kindi. Inspirado em Aristóteles, mas também em princípios islâmicos sobre o conhecimento, propunha a “tese de um crescimento do saber, de um progresso, de uma construção gradual do pensamento e da sabedoria, implicando o concurso de uma multidão de homens.” O segundo, seria a “idéia ético-intelectual do destino do homem” (De Libera, 1991: 140).
A visão do universo adotada pelos filósofos árabes definia:
“[...] o ato de pensamento como um estado do universo inteligível, como um grau de unidade e de unificação da alma, que podia se intensificar à medida que se operavam a ‘continuação’, a ‘conjunção’ da alma humana com a inteligência separada que, na cosmologia peripatética, presidia os movimentos do mundo sublunar. O progresso, o crescimento do saber, tinha desde então um sentido complexo, ao mesmo tempo pessoal e transpessoal. O homem era considerado não como sujeito pensante, mas como local do pensamento, lugar do inteligível” (De Libera, 1991: 141).
Os latinos medievais teriam aprendido com Al-Kindi e Farabi que:
“[...] o pensamento podia ser um progresso cotidiano, uma assimilação progressiva, dito de outra forma, um trabalho e, em última análise, uma santificação. Os pensadores latinos aprendiam assim a considerar o exercício do pensamento como uma ascese, a ‘espiritualizar’ o ideal aristotélico da sabedoria contemplativa em uma espiritualidade do trabalho intelectual. Ao aprender dos árabes em geral a existência de uma ‘esperança filosófica’ [...], eles ascendiam à idéia de que havia lugar na terra para uma vida bem-aventurada, uma vida do pensamento, antecipando a visão beatífica prometida aos eleitos na pátria celeste.
Deviam a eles assim “a idéia de que a atividade do pensamento é também um crescimento da alma no ser, tese nova que, proporcionando ao trabalho intelectual sua dupla dimensão de labor e de contemplação, impunha uma redefinição do ideal da sabedoria” (De Libera, 1991: 140).
  • E é certo que, embora essas influências fossem adquirir um tom mais radical entre os artistas heterodoxos, estavam também presentes entre outros pensadores, como Alberto Magno.
Intelectocratas:
  • Os aristotélicos heterodoxos da faculdade de artes de Paris sofrem censuras universitárias, as de 1277 em particular, devido à sua pretensão de reviver um antigo ideal ético, próprio aos filósofos, no seio da corporação universitária.
Agora, a “filosofia não era mais considerada abstratamente, como ‘vã curiosidade’ parasitando o espírito dos clérigos, mas concretamente, como um conjunto articulado de decisões relativas ao mundo, ao lugar que nele ocupava o homem e à ética daí extraída” (De Libera, 1991: 178). 
  • E os valores que integravam esse ideal ético não se opunham, necessariamente, aos valores cristãos, mas de algum modo com eles concorriam por justificarem de modo diverso comportamentos similares. 
Havia uma espécie de assimilação de temas da moral cristã para o domínio da filosofia, dando-lhes outra justificativa, assim como a transposição de temas filosóficos para terrenos diferentes daquele em que eram tratados em sua origem. Assim, por exemplo, ao dar sentido filosófico à apologia da castidade, Siger de Brabante argumentou utilizando um tema aristotélico: o do egoísmo virtuoso. 
  • O egoísta virtuoso, sinônimo de filósofo, seria o que “se identifica com a parte mais nobre de si mesmo: o intelecto, o pensamento”, uma vez que cada “homem é seu próprio intelecto”. Apenas ele seria realmente livre e nobre, porque, ao “obedecer apenas às determinações de seu intelecto, obedece a si mesmo”.
Associada a essa concepção viria, então, a defesa de “uma nobreza do intelecto, superior à nobreza do sangue”, concepção que muito deve à idéia averroísta da elite filosófica.. Em meio aos aristotélicos heterodoxos da Universidade de Paris, afirma-se um ideal “intelectocrata”, “uma elite que deve sua dignidade não a privilégio ou condição hierárquica, mas a uma superioridade intelectual” (Lohr, 1992: 91).
  • A idéia do egoísmo virtuoso seria também acompanhada por outro aspecto da ética aristotélica: o da amizade virtuosa.
Para chegar à:
“[...] plenitude filosófica da vida individual, o homem deve ser absolutamente ele mesmo, isto é, como vimos, “viver segundo o que há de melhor nele”: o pensamento. Esse engajamento intelectual é a decisão filosófica por excelência, o ato supremo de virtude. Ora, o homem não pode viver o pensamento sem comunicação [...]. Tendo consciência de sua própria bondade, o egoísta virtuoso tem necessidade de “participar também da consciência que seu amigo tem de sua própria existência”. Necessita portanto de “viver com ele”, de ‘partilhar discussões e pensamentos’” (De Libera, 1991: 239).
Além de uma “alternativa filosófica” ao ideal cristão da castidade, apresentava-se assim também uma “alternativa” à caridade cristã.
  • “A pretensão dos filósofos contemplativos a uma dignidade de vida igual às mais elevadas virtudes da vida monástica impunha um problema corporativo aos teólogos. [...] A idéia de uma corporação de egoístas — os magistri artium — só podia causar embaraço à hierarquia eclesiástica. Era uma contradição de termos, mas uma contradição operativa, minando concretamente a universidade cristã. 
Ao eliminar a distância entre mendicantes, seculares e leigos, a reivindicação dos “filósofos” apresentava um problema novo ao cristianismo: o do intelectual em meio cristão (De Libera, 1991: 237).

A utopia universitária:
  • Um dos aspectos mais interessantes desse processo foi o de que, ao fazer da Universidade o espaço em que se poderia conduzir uma vida orientada para o ideal de atingir a contemplação intelectual, transformavam-na em utopia.
Além disso, aqueles que postulavam a exaltação da vida filosófica transpunham para o espaço da Universidade — lugar de exercício de seu ofício — algo que, para os primeiros formuladores do ideal da contemplação, da sabedoria teorética, da amizade perfeita entre filósofos, só era compatível com o domínio do ócio. 
A vida universitária se confunde com o ócio de Aristóteles, pois o estudo “é um tempo para a virtude egoísta e a amizade que ela demanda [...], considerada com os olhos de um “aristotélico”, a universidade medieval é antes de tudo um lugar e um laço de contemplação (De Libera, 1991: 240-241).
Na verdade, segundo essa concepção, a atividade do pensamento, o conhecimento, não deixava de ser um trabalho, mas um trabalho capaz de liberar, à diferença daquele que escravizaria o homem à matéria, o trabalho servil.
  • A relação entre sabedoria e conhecimento, entre contemplação e trabalho, é redefinida, e os intelectuais/filósofos são membros “de uma sociedade de homens reunidos para viver juntos uma moral, um trabalho e um ideal” (De Libera, 1997: 8).
E a junção do ideal filosófico da “felicidade intelectual” com a ética corporativista transforma essa “felicidade” em profissão. É tendo em vista essa possibilidade que fazem sentido as “interrupções de carreira”, mediante as quais alguns mestres em artes escolhem permanecer na faculdade de artes, no que seria o estágio preparatório para os demais cursos, apesar das dificuldades materiais decorrentes dessa opção. 
  • Vários desses mestres “voluntariamente se eternizaram numa situação — um ‘estado’ (status) — do qual a pobreza e a ausência de perspectivas os devia normalmente afastar” (De Libera, 1991: 12). Chegando a fazer propaganda da força dessa sedução, eles:
“souberam lhe dar um slogan que expressava o término esperado de uma carreira de professor e o fim desejado de uma ascese intelectual: ibi statur, “aí permaneçamos”. Alcançada a filosofia, deve-se manter nela; não há por que ir além do sabor (sapor) da sabedoria (sapientia)” (De Libera, 1991: 147).
Não é surpreendente que a retomada de concepções do pensamento grego não tenha contribuído para apagar a distância entre trabalho manual e trabalho intelectual. 
O surpreendente é terem, por outro lado, associado o caminho de busca da beatitude perfeita ao exercício de uma profissão; a corporação universitária ser vista como o lugar em que se poderia conduzir uma vida “definida por um privilégio realmente extraordinário: a possibilidade de abolir institucionalmente a distância que separa o otium do negotium”. 
Como uma estrutura social em que o “estudo é lazer” e “a vida pode ser inteiramente dedicada ao prazer da dificuldade” (De Libera, 1991: 242).
Os aristotélicos heterodoxos postulam uma concepção de nobreza que buscava distingui-la da nobreza tradicional. Tratava-se não de uma nobreza de sangue, mas de uma nobreza adquirida por um esforço pessoal: o “filósofo” se enobrecia por uma superioridade intelectual, em razão da escolha por viver segundo o intelecto e pela virtude a ela correspondente, pois
“a filosofia se atesta na maneira de viver e de desejar. Ainda que insistindo em falar dos rigores de sua condição, os “pobres mestres e estudantes da universidade de Paris” vivem como antigos aristocratas e cantam até os prazeres da abstinência — ou, melhor dizendo, da abstenção — egoísta. A universidade é uma instituição de pobreza onde se ganha a vida com dificuldades, mas é nesse lugar de miséria que se goza a alegria da emulação e do reconhecimento, o charme da virtude” (De Libera, 1991: 242).
Tratava-se, em essência, do ideal de uma “aristocracia intelectualista desinteressada”, deixando sua marca indelével na vida universitária. Ainda que seja evidente que esse ideal não impediu uma evolução no sentido de uma integração dos professores universitários a classes privilegiadas ou de um comprometimento do ensino com esses grupos.

Referências:

DE LIBERA, Alain. Penser au moyen âge. Paris, Ed. du Seuil, 1991.
______. Os antepassados árabes do renascimento europeu, O Correio
da Unesco, 25, 4 (abr. 1997), p. 4-9, 1997.
DOMANSKI, Juliusz. La philosophie, théorie ou manière de vivre? Les controverses de l’Antiquité à la Renaissance. Fribourg/Paris, Éditions Universitaires Fribourg Suisse/Éditions du CERF, 1996.
GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. 4. ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1982. LE GOFF, Jacques. Os intelectuais na Idade Média. 3. ed. São Paulo, Brasiliense, 1993.
LOHR, Charles. The Medieval Interpretation of Aristotle. In:
KRETZMANN, N. et al. The Cambridge History of Later Medieval Philosophy, 4. ed. Cambridge, Cambridge University Press p. 80-98, 1992.
PAUL, Jacques. Histoire Intellectuelle de l’Occident Médiéval. Paris, Armand Colin, 1973.
RASHDALL, Hastings. The Universities in the Middle Ages (ed.: F. M. Powicke e A. B. Emden). 2. ed. rev. Oxford, Oxford University Press, 3 v., 1936.

Ciência, Ética e Sustentabilidade
Desafios ao novo século

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

A poluição do ar e o sistema respiratório

A poluição do ar e o sistema respiratório

Marcos Abdo Arbex; 
Ubiratan de Paula Santos; 
Lourdes Conceição Martins; 
Paulo Hilário Nascimento Saldiva; 
Luiz Alberto Amador Pereira; 
Alfésio Luis Ferreira Braga 
  • Apesar dos efeitos da poluição terem sido descritos desde a antiguidade, somente com o advento da revolução industrial a poluição passou a atingir a população em grandes proporções. A
 rápida urbanização verificada em todo o planeta trouxe um grande aumento no consumo de energia e também de emissões de poluentes provenientes da queima de combustíveis fósseis por fontes fixas, como as indústrias, e por fontes móveis, como os veículos automotores. 
  • Atualmente, aproximadamente 50% da população do planeta vivem em cidades e aglomerados urbanos e estão expostas a níveis progressivamente maiores de poluentes do ar.(1) 
A outra metade, principalmente nos países em desenvolvimento, utiliza combustíveis sólidos derivados de biomassa (madeira, carvão vegetal, esterco animal seco e resíduos agrícolas) e combustíveis líquidos, em menor proporção, como fonte de energia para cocção, aquecimento e iluminação.(1,2)
  • Devido à grande área de contato entre a superfície do sistema respiratório e o meio ambiente, a qualidade do ar interfere diretamente na saúde respiratória. Além disso, uma quantidade significante dos poluentes inalados atinge a circulação sistêmica através dos pulmões e pode causar efeitos deletérios em diversos órgãos e sistemas.(3)
Estimativas globais sugerem que a poluição ambiental externa (outdoors) cause 1,15 milhões de óbitos em todo o mundo (correspondendo a cerca de 2% do total de óbitos) e seja responsável por 8,75 milhões de anos vividos a menos ou com incapacidade,(4) enquanto a poluição no interior dos domicílios cause aproximadamente 2 milhões de óbitos prematuros e 41 milhões de anos vividos a menos ou com incapacidade.(5) 
  • Para o Brasil, a Organização Mundial da Saúde estima que a poluição atmosférica cause cerca de 20 mil óbitos/ano, valor cinco vezes superior ao número de óbitos estimado pelo tabagismo ambiental/passivo, e 10,7 mil óbitos/ano decorrentes da poluição do ar em ambientes internos.(4,5)
Poluição do ar: fontes: 
Sítio de ação e fisiopatologia:
  • O ar poluído é uma mistura de partículas - material particulado (MP) -e gases que são emitidos para a atmosfera principalmente por indústrias, veículos automotivos, termoelétricas, queima de biomassa e de combustíveis fósseis. Os poluentes podem ser classificados em primários e secundários. Os poluentes primários são emitidos diretamente para a atmosfera, e os secundários são resultantes de reações químicas entre os poluentes primários.
Os principais poluentes primários monitorados no Brasil e pelas principais agências ambientais em todo o mundo são óxidos de nitrogênio (NO2 ou NOx), compostos orgânicos voláteis (COVs), monóxido de carbono (CO) e dióxido de enxofre (SO2). Um exemplo de poluente secundário é o ozônio (O3), formado a partir da reação química induzida pela oxidação fotoquímica dos COVs e do NO2 na presença de raios ultravioleta provenientes da luz solar.(6,7)
  • O MP é o poluente mais estudado e pode ter origem primária ou secundaria. O MP varia em número, tamanho, formato, área de superfície e composição química, dependendo do local de sua produção e da fonte emissora. 
Os efeitos deletérios sobre a saúde humana produzidos pelo MP dependem de sua composição química e de seu tamanho. O MP é formado por múltiplos constituintes químicos, incluindo um núcleo de carbono elementar ou orgânico, compostos inorgânicos, como sulfatos e nitratos, metais de transição sob a forma de óxidos, sais solúveis, compostos orgânicos, como hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, e material biológico, como pólen, bactérias, esporos e restos animais. 
  • O MP é classificado de acordo com o seu tamanho em partículas totais em suspensão: partículas com até 30 µm de diâmetro; partículas com diâmetro inferior a 10 µm (MP10 ou fração inalável); partículas com diâmetro inferior a 2,5 µm (MP2,5 ou fina); e partículas com diâmetro menor que 10 nm (MP0,1 ou ultrafina).(6,7)
O Quadro 1 mostra os principais poluentes monitorados pelas agências de proteção ambiental nas áreas urbanas, suas fontes, área de ação no sistema respiratório e efeitos sobre a saúde humana.


Como os poluentes: 
Aéreos afetam o sistema respiratório:
  • Diversos mecanismos têm sido sugeridos para explicar os efeitos adversos dos poluentes aéreos. A explicação mais consistente e mais aceita é a de que altas concentrações de oxidantes e pró-oxidantes contidos nos poluentes ambientais, como MP de diversos tamanhos e composição, e nos gases, como O3 e óxidos de nitrogênio, em contato com o epitélio respiratório, provocam a formação de radicais livres de oxigênio e de nitrogênio que, por sua vez, induzem o estresse oxidativo nas vias aéreas. 
Em outras palavras, um aumento da presença de radicais livres que não foram neutralizados pelas defesas antioxidantes inicia uma resposta inflamatória com a liberação de células e mediadores inflamatórios (citocinas, quimiocinas e moléculas de adesão) que atingem a circulação sistêmica, levando a uma inflamação subclínica com repercussão não somente no sistema respiratório mas também causando efeitos sistêmicos.(6,7)

Período de latência dos efeitos dos poluentes:
  • Os efeitos dos poluentes sobre a saúde pode ser agudos ou crônicos. Os efeitos agudos se manifestam após um curto espaço de tempo entre a exposição e os efeitos (horas ou dias). Os efeitos crônicos são avaliados geralmente em estudos longitudinais com duração de anos ou décadas.(8) O Quadro 2 resume os efeitos agudos e crônicos dos poluentes sobre o sistema respiratório.


Grupos suscetíveis:
Crianças:
  • As crianças apresentam grande suscetibilidade à exposição aos poluentes aéreos. Apresentam maior ventilação minuto devido ao metabolismo basal acelerado e à maior atividade física quando comparados aos adultos, além de permanecerem por mais tempo em ambientes externos. Tomando como base o peso corporal, o volume de ar que passa através das vias respiratórias da criança em repouso é o dobro daquele nos adultos em condições semelhantes. 
A irritação pelos poluentes que produziria uma débil resposta em adultos pode resultar potencialmente em significante obstrução na infância. Adicionalmente, o sistema imunológico ainda não totalmente desenvolvido aumenta a possibilidade de infecções respiratórias.(6,7,9)

Idosos:
  • Os idosos são suscetíveis aos efeitos adversos da exposição aos poluentes atmosféricos por apresentarem um sistema imunológico menos eficiente (imunosenescência), um progressivo declínio na função pulmonar que pode levar a obstrução das vias aéreas e limitação aos exercícios. 
Há redução da complacência da parede torácica e hiperinsuflação pulmonar, provocando um gasto adicional de energia para efetuar os movimentos respiratórios, além de diminuição funcional dos sistemas orgânicos.(10)

Portadores de doenças crônicas pré-existentes
  • O terceiro grupo mais suscetível, independente da idade, é formado pelos portadores de doenças crônicas pré-existentes que atingem, principalmente, os sistemas respiratório (asma, DPOC e fibroses) e circulatório (arritmias, hipertensão e doenças isquêmicas do coração), além de doenças crônicas, como diabetes e doenças do colágeno.(3)
Suscetibilidade genética:
  • A produção de radicais livres e a indução da resposta inflamatória pelos poluentes no sistema respiratório pode ser neutralizada pelas substâncias antioxidantes presentes na camada fluida de revestimento do epitélio respiratório - glutationa S-transferase (GST), superóxido dismutase, catalase, tocoferol, ácido ascórbico e ácido úrico - capazes de conter o estresse oxidativo e que representam a primeira linha de defesa contra os efeitos adversos dos poluentes.(11) 
Entre os elementos antioxidantes presentes no epitélio respiratório, a GST é considerada a mais importante(11) e é representada por três classes principais de enzimas: GSTM1, GSTP1 e GSTT1.(11)
  • Polimorfismos em genes que codificam as enzimas da família GST podem alterar a expressão ou a função das mesmas no tecido pulmonar e resultar em diferentes respostas à inflamação e ao estresse oxidativo e, consequentemente, resultar em uma suscetibilidade maior aos efeitos adversos dos poluentes aéreos.(11) 
Estudos realizados no México mostraram que crianças asmáticas com polimorfismo por deleção dos genes que codificam as enzimas GSTM1 e GSTP1 apresentavam um aumento de suscetibilidade quando expostas ao ozônio, caracterizada por um aumento de biomarcadores de inflamação nasal, decréscimo no pico de fluxo expiratório e aumento da dispneia.(12,13)

Efeitos da poluição do ar na gestação:
  • A exposição a poluentes do ar durante a gestação pode comprometer o desenvolvimento fetal e ser causa de retardo de crescimento intrauterino, prematuridade, baixo peso ao nascer, anomalias congênitas e, nos casos mais graves, óbito intrauterino ou perinatal.(14)
Os mecanismos biológicos dos efeitos dos poluentes aéreos durante a gestação não estão bem esclarecidos. A intensa proliferação celular, a imaturidade fisiológica, o acelerado desenvolvimento de órgãos e as mudanças no metabolismo aumentam a suscetibilidade do feto à inalação dos poluentes aéreos pela mãe, e essa, por sua vez, pode ter seu sistema respiratório comprometido pela ação dos poluentes e, com isso, afetar o transporte de oxigênio e glicose através da placenta.(15) 
  • Adicionalmente, os poluentes podem interferir na coagulabilidade sanguínea materna devido a uma resposta inflamatória consequente ao estresse oxidativo, aumentando a possibilidade de infarto placentário e vilosite crônica.(16)
Em uma meta-análise avaliando estudos publicados entre 1994 e 2003, mostrou-se que um aumento de 10 µg/m3 de MP10 associou-se a um aumento de 5% na mortalidade pós-natal por todas as causas e de 22% na mortalidade por doenças respiratórias.(17) Em um estudo realizado em São Paulo, mostrou-se que aumento de 1 µg/m3 na concentração de MP10 e de 1 ppm de CO associou-se à redução de peso ao nascer de 0,6 g e 12 g, respectivamente.(18) 
  • Em um estudo realizado na Califórnia, EUA, avaliando 81.186 nascimentos, mostrou-se um aumento de risco materno de pré-eclampsia e de prematuridade fetal associado ao aumento nas concentrações de NOx e MP2,5 gerados pelo tráfego.(19)
Efeitos dos poluentes no sistema respiratório:
Efeitos sobre sintomas respiratórios:
  • Estudos epidemiológicos evidenciam que a exposição a poluentes gasosos e MP está associada a maior incidência de sintomas das vias aéreas superiores, como rinorreia, obstrução nasal, tosse, laringoespasmo e disfunção de cordas vocais,(20) e das vias aéreas inferiores, como tosse, dispneia e sibilância, especialmente em crianças.(21) Em adultos, essa exposição está também associada ao aumento de tosse e sibilância tanto em indivíduos com doenças pulmonares crônicas como em indivíduos hígidos.(21)
Efeitos sobre a função pulmonar:
  • A função pulmonar é um marcador importante dos efeitos da poluição do ar na população exposta, sendo um preditor objetivo, quantitativo e precoce de morbidade e de mortalidade cardiorrespiratória. Estudos demonstram os efeitos agudos e crônicos dos poluentes sobre a função pulmonar em crianças, adolescentes, adultos sadios e portadores de doenças respiratórias prévias.(6,7)
Efeitos associados à exposição aguda:
  • Chang et al.(22) avaliaram o efeito de variações na concentração diária de MP10, SO2, CO e NO2 sobre a função pulmonar de 2.919 estudantes com idade entre 12 e 16 anos na cidade de Taipei, Taiwan. O aumento de 1 ppm na concentração do CO associou-se a uma redução de 69,8 mL (IC95%: −115,0 a −24,4) na CVF e de 73,7 mL (IC95%: −118,0 a −29,7) no VEF1 com defasagem de um dia. O aumento de 1 ppb na concentração de SO2 associou-se a uma redução na CVF e no VEF1 de 12,9 mL (IC95%: −20,7 a −5,1) e 11,7 mL (IC95%: −19,3 a −4,2), respectivamente, também com um dia de defasagem. A CVF e o VEF1 apresentaram uma pequena associação negativa e significante com variações na concentração de O3 e MP10 no mesmo dia de exposição.
Em um estudo em Londres, Inglaterra, foram comparados parâmetros de função pulmonar em 60 adultos portadores de asma leve ou moderada em duas ocasiões distintas: após duas horas de caminhada pela Oxford Street, o principal corredor comercial e de tráfego de ônibus movidos a diesel da cidade; e após duas horas de caminhada pelo Hyde Park (parque municipal londrino). As concentrações de MP2,5 e de NO2, respectivamente, eram 3,0 e 6,5 vezes maiores na Oxford Street do que no Hyde Park por ocasião do estudo. Houve uma redução no VEF1 e CVF, respectivamente, de 6,1% (p = 0,04) e de 5,4% (p = 0,001) após a caminhada na Oxford Street em relação àquela realizada no Hyde Park.(23)

Efeitos associados à exposição crônica:
  • Gauderman et al. conduziram um estudo prospectivo acompanhando 1.759 crianças entre 10 e 18 anos de idade em 12 comunidades na Califórnia, EUA, que apresentavam níveis diferentes de NO2, vapor ácido, MP2,5 e carbono elementar. 
As crianças que viviam em áreas com níveis ambientais maiores de MP apresentaram uma diminuição significativa do VEF1 (aproximadamente 100 mL) quando comparadas àquelas que viviam em áreas menos poluídas, após o controle dos fatores de confusão. Os efeitos foram significantes mesmo em crianças não portadoras de asma brônquica. 
  • A proporção de crianças com VEF1 < 80% aos 18 anos era cinco vezes maior nas comunidades mais poluídas do que naquelas menos poluídas (concentrações médias de MP2.5 de 29,0 µg/m3 e 6,0 µg/m3, respectivamente).(24)
Os mesmos autores acompanharam 3.677 indivíduos a partir dos 10 anos de idade até os 18 anos que residiam à distância de 500 m e de 1.500 m de vias com grande tráfego de veículos, investigando sua função pulmonar. Aos 18 anos, os adolescentes que residiam à menor distância dessas vias apresentavam um déficit no VEF1 e no FEF25-75% de 81,0 mL e 127,0 mL/s, respectivamente, em comparação com os que residiam à maior distância.(25)
  • Em um estudo transversal realizado na Alemanha, foram avaliadas 2.593 mulheres com média de idade de 54,5 anos em 7 comunidades. Houve associações significativas e negativas dos níveis de NO2 e de MP10 com VEF1, CVF e relação VEF1/CVF. Um aumento anual de 7,0 µg/m3 de MP10 associou-se a uma redução de 5,0% no VEF1 e de 1,0% na relação VEF1/CVF, e, para um aumento anual de 16,0% de NO2, houve uma redução de 4,0% no VEF1 e de 1,0% na relação VEF1/CVF.(26)
Em um estudo prospectivo na Suíça, foram avaliados 4.742 adultos, entre 18 e 60 anos, em 8 comunidades por 11 anos. Ao longo do período do estudo, houve uma queda média do nível de MP10 de 5,3 µg/m3. Um declínio de 10 µg/m3 na média anual do MP10 associou-se a reduções estatisticamente significativas das taxas anuais de declínio em VEF1 (de 9%), FEF25-75% (de 16%), e relação VEF1/CVF (de 6%).(27)

A poluição do ar e o sistema respiratório

Poluição e asma brônquica:
  • Estudos epidemiológicos e toxicológicos demonstram a associação entre poluição do ar e asma brônquica.(21) Os poluentes aéreos estão associados com o aumento de visitas aos serviços de emergência e de hospitalização por crise aguda de asma, assim como o aumento de sibilos expiratórios, de sintomas respiratórios e do uso de medicação de resgate.(21)
A prevalência da asma brônquica tem aumentado em todo o planeta, particularmente em regiões urbanas densamente industrializadas. Estudos prospectivos sugerem que a exposição aos poluentes aéreos possa levar ao desenvolvimento de novos casos de asma. Um exemplo é o grande aumento da incidência de asma na China após o recente desenvolvimento industrial e, em consequência, o grande aumento da concentração dos poluentes.(28)

Efeitos associados à exposição aguda:
  • Em Atenas, Grécia, pesquisadores avaliaram os efeitos agudos de MP10 e de SO2 sobre os atendimentos de crianças e adolescentes de 0-14 anos em serviços de emergência entre 2001 e 2004. O aumento de 10 µg/m3 nos níveis de MP10 e de SO2 associou-se a aumentos de 2,2% (IC95%: 0,1-5,1) e de 6,0% (IC95%: 0,9-11,3), respectivamente, nos atendimentos por asma.
Em um estudo realizado em Copenhagen, Dinamarca, com crianças e adolescentes até 18 anos entre 2001 e 2008, demonstrou-se um aumento nas hospitalizações por asma devido a aumentos nas concentrações de NOx (OR = 1,11; IC95%: 1,05-1,17), NO2 (OR = 1,10; IC95%: 1,04-1,16), MP10 (OR = 1,07; IC95%: 1,03-1,12) e MP2,5 (OR = 1,09; IC95%: 1,04-1,13).(30)
  • Uma associação entre o aumento do nível de poluentes e internações por asma foi observada em Araraquara, Brasil, cidade localizada no centro da região canavieira do estado de São Paulo. Durante o período de colheita da safra, quando a maior fonte de emissão de poluentes é a queima da palha da cana-de-açúcar, as admissões hospitalares por asma foram 50% maiores do que aquelas no período sem queima (p < 0,001). 
O aumento de 10 µg/m3 de MP com até 30 µm de diâmetro foi associado a um aumento de 11,6% (IC95%: 5,4-17,7) nas internações hospitalares com defasagem de 1 dia em relação à exposição.(31)
  • Um estudo realizado em Rio Branco, Brasil, mostrou que, durante o período de queima de biomassa florestal, paralelamente ao aumento da concentração de MP2,5 medido na cidade, houve um aumento dos atendimentos por asma em crianças menores de 10 anos de idade.(32)
Durante os Jogos Olímpicos de Atlanta, EUA, houve um implemento de medidas para reduzir a poluição urbana. Durante as três semanas dos jogos, o tráfego diminuiu em torno de 22%. Houve uma queda do pico diário dos níveis de O3 (28%), NO2 (7%), CO (19%) e MP10 (16%) em comparação com as três semanas anteriores e posteriores aos jogos. 
  • Naquele período, houve uma redução de 40% das consultas por asma em crianças e um declínio de 11-19% no atendimento por asma em todas as idades em serviços de emergência da cidade.(33) No período dos Jogos Olímpicos de Pequim, houve uma queda nas concentrações de MP2,5 e de O3, respectivamente, de 78,8 µg/m3 para 46,7 µg/m3 e de 65,8 ppb para 61 ppb, assim como um decréscimo de 41,6% no tratamento por asma em serviços de emergência.(34)
Efeitos associados à exposição crônica:
  • Em um estudo prospectivo em 12 comunidades da Califórnia, EUA, com diferentes níveis de concentração de ozônio, foram acompanhados 3.535 escolares, sem história prévia de asma, por 5 anos. Durante o seguimento, 265 crianças desenvolveram asma. 
Nas comunidades que apresentavam altas concentrações de ozônio, o risco das crianças que praticavam três ou mais esportes em desenvolver asma era 3,3 vezes maior (IC95%: 1,9-5,8) em comparação com o risco daquelas que não praticavam esportes. 
  • Nas áreas com baixas concentrações de O3, a quantidade de esportes praticados não se mostrou um fator de risco para o desenvolvimento de asma. O mesmo comportamento foi observado para o tempo de permanência em ambientes externos, que, apenas nas áreas de maior concentração de O3, se mostrou como fator de risco diretamente associado ao desenvolvimento de asma.(35)
Ghering et al. acompanharam os primeiros 8 anos de vida de 3.863 crianças em comunidades do norte, oeste e centro da Holanda. Aos 8 anos, as crianças foram submetidas a testes alérgicos e de hiper-responsividade brônquica. Os níveis de MP2,5 associaram-se a um aumento na incidência, prevalência e sintomas de asma em 28%, 29% e 15%, respectivamente.(36)
  • Em Munique, Alemanha, 2.860 crianças foram acompanhadas do nascimento até os 4 anos de idade, e outras 3.061, até os 6 anos de idade. Os autores categorizaram a distância da moradia em relação a grandes vias de trafego em: menos de 50 m, 50-250 m, 250-1.000 m, e > 1.000 m. 
O estudo mostrou significantes associações inversas entre a distância da moradia até as vias de tráfego e os desfechos analisados. Entre aqueles que moravam a menos de 50 m das vias com grande tráfego, foram observadas as maiores OR para asma (OR = 1,6; IC95%: 1,03 2,37), febre do feno (OR = 1,6; IC95%: 1,1-2,3), e sensibilização alérgica ao pólen (OR = 1,4; IC95%: 1,2-1,6).(37)
  • Um estudo de coorte realizado na Suíça entre 1991 e 2002, no qual foram avaliados 2.725 adultos não fumantes com idades entre 18 e 60 anos, mostrou que aqueles que residiam em localidades mais poluídas apresentavam maiores riscos de desenvolver asma (da ordem de 30% para cada aumento de 1 µg/m3 na concentração de MP10 emitido pelo tráfego).(38)
Poluição e DPOC:
  • Os pacientes portadores de DPOC são particularmente vulneráveis ao estresse adicional em vias respiratórias causado por diferentes agentes agressores. O tabagismo é reconhecido como o mais importante fator para o desenvolvimento da DPOC, principalmente nos países desenvolvidos. Entretanto, nos últimos 10 anos, cresceu o número de estudos que sugerem que há outros fatores de risco além do tabagismo na gênese da DPOC. 
Esses fatores incluem a exposição aos poluentes do ar em ambientes internos e externos, ambientes de trabalhos com poeira e fumaça, história de infecções respiratórias de repetição na infância, assim como história de tuberculose pulmonar, asma crônica, retardo do crescimento intrauterino, alimentação deficiente e baixo nível socioeconômico.(1)
  • A exposição ao ar poluído associa-se ao aumento de morbidade respiratória por DPOC, que inclui aumento de sintomas respiratórios e diminuição da função pulmonar, sendo causa frequente de exacerbações que provocam visitas aos serviços de emergência ou hospitalização.(39) 
A queima de biomassa em ambientes internos é uma causa significante de DPOC em mulheres não fumantes que são expostas a concentrações elevadas de poluentes durante o ato de cozinhar, mormente em áreas rurais dos países em desenvolvimento, e isso contribui de forma importante para o aumento global da doença.(1,2) 
  • Enquanto mulheres com DPOC causado pelo tabagismo apresentam enfisema e metaplasia das células caliciformes mais frequentemente do que aquelas expostas à queima de biomassa, essas últimas apresentam maior espessamento do septo interlobular, maior deposição de pigmentos no parênquima pulmonar, mais fibrose nas paredes das pequenas vias aéreas e maior espessamento da camada íntima da artéria pulmonar.(39)
Efeitos associados a exposição aguda:
  • Em um estudo ecológico realizado em Hong Kong, China, avaliou-se a associação entre poluentes aéreos e admissões por DPOC entre 2000 e 2004. Observaram-se associações significativas entre admissões hospitalares por DPOC e níveis de poluentes. 
O risco relativo (RR) de admissão para aumentos de 10 µg/m3 de SO2, NO2, O3, MP10 e MP2,5 foi de, respectivamente, 1,007; 1,026; 1,040; 1,024; e 1,031. O efeito iniciava-se no mesmo dia da exposição e mantinha-se até o quinto dia, sendo mais acentuado no inverno do que no verão.(40)
  • Um estudo envolvendo 36 cidades americanas entre 1986 e 1999 mostrou que aumento de 5 ppb nos níveis de O3 e de 10 µg/m3 nos de MP10 estava associado a um aumento de, respectivamente, 0,27% (IC95%: 0,1-0,5) e de 1,5% (IC95%: 0,9-2,0) no número de admissões hospitalares por DPOC. O uso de ar condicionado central reduzia os efeitos adversos da poluição do ar.(41)
Um estudo em São Paulo, Brasil, avaliando 1.769 pacientes com idade acima de 40 anos entre 2001 e 2003 mostrou um aumento no número de atendimentos por DPOC em associação a aumentos nas concentrações atmosféricas de MP10 e de SO2. 
  • Variações nas concentrações de MP10 e de SO2 (28,2 µg/m3 e 7,8 µg/m3, respectivamente) foram associadas a um aumento cumulativo em 6 dias de 19% e 16% de consultas por DPOC. Um aumento de 10 µg/m3 na concentração de MP10 associou-se a um aumento de 6,7% no número de atendimentos no dia da exposição.(42)
Efeitos associados à exposição crônica:
  • Schikowski et al. acompanharam 4.757 mulheres entre 54 e 55 anos na Alemanha, utilizando critérios diagnósticos do Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease. Houve uma prevalência de 4,5% de DPOC (estágios I-IV). O aumento de 7 µg/m3 na concentração média de MP10 durante 5 anos estava associado a OR de 1,33 (IC95%: 1,03-1,72) no desenvolvimento de DPOC e a um declínio de VEF1 em 5,1% (IC95%: 2,5-7,7). 
Mulheres que moravam a menos de 100 m de vias com grande tráfego apresentavam maior risco de desenvolver DPOC em relação àquelas que moravam a uma distância maior (OR = 1,8; IC95%: 1,1-3,0).(26) Os autores sugerem que a exposição crônica ao MP10 proveniente do tráfego aumenta o risco de desenvolver DPOC e acelera a perda de função pulmonar.
  • Um estudo na Dinamarca acompanhou 57.053 indivíduos entre 1993 e 2004 e mostrou que 1.786 pessoas (3,4%) desenvolveram DPOC. Houve uma associação positiva entre DPOC e exposição aos poluentes gerados pelo tráfego após o controle dos fatores de confusão, tabagismo inclusive. A incidência de DPOC foi associada com a média da concentração de NO2 no período de 35 anos (RR = 1,08; IC95%: 1,02-1,14 para uma variação interquartílica de 5,8 µg/m3).(43)
Uma meta-análise analisando 15 estudos mostrou que indivíduos expostos à queima de biomassa apresentam OR 2,4 vezes maior (IC95%: 1,9-3,3) de desenvolver DPOC em relação a indivíduos não expostos.(44) Uma meta-análise recente, que incluiu 25 estudos, mostrou risco similar (OR = 2,4; IC95%: 1,5-9,9) em mulheres expostas à queima de biomassa em relação aquelas que faziam uso de outro tipo de combustível.(2)
  • Em uma meta-análise, Kurmi et al. mostraram uma associação positiva entre o uso de combustível sólido e DPOC (OR = 2,8; IC95%: 1,8-4,0) e bronquite crônica (OR = 2,3; IC95%: 1,9-2,8) quando comparado ao uso de outros tipos de combustíveis.(45) O risco é similar ao que tem sido mostrado em fumantes que desenvolveram DPOC (OR = 2,5) e maior do que de indivíduos que desenvolveram DPOC devido a tabagismo passivo ou a deficiência de alfa-1 antitripsina. 
Comparando os 1,1 bilhão de fumantes com os 3 bilhões de indivíduos expostos a altas concentrações de poluentes devido à queima de combustíveis sólidos, Kodgule e Salvi questionam se não seria esse o fator de risco mais importante para o desenvolvimento de DPOC.(46)

Poluição e infecção respiratória aguda:
  • A infecção aguda do trato respiratório inferior é a mais importante causa de morte em crianças até 5 anos. Nessa faixa etária, esse tipo de infecção causa 2 milhões de mortes anuais. Metade dessas mortes é atribuída à exposição a poluentes em ambientes internos provenientes da queima de combustíveis sólidos.(46) Uma meta-análise avaliando 24 estudos mostrou que a exposição à queima de biomassa em ambientes internos aumenta o risco de pneumonia em crianças (OR = 1,8; IC95%: 1,5-2,1).(47) 
Em concordância, em uma meta-análise recente avaliando 25 estudos, encontrou-se uma significante e robusta associação entre queima de biomassa em ambientes internos e infecção respiratória aguda em crianças (OR = 3,5; IC95%: 1,9-6,4).(2)

Efeitos associados à exposição aguda:
  • Host et al. avaliaram a associação entre concentrações de MP10 e MP2,5 e hospitalização por infecção respiratória em 6 cidades francesas entre 2000 e 2003. O excesso de RR para hospitalização por infecção respiratória associado a aumentos de 10 µg/m3 na concentração de MP10 e MP2,5 foi de 4,4% (IC95%: 0,9-8,0) e de 2,5% (IC95%: 0,1-4,8), respectivamente. A faixa etária mais suscetível foi a de crianças com idade abaixo de 15 anos.(48)
Belleudi et al. avaliaram os efeitos do MP sobre as internações por pneumonia de indivíduos com mais de 35 anos em cinco hospitais romanos entre 2001 e 2005. Um aumento de 10 µg/m3 na concentração de MP2,5 foi associado a um aumento de 2,8% do número de internações hospitalares por pneumonia, com defasagem de 2 dias.(49)
  • Medina-Ramón et al., em um estudo envolvendo 36 cidades americanas entre 1986 e 1999, mostraram que, durante o período de maior calor, um aumento cumulativo de 2 dias de 5 ppb de O3 estava associado a um aumento de 0,41% (IC95%: 0,26-0,57) no número de internações por pneumonia. De forma similar, um aumento de 10 µg/m3 na concentração de MP10 foi associado a um aumento em internações por pneumonia no mesmo dia da exposição de 0,8% (IC95%: 0,5-1,2).(41)
Efeitos associados à exposição crônica:
  • Neupane et al. conduziram um estudo caso controle no Canadá, entre 2003 e 2005, avaliando a exposição em longo prazo a NO2, MP2,5 e SO2 e o risco de hospitalização por pneumonia em indivíduos maiores de 65 anos de idade. Foram avaliados 365 idosos com pneumonia adquirida na comunidade, confirmada radiologicamente, e 494 indivíduos controles. Os grupos foram comparados tomando como base a exposição individual a NO2, MP2,5 e SO2 no ano prévio. 
A exposição de longo prazo a altos níveis de concentração de NO2 e MP2,5, por ao menos 1 ano, foi significativamente associada à hospitalização por pneumonia adquirida na comunidade.(50)
  • Um estudo de coorte conduzido nos EUA mostrou um aumento no risco de óbitos por pneumonia e influenza em não fumantes da ordem de 20% em associação ao aumento de 10 µg/m³ na concentração de MP2,5.(51)
Poluição e câncer de pulmão:
  • A Organização Mundial da Saúde estima que no ano de 2008 houve 12,7 milhões novos casos de câncer em todo o planeta que ocasionaram 7,6 milhões de óbitos, sendo 1,61 milhões e 1,18 milhões os casos novos e número de óbitos por câncer de pulmão.(52) 
Estudos têm evidenciado os efeitos da exposição a poluentes e o desenvolvimento de câncer de pulmão, atribuídos tanto à ação direta dos cancerígenos presentes na poluição, como à inflamação crônica induzida pelos mesmos.(7,53)
  • Um estudo prospectivo envolvendo 500.000 adultos de 50 estados dos EUA(54) mostrou um aumento de 14% na incidência de câncer de pulmão, associado à elevação em 10 µg/m3 na concentração do MP2,5. Em um estudo realizado em países europeus, atribuiu-se que 5% e 7% dos diversos tipos de câncer de pulmão, respectivamente, em não fumantes e em ex-fumantes são causados pelos efeitos da poluição.(55) Pela análise de diversos estudos de coorte e caso controle, foi sugerido que, em média, a exposição crônica à poluição do ar aumenta de 20-30% o risco de incidência de câncer de pulmão.(7,56)
Poluição do ar e mortalidade:
  • Em uma revisão de estudos realizados em diversos países que avaliaram os efeitos das variações agudas da poluição, foi sugerido que um aumento de 0,4-1,3% no RR de morte está associado à elevação de 10 µg/m3 nos níveis de MP2,5 ou de 20 µg/m3 naqueles de MP10.(57) O maior impacto na mortalidade é em crianças abaixo de 5 anos (RR = 1,6%) e em idosos (RR = 2,0%), para cada elevação de 10 µg/m3 na concentração de MP10.(57)
Os principais estudos sobre os efeitos crônicos na mortalidade realizados nos EUA estimam um aumento entre 6% e 17% na mortalidade cardiopulmonar associado à elevação de 10 µg/m³ de MP2,5.(57)

Efeitos da poluição do ar no exercício:
Poluição do ar e exercícios físicos: 
Riscos e benefícios:
  • Durante a realização de exercícios aeróbicos, o ar inspirado penetra nas vias aéreas, preferencialmente pela boca, sendo maiores o volume minuto e a capacidade de difusão, facilitando a penetração de poluentes.(58) A quantidade de partículas ultrafinas que se deposita no trato respiratório enquanto se realiza exercícios moderados é maior quanto menor for o tamanho das partículas e é cerca de cinco vezes superior quando comparado se está em repouso.(59)
A realização de exercícios próximos a vias de tráfego intenso aumenta os níveis de carboxi-hemoglobina (30 min de corrida pode elevar os níveis dessa ao equivalente ao consumo de 10 cigarros/dia) e reduz o desempenho aeróbio de atletas.(58)
  • As principais recomendações das sociedades de medicina esportiva não incluem a precaução da realização de exercícios em ambientes poluídos, mas a recente declaração da American Heart Association(3) sobre efeitos da poluição recomenda que se evitem exercícios intensos na presença de ar com qualidade insatisfatória.
Em uma revisão recente,(60) que avaliou os efeitos da poluição no desempenho de atletas, concluiu-se que a realização de exercícios físicos em ambientes com elevados níveis de poluentes reduz agudamente a função pulmonar e vascular tanto em indivíduos asmáticos como em sadios e que a realização de exercícios em longo prazo em ambientes poluídos está associada à redução da função pulmonar, podendo induzir disfunção vascular, provavelmente devido a stress oxidativo sistêmico e nas vias aéreas, levando a uma redução do desempenho ao exercício. 
  • De maneira resumida, recomenda-se que indivíduos suscetíveis (portadores de asma, DPOC, cardiopatas, idosos e crianças) evitem a realização de exercícios em dias com qualidade inadequada do ar.
Considerações finais:
A exposição aos poluentes do ar é um fator de risco para os seres humanos desde a gestação:
  • Cabe ao profissional da saúde reconhecer a importância dos efeitos dos poluentes na prática clínica e avaliar adequadamente o perfil de exposição dos pacientes em suas residências, locais de trabalho e regiões onde mora. Se não for possível reduzir a emissão de poluentes em curto ou médio prazo, é perfeitamente possível orientar os pacientes quanto à adoção de medidas preventivas que busquem reduzir os efeitos dos poluentes presentes nos ambientes externos e internos, diminuindo os efeitos adversos relacionados a essa exposição. 
Além disso, deve o médico, quando pertinente, não só ajustar a terapêutica normalmente adotada, adequando-a para momentos quando aumentos nas concentrações dos poluentes aéreos possam agravar doenças pré-existentes, mas também utilizar seus conhecimentos, como cidadão, para a adoção de medidas que levem à redução dos poluentes em ambientes urbanos e rurais.

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