quarta-feira, 22 de junho de 2016

O Mercado de carbono e as oportunidades para o agronegócio brasileiro

O Mercado de carbono e as oportunidades para o agronegócio brasileiro

Mariano Colini Cenamo 
mccenamo@esalq.usp.br www.cepea.esalq.usp.br/economiaambiental 
Elaborado em 30 de Setembro de 2005 
  • O aumento na concentração atmosférica dos gases de efeito estufa (GEEs2 ), decorrente das atividades humanas, tem sido apontado como principal causador do aquecimento global e das mudanças climáticas. Calcula-se que a alteração na concentração dos GEEs poderá desencadear, nos próximos cem anos, um aumento da temperatura média do planeta, entre 1,4 e 5,8°C. 
O tema tem sido objeto de grande discussão nas esferas política, econômica e social quanto às suas possíveis implicações sobre o meio ambiente e o modo de vida na Terra. Para lidar com o problema, foi estabelecida a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que, em 1997, criou o acordo conhecido como Protocolo de Quioto (PQ). 
  • O Protocolo de Quioto entrou em vigor em fevereiro de 2005 e tem como meta principal regular as emissões de GEEs pelos países industrializados (do Anexo I)3 , impondo a redução obrigatória de, em média, 5% abaixo das emissões observadas em 1990, no período compreendido entre 2008 e 2012. Para auxiliar esses países no cumprimento de suas metas foram criados “mecanismos de flexibilização”, dentre os quais encontra-se o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). 
O MDL determina que remoções e/ou reduções de emissões de GEEs realizadas em países em desenvolvimento, podem ser utilizadas pelos países do Anexo I no cumprimento de suas metas. Desta forma, os países que não consigam atingir integralmente suas metas de redução, podem adquirir os chamados “créditos de carbono” de projetos localizados em outros países, como, por exemplo, no Brasil. De maneira geral, os projetos de MDL podem ser divididos em duas categorias: 
  1. “projetos de redução de emissão”, geralmente associados ao deslocamento de emissões oriundas da queima de combustíveis e/ou captura e queima de metano; e 
  2. projetos de remoção de CO2 atmosférico, ou, como são usualmente chamados, de “sequestro de carbono”, relacionados à captação e estocagem de carbono em ecossistemas florestais. 
Ao contrário do que muitas vezes se associa a “projetos de carbono”, o potencial para os projetos florestais, ou de “sequestro de carbono”, no MDL, é ainda incipiente se comparado com as demais atividades dos setores brasileiros. 
  • As regras para tais projetos já foram definidas e somente serão elegíveis aqueles projetos que constituírem novos reflorestamentos, a partir de 2000, em áreas já desmatadas antes de 1990 e, onde o cenário futuro seja a manutenção de pastagens ou outros usos não florestais. 
Entre as principais atividades de projetos do MDL realizadas no Brasil estão: co-geração de energia com biomassa; tratamento de Resíduos Sólidos Urbanos e aproveitamento de biogás em aterros sanitários; substituição de combustíveis e/ou aumento de eficiência energética em processos industriais; instalação de biodigestores para captação de metano em granjas de confinamento (particularmente suinocultura); implantação de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs); e os projetos de reflorestamento. Para serem aceitos no MDL, os projetos devem passar por uma série de etapas no chamado “Ciclo de Aprovação do MDL”, que pode ser resumido da seguinte maneira: 
  1. Aprovação das metodologias utilizadas no projeto pelo Conselho Executivo (CE) do MDL (ver: www.unfccc.int/cdm); 
  2. Validação do projeto por uma “certificadora” credenciada no CE; 
  3. Aprovação do governo brasileiro – através da Comissão Interministerial (ver: www.mct.gov.br/clima); 
  4. Aceitação e registro do projeto no CE; 
  5. Verificação e certificação, novamente por uma certificadora credenciada; e 6) emissão das Reduções Certificadas de Emissões (RCEs) pelo CE.

O Mercado de carbono e as oportunidades para o agronegócio brasileiro

  • Até o momento nenhum projeto completou ainda todas as etapas do Ciclo de Aprovação do MDL, cujo término é determinado pelo período de emissão dos créditos e duração do projeto. No entanto, os interessados no mercado não precisam esperar pela emissão das RCEs para negociar a compra e venda de créditos, de forma que a grande maioria dos projetos tem negociado a venda dos créditos antes mesmo do registro no CE - etapa que oficializa a aceitação do projeto no PQ. 
Ainda que sujeitos a grandes variações entre os acordos bilaterais negociados, os preços atuais das potenciais RCEs (expressas em t.CO2e) tem estado em torno de 4 a 6 euros (€). O Brasil tem assumido posição de liderança na proposição de projetos de MDL. Até a presente data (setembro de 2005) existem 87 projetos brasileiros no Ciclo de Aprovação do MDL, que, se concluírem sucessivamente todas as etapas do ciclo, correspondem a um potencial de redução de aproximadamente 165 milhões de t.CO2e. 
  • No agronegócio, o maior volume de projetos, já há um certo tempo, está relacionado ao aproveitamento de resíduos para geração de energia, destacando-se a queima de bagaço de cana no setor sucro-alcooleiro, que representa, em número de projetos (28), 30% do total de projetos de MDL submetidos pelo Brasil. 
Esses projetos já possuem um funcionamento estabelecido e bastante conhecido, onde, de maneira geral, a biomassa residual gerada nos processos industriais e agrícolas é utilizada para produzir energia, entrando como fonte substituta da geração usual (com óleo diesel ou gás natural), deslocando assim uma geração fóssil altamente emissora e resultando nos créditos de carbono, pela redução/deslocamento de emissões efetuado. 
  • A outra atividade do setor agrícola que tem chamado grande atenção no contexto do MDL é o tratamento de dejetos suínos em biodigestores e captação do biogás produzido para geração de energia. 
No processo usual das granjas suínas, os dejetos são descartados diretamente no meio ambiente ou em lagoas de captação, não havendo qualquer controle das emissões de gases resultantes do processo de decomposição. Entretanto, o metano emitido (CH4) tem um forte “potencial de aquecimento global”, 21 vezes maior que o dióxido de carbono (CO2).
  • Com a instalação dos biodigestores, capta-se o biogás rico em metano e, através da queima na geração de energia, passa a se emitir apenas dióxido de carbono, resultando em benefícios ao meio ambiente e energia a custo zero para o produtor, redução das emissões de GEEs para a atmosfera e em receita com venda de créditos de carbono para os potenciais investidores. 
Apenas para ilustrar o potencial da suinocultura no cenário brasileiro, existem atualmente 10 projetos em avaliação, distribuídos nos estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Bahia. Desses, 8 encontram-se em validação e 2 já foram aprovados pelo governo brasileiro. 
  • A quantidade total de créditos prevista para ser gerada, durante os 10 anos do ciclo de duração dos projetos, é de cerca de 8,3 milhões de t.CO2e. Assim, considerando que os créditos tenham sido negociados nos preços atuais praticados no mercado, os 10 projetos gerarão, nos próximos anos, uma receita total em torno de R$ 110 milhões, ou seja, em média R$ 11 milhões por projeto e MDL. 

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