quarta-feira, 21 de maio de 2014

A composição química dos alimentos orgânicos

Alimentos Orgânicos 

Compreendendo o que são alimentos orgânicos:
  • Produtos orgânicos são definidos como alimentos in natura ou processados que são provenientes de um sistema de produção agropecuária e industrial; cujos processos estão baseados no emprego mínimo de insumos externos, e não são utilizados fertilizantes sintéticos solúveis, agrotóxicos e transgênicos (ORGANIZACIÓN DE LAS NACIONES UNIDAS PARA LA AGRICULTURA Y LA ALIMENTACIÓN, 2001). 
Quando surgiu, nos anos 20, esse tipo de produção era identificado como agricultura biodinâmica, orgânica, biológica ou natural, e posteriormente agricultura ecológica, regenerativa, poupadora de insumos e renovável. 
  • Já nos anos 1970, o conjunto dessas vertentes passaria a ser chamado de agricultura alternativa, e a seguir, a denominação agricultura orgânica passou a ser comumente usada (ALMEIDA et al., 2000).
Na verdade, vários são os conceitos utilizados pelos pesquisadores para definir o que seria um alimento orgânico. Borguini e Torres (2006), por exemplo, destacam que os alimentos orgânicos podem ser entendidos como aqueles produzidos de acordo com normas específicas, que proíbem o uso de quaisquer agroquímicos e que são certificados por uma entidade autorizada. Oliveira (2004) amplia esse conceito com base na International Federation of Organic Agriculture Movements (IFOAM) ao destacar que, além de certificado, o alimento orgânico deve ser entendido como aquele proveniente de um sistema de produção que visa à qualidade e a saúde do solo, da população e dos ecossistemas, usando pesticidas de origem orgânica ou naturais, evitando o uso de agrotóxicos, fertilizantes e pesticidas de síntese química, além de hormônios de produção, desde a preparação do solo até a embalagem do alimento, sempre preservando o meio ambiente.
  • Com base nestes quesitos, o termo orgânico utilizado nos rótulos de alimentos indica que o produto foi produzido em conformidade com as normas de produção orgânica e que foi certificado por uma entidade certificadora devidamente constituída e autorizada, ou liberado de certificação quando comercializado, em feiras ecológicas, diretamente pelo produtor. 
Tais regras e inspeções são guiadas pelo código de normas, orientações e práticas alimentares: o Codex Alimentarius, o qual foi implementado no Brasil em 1999 e atualizado regularmente entre 2001 e 2010.

Produção de alimentos orgânicos:
  • A agricultura orgânica surgiu, inicialmente como uma resposta ao processo de industrialização da agricultura, marcado pela tecnificação (TORJUSEN et al., 2001). 
Em contrapartida, desde meados da década de 1980 tem sido foco de atenção significativa por parte de ambientalistas e consumidores, além dos agricultores. Porém, apenas a partir de 2003 o Brasil inicia a regulamentação do setor, intensificando a ciência desta forma de produção de alimentos (BRASIL, 2003).
  • O panorama dos produtos orgânicos envolve fatores como a produtividade, a certificação, as políticas agrícolas e agro-ambientais, a dinâmica de mercado e o desenvolvimento de tecnologias para esse sistema de produção (BRASIL 2007), tais fatores têm influenciado o crescimento da agricultura orgânica positiva e negativamente. 
Contudo, o mercado tanto em termos de oferta de produtos como em relação ao número de agricultores vem apresentando forte crescimento no Brasil e no mundo (BRASIL 2007; BARBÉ, 2009; STOLZ et al., 2010).
  • O cultivo de alimentos orgânicos já foi identificado em mais de 120 países (WILLER; YUSSEFI, 2007) abrangendo todos os continentes. Em dados obtidos a partir de uma pesquisa mundial, divulgada em 2008, há mais de 600 mil agricultores orgânicos, e a Oceania apresenta maior área agrícola cultivada organicamente, seguida da Europa e America Latina (SUGIMOTO, 2008; BRASIL, 2007)
A agricultura orgânica tem aumentado constantemente em todo o mundo (FLATEN et al., 2010) e o Brasil vem se destacando com uma taxa de crescimento do mercado superior à média global (SILVA et al., 2005; BLANC, 2009). 
  • Segundo a Organização para Alimentos e Agricultura da Organização das Nações Unidas – FAO/ONU - em 2012, o setor orgânico obteve um crescimento de 20 a 30 % em comparação à agropecuária convencional e vem abrangendo em até 5% da área brasileira, sendo considerada uma estratégia de avanços na economia (BRASIL,2007; BLANC,2009) e no desenvolvimento social, desde que pequenos agricultores e agricultura familiar são os principais envolvidos da produção orgânica do país (BRASIL, 2006).
Em relação à área cultivada, o Brasil apresenta a 6ª produção mundial, e 2ª na América Latina, com cerca de 840 mil hectares ocupados com agricultura orgânica (SUGIMOTO, 2008). O censo agrícola realizado no ano de 2006 identificou que 1,8% das unidades de produção no país, eram certificadas ou estavam em processo de certificação de produção orgânica (BRASIL, 2006). 
  • O principal setor, entre os produtores orgânicos, de acordo com este censo, é da criação de animais (42% das unidades) seguida da horticultura (10% das unidades).
Já em relação aos tipos de alimentos orgânicos produzidos no Brasil, estes incluem, sobretudo, a soja seguida de hortaliças e do café; as frutas por sua vez destacam-se por ocupar a maior área plantada, seja com a manga, morangos ou uva (SUGIMOTO, 2008).
  • A evolução da produção agrícola de orgânicos envolve incentivo aos pequenos agricultores, políticas públicas para aquisição dos alimentos produzidos no sistema orgânico e ainda o crescente interesse da população por produtos considerados mais saudáveis e seguros para o consumo.
Fatores que influenciam o consumo de alimentos orgânico:
  • A alimentação da população brasileira, embora constatada excedente em alimentos não saudáveis cuja consequência é evidenciada na prevalência de excesso de peso há sinais que evidenciam uma mudança de hábito alimentar, em direção de uma maior demanda de produtos orgânicos, estimulada pelos meios de comunicação e muitas vezes pela presença destes produtos nas gôndolas de supermercados.
A partir de levantamentos sobre o perfil do consumidor típico de alimentos orgânicos, no Brasil e no mundo, alguns pontos em comum têm sido verificados, tais como residir em regiões urbanas, apresentar poder aquisitivo acima da média e/ou ter maior nível de escolaridade (BRASIL, 2007; SOARES et al., 2008; OLIVEIRA, 2004; ROITNERSCHOBESBERGER et al., 2008).
  • Fatores que influenciam o consumidor no momento da compra, de acordo com estudos realizados por Schmidt (2004), podem influenciar tanto positiva quanto negativamente, destacando que o principal motivo pelo qual são consumidos no Brasil está na preocupação com a saúde (BRASIL 2007; BARBÉ 2009); esta motivação também é relatada em outros estudos envolvendo diversos países (STOLZ et al., 2010; YIRIDOE et al., 2005). 
O valor nutricional, seguido do atributo de ser um alimento seguro, foram as razões mais frequentemente relatadas entre os consumidores de alimentos orgânicos nos Estados Unidos, Canadá e Europa; aspectos ambientais também foram relatados pelos consumidores europeus, enquanto aspectos sensoriais surgiram principalmente entre canadenses e norte-americanos (YIRIDOE et al., 2005).
  • Por outro lado, apesar de existirem diversos fatores que incentivam, há uma série de outros que desestimulam o consumo de alimentos orgânicos (BRASIL, 2007). 
O principal fator que influencia negativamente o consumo de alimentos orgânicos é o preço de venda desses produtos (STOLZ et al., 2010; BARBÉ, 2012). “O preço é considerado uma das maiores dificuldades para o desenvolvimento da produção orgânica no Brasil”. 
  • Porém entre outros inibidores do consumo de orgânicos podem ser destacados a baixa diversidade a falta de confiança na procedência do alimento (BARBÉ, 2009; SOARES et al., 2008; AVELAR 2012), o menor tempo de vida útil (SCHMIDT, 2004) e a baixa regularidade de fornecimento (AVELAR 2012; SOARES et al., 2008). 
Para incrementar o consumo e produção, Soares et al. (2008) sugerem a necessidade de maior divulgação dos benefícios da cultura orgânica à população.
  • Com relação aos tipos de alimentos consumidos, estudo realizado na Dinamarca e Reino Unido (WIER et al., 2008) apontou que entre os consumidores mais frequentes, produtos lácteos e ovos são os alimentos de maior consumo no mercado de orgânicos, seguido das hortaliças. Yiridoe et al. (2005) por sua vez, relata que frutas e vegetais são os principais alimentos orgânicos consumidos entre oeste europeu e americanos. 
No Brasil a produção, e assim potencial consumo, é evidenciado para hortaliças (BRASIL, 2006), e diferentemente de outros países, os produtos lácteos, cárneos ou ovos apresentam menor disponibilidade ao consumidor.
  • Assim, a aquisição de alimentos orgânicos é influenciada principalmente pelo interesse dos consumidores, os quais julgam que os produtos apresentam menor risco à saúde, além do fator econômico, da produção e disponibilidade no mercado.

Alimentos Orgânicos

As alterações na Composição: 
E no valor nutricional dos alimentos orgânicos:
  • Os benefícios atribuídos àqueles alimentos produzidos sob o sistema se orgânico como alimentos mais saudáveis está da provável ausência de agrotóxicos (BOURN e PRESCOTT, 2002; TOASSA et al., 2009) e a maior concentração de nutrientes. Estas afirmativas, entretanto, devem ser questionadas, os dados devem ser reconsiderados a partir dos estudos individuais dos alimentos e das informações sobre controle de resíduos nos alimentos desse tipo de cultivo.
Em amplo levantamento realizado no Reino Unido a partir de centenas de pesquisas selecionadas com alimentos orgânicos, concluiu-se que “não ficaram evidenciados benefícios dos orgânicos comparados aos produzidos convencionalmente” (ORGANIC FOOD, 2009).
  • Quanto ao valor nutricional, não houve constatações de que o orgânico e o convencional apresentem diferenças na concentração de nutrientes, sejam macro ou micronutrientes (BOURN; PRESCOTT, 2002).
Em contrapartida, de acordo com os dados pesquisados pela Agência Francesa de Segurança Alimentar, Lairon (2010) conclui que alimentos orgânicos vegetais e de origem animal podem apresentar maiores teores de alguns minerais, fitoquímicos e ácidos graxos poli-insaturados.
  • Outros autores também sugerem uma tendência de maior conteúdo de alguns poucos nutrientes e compostos funcionais em vegetais orgânicos (BORGUINI; TORRES, 2006; YOUNG et al., 2005; LIMA; VIANELO, 2011; CARIS-VEYRAT et al., 2004). 
As hortaliças tomate e beterraba apresentaram maior teor de vitamina C em relação a essas hortaliças não orgânicas (BORGUINI, 2006; ROSSETTO et al., 2009; FERREIRA et al., 2010; CARIS-VEYRAT et al., 2004) e em frutas como pêssego (CARBONARO et al., 2002).
  • Carotenóides e vitamina E, por sua vez não apresentaram os mesmos resultados em tomate e frutas (CARBONARO et al., 2002; CARIS-VEYRAT et al., 2004).
Embora não haja consenso quanto aos maiores teores de nutrientes, a maior quantidade de compostos fenólicos (CARIS-VEYRAT et al., 2004; FERREIRA et al., 2010; LIMA; VIANELLO 2011; LAIRON, 2010; CARBONARO et al., 2002), e o menor teor de nitrato (FERREIRA et al., 2010; LIMA; VIANELLO, 2011; LAIRON, 2010) são os aspectos mais concordantes nos os estudos comparativos entre alimentos da agricultura orgânica ou convencional.
  • Benefícios dos fenólicos à saúde, em geral, são justificados devido à atividade reconhecida desses compostos como antioxidantes e assim agir no controle do estresse oxidativo (HO, 1992), o qual está relacionado a enfermidades, em especial a processos carcinogênicos e as doenças cardiovasculares como identificado desde anos 80 (COLLINS, 1999; LINN, 1992; HALLIWELL; GUTTERIDGE, 1989).
Os reduzidos teores de nitratos, por sua vez, podem diminuir a formação de nitrosaminas, sob baixo pH, e assim reduzir a formação destes compostos potencialmente carcinogênicos no estômago (TANNENBAUM; CORREA, 1985).
  • Quanto aos alimentos de origem animal provenientes do sistema orgânicos de produção, os estudos apontam poucas alterações quando comparados aos produtos convencionais. Se por um lado não são observadas modificações nos teores totais de proteínas, de lipídios, incluindo colesterol em carnes ou no leite; muitos estudos apontam para perfil lipídico benéfico, com mais ácidos graxos poli-insaturados da família Omega-3 e ácidos graxos poli-insaturados com duplas ligações conjugadas (CLA).
Fanti et al. (2008) em São Paulo, encontraram valores pouco maiores de lipídios e proteínas no leite orgânico, mas outros autores não observaram estas diferenças (BUTTLER et al., 2011; TOLEDO et al., 2002). 
  • Teores maiores de poli-insaturados, Omega 3 e ácido linoleico conjugado (CLA) entretanto foram observados na maioria dos estudos sobre o leite orgânico (BUTLER et al., 2011; ELLIS et al., 2006; FANTI et al., 2008).
Carnes orgânicas por sua vez apresentaram composição com mais ácidos graxos poliinsaturados totais e da família Omega 3 (ALFAIA 2009; NUERNBERG et al., 2002; LELESKA et al., 2008), inclusive em estudos com carnes do sul do Brasil (PINHO et al., 2011). Já os estudos sobre frangos orgânicos indicam os mesmos resultados (JAHAN et al., 2004; CASTRONÁN et al., 2013).
  • À maior proporção de ácidos graxos Omega-3 tem sido atribuído efeitos benéficos em processos inflamatórios ou carcinogênicos e ainda nas enfermidades autoimunes e cardiovasculares (SIMOPOULOS, 2008) devido à ação sobre síntese hormônios eicosanóides com ação na resposta imune, mudanças nas lipoproteinas e colesterol plasmático. 
Já os ácidos graxos conjugados, como ácido linoléico (CLA), têm sido estudados quanto aos efeitos benéficos na obesidade, diabetes e aterosclerose como descreve Salas-Salvado e seus colaboradores (2006) e Carvalho, Melo e Mancini-Filho (2010). 
  • Mecanismos propostos envolvem a incorporação de CLA nas membranas celulares e tecidos, e sua metabolização como um poli-insaturado e assim síntese dos hormônios eicosanóides; ou ainda na expressão e síntese de proteínas envolvidas na resistência à insulina; ou devido à suposta ação antioxidante, no entanto tais efeitos não são uma unanimidade entre a comunidade científica (CARVALHO et al., 2010).
Os pesquisadores consideram, entretanto, a dificuldade nas interpretações e a avaliação de forma consistente devido à variabilidade da metodologia empregada nas pesquisas e aos fatores que afetam a composição do vegetal ou animal, como solo, clima, além dos fatores genéticos e das práticas e período pós-colheita ou abate (BOURN; PRESCOTT, 2002; BORGUINI; TORRES, 2006; ORGANIC FOOD, 2009).

Outras e Considerações:
  • O quadro da produção dos alimentos orgânicos no Brasil é promissor, uma vez que há políticas de incentivo e os consumidores têm buscado alimentos mais saudáveis; no entanto há barreiras para o consumo como custo e disponibilidade no mercado.
A composição química, no entanto pode ser inalterada e variar para cada alimento orgânico, não permitindo afirmativas conclusivas sobre o benefício nutricional em geral. Por outro lado, a presença de compostos benéficos em alimentos de origem orgânica pode evidenciar seu potencial para a redução de risco de enfermidades crônicas não transmissíveis como as cardiovasculares e contribuir na redução de problemas de saúde com alta prevalência na população.
  • Estes aspectos fundamentais da problemática sobre alimentos orgânicos portanto merece maiores estudos, seja na foram de pesquisas experimentais ou de intervenção, seja por levantamento de dados sistemáticos de alimentos e compostos de maneira individualiza para que as conclusões possam contribuir para elucidar as questões sobre o tema alimentos orgânicos.

Não é segredo para ninguém. Os pesticidas usados para matar pragas em plantações, além de agredirem a natureza, fazem mal para saúde.