sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Heroína - Opiáceo

Modo de uso: Chasing the Dragon

  • Arquimedes, que provou que a sua coroa de rei não era de ouro por medição da sua densidade, foi talvez o primeiro cientista do mundo forense. No entanto, foram as histórias de ficção de Sir Arthur Conan Doyle de Sherlock Holmes, escritas no final do século XIX, que anteciparam o uso da ciência na resolução de crimes no século XX. Na mesma época, os estudos de Sir Francis Galton revelaram que as impressões digitais são únicas e que não mudam com a idade. Já em 1858, William Herschel, um oficial britânico na Índia, usou as impressões dos dedos e das mãos com tinta como assinaturas em documentos para pessoas que não sabiam escrever.
Edmond Locard, um criminalista francês, estabeleceu o primeiro laboratório dedicado à análise da criminalidade em 1910. Uma década depois, laboratórios criminalísticos foram estabelecidos pelo resto dos países Europeus. 
  • Todos os químicos em geral, são escolarizados em química orgânica, inorgânica e analítica, mas os químicos forenses especializam-se em áreas específicas. Por exemplo, em química inorgânica pode examinar vestígios de pó usando técnicas microanalíticas para identificar a composição química de partículas minúsculas. Outra aplicação química pode empregar a cromatografia em camada fina durante a análise de sangue ou urina para detectar vestígios de drogas, e outro ainda pode usar reações em tubos de ensaio para identificar compostos de amostras em grandes quantidades.
Uma ampla gama de técnicas laboratoriais e instrumentais são usadas em estudos forenses, em que estas dependem do tipo de amostra ou substância a ser analisada. O facto de que a maior parte das substâncias examinadas não serem puras, representa um grande desafio para um químico forense. 
  • Devido à preocupação internacional sobre o abuso de drogas, esta necessita de dados precisos, de elevada sensibilidade e confiáveis sobre a epidemiologia deste fenômeno, que deverão ser utilizados tanto para fins preventivos como também para fins repressivos. Além disso, a importância do tráfico internacional de drogas ilícitas necessita de conhecimento atualizado das rotas e da rede de distribuição. Para este objectivo, informação importante é fornecida pela análise químico-toxicológica de amostras de substâncias confiscadas. 
Contudo, é certo que uma detalhada caracterização química de um narcótico natural ou sintético é crucial para o sucesso das várias atividades de controlo do comércio de drogas ilícitas. Além disso, na análise de drogas ilícitas a identificação de componentes minoritários, como por exemplo, a impureza devida à origem ou à síntese, é de importância crucial. Durante a preparação de uma droga ilícita, de origem semi-sintética como a heroína, todos os procedimentos de extração, purificação, síntese, envolvem o uso de diferentes produtos químicos, como ácidos, bases, solventes, etc., e estes podem deixar traços no produto final ou podem produzir alterações específicas na estrutura química de alguns componentes da droga. Também, em muitos casos há a possibilidade de transformação dos produtos químicos depois de síntese por hidrólise, oxidação ou outras reações de degradação, o que também vai permitir obter informação sobre a história de drogas ilícitas.
  • A heroína, ou diacetilmorfina, é um produto semi-sintético derivado da acetilação da morfina, que por sua vez é obtida a partir da Papaver somniferum. Em laboratórios clandestinos, a purificação da morfina e da heroína é bastante eficiente e devido às diferenças nos procedimentos agrícolas e de fabricação a presença e a concentração de alcalóides do ópio, como também os seus derivativos depois da acetilação, podem variar significativamente, e estes alcalóides e seus derivativos acetilados, podem ser encontrados no que é vendido no mercado ilícito como heroína clandestina. Outras substâncias como analgésicos, anestésicos locais e cafeína são substâncias farmacologicamente ativas que imitam o sabor amargo da heroína e são normalmente usados como adulterantes, ao passo que, glúcidos como a lactose, o manitol e a sacarose são inativos e muitas vezes usados para efeitos de diluição.

Molécula de heroína
(5α,6α)-7,8-didehydro-4,5-epoxy-17-methylmorphinan-3,6-diol diacetate

A heroína:
  • A heroína (diacetilmorfina) ainda hoje é uma das drogas de abuso mais consumidas. Esta droga é semi-sintética sendo produzida a partir da morfina contida no ópio que é a seiva das cápsulas da papoila, Papaver somniferum. O abuso desta substância é conhecido há muitos anos, desde que foi sintetizada pela primeira vez, em 1874 por C.R.A Wright, numa reação em que a morfina entrou em contacto com um excesso de anidrido acético. Mais tarde em 1898, a substância foi produzida comercialmente pela Companhia Bayer em Eberfeld na Alemanha e nomeada com o nome de Heroína. 
A heroína foi usada em vez da codeína e da morfina em pacientes que sofriam de doenças pulmonares, como a tuberculose. Adicionalmente, a Companhia Bayer recomendou a heroína como a cura para a dependência de morfina. As propriedades analgésicas da droga foram muito efetivas, contudo, as propriedades aditivas eram devastantes. Por todas estas razões foi proibida anos depois. Hoje em dia, a heroína não é usada como um fármaco, mas de qualquer maneira, devido à alta produção ilícita é uma das drogas mais significantes em relação a overdoses, em drogas relacionadas com a morte, em hospitalização, em envolvimento em crimes relacionados com drogas e violência.
De acordo com o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, Decreto-Lei nº 15/93 de 22 de Janeiro, na Aprovação da Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e de Substâncias Psicotrópicas de 1988 estabeleceu-se três objetivos fundamentais.
  • Em primeiro lugar, privar aqueles que se dedicam ao tráfico de estupefacientes do produto das suas atividades criminosas, suprimindo assim, o seu incentivo principal e evitando que a utilização de fortunas ilicitamente acumuladas permita a organizações criminosas transnacionais invadir, contaminar e corromper as estruturas do Estado, as atividades comerciais e financeiras legítimas e a sociedade a todos os seus níveis.
Em segundo lugar, adotar medidas adequadas ao controlo e fiscalização dos precursores, produtos químicos e solventes, substâncias que são utilizadas no fabrico de estupefacientes e de psicotrópicos, que pela sua fácil obtenção e pela disponibilidade em que estão no mercado, têm conduzido a um aumento do fabrico clandestino.
  • Em terceiro lugar, e por último reforçar e complementar as medidas previstas na Convenção sobre Estupefacientes de 1961 e na Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971, preenchendo fendas e potenciando os meios jurídicos de cooperação internacional em matéria penal.
A classificação das penas aplicáveis ao tráfico tendo em conta a real perigosidade das respectivas drogas parece ser a posição mais compatível com a ideia de proporcionalidade, o que não vai implicar uma necessária adesão à distinção entre drogas duras e leves e, muito menos, às conclusões obtidas por alguns países no campo da descriminalização ou despenalização do consumo. Simplesmente, a decisão de uma classificação mais ajustada tem de assentar na aferição científica rigorosa da perigosidade das drogas nos seus diversos aspectos.
  • A lei n.º 30/2000, de 29 de Novembro, define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a proteção sanitária e social das pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica. 
Durante estes anos, os países de origem do ópio utilizado na produção de heroína têm aumentado significativamente. O ópio que é utilizado na produção de heroína tem quatro fontes principais, que serão mencionadas a seguir. Geograficamente estas regiões são caracterizadas por um clima temperado com condições de solo convenientes e de chuva para a produção de ópio, apesar de haver diferenças na qualidade do ópio, no que diz respeito à quantidade de morfina e ao número de colheitas em cada uma destas áreas. 

Origem da heroína:
  • A Birmânia, Laos e Tailândia, “Triângulo Dourado”, eram os três maiores países de origem para a produção de ópio, sendo ultrapassado pelo Afeganistão, que desde o início de 1990 tem sido a principal fonte mundial no mercado ilícito. A heroína do Sul Asiático é de alta qualidade e é reconhecida pela sua aparência branca cristalina, apesar de os agentes de corte serem em grande quantidade, tais como a cafeína e o paracetamol.
Em relação ao Sudoeste Asiático, a Turquia, Iraque, Irã, Afeganistão, Paquistão, Índia e o Líbano são os países reconhecidos como os de origem do ópio nesta parte do Mundo. A heroína do Sudoeste Asiático é caracterizada pela sua aparência de um pó, não sendo totalmente branca comparada com a heroína do Sul Asiático, tendo uma pureza menor. Os agentes de corte são vários, tais como, a cafeína e o paracetamol, que são aqueles que aparecem mais frequentemente.
  • Na América Central, o México e Guatemala são os países de fonte primária para a heroína, em que esta tem a aparência de um pó castanho-escuro, e os adulterantes que aparecem mais frequentemente são materiais amorfos e açucares. A aparência mais escura da heroína é devida ao processamento de subprodutos.A heroína da América do Sul é mais pura e com menos adulterantes que a heroína do Sudoeste Asiático. Por vezes é encontrada cocaína nesta heroína, e em muitos casos não se sabe se a cocaína encontrada foi adicionada como adulterante ou se está presente como um contaminante introduzido devido ao empacotamento que é comum ao da cocaína. 
Preparação da heroína:
  • Todas as amostras de heroína confiscadas vêm direta ou indiretamente do ópio, que é extraído da planta Papaver somniferum, que é mais conhecida como a papoila do ópio, sendo esta o material de início para a produção ilegal de heroína.
A Papaver somniferum faz parte da família da papoila (Papaveraceae), é uma planta herbácea com folhas alternadas, é anual com várias subespécies, uma vez que é capaz de hibridizar e mudar as suas características, e estas podem variar com factores ambientais. Devido a estas condições torna-se muito difícil conseguir fazer uma classificação, mas está concluído que de toda a família da papoila só a Papaver somniferum e a Papaver setigerum contêm morfina.
  • Existem outras variedades da planta Papaver somniferum mas só duas delas são cultivadas para produção de heroína, devido ao seu elevado conteúdo de morfina, a Papaver somniferum var. album e a Papaver somniferum var. glabrum.
Nestas plantas o processo de biossíntese da morfina segue várias fases. Depois da floração e da queda das folhas da Papaver somniferum, as cápsulas que estão cheias e verdes são cortadas e o látex, endurecido e úmido, ou o ópio bruto, é raspado e recolhido para um recipiente de barro ou de plástico.A preparação da heroína requere a separação da morfina do ópio, e existem alguns métodos específicos, sendo o processo de Thiboumery e Mohr o mais utilizado. Contudo todos estes processos, envolvem os quatro passos: 
  1. A Papaver somniferum é cultivada; 
  2. A cabeça da papoila sofre um corte e o látex do ópio é recolhido; 
  3. A morfina é isolada do ópio; 
  4. A morfina é tratada com um agente de acetilação. O isolamento da morfina é realizado usando um dos seguintes métodos:
  • Processo de Thiboumery e Mohr – neste método o látex do ópio já seco é dissolvido em água quente, que depois é filtrado ainda quente, para que as substâncias botânicas insolúveis sejam removidas. Estas são lavadas com água quente e filtradas, o que vai assegurar uma maior quantidade de morfina no produto final. Ao filtrado é adicionado uma solução quente de hidróxido de cálcio. Os precipitados, que incluem os alcalóides insolúveis do ópio e os materiais insolúveis são filtrados que são posteriormente lavados com água e novamente filtrados. O resultado do filtrado, é então evaporado e depois filtrado, o que resulta numa solução concentrada de morfinato de cálcio que é aquecida até ferver. Cloreto de amônio é adicionado. Quando esta solução arrefece, a forma base da morfina precipita e é recolhida por filtração. Esta é dissolvida num mínimo volume de ácido clorídrico quente e quando este arrefece o cloreto de morfina precipita, e é depois isolado por filtração.
  • Processo de Robertson e Gregory – o ópio é lavado com água quente, em que depois a solução é evaporada e é re-extraída com água quente e filtrada, em que este filtrado é evaporado. A solução é aquecida até ferver e é adicionado cloreto de cálcio. À solução de morfinato de cálcio é adicionada água quente que depois é filtrada. A solução é concentrada, em que o morfinato de cálcio precipita à medida que o líquido evapora. Este é redissolvido em água e filtrado. A este filtrado é adicionada amônia, o que vai permitir que a forma base da morfina precipite. 
Na produção de heroína, não é feito o isolamento da morfina previamente. Isso só acontece quando é produzida morfina como produto final, e como esta separação quase nunca é completamente eficiente a heroína consiste numa mistura de morfina e traços de outros alcalóides opiáceos, como a codeína, a noscapina, a papaverina e a tebaína. 
  • A tradicional síntese de heroína, consiste numa simples reação de acetilação, e normalmente é realizada adicionando um grande excesso de anidrido acético diretamente à morfina, ou ao extracto do ópio, seguido de aquecimento até ferver. O anidrido acético é o reagente acetilante mais usado, apesar de às vezes utilizarem outros dois reagentes, nomeadamente, o cloreto de acetilo e o diacetato de etileno. Durante o processo de acetilação é formado o primeiro produto intermediário, 3-monoacetilmorfina, em que depois a heroína é formada e é em parte diacetilada em 6-monoacetilmorfina. Os outros alcalóides, que são encontrados como contaminantes da morfina original, e que também têm grupos funcionais que podem reagir com radicais acetilícos, eles irão produzir derivados acetílicos, como no caso da codeína. Se eles não reagirem com os grupos acetílicos, irão manter-se inalterados no produto final, como no caso da papaverina e da noscapina. Se forem quimicamente instáveis, como no caso da tebaína,irão formar uma variedade de subprodutos, como o tebaol, o acetiltebaol. 
O produto que se pretende é isolado tratando a mistura com carbonato de sódio e a heroína é recolhida por filtração. O produto final é normalmente usado para fumar ou para inalar. Se o que se pretende é cloridrato de heroína, o material de base é dissolvido em acetona e é adicionado ácido clorídrico, este conteúdo é seco ao ar até se obter um pó uniforme.
  • Finalmente, substâncias de corte são adicionadas à heroína, para aumentar o conteúdo do produto, e também para aumentar os lucros de quando é vendido, são adicionadas substâncias inertes ao pó puro. Na maior parte dos produtos vendidos é adicionado mais que um diluente. Estes diluentes são produtos químicos mais usados como enchimento do que como desencadeamento para obter uma resposta fisiológica, e podem ser adicionados para afetar a cor e a composição em prol da satisfação do consumidor.
Substâncias farmacologicamente ativas ou adulterantes também são adicionadas. Alguns destes componentes têm como objectivo aumentar o efeito da heroína. No caso de alguns adulterantes o tipo de resposta fisiológica pode ser afetada, o que se pode traduzir num efeito muito ou pouco severo. No caso do paracetamol, este aumenta a volatilidade da base de heroína, o que vai aumentar o efeito do “chasing the dragon”. Outros, por exemplo, a adição da procaína, é feita mais para aliviar a dor de uma injeção intravenosa. Contudo a composição química da heroína disponível no mercado depende de vários factores, tais como:
  • Composição do ópio;
  • Métodos utilizados na extração da morfina;
  • Procedimentos na acetilação da morfina;
  • Purificação da mistura através da adição de diferentes solventes;
  • Precipitação da forma base da heroína e sua purificação;
  • Conversão da forma base da heroína para os seus sais clorídricos.
Propriedades físico-químicas da heroína:
  • A heroína possui uma constante de ionização (pKa) de 7,60, em que o nitrogênio presente na heroína a pH’s ácidos vai ser protonado, o mesmo acontece para pH’s básicos. O seu coeficiente de partilha octanol-água é de 1,69. Aproximadamente 40% de heroína, a pH fisiológico, encontra-se na forma não-ionizada, tendo portanto um grau de ionização baixo. 
A este pH a heroína é lipofílica, sendo rapidamente absorvida pelas membranas mucosas, quando fumada ou inalada, sendo os pulmões e a mucosa intranasal órgãos altamente perfurados, o que contribui para uma absorção maior de compostos lipofílicos. O ponto de fusão da base livre de heroína é de 173ºC, havendo degradação da heroína a temperaturas superiores a esta, sendo solúvel em clorofórmio, álcool, éter e água. O cloridrato de heroína tem um ponto de fusão de 243-244ºC, sendo solúvel em água, álcool e éter.

Classificação e modo de ação:
  • Os opiáceos são drogas que são extraídos diretamente do ópio, como a morfina e a codeína, ou são derivados químicos, como a heroína (diacetilmorfina). Todos estão estruturalmente relacionados com a morfina.
Três grandes classes de receptores opiáceos foram descobertas, μ, K, δ e ζ como também muitas subclasses de receptores são conhecidas.A morfina e as drogas relacionadas com esta produzem os seus maiores efeitos no corpo pela sua interação com receptores μ, contudo parece haver alguma interação com outros receptores para doses mais elevadas.Os principais efeitos farmacológicos dos opiáceos são bem conhecidos, e incluem anestesia, analgesia, convulsões, desenvolvimento de tolerância e dependência, sonolência, alterações de humor, etc.
  • A codeína resulta da substituição do grupo –OH na posição 3 da morfina, por um grupo metilo, o que vai reduzir a ligação aos receptores específicos μ da morfina, portanto atua como uma fármaco menos potente que a morfina. Além disso, a heroína em si pensa-se que tem pouca ou nenhuma atividade farmacológica, mas é uma pró-droga ou neste caso pró-fármaco, com a maior parte da sua atividade a ser devida à produção de metabolitos ativos, particularmente a morfina. 
Farmacocinética e metabolismo da heroína:
  • Em poucos minutos após entrar na circulação, a heroína é rapidamente convertida num intermediário relativamente instável, a 6-monoacetilmorfina (6-MAM). Este intermediário é também rapidamente convertido em morfina completando assim o processo de desacetilação.
A morfina é metabolizada no fígado por um processo de conjugação, glucuronização. Neste processo, o ácido glucurónico é conjugado com a morfina para formar a morfina-3-glucuronídeo (M-3-G) e a morfina-6-glucuronídeo (M-6-G). Estes produtos são mais solúveis em água que a morfina e são excretados na urina. O principal produto deste processo, a M-3-G é inativo, contudo, o metabolito M-6-G é extremamente ativo e a sua ação no corpo é acrescentada à da morfina. As proporções relativas da morfina e dos seus metabolitos glucuronídeos são importantes, para se entender a ação analgésica da heroína e da morfina. Também têm uma importante aplicação em casos forenses, particularmente na investigação de mortes relacionadas com a morfina e a heroína. 

Vias de administração de heroína:
  • Existem várias vias de administração de heroína que se podem utilizar, tais como, injeção intravenosa, fumar, inalação, subcutânea, intramuscular, oral e também retal. A via escolhida pode ter muitas implicações em termos de riscos de saúde. Há também algumas diferenças importantes na natureza e composição da heroína de acordo com o tipo de via de administração.
Administração intravenosa:
  • A via de administração intravenosa leva a muitos riscos de saúde devido ao uso de técnicas de injeção pouco assépticas e à partilha de agulhas. Os problemas mais graves são, a transmissão do vírus HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana), a hepatite B e C, o elevado risco de overdose. Destes o mais grave é a transmissão do HIV.
A heroína usada em administração intravenosa pode ser de pureza variável, mas é geralmente usada na forma de sal cloridrato, que é mais solúvel em água. A heroína para injeção é comprada em pó branco, bege ou castanho claro, o qual é dissolvido numa pequena quantidade de água com um traço de sumo de limão, que contém ácido cítrico e ajuda a aumentar a solubilidade. Tudo isto pode ser misturado numa colher pequena sobre uma chama, usualmente um isqueiro, onde se pretende esterilizar o líquido antes da extração da droga que se coloca depois numa seringa para posterior injeção. 

Chasing the Dragon:
  • No procedimento “chasing the dragon”, os consumidores de heroína aquecem o pó num pedaço de alumínio com um isqueiro até derreter e evaporar. Posteriormente o vapor da heroína é inalado ou fumado. Este tipo de heroína é usada na forma de “base livre”, que é mais volátil e pode ser fumada em vez de injetada. A forma base da heroína é geralmente castanha e relativamente insolúvel em água, por isso, não é ideal para injeção, enquanto que, a heroína na forma de sal cloridrato não é ideal para fumar devido ao facto de se decompor facilmente quando aquecida.
Inalação:
  • É a forma menos eficiente de administração de heroína. Quantidades variáveis de heroína podem ser engolidas quando esta é inalada, reduzindo a quantidade de droga ativa que chega à circulação.
Ingestão oral:
  • É uma forma muito incomum de administração, isto porque a heroína é absorvida lentamente sem produzir nenhuma característica desejada, assim como também a maior parte da dose é metabolizada pelo fígado antes de chegar à circulação.
A ingestão oral de heroína pode ser vista algumas vezes em casos de suicídio ou homicídio. Os acidentes mais comuns em que se verifica este tipo de ingestão acontecem com as “mulas”, ou seja, pessoas que transportam a heroína no corpo, engolindo-a em pequenos sacos de plástico ou látex. Menos comum é o caso de pessoas que tentam contrabandear a heroína inserindo pacotes no recto ou na vagina.

É comum encontrarmos dependentes químicos que não consegue submeter-se a 
tratamentos de reabilitação.

Efeitos:
  • A heroína tem efeito similar aos outros opióides. Logo após o uso, a pessoa fica num estado sonolento, fora da realidade. Os batimentos cardíacos e respiração diminuem, sintoma muito comum no uso de opiáceos, sendo inclusive a causa de morte por overdose, insuficiência respiratória. As primeiras sensações são de euforia e conforto.
O dependente de heroína também pode ter problemas sociais e familiares. Ele torna-se apático, desanimado, perdendo o interesse por sua vida profissional e familiar.
  • Euforia e disforia: São necessárias maiores doses do que antes para causar analgesia. Consiste num sentimento de estar no paraíso. A euforia após um período de tempo de aproximadamente 10 minutos, é substituída pela disforia, um estado de ansiedade desagradável e mal-estar. A euforia produzida pela droga transforma-se em depressão e ansiedade após passarem os efeitos. 
  • Analgesia (perda da sensação de dor física e emocional): pode levar à inflicção de ferimentos no heroinômano sem que este se dê conta e se afaste do agente agressor, pode levar a um infarto do miocárdio.
  • Sonolência, embotamento mental sem amnésia 
  • Disfunção sexual em altos graus. 
  • Sensação de tranquilidade e de diminuição do sentimento de desconfiança. 
  • Maior autoconfiança e indiferença aos outros: comportamentos agressivos. 
  • Miose: contração da pupila. Ao contrário da grande maioria das outras drogas de abuso, como cocaína e anfetaminas (metanfetamina e ecstasy) que produzem midríase (dilatação da pupila). É uma característica importante na distinção clínica da overdose de heroína daquelas produzidas por outras drogas 
  • Obstipação ("prisão de ventre") e vômitos. Só são sentidos na primeira semana de consumo continuado, depois o corpo habitua-se e torna-se adicto. 
  • Depressão do centro neuronal respiratório. É a principal causa de morte por overdose. 
  • Supressão do reflexo da tosse: devido à depressão do centro neuronal cerebral da tosse. 
  • Náuseas e vômitos: podem ocorrer se for ativado os centros quimiorreceptores do cérebro.
  • Espasmos nas vias biliares. 
  • Hipotensão, prurido. 
  • Os seus efeitos, quando fumada, são sentidos quase imediatamente (cerca de 3 a 8 segundos). 
  • Perda do controle humorístico, ou seja, o famoso humor bipolar. Ao ser usada, a droga pode acarretar a mudança de humor bipolar, em um certo período de tempo o usuário está depressivo, sem energia com pensamentos suicidas, um pequeno período de tempo depois por exemplo 1 semana, ele se torna muito alegre, falante, desinibido eufórico tendo um comportamento totalmente diferente do anterior
Efeitos a longo prazo e potencial da dependência:
  • Tendência para aumentar a quantidade de heroína auto-administrada, com o fim de conseguir os mesmos efeitos que antes eram conseguidos com doses menores, o que conduz a uma manifesta dependência. Passadas várias horas da última dose, o viciado necessita de uma nova dose para evitar a síndrome de abstinência provocada pela falta dela. 
Desenvolve tolerância em relação aos efeitos de euforia, de depressão respiratória, analgesia, sedação, vômitos e alterações hormonais. Não há desenvolvimento para a miose nem para a obstipação. Estes efeitos, junto com a diminuição da libido, a insônia e a transpiração, são os sintomas dos consumidores crônicos. Há alguma imunossupressão com maior risco de infecções, principalmente aquelas introduzidas pelas agulhas partilhadas (SIDA/AIDS, Hepatite B) ou por bactérias através da pele quebrada pela agulha. A síndrome de privação pode levar à cegueira, dores,epilepsia, enfarte do miocárdio ou AVCs potencialmente fatais. A longo prazo leva sempre a lesões cerebrais extensas, claramente visíveis macroscópica e microscopicamente em autópsia.
  • Bastam apenas 3 dias de consumo continuado desta substância para que, na sua ausência, se comecem a sentir os efeitos da ressaca, que quer dizer que o organismo em 3 dias apenas se habitua de tal forma à presença desta substância que quando se deixa de a administrar o organismo entra num estado de desequilíbrio tal, que o indivíduo vê-se obrigado a procurar de forma frenética satisfazer os pedidos do seu organismo, aumentando sempre a dose consumida. A ressaca traduz-se em primeiro lugar por corrimento lacrimal e nasal, seguida de má disposição a nível estomacal e intestinal, suores frios e afrontamentos, dores de rins lancinantes, e na fase final de ausência de consumo, espasmos musculares e câimbras generalizadas.
Tratamentos: 
Fármacos agonistas α2-adrenérgicos:
  • O tratamento com agonistas α2-adrenérgicos como a clonidina, a lofexidina ou a guafacina tem como objectivo a inibição da atividade noradrenérgica ao nível da região cerebral conhecida como locus ceruleus que aumenta de forma marcada quando ocorre um quadro de privação de opiáceos.
Esses fármacos diminuem, embora interagindo com outros receptores, a síndrome de abstinência. A lofexidina produz uma hipotensão menor que a clonidina quando utilizada.

Fármacos antagonistas opióides:
  • Antagonistas opióides como a naloxona e a naltrexona (de ação mais prolongada) são moléculas que bloqueiam os efeitos da heroína (e de qualquer outro opióide) impedindo a sua conexão a receptores opióides dado que têm alta afinidade para estes receptores, mas a conexão ligando-receptor não causa a ativação destes. 
São, por isso, muito utilizados em tratamento de overdose de heroína e têm vindo a ser utilizados em conjugação com outras terapias pois causam a diminuição da duração do quadro de privação.No entanto, e apesar de diminuírem a duração do quadro de privação, os antagonistas opióides parecem também aumentar a intensidade destes mesmos sintomas.
  • Desaconselha-se o uso destes antagonistas que têm fortes efeitos secundários que podem levar o paciente a uma morte certa. Estão documentados dezenas de casos de mortes provocadas direta e indiretamente por estes antagonistas- é preferível o uso da metadona como recurso terapêutico.
Tráfico e custos sociais da Heroína:
  • A heroína é uma droga proibida por lei em todos os países. É produzida a partir do ópio extraído de bolbos de papoilas opiáceas. 
O Afeganistão é o maior produtor do mundo, produzindo 86% (2004) do ópio usado; outros países produtores são o Paquistão e a região do triângulo dourado: Birmânia, Tailândia, Vietnam e Laos e província de Yunnan na China. Ultimamente os traficantes latino-americanos de cocaína têm investido no cultivo do ópio, e começa a haver produções significativas na Colômbia e no México, que já detêm a maioria do mercado dos EUA. A colheita de 2003 terá rendido aos seus cultivadores cerca de 2,8 bilhões de dólares americanos. 
  • É desconhecido, no entanto, o valor global dos rendimentos gerados aos vários níveis envolvidos após produção, onde se incluem transporte, transformação laboratorial em heroína e distribuição, assim como todas as ramificações existentes, desde custos dos países em tratamento dos toxicodependentes, policiamento e meios jurídico-legais.

O sofrimento que a drogadição traz a todo o núcleo familiar e social, do qual o dependente químico faz parte, faz com que se pergunte: “Porque voluntário na recuperação de dependentes químicos?”