sábado, 7 de novembro de 2015

Rumo a uma Economia Verde

Rumo a uma Economia Verde

  • Os últimos dois anos testemunharam a saída do conceito de “economia verde” de um campo especializado em economia ambiental e ganhar ênfase no discurso sobre políticas. 
Esse conceito vem sendo cada vez mais encontrado nos discursos dos chefes de estado e ministros das finanças, no texto dos comunicados do G20 e discutido no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza.
  • Esse recente movimento na direção do conceito de economia verde, sem dúvida, foi auxiliado pela grande desilusão em relação ao paradigma econômico predominante, uma sensação de fatiga que emana das várias crises simultâneas e falhas no mercado vividas durante a primeira década do novo milênio, incluindo, principalmente, a crise financeira e econômica de 2008.
Mas ao mesmo tempo, há cada vez mais evidências de um caminho para o avanço, um novo modelo econômico, no qual a riqueza material não é alcançada necessariamente à custa de crescentes riscos ambientais, da escassez ecológica e de disparidades sociais.
  • Um número de evidências cada vez maior também sugere que a transição para uma economia verde pode ser inteiramente justificada em termos econômicos e sociais. Há um forte argumento emergindo para que haja uma duplicação do número de esforços feitos tanto por parte dos governos e do setor privado no engajamento em tal transformação econômica.
Para os governos, isso incluiria nivelar o campo de ação para produtos mais verdes, eliminando progressivamente subsídios defasados, reformando políticas e oferecendo novos incentivos, fortalecendo a infraestrutura do mercado e mecanismos baseados no mercado, redirecionando o investimento público e tornando os contratos públicos mais verdes. 
  • Para o setor privado, isso envolveria entender e dimensionar a verdadeira oportunidade apresentada pela transição a uma economia verde em uma série de setores chave, e responder às reformas de políticas e aos sinais de preço por meio de níveis mais altos de financiamento e investimento.
Uma era marcada pelo uso inadequado do capital:
  • Várias crises simultâneas se desdobraram na última década: em relação ao clima, biodiversidade, combustíveis, aos alimentos, água e, mais recentemente, no sistema financeiro global. 
O crescimento das emissões de carbono indica uma ameaça crescente de mudança climática, com consequências potencialmente desastrosas para a humanidade. O choque no preço dos combustíveis em 2007-2008 e o consequente aumento acentuado nos preços dos alimentos e mercadorias indicam fraquezas estruturais e riscos que continuam mal resolvidos. 
  • As previsões da Agência Internacional de Energia (AIE) e de outros órgãos quanto a um aumento na demanda de combustível fóssil e nos preços de energia sugerem uma dependência contínua, ao passo que a economia mundial luta para se recuperar e crescer (AIE 2010).
Atualmente, não há um consenso internacional quanto ao problema da segurança global dos alimentos ou possíveis soluções para conseguir alimentar uma população de 9 bilhões de pessoas até 2050. 
  • A escassez de água doce já é um problema global e as previsões indicam uma diferença crescente até 2030 entre a demanda anual de água doce e as reservas renováveis (McKinsey e Company 2009). A perspectiva de melhorias no saneamento ainda é desoladora para mais de 1,1 bilhão de pessoas e 844 milhões de pessoas ainda não têm acesso à água potável limpa (Organização Mundial de Saúde e UNICEF 2010). 
Coletivamente, essas crises têm um impacto muito grande na nossa habilidade de promover a prosperidade em todo o mundo e atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs) na redução da pobreza extrema. Elas também compõem problemas sociais persistentes, tais como desemprego, insegurança socioeconômica, doenças e instabilidade social. As causas dessas crises variam, mas, em um nível básico, todas elas partilham uma característica em comum: um grande uso inadequado de capital. 
  • Nas últimas duas décadas, grande parte do capital foi empregado em propriedades, combustíveis fósseis e ativos financeiros estruturados com derivativos integrados. Entretanto, uma quantia relativamente pequena em comparação foi investida em energias renováveis, eficiência energética, transportes públicos, agricultura sustentável, proteção dos ecossistemas e da biodiversidade e conservação do solo e da água.
Administrando o desafio Populacional: 
No contexto do desenvolvimento sustentável
  • O vínculo entre a dinâmica populacional e o desenvolvimento sustentável é forte e inseparável, conforme refletido no Princípio 8 da Declaração sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da Conferência Rio 1992.
  • “Para alcançar um desenvolvimento sustentável e uma melhor qualidade de vida para todas as pessoas, os Estados devem reduzir e eliminar os padrões não sustentáveis de produção e consumo e promover políticas demográficas adequadas.” Declaração da Rio 92, Princípio 8 (ONU, 1992).
  • Este ano a população mundial atingirá 7 bilhões de pessoas e, até o meio do século XXI, aumentará para mais de 9 bilhões. Ao contrário das previsões anteriores, as projeções populacionais mais recentes estimam que o crescimento populacional irá continuar (ECOSOC 2009 e 2011), o que aumenta a necessidade de esforços para reduzir a pobreza.
  • Além do maior desafio de alimentar uma população em crescimento, o que depende crucialmente de uma produção agrícola mais eficaz (FAO 2009 e 2010; Tokgoz e Rosegrant 2011), esse crescimento também requer a criação de oportunidades de emprego suficientes, o que, por sua vez, depende de um desenvolvimento econômico favorável (OIT 2011; UNFPA 2011a; Basten et al. 2011; Herrmann e Khan 2008).
  • Uma transição para uma economia verde pode ajudar a superar o impacto do crescimento populacional na diminuição dos recursos naturais escassos. 
  • Os países menos desenvolvidos (LDCs) do mundo são os mais fortemente afetados pela degradação ambiental em relação à maioria dos outros países em desenvolvimento (UNCTAD 2010a), portanto, eles têm muito a ganhar com a transição para uma economia verde.
  • Além disso, mudanças na distribuição espacial das populações, impulsionadas tanto pela migração de áreas rurais para urbanas quanto pelo crescimento das cidades, estão alterando os impactos e vulnerabilidades ambientais. 
  • Quando planejada, a urbanização pode ser um vetor poderoso para o desenvolvimento sustentável. 
  • Considerando que em 2008 a parcela da população urbana excedeu pela primeira vez a parcela das pessoas que vivem nas áreas rurais em nível global (UNFPA 2007), uma transição para uma economia verde se torna cada vez mais importante. 
  • De maneira significativa, nos países menos desenvolvidos, em que a maioria das pessoas ainda vive no campo, a década compreendida entre os anos 2000 a 2010 foi a primeira em que o crescimento da população urbana ultrapassou o crescimento das populações rurais. 
  • Esses tipos de mudanças no nível societário também podem apresentar oportunidades para o desenvolvimento de uma economia verde.
  • Por exemplo, as cidades podem oferecer serviços essenciais, incluindo saúde e educação, a custos per capita mais baixos, devido aos benefícios das economias de escala. 
  • Uma maior eficiência também pode ser obtida no desenvolvimento de infraestruturas vitais, incluindo habitação, água, saneamento e transporte. 
  • A urbanização também pode reduzir o consumo de energia, especialmente em termos de transporte e habitação, bem como criar espaços interativos que estendam o alcance à cultura e às trocas culturais. 
  • A materialização desses benefícios requer um planejamento proativo em relação às futuras mudanças demográficas. Um planejamento antecipado por parte dos governos e das autoridades locais é capaz de lidar com a dinâmica populacional de maneira proativa.
  • Por exemplo, uma ferramenta de auxílio aos países é fazer um melhor uso dos dados populacionais e conduzir uma análise sistemática da situação (UNFPA 2011b), com o objetivo de destacar o modo como as tendências populacionais atuais e projetadas afetam o desenvolvimento. 
  • Tal análise oferece a base necessária para lidar com a dinâmica populacional e seus vínculos com o desenvolvimento sustentável e as estratégias de redução da pobreza.
A maioria das estratégias de crescimento e desenvolvimento econômico incentivaram um rápido acúmulo de capital físico, financeiro e humano, porém, à custa de uma redução excessiva e degradação do capital natural, que inclui as reservas de recursos naturais e os ecossistemas. Ao esgotar as reservas de riquezas naturais do mundo (em muitos casos, irreversivelmente) esse padrão de desenvolvimento e crescimento teve impactos prejudiciais ao bem-estar das gerações atuais e apresenta riscos e desafios tremendos para o futuro. As múltiplas crises recentes são sintomáticas desse padrão.
  • As políticas e incentivos de mercado existentes contribuíram para o problema do uso inadequado de capital, pois permitem que as empresas gerem externalidades sociais e ambientais significativas, em grande parte não contabilizadas e não verificadas.
Reverter esse uso inadequado requer melhores políticas públicas, incluindo medidas de precificação e regulatórias, a fim de mudar os incentivos perversos que impulsionam esse uso inadequado de capital e ignoram as externalidades sociais e ambientais. 
  • Ao mesmo tempo, regulamentações políticas e investimentos públicos adequados que promovem mudanças no padrão dos investimentos privados estão sendo cada vez mais adotados no mundo inteiro, especialmente em países em desenvolvimento (PNUMA 2010).
Por que este relatório é necessário agora?
  • O relatório do PNUMA, Rumo a uma Economia Verde, pretende desmascarar diversos mitos e equívocos sobre a criação de uma economia verde global e oferece orientações oportunas e práticas aos criadores de políticas sobre quais reformas eles precisam implantar a fim de dar vazão ao potencial produtivo e empregatício da economia verde. 
Talvez o mito mais predominante seja aquele de que há uma incompatibilidade inevitável entre a sustentabilidade ambiental e o progresso econômico.Hoje em dia, há evidências substanciais de que tornar as economias verdes não inibe a criação de riquezas nem as oportunidades de emprego. Pelo contrário, muitos setores verdes oferecem oportunidades significativas de investimento, crescimento e trabalho. 
  • No entanto, para que isso ocorra, são necessárias novas condições facilitadoras para promover tais investimentos na transição para uma economia verde, o que, em troca, pede uma ação urgente por parte dos decisores políticos.
Um segundo mito é o de que uma economia verde é um luxo que somente países ricos podem ter, ou pior, de que ela seria uma armadilha para frear o desenvolvimento e perpetuar a pobreza nos países em desenvolvimento.
  • Ao contrário dessa percepção, inúmeros exemplos de transições verdes podem ser encontrados nos países em desenvolvimento, que deveriam ser replicados em outros lugares. Rumo a uma Economia Verde traz alguns desses exemplos à luz e destaca seu escopo para uma aplicação mais ampla.
O trabalho do PNUMA sobre a economia verde aumentou a visibilidade do conceito em 2008, especialmente por meio do chamado para um Novo

Acordo Verde Global: 
(Global Green New Deal, GGND):
  • O GGND recomendava um pacote de investimentos públicos, bem como de políticas complementares e reformas nos preços, que visava dar início a uma transição para uma economia verde e ao mesmo tempo revigorar economias e empregos e lidar com a pobreza persistente (Barbier 2010a). Projetada como uma política de resposta oportuna e adequada à crise econômica, a proposta do GGND foi um dos primeiros resultados da Iniciativa Economia Verde (Green Economy) das Nações Unidas. 
Essa iniciativa, coordenada pelo PNUMA, foi uma das nove Iniciativas Conjuntas contra a Crise assumidas pelo Secretário Geral da ONU e sua Câmara de Diretores Gerais em resposta à crise econômica e financeira de 2008.
  • Rumo a uma Economia Verde – o principal resultado da
  • Iniciativa Economia Verde – demonstra que esverdear as economias mais verdes não precisa ser um fardo sobre o crescimento. 
Pelo contrário, tornar as economias mais verdes tem o potencial de ser um novo vetor de crescimento, uma rede criadora de empregos decentes e uma estratégia vital para eliminar a pobreza persistente.O relatório também busca, de três maneiras, motivar os decisores políticos a gerar condições que permitam maiores investimentos em uma transição para uma economia verde.
  • Primeiramente, o relatório apresenta uma proposta econômica para alterar os investimentos públicos e privados a fim de transformar setores chave que são críticos a uma economia verde global. O relatório ilustra, por meio de exemplos, como os empregos criados em profissões verdes compensam as perdas de empregos na transição para uma economia verde.
Em segundo lugar, mostra como uma economia verde pode reduzir a pobreza persistente em diversos setores importantes – agricultura, silvicultura, água potável, pesca e energia. A silvicultura sustentável e métodos agrícolas ecologicamente conscientes ajudam a conservar a fertilidade do solo e os recursos da água. Isso é especialmente crítico para a agricultura de subsistência, da qual quase 1,3 bilhão de pessoas dependem para sua sobrevivência (PNUMA et al. 2008).
  • Em terceiro lugar, o relatório oferece orientações sobre as políticas para alcançar essa mudança reduzindo ou eliminando subsídios ambientalmente prejudiciais ou perversos, lidando com as falhas do mercado criadas por externalidades ou informações imperfeitas, desenvolvendo iniciativas baseadas no mercado, implementando estruturas regulatórias adequadas, celebrando contratos públicos verdes e estimulando o investimento.
O que é a economia verde?
  • O PNUMA define economia verde como um modelo econômico que resulta em “melhoria do bem-estar da humanidade e igualdade social, ao mesmo tempo em que reduz significativamente riscos ambientais e escassez ecológica” (PNUMA 2010). Em outras palavras, uma economia verde tem baixa emissão de carbono, é eficiente em seu uso de recursos e é socialmente inclusiva.
Em uma economia verde, o crescimento de renda e emprego deve ser impulsionado por investimentos públicos e privados que reduzam as emissões de carbono e a poluição, aumentem a eficiência energética e o uso de recursos e impeçam a perda da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos. Esses investimentos precisam ser catalisados e apoiados por gastos públicos direcionados, reformas políticas e mudanças nas regulamentações. 
  • O caminho do desenvolvimento deve manter, aprimorar e, quando necessário, reconstruir o capital natural como um bem econômico crítico e como uma fonte de benefícios públicos. Isso é especialmente importante para a população carente, cujo sustento e segurança dependem da natureza.
O objetivo chave de uma transição para uma economia verde é possibilitar o crescimento econômico e investimentos, aprimorando ao mesmo tempo a qualidade ambiental e a inclusão social. Um fator crítico para atingir tal objetivo é criar as condições propícias para que investimentos públicos e privados incorporem critérios ambientais e sociais mais amplos. 
  • Além disso, os principais indicadores de desempenho econômico, tais como o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), precisam ser ajustados a fim de englobarem a poluição, o esgotamento dos recursos, a diminuição de serviços ecossistêmicos e as consequências distribucionais da perda de capital natural para a população carente.
Um grande desafio é conciliar as aspirações de desenvolvimento econômico dos países ricos e pobres em competição em uma economia mundial que enfrenta uma crescente mudança climática, insegurança energética e escassez ecológica. 
  • Uma economia verde é capaz de atender a esse desafio oferecendo um caminho para o desenvolvimento que reduza a dependência no carbono, promova a eficiência dos recursos e da energia e diminua a degradação ambiental. Conforme o crescimento econômico e os investimentos se tornam menos dependentes da liquidação de ativos ambientais e do sacrifício da qualidade ambiental, países ricos e pobres podem atingir um desenvolvimento econômico mais sustentável.
O conceito de economia verde não substitui o desenvolvimento sustentável; mas há um reconhecimento crescente de que alcançar a sustentabilidade depende quase que inteiramente em obter um modelo certo de economia. 
  • Décadas de criação de uma nova riqueza por meio de um modelo de “economia marrom,” baseada em combustíveis fósseis, não lidaram de maneira sustentável com a marginalização social, a degradação ambiental e o esgotamento de recursos. Além disso, o mundo ainda está longe de atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio até 2015.

Rumo a uma Economia Verde

Uma economia verde e o desenvolvimento sustentável:

Em 2009, a Assembleia Geral da ONU decidiu realizar uma convenção no Rio de Janeiro no ano de 2012 (Rio+20) para celebrar o 20º aniversário da primeira Cúpula da Terra no Rio, em 1992. Dois dos itens da agenda para a Rio+20 foram 
“A Economia Verde no Contexto do Desenvolvimento Sustentável e da Erradicação da Pobreza” e “Estrutura Internacional para o Desenvolvimento Sustentável”. 
Com a economia verde agora firmemente estabelecida na agenda de políticas internacionais, é útil revisar e esclarecer os vínculos entre uma economia verde e o desenvolvimento sustentável.
  • A maioria das interpretações da sustentabilidade toma como ponto de partida o consenso alcançado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) em 1987, que definia o desenvolvimento sustentável como o “desenvolvimento que atende as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações de atender as suas próprias necessidades” (CMMAD 1987).
Os economistas geralmente se sentem confortáveis com essa interpretação ampla da sustentabilidade, uma vez que ela é facilmente convertida em termos econômicos: um aumento no bem-estar atual não deve resultar na redução do bem-estar futuro. Ou seja, as gerações futuras devem ter o direito a pelo menos o mesmo nível de oportunidades econômicas e, da mesma forma, a pelo menos o mesmo nível de bem-estar econômico, disponíveis às gerações atuais.
  • Como resultado, o desenvolvimento econômico de hoje deve assegurar que as gerações futuras não sejam deixadas em pior estado do que as gerações atuais. Ou, como alguns economistas expressaram de maneira sucinta, o bem-estar per capita não deve diminuir com o tempo (Pezzey 1989). 
De acordo com esse ponto de vista, é o estoque de capital total empregado pelo sistema econômico, incluindo o capital natural, que determina a extensão total das oportunidades econômicas e, assim, o bem-estar disponível às gerações atual e futura (Pearce et al. 1989).
  • A sociedade deve decidir como melhor usar seu estoque de capital total hoje a fim de aumentar as atividades econômicas e o bem-estar atuais. A sociedade também deve decidir quanto ela precisa economizar ou acumular para o futuro e, por fim, para o bem-estar das gerações futuras.
No entanto, não é simplesmente o estoque de capital agregado na economia que fará a diferença, mas também sua composição, em especial o fato de as gerações atuais estarem ou não esgotando uma forma de capital para atender suas necessidades. Por exemplo, grande parte do interesse no desenvolvimento sustentável é impulsionado por uma preocupação de que o desenvolvimento econômico possa estar levando a uma rápida acumulação de capital físico e humano às custas da diminuição excessiva e da degradação do capital natural. 
  • A principal preocupação é que ao esgotar irreversivelmente o estoque mundial de riquezas naturais, o caminho atual para o desenvolvimento terá implicações prejudiciais para o bem-estar das gerações futuras.
Um dos primeiros estudos econômicos a fazer a ligação entre essa abordagem do capital em relação ao desenvolvimento sustentável e uma economia verde foi o livro, publicado em 1989, Blueprint for a Green Economy (Pearce et al. 1989). Os autores argumentavam que, como as economias atuais estão voltadas à redução do capital natural a fim de assegurar o crescimento, o desenvolvimento sustentável se torna inalcançável.
  • Uma economia verde que valoriza os ativos ambientais, emprega políticas de precificação e mudanças regulamentares a fim de converter esses valores em incentivos de mercado e ajusta a medida econômica do PIB às perdas ambientais é essencial para assegurar o bem-estar das gerações atual e futura.
Conforme destacado pelos autores do livro Blueprint for a Green Economy, um dos grandes problemas na abordagem do capital em relação ao desenvolvimento sustentável é possibilidade ou impossibilidade da substituição entre diferentes formas de capital: capital humano, capital físico e capital natural. Um ponto de vista fortemente conservacionista pode sustentar que o componente natural do estoque de capital total deve ser mantido intacto, conforme medido em termos físicos. 
  • No entanto, isso pode ser questionado na prática, especialmente no contexto dos países em desenvolvimento, caso o capital natural seja relativamente abundante e o capital físico e humano precise ser desenvolvido a fim de atender a outras demandas humanas. Esse tipo de substituição reflete a infeliz realidade de que a criação de capital físico – por exemplo, estradas, construções e maquinários – geralmente requer a conversão de capital natural. 
Embora a substituição entre o capital natural e outras formas de capital seja frequentemente inevitável, geralmente há espaço para ganhos em eficiência. Há também um crescente reconhecimento dos limites ambientais que refreariam a substituição além dos níveis mínimos necessários para o bem-estar humano.
  • Ainda assim, sempre houve uma preocupação de que algumas formas de capital natural são essenciais para o bem-estar humano, especialmente bens e serviços ecológicos chave, ambientes únicos e habitats naturais, bem como atributos insubstituíveis do ecossistema. 
A incerteza quanto ao real valor desses importantes ativos para o bem-estar da humanidade, principalmente o valor que as futuras geração podem depositar sobre eles caso se tornem cada vez mais escassos, limita ainda mais nossa capacidade de determinar se poderemos ou não compensar de maneira adequada as próximas gerações pelas atuais perdas irreversíveis de tais capitais naturais essenciais. Essa preocupação se reflete em outras definições do desenvolvimento sustentável. 
  • Por exemplo, em 1991, o World Wide Fund for Nature (WWF), a International Union for Conservation of Nature (IUCN) e o PNUMA interpretaram o conceito de desenvolvimento sustentável como “melhorar a qualidade de vida humana de acordo com as capacidades de fornecimento dos ecossistemas de apoio” (WWF, IUCN e PNUMA 1991).
Conforme essa definição sugere, o tipo de capital natural que está especialmente em risco são os ecossistemas. Como explicado por Partha Dasgupta (2008): 
“Os ecossistemas são ativos de capital. Como ativos de capital reprodutíveis … os ecossistemas sofrem uma depreciação se forem usados de forma inadequada ou demasiada. Mas eles diferem dos ativos de capital reprodutíveis de três maneiras: 
  1. A depreciação do capital natural frequentemente é irreversível (ou, no melhor dos casos, o sistema leva muito tempo para se recuperar); 
  2. Exceto de uma maneira bastante limitada, não é possível substituir um ecossistema esgotado ou degradado por um novo; e 
  3. Os ecossistemas podem sofrer um colapso de maneira abrupta, sem muito aviso prévio.”
A crescente escassez ecológica é uma indicação de que estamos esgotando irreversivelmente os ecossistemas de maneira muita rápida e a consequência é que o bem-estar econômico atual e futuro será afetado. 
  • Uma indicação importante da crescente escassez ecológica mundial foi apresentada na Avaliação Ecossistêmica do Milênio (AEM) em 2005, que descobriu que mais de 60% dos principais bens e serviços ecossistêmicos mundiais cobertos pela avaliação estavam degradados ou eram utilizados de maneira inadequada. 
Alguns benefícios importantes para a humanidade estão nessa categoria, incluindo água doce; 
  • Pescas de captura; 
  • Purificação da água e tratamento de resíduos;
  • Alimentos silvestres; 
  • Recursos genéticos; 
  • Bioquímicos; 
  • Combustíveis provenientes da madeira; polinização;
  • Valores espirituais, religiosos e estéticos; 
  • A regulação do clima regional e local; erosão; 
  • Pestes; e perigos naturais. 
Os valores econômicos associados com esses serviços ecossistêmicos, embora geralmente não sejam comercializados, são substanciais. Uma grande dificuldade é o fato de que os custos crescentes associados à escassez ecológica cada vez mais acentuada não são rotineiramente refletidos nos mercados. Quase todos os bens ou serviços ecossistêmicos degradados identificados pela Avaliação Ecossistêmica do Milênio não são comercializados.
  • Alguns bens, como pescas de captura, água doce, alimentos silvestres e combustíveis provenientes da madeira, geralmente são comercializados, mas, devido a uma má administração dos recursos biológicos e dos ecossistemas que são fonte desses bens, e devido a informações imperfeitas, os preços de mercado não refletem seu uso não sustentável e exploração demasiada.Além disso, políticas e instituições adequadas também não foram desenvolvidas a fim de lidar com os custos associados à piora na escassez ecológica globalmente.
Muito frequentemente, distorções e falhas nas políticas são as causas desses problemas ao encorajar o desperdício dos recursos naturais e a degradação ambiental. Hoje em dia, o desafio exclusivo imposto por uma crescente escassez ecológica e o uso ineficiente de recursos e energia é superar um grande número de falhas no mercado, nas políticas e falhas institucionais que impedem o reconhecimento da importância econômica dessa degradação ambiental. Reverter esse processo de desenvolvimento não sustentável requer três etapas importantes.
  • Primeiramente, conforme argumentado pelos autores do livro Blueprint for a Green Economy, são necessárias melhorias na avaliação ambiental e na análise de políticas para assegurar que os mercados e as políticas incorporem os custos e benefícios totais dos impactos ambientais (Pearce et al. 1989; Pearce e Barbier 2000). 
A avaliação ambiental e a responsabilização pela depreciação do capital natural devem ser plenamente integradas à política e à estratégia de desenvolvimento econômico. 
  • Conforme sugerido acima, os componentes mais desvalorizados do capital natural são os ecossistemas e os diversos bens e serviços que eles oferecem. Valorizar os bens e serviços ecossistêmicos não é fácil, mas ainda assim, isso é fundamental para assegurar a sustentabilidade dos esforços de desenvolvimento econômico globais.
Um grande esforço de pesquisa internacional apoiado pelo PNUMA, a Economia dos Ecossistemas e Biodiversidade (TEEB), ilustra como a pesquisa ecológica e econômica pode ser usada para valorizar os bens e serviços ecossistêmicos, e também como tal valorização é essencial para a criação de políticas e investimentos no meio ambiente (Sukhdev 2008; TEEB 2010).
  • Em segundo lugar, o papel da política em controlar a degradação ambiental excessiva requer a implementação de informações, incentivos, instituições, investimentos e infraestruturas eficazes e adequados.
Informações mais precisas sobre o estado do meio ambiente, dos ecossistemas e da biodiversidade são essenciais para a tomada de decisões privadas e públicas, que determinam a alocação de capital natural para o desenvolvimento econômico. 
  • O uso de instrumentos baseados no mercado e a criação de mercados e, quando adequado, de medidas regulatórias, têm um papel a desempenhar na internalização dessas informações nas decisões diárias de alocação na economia. 
Tais instrumentos também são importantes para corrigir as falhas nos mercados e políticas que distorcem os incentivos econômicos para um gerenciamento aprimorado do meio ambiente e dos ecossistemas.
  • No entanto, superar falhas institucionais e encorajar direitos de propriedade mais eficazes, uma boa governança e o apoio às comunidades locais também são elementos críticos. Reduzir a ineficiência governamental, corrupção e práticas inadequadas de prestação de contas são aspectos importantes para reverter a degradação ambiental excessiva em muitos países. 
Mas também há um papel positivo por parte do governo em oferecer uma infraestrutura adequada e eficaz por meio do investimento público, proteção de ecossistemas críticos e conservação da biodiversidade, criando novos mecanismos de incentivo, tais como o pagamento por serviços ecossistêmicos, a promoção das tecnologias e conhecimento necessários para melhorar a restauração dos ecossistemas e facilitação da transição para uma economia com baixa emissão de carbono.
  • Em terceiro lugar, a degradação ambiental contínua, a conversão do solo e as mudanças no clima global afetam o funcionamento, a diversidade e a resiliência dos sistemas ecológicos e dos bens e serviços que eles oferecem. É difícil quantificar e avaliar os possíveis impactos a longo prazo desses efeitos sobre a saúde e a estabilidade dos ecossistemas. Uma crescente colaboração entre cientistas ambientais, ecologistas e economistas será necessária para avaliar e monitorar esses impactos (AEM 2005; Polasky e Segerson 2009).
Essa análise ecológica e econômica interdisciplinar também é necessária para identificar e avaliar as consequências sobre o bem-estar das gerações atuais e futuras advindas da crescente escassez ecológica.
  • O progresso na reversão do desenvolvimento não sustentável pede uma colaboração interdisciplinar mais disseminada para analisar problemas complexos de degradação ambiental, perda da biodiversidade e declínio de ecossistemas.
Uma pesquisa interdisciplinar também precisa determinar os limites que devem reger a transformação de tipos específicos de capital natural em outras formas de capital. 
Por exemplo, quanto de terreno florestal é permitido para conversão em terreno agrícola, uso industrial ou desenvolvimento urbano em uma determinada área?
Que quantidade de água subterrânea pode ser extraída por ano?
Quantas e quais espécies de peixe podem ser capturadas em uma determinada temporada?
Quais substâncias químicas devem ser banidas da produção e comércio?
E mais importante, quais são os critérios para estabelecer esses limites? 
Uma vez que esses padrões forem estabelecidos, medidas de incentivo em níveis nacionais ou internacionais podem ser criadas para assegurar sua conformidade. O outro elemento chave para equilibrar diferentes formas de capital reconhece que a sustentabilidade é uma característica das tecnologias atuais. Investir em mudanças e substituições dessas tecnologias pode levar a novas complementariedades. 
  • A maioria das fontes de energia renováveis, tais como turbinas eólicas ou painéis solares, reduzem consideravelmente a quantidade de capital natural sacrificado em sua construção e a vida útil de sua operação, quando comparado a tecnologias que usam a queima de combustível fóssil. Esses dois tipos de solução – estabelecer limites e alterar as tecnologias – são importantes para alcançar uma economia verde.
Em suma, mover-se em direção a uma economia verde deve se tornar uma prioridade nas políticas econômicas estratégicas para alcançar o desenvolvimento sustentável. Uma economia verde reconhece que o objetivo do desenvolvimento sustentável é melhorar a qualidade da vida humana dentro dos limites do meio ambiente, o que inclui combater as mudanças climáticas globais, a insegurança energética e a escassez ecológica. 
  • No entanto, uma economia verde não pode se concentrar exclusivamente em eliminar os problemas e a escassez ambientais. Também deve lidar com as preocupações de desenvolvimento sustentável com igualdade intergeracional e a erradicação da pobreza. 
A Rio+20 terminou com decepção para todos os envolvidos 
e para aqueles  que tinham alguma esperança no nosso pais