terça-feira, 5 de maio de 2015

Design de Moda Sustentável

Algodão ecológico não é resposta, nem o tratamento de água nas lavanderias de jeans. O desafio de buscar materiais e processos menos impactantes ao ambiente é comum a todas as indústrias de bens de consumo.

  • O sistema moda impõe um ritmo de obsolescência programada acelerado em que os produtos são descartados antes do final da sua vida potencial, o que é diametralmente contrário aos axiomas do design sustentável. Segundo Martins e Santos (2008), é premente a necessidade de desenvolver novos modelos de consumo e produção para o setor de moda e vestuário, visto que este tem um significativo impacto econômico, ambiental e social que justifica tal premência.
Para acompanhar e satisfazer os consumidores, as indústrias do setor investem de forma exacerbada em novos produtos e esquecem a exagerada taxa de resíduos gerados pela fabricação acelerada e o conseqüente descarte dos inúmeros novos produtos produzidos.
  • Assim, em tempos em que ocorre tanto desperdício por meio do consumo desenfreado, o reaproveitamento de produtos, em especial, os produtos de vestuário, tem-se mostrado necessário e relevante, ao mesmo tempo em que delineia-se como importante questão para consumidores que buscam e valorizam o consumo consciente.
No sistema de reaproveitamento, as roupas estocadas nos brechós e os materiais que compreendem estas roupas como tecidos e aviamentos resultam em preciosa fonte de matéria prima disponível e muitas vezes desperdiçada devido à carência de linguagem contemporânea destas.Assim vislumbrou-se a possibilidade de desenvolver produtos de moda visando um sistema produtivo sustentável e promover o consumo consciente atentando os consumidores à proposta de desconstrução e reconstrução de peças de vestuário por meio do reaproveitamento de peças estocadas em brechós e o conseqüente aumento do ciclo de vida desses materiais
  • De acordo com Moreira (2008), a palavra Brechó é originada no século XIX, quando um comerciante chamado Belchior montou sua primeira loja no Rio de Janeiro destinada ao comercio de roupas e artigos usados. Com o uso, a expressão “Casa de Belchior” ou apenas “Belchior” tornou-se Brechó.
Nesse universo, partindo de observações presenciais, detectou-se a existência de muitas lojas de brechó que possuem um grande número de peças de vestuário aproveitáveis por sua qualidade e conservação, sendo possível transformá-las em produtos de moda contemporâneos, visando um sistema produtivo estratégico sustentável. Além disso, promover o consumo consciente atentando aos consumidores a proposta de desconstrução e reconstrução de peças de vestuário por meio do reaproveitamento de estoques brecholinos e o conseqüente aumento do ciclo de vida desses materiais.
Com base à observação realizada, determinaram-se alguns requisitos para a proposta desenvolvida, tais como: desenvolvimento de produtos com linguagem formal contemporânea para desvinculá-los da linguagem formal antiga de produtos de brechó; construção de peças versáteis que acompanhadas de acessórios diferenciados possam ser utilizadas em diferentes ocasiões; produtos exclusivos; parcerias estratégicas; otimização de energia e trabalho por meio do reaproveitamento de partes já costuradas das peças de brechó; e ampliação do ciclo de vida dos produtos ao conferir maior durabilidade a estes. Estes requisitos serão demonstrados e fundamentados na seqüência deste trabalho, ao considerar que:
Precisamos nos alimentar, nos abrigar e nos vestir. A indústria de roupa é a terceira ou quarta maior do mundo. Ela emprega um sexto da população mundial. Pesquisas mostram que há um aumento sem precedentes na preocupação do consumidor com quem faz as roupas, como são tratados e como o processo afeta o ambiente. Essa preocupação cresceu tanto que a demanda por produtos comercializados de maneira justa, em algumas áreas, logo vai exceder a oferta. (LEE, 2008, p. 7)
O brechó e o reaproveitamento:
  • Segundo Serrano (s.d.), por muito tempo os brechós ficaram conhecidos como sendo lojas empoeiradas com produtos destinados ao público de baixa renda. Apesar de esse conceito ter mudado mundialmente, ainda existe esse preconceito no imaginário de muitas pessoas, principalmente na cultura brasileira, pois nos EUA e na Europa esses estabelecimentos são muito bem aceitos por uma grande parcela da população de variadas classes sociais.
O brechó, numa primeira análise, surge como uma alternativa para aqueles que buscam adquirir produtos com preços econômicos, uma vez que ali existem os mais variados tipos de roupas e acessórios alternativos a preços relativamente baixos.
  • O benefício nas compras em brechós reside em garimpar com minúcia peças de roupas disponíveis e para tal, é necessário tempo, paciência e o para encontrar peças que de fato valham a pena. É comum também que usuários de brechós optem pela customização das peças. Conforme observa o Portal São Francisco (s.d.), atualmente existe um público de maioria jovem que prefere encontrar nas vitrines de grife roupas nova com “cara” de brechó.
Nesse ambiente não é necessário “garimpar” tanto quanto em um brechó para achar algo de qualidade e esteticamente agradável. Eles preferem produtos novos feitos estilistas contemporâneos seguindo a tendência “vintage” (inspirada nas roupas brecholinas). Essa característica revela o grande investimento das indústrias na concepção de novos produtos, o que contribui para as altas taxas de resíduos e para o descarte antecipado.
  • No sistema de reaproveitamento, o alvo do garimpo dentro dos brechós são os tecidos. Estes são descritos por Martini (2008) como sendo algo de muita qualidade, visto que os tecidos de décadas atrás eram produzidos para durar mais. A exemplo da comparação de um vestido da estilista Diane von Furstenberg de 1970 com outro de 2010, percebe-se que há algo ali que, por mais que a estilista tente, não está mais presente.
Dessa forma, ao reaproveitar os tecidos provenientes de brechós foi possível adaptá-los à estética atual que contém muitos traços de um “revival”, mas cuja linha de corte-costura é nova, uma vez que a moda contemporânea é abrangente e alegre e ao mesmo tempo dialoga como o que os brechós têm a oferecer em exclusividade.

Individualizar: 
No conceito e no produto
Aquilo que se veste em uma época ou outra é de interesse da subjetividade, individualidade, estilo e consciência.
  • De acordo com Lipovetsky (apud MESQUITA, 2004), a moda vive uma fase de ambiguidade, uma vez que propõe a padronização do vestir através da indústria de confecção em série e ao mesmo tempo propõe agentes de diferenciação e instrumentos de individualização com a produção de artigos exclusivos. O indivíduo, mesmo submetendo-se às regras coletivas da moda nos dias atuais por meio da padronização das tendências, quer se distinguir social e pessoalmente pela diferenciação.
Assim, o individualismo, gerado pela exaustão causada pela moda pluralizada e pela multiplicidade estilística faz com que o indivíduo exerça cada vez mais sua autonomia não somente com o poder de escolha dentro desse universo, mas também com a invenção de universos particulares e diferenciados.
Lipovetsky (2001) ressalta que o consumidor hoje está alicerçado na idéia de desmaterialização. É preciso adquirir produtos com valores intrínsecos socioeconômicos, artísticos e culturais que contenham informação. O consumidor adquire não só uma peça, mas também um discurso, um discurso pessoal. Logo, o consumo consciente é atualmente uma ferramenta de discurso social que se traduz no vestir como potencial de exclusividade e valor pessoal.
  • Dessa forma, é necessário fazer com que os consumidores se diferenciem por meio de uma roupa que seja eficiente em construir e comunicar um conceito. O conceito do vestir consciente. De acordo com o instituto ECOTECE (2007) vestir consciente é buscar equilíbrio entre a sua satisfação, a preservação do meio ambiente e o bem-estar social. É vestir-se com consciência.
Para Caldas (2004), a última década vivida acentua a proeminência do indivíduo, como vetor de prescrição para produção. O consumidor é um indivíduo bem informado, com consciência sobre moda e na medida em que relativamente este é independente dos ditames do mercado, ele é estimulado como nunca a desenvolver um estilo pessoal. “Vale ressaltar que o estilo individual é entronizado pela mídia e pelas instituições de moda como valor a ser almejado por todos, cultua-se a exclusividade e a individualização concretiza-se em conceitos como o de customização.” (CALDAS, 2004, p. 185).
  • Mesquita (2004) disserta que o individualismo pode ser reconhecido na Moda como sendo a busca pela exclusividade e diferenciação presente na subjetividade contemporânea. Assim, encontra-se a chamada “era do individualismo”, a qual surge como fonte de inspiração à criatividade e determina algumas diretrizes do consumo.
Dessa maneira, a corrida para os brechós é uma maneira de garimpar produtos com diferencial e com característica de exclusividade seja na forma ou no material; conceitos muito difíceis de serem encontrados na moda atual, seriada e pluralizada. Conforme Argemi (2008, p.126), 
“se antes o modelo eram as relações de produção, agora são as de consumo. Tudo passa a ser personalizado e as lojas passam a ser especializadas não apenas em objetos, mas especializadas nas pessoas, em suas emoções. É uma das vias de apropriação do mundo, inclusive do corpo e da própria subjetividade”.
Consumo consciente: 
Consumidor inserido no contexto atual:

Os interesses de um consumidor são motivados por diversos tipos de influências, que impulsionam suas ações tais como os aspectos culturais, sociais, psicológicos, situacionais, ambientais bem como estímulos de marketing como preço, promoção e divulgação.
  • De acordo com Furriela (2001,p. 47), entende-se por consumo sustentável “ o consumo de bens e serviços promovido com respeito aos recursos ambientais, que se dá de forma que garanta o atendimento das necessidades das presentes gerações, sem comprometer o atendimento das necessidades das futuras gerações.
Assim, para que haja a adesão do consumo sustentável por parte dos indivíduos é necessária a conscientização da importância do ato de “consumir com responsabilidade” e a conseqüente formação de consumidores esclarecidos a respeito de cidadania e preservação.
  • Esse consumidor cada vez mais consciente e esclarecido, deve ser entendido como mercado consumidor potencial caracterizando assim uma demanda cada vez maior por produtos que contenham um valor social agregado.
Design de moda para a sustentabilidade:  
Projeto de produto de moda e Proposta de Produto Sistema-serviço - PSS
  • Manzini e Vezzoli (2002) apontam quatro abordagens possíveis em design para a sustentabilidade com foco especificamente na redução de impactos ambientais causados pelos produtos, ou considerando o sistema como um todo. No primeiro caso (foco em produtos), é possível atuar a partir do redesign ou design de novos produtos intrinsicamente sustentáveis.
No caso de uma abordagem sistêmica, pode-se repensar todo o sistema de produção e consumo à volta deste, isto é, todo o ciclo de vida, que envolve também uma série de operações complementares, serviços e outros elementos. Neste caso, é possível propor serviços que busquem desmaterializar o consumo, bem como criar novas propostas de cenários de estilos de vida mais sustentáveis.A proposta aqui apresentada fundamenta-se nas abordagens citadas ao mesmo tempo em que busca a conscientização mercadológica da importância da redução do impacto ambiental na produção e no consumo de moda.
  • A responsabilidade ambiental para com os bens de consumo necessita de ações conscientes por parte do consumidor e da estrutura produtiva. Nesse contexto, projetar um produto, no caso específico um produto de vestuário, não é somente projetar e produzir um produto de moda tangível, mas também trabalhar a integração produto, serviço e comunicação.
E é em função dessa integração que se apóia a proposta de desenvolvimento de uma linha de produtos de moda estratégicos dentro dos conceitos da metodologia do Life Cyle Design. Por Life Cyle Design entende-se, segundo Manzini e Vezolli ( 2008, p.23) 
“uma maneira de conceber o desenvolvimento de novos produtos tendo como objetivo que, durante todas as suas fases de projeto, sejam consideradas as possíveis implicações ambientais ligadas às fases do próprio ciclo de vida do produto (pré-produção, produção, distribuição, uso e descarte) buscando, assim, minimizar todos os efeitos negativos possíveis”.
De acordo com Manzini e Vezzoli (2008), para projetar produtos e sistemas sustentáveis não é necessário valer-se de instrumentos de convencimento e sim oferecer soluções, onde o consumidor consiga reconhecer a funcionalidade e o bem-estar intrínseco destes produtos e sistemas e onde o fornecedor destes os considere estratégicos para a geração de lucro e para a redução de gastos com recursos.
  • O design, enfatizando nesta abordagem o design de moda, deve interpretar a vida de um produto como um conjunto de atividades e processos que absorvem matéria-prima e energia, as transformam e liberam emissões de natureza diversa. Papanek (1995) sugere que o desenvolvimento e a fabricação de produtos tanto durante o seu período de uso ativo como na sua posterior existência inserem-se em várias fases, cada uma com o potencial de causar danos à ecologia e conseqüentemente ao futuro e por isso torna-se cada vez mais necessário criar em favor de um futuro mais seguro.
O autor cita as fases como sendo desde a aquisição original das matérias-primas, passando pelo processo de transformação e montagem, a compra do produto acabado (que inclui também expedição, embalagem e publicidade), o uso, o recolhimento do produto após o uso e, finalmente a reutilização ou reciclagem e tratamento final.
  • A partir desse mesmo raciocínio e no contexto atual, Manzini e Vezzoli (2008) acrescentam a importância do pensamento sustentável em cada uma dessas fases a fim de minimizar os impactos ambientais a favor de um futuro sustentável.
De acordo com os autores acima, o pensamento projetual deste trabalho é o de conceber um sistema envolvendo serviços e elementos complementares para a concepção de um produto de moda onde em todas as fases do projeto sejam consideradas as implicações ambientais relacionadas ao ciclo de vida deste (pré-produção, produção, distribuição, uso e descarte) conforme apontam Manzini e Vezzoli (2008).
  • A proposta de PSS (Product Service Systems), seguindo os conceitos acima abordados e segundo a UNEP (2001), é uma inovação estratégica com foco não apenas no planejamento e na venda de produtos físicos, mas sim na comercialização de sistemas de produtos e serviços que em conjunto atendam a demandas específicas dos clientes.
Dessa forma, a proposta deste trabalho, além do desenvolvimento de uma linha de produtos de moda, trata a criação de sistemas de produção, consumo e serviços sustentáveis valendo-se de um conjunto de parcerias estratégicas.

Tecido em fibra de bambu.

Método de pesquisa:
  • O método de pesquisa utilizado pautou-se em entrevistas semi estruturadas com os consumidores, visitas in loco, e o estudo de caso da marca Junky Styling, fundada por Kerry Seager e Annika Sanders em 1997, após a explosão de mercados de reciclagem têxtil em cidades como San Francisco e Tóquio. Segundo Lee (2009), a Junky Styling desconstrói roupas de segunda mão e as transforma em roupas novas e singulares, e norteou a proposta deste trabalho. As peças da marca são produzidas com ternos, casacos e peças de lã recicladas e oferece um serviço de ‘Cirurgia de Roupas’ em que os clientes têm a oportunidade de que suas peças preferidas sejam retrabalhadas em novas criações sob medida.
Resultados:
  • A proposta buscou agregar valor conceitual a um novo produto de moda, destinado à demanda de um mercado consumidor formado por mulheres que valorizam a preservação do meio ambiente e desejam exclusividade, seguindo um sistema de etapas e estratégias tais como o recolhimento de matéria-prima; estudo de reaproveitamento; desconstrução; modelagem e viabilidade de reconstrução; produção; vendas e marketing.
Recolhimento/Reaproveitamento:
  • De acordo com Kazazian (2005) a durabilidade é uma estratégia que permite alongar a duração de vida dos produtos, diminuir sua renovação e, portanto preservar os recursos naturais, limitando assim os impactos dos produtos sobre o meio ambiente.
Trabalhar o conceito durabilidade nesta proposta começa na escolha da matéria-prima que confere a ampliação do ciclo de vida útil de produtos anteriormente comercializados e precocemente descartados. A utilização como matéria-prima de peças que já foram usadas e que estão paradas nos brechós soluciona diretamente a questão de reaproveitamento de matéria-prima ainda durável e de qualidade descartada precocemente, além de contribuir para minimizar o desperdício de mais fontes de novas matérias-primas e recursos. Dessa mesma maneira, o reuso de costuras presentes nas peças resgatadas favorece a otimização do processo produtivo e economia de recursos.
  • Por outro lado, a utilização de produtos de brechós oportuniza parcerias com brechós especializados dentro da mesma cidade ou numa região bem próxima à confecção. Isso minimiza gastos com logística e impactos ambientais. A parceria é positiva no sentido em que garante grandes compras com quantidades negociadas pela empresa e pelos donos dos brechós, além de garantir a rotatividade de grande quantidade de peças paradas nesses estabelecimentos. Em troca, viabiliza facilidades comerciais e materiais exclusivos para a produção dos novos produtos.
O objetivo de otimizar costuras, energia e trabalho é obtido com a proposta de criação a partir da reutilização de formas, detalhes, e partes das peças já prontas. O presente projeto não utiliza a desconstrução total das peças para usá-las como retalhos. A proposta consiste em desconstruir o necessário e reconstruir reutilizando o máximo possível das peças dando contemporaneidade ao que já existe e ainda é adaptável.

Desenvolvimento:
  • A proposição de peças contemporâneas, com características atemporais que sejam versáteis e adaptáveis a diferentes acessórios e complementos para serem usadas em diferentes tipos de ambientes trabalha o conceito da durabilidade no produto pronto, característica essa que colabora para retardar a obsolescência do produto de moda.
A criação de produtos contemporâneos a partir de formas retrôs ou clássicas das peças de brechó inicia-se com a observação dos detalhes das peças e reconhecimento daquilo que pode originar formas e volumes diferenciado. Por sua vez, os shapes definidos e os tecidos utilizados criam composições versáteis para serem acompanhadas de acessórios diversos e usadas em diferentes lugares e períodos do dia.
Em continuidade, o uso de tecidos exclusivos garante composições personalizadas e não padronizadas, o que atende à tendência também trabalhada por Pop Corn (1999) denominada ‘Egonomia’. Essa tendência sócio-cultural afirma que algo fabricado especialmente para cada um dos consumidores é o que mais atrai a atenção dos mesmos. Um produto individualizado traduz essa tendência.
O garimpo de materiais nos brechós é feito sobre uma organização de coleção com tabelas de cores e materiais e em seguida, esses materiais são primeiramente desconstruídos para posteriormente serem reconstruídos viabilizando produtos com uma nova linguagem, como por exemplo. Este foi produzido pelo reaproveitamento da saia. A modelagem foi desenvolvida para enfatizar a possibilidade de uso dos lados direito e avesso de um tecido exclusivo.
  • A desconstrução da roupa de brechó fornece uma matéria-prima de qualidade e conservação para a criação de peças contemporâneas e perfeitamente comercializáveis. A partir da moulage (modelagem tridimensional), e seguindo uma ficha técnica, construiu-se um produto de moda versátil que pode ser combinado com demais acessórios para formar looks noturnos e diurnos, proporcionando à consumidora uma oportunidade de tornar esse produto aproveitável por muito mais tempo em seu guarda-roupa.
A camisa de seda foi transformada em uma blusa de modelagem ousada onde se observa uma transposição de função. Uma das mangas foi transformada em bolso e a gola originou o decote. O vestido foi transformado em uma bermuda sarouel com cós sobreposto e estampa exclusiva. O sistema adotado foi aplicado para as outras peças de produtos propostos em um trabalho em rede com os demais brechós da cidade de Londrina,
  • Paraná e em parceria com comunidades organizadas da Região, por meio de oficinas criativas onde a comunidade possui a oportunidade de conhecer e entender a importância desse sistema produtivo. Simultaneamente, a realização de oficinas proporcionará o aprimoramento de técnicas de costura e modelagem que podem garantir aos participantes condições para desenvolver produtos próprios ampliando a geração de renda para sustento familiar.
O desenvolvimento de rede de trabalho em comunidades organizadas gera contribuição social à parcela da sociedade excluída dos sistemas fabris e das suas conseqüências produtivas.

Marketing e Comunicação:
  • A conscientização dos consumidores é também tarefa de ação da equipe de venda dos produtos. Os vendedores serão preparados para esclarecer e enfatizar todo o processo de fabricação das peças criando um vínculo do consumidor não só com o produto, mas também com seu sistema de produção sustentável e o consumo consciente. Além disso, etiquetas, tags, e embalagens explicativas colaboram para aumentar o vínculo afetivo entre o consumidor e o produto.
A composição dos modelos de tags a seguir, são explicativas, abordam a responsabilidade ambiental dos produtos e ao mesmo tempo são também instrutivas com orientações de uso a fim de valorizar a versatilidade na garantia de extensão de usabilidade.
  • Dessa forma, esse trabalho propôs superar o conceito de projeto de produto centralizado unicamente na produção de um bem físico enquanto propõe uma extensão que vai do produto ao serviço e deste ao sistema de comunicação à relação direta com a consumidora.
Assim, é possível tornar o produto em uso mais durável ao favorecer, uma relação afetiva entre o consumidor e o produto, e como ressalta Martins (2008), uma vez que ao estabelecer uma conexão emocional entre o produto e seu usuário, ele não será descartado tão facilmente, ampliando assim o ciclo de vida deste.
Dessa forma, Kazazian (2005, p. 44) aponta que “nele (produto) depositamos uma vivência; nós o carregamos de significação, lhe pedimos que conte uma história quando ele materializa para nós um sentimento, a lembrança de um instante. Ele nos acompanha enquanto nos dá a convicção íntima de que fizemos a melhor escolha. Provoca em nós um prazer de utilização que explica sua longevidade”.
Em seguida, ainda como forma de manter um relacionamento com o cliente e para sustentar o sistema proposto valer-se-á da estratégia de ofertar um sistema de reparos dentro da própria empresa e parcerias com alguma lavanderia a fim de oferecer a preços melhores e negociados a facilidade ao cliente em manter a qualidade dos produtos e contribuir para a durabilidade destes, aumentando seu ciclo de vida útil.
  • Finalmente, foram concebidas embalagens tornando-as objetos retornáveis e duráveis. O objetivo é incentivar as consumidoras a trazerem as embalagens fornecidas na primeira compra para que estas sejam reutilizadas nas suas próximas compras. Em troca de cada reuso, a concessão de facilidades na aquisição de novos produtos ou até mesmo maiores descontos para incentivar ainda mais a utilização do serviço de reparo oferecido pela empresa e das parcerias com as lavanderias citadas; além da redução do gasto com embalagens.
Outras considerações:
  • O presente trabalho potencializa instrumentos a serem usados pelo design que viabilizam a construção de um ciclo resultante em produtos de moda sustentáveis em prol do meio ambiente.
Em outra esfera, a presente proposta aponta idéias viáveis para serem trabalhadas em oficinas criativas no âmbito acadêmico nos cursos de Design de Moda, uma vez que o reaproveitamento de peças de segunda-mão oferece inúmeras possibilidades de interferências inusitadas que colaboram diretamente para o exercício de criatividade dos graduandos. Além disso, trabalhar com peças de brechós faz com que mais estudantes da área conheçam e valorizem estes estabelecimentos, uma vez que a busca por tecidos exclusivos torna-se relevante e incentivadora para composição de novas idéias e estilos de vida e de consumo.
  • Ao mesmo tempo, a proposta desse trabalho gera contribuição ao prolongar o ciclo de vida desses produtos de brechós e reduzir os impactos ambientais causados pelo descarte precoce ou incorreto desses produtos.
Por outro lado, a possibilidade de redução dos impactos ambientais a partir da abordagem de sistemas produto-serviço é algo ainda pouco conhecido e discutido no Brasil, tanto nos cursos de design quanto nas empresas, no entanto é uma abordagem facilmente aplicável passível de gerar bons resultados, aliando aos benefícios econômicos os ganhos sociais e ambientais.
  • Finalmente, trabalhar o consumo consciente significa valorizar as possibilidades de ação de cada consumidor, envolvendo este consumidor para a importância da sua conexão afetiva no momento da aquisição dos novos produtos que irá vestir, bem como a prática do consumo e vestir consciente, apontando assim a sua parcela na construção de um futuro mais sustentável.
Como ressalta Zanesco (2007)2 “vestir” é um verbo presente no cotidiano de cada um e é através desse ato que podemos construir uma sociedade mais consciente. “Cada vez que compramos uma peça de roupa usamos nosso poder de consumidor. Nele, devemos buscar o equilíbrio entre satisfação pessoal, preservação do planeta e o bem-estar social”.
  • Dessa forma, o Design de Moda demonstra possibilidades efetivas de ação com a possibilidade de ampliação do ciclo de vida dos seus produtos além de intervir de maneira eficaz em prol de um vestir consciente.

Um processo longo, delicado, artesanal, que rende verdadeiras peças de arte, 
tecidas para encantar nossos sentidos por muito, muito tempo. 
Um esforço que vale à pena, fibra por fibra.