segunda-feira, 14 de março de 2016

Sustentabilidade do Desenvolvimento no Brasil pós-Rio+20

Sala decorada com objetos reciclados

Fátima Mello e Ana Toni
Novembro de 2013
  • Ao longo da última década o Brasil e a América do Sul realizaram amplos processos de inclusão social de dezenas de milhões de pessoas, o que se tornou possível graças a um novo ciclo de governos progressistas que priorizaram o papel do Estado e a erradicação da pobreza, combinada com uma conjuntura internacional de forte alta no preço de commodities e de crescente demanda por matérias primas e recursos naturais abundantes no país e na região. 
A pobreza e as desigualdades foram reduzidas, embora a região e o Brasil sigam mantendo os maiores padrões de concentração de renda e riqueza no planeta. Ao mesmo tempo, o perfil do PIB e da pauta de exportações latino-americanas demonstra uma tendência à desindustrialização, crescente dependência do extrativismo (caracterizado pela exploração de minérios, petróleo, monocultivos intensivos e em larga escala, ou seja, exploração de grandes volumes de recursos naturais), reprimarização das economias da região e, portanto, de uma crescente dependência econômica e política do setor primário exportador para a manutenção das taxas de crescimento e, por conseguinte, dos programas de inclusão social. 
  • Este cenário tem levado amplos setores da opinião pública e inclusive forças no campo progressista a enxergarem uma falsa polarização entre a necessária prioridade a ser dada à manutenção dos programas de inclusão social por um lado e a sustentabilidade socioambiental do desenvolvimento por outro. 
Os argumentos correntes tendem a apresentar como inexorável a intensificação da exploração dos recursos naturais e do extrativismo como a única alternativa para a manutenção das conquistas sociais da última década. 
  • Este texto visa desmontar esta polarização e problematizar a trajetória do desenvolvimento brasileiro na última década do ponto de vista de sua insustentabilidade estrutural, econômica, social, política, ecológica, estratégica e de inserção internacional. 
Pretende demonstrar que a opção pela super exploração dos recursos naturais como aproveitamento da vantagem comparativa da região e marca de inserção dos países no mercado externo condena o país e a região a uma perigosa dependência de grupos rentistas nacionais e estrangeiros, e gera maior vulnerabilidade em relação a flutuação dos preços das commodities. 
  • No plano interno, este caminho leva a uma submissão aos interesses dos setores que concentram a propriedade da terra ou que dominam os recursos naturais, como minérios e petróleo, ao mesmo tempo em que nos setores extrativos gera pouco emprego e precariza o trabalho, perpetua desigualdades, concentra a renda da exploração e exportação ao mesmo tempo em que entrega para as maiorias os conflitos e injustiças sociais e ambientais. 
O modelo de desenvolvimento em curso baseado na exploração intensiva e ineficiente de uso de recursos naturais em breve chegará ao fim. Os limites de nossas reservas de recursos naturais minerais, florestais e petrolíferos, as futuras mudanças físicas, sociais, políticas e econômicas causadas pelas mudanças climáticas e a persistência das desigualdades demandam que o campo progressista reflita sobre o nosso modelo de desenvolvimento e se pergunte como queremos nos posicionar no futuro neste contexto e se e qual deve ser nossa posição quanto ao debate nacional e internacional sobre a sustentabilidade. 
  • Se hoje a agenda de sustentabilidade é ainda vista por muitos na sociedade brasileira como uma agenda supérflua ou conservadora, e por setores empresariais como oportunidade para elevarem a lucratividade de seus negócios, a eficiência no uso de recursos naturais, a diminuição da emissão de gases do efeito estufa, a diversificação da produção agrícola, a valorização dos sistemas de produção que mantém a floresta em pé, a preservação dos rios e da biodiversidade podem se tornar a chave da nossa competitividade econômica e da justiça social no futuro próximo.
No plano regional, a dinâmica de integração impulsionada pelo novo ciclo de governos progressistas e pós-neoliberais também é caracterizada por uma forte orientação voltada à exploração dos recursos naturais – em especial nos setores de mineração, petróleo e gás. Este arranjo pode constituir um obstáculo à consolidação de uma nova identidade regional e uma nova forma de inserção da região no sistema internacional, que tenha como base a vontade política constituída pelo ciclo pós-neoliberal inaugurado nos últimos anos. 
  • No plano multilateral, a realização em 2012 da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio+20) desafia os governos a se posicionarem sobre o tema e a estabelecerem compromissos de longo prazo, demandando que as organizações e movimentos sociais se engajem e disputem os rumos desta agenda, sob pena de verem a mesma ser capturada por interesses empresariais e privatistas. 
O texto visa, portanto, apresentar elementos que demonstrem que o ciclo de exploração intensiva dos recursos naturais como opção de inserção global do país e da região é insustentável e se esgotará. O campo progressista precisa reunir elementos de análise e de perspectivas de futuro de modo a poder incidir nos rumos desta agenda.

Brasil na encruzilhada: 
O modelo brasileiro e a agenda da sustentabilidade:
  • O Brasil tem muito a comemorar. A redução das desigualdades de renda e da pobreza é fruto não só de uma ação coordenada do governo na última década de garantir valores mínimos de renda aos mais pobres através de programas de transferência de renda como o Bolsa Família, mas principalmente devido a expansão econômica e a expansão do mercado de trabalho com a garantia de um patamar mínimo de remuneração através do aumento do salário mínimo.
Apesar destas importantes conquistas, a luta pela redução da desigualdade de renda está longe de estar concluída. Uma das maiores desigualdades que ainda enfrentamos são as desigualdades regionais, onde os embates e conflitos em torno da exploração de recursos naturais são maiores. 
  • A realidade de exclusão social é muito mais severa nas regiões Norte e Nordeste, de onde grande parte das commodities brasileiras para exportação são extraídas, do que nas regiões Sul e Sudeste.3 Apesar do modelo de desenvolvimento adotado pelos partidos progressistas no Brasil e na América Latina ter dado passos importantíssimos na redução de pobreza e desigualdade de renda, sabemos que ele fez pouco para superar as altas disparidades de riqueza regionais e de acesso a serviços públicos de qualidade, como educação, saúde, moradia e transporte. 
Sabemos também que o atual modelo de desenvolvimento criou um ciclo vicioso que faz com que as políticas sociais dependam direta ou indiretamente de um crescimento econômico baseado na exploração e exportação de recursos naturais e commodities, levando-as a estar cada vez mais dependentes da alta dos preços destes produtos no mercado externo. 
  • A vinculação dos futuros orçamentos da área de educação e saúde aos royalties do Pré-Sal é uma clara evidência disto. Algumas perguntas que temos que enfrentar são: Como podemos avançar nas mudanças sociais já em curso em um eventual contexto econômico global menos favorável à região? 
Deveríamos deixar os avanços sociais dependentes de um modelo de desenvolvimento pautado em fatores externos como o preço das commodities e recursos naturais no mercado externo? Recursos naturais: um dos mais importantes ativos brasileiros 
  • O Brasil tem a maior área de floresta protegida do mundo: 2,4 milhões de quilômetros quadrados, 28% do seu território ou 28.3% das florestas originais remanescentes do planeta. A biodiversidade brasileira é reconhecida mundialmente por sua riqueza extraordinária e contamos com 12% da água doce superficial no mundo .
No que se refere a energia, o Brasil sempre se apresenta como o grande campeão em termos de matriz energética limpa, desde que se considere a energia hidrelétrica enquanto tal, já que os impactos sociais, violações de direitos de populações tradicionais, massivos reassentamentos e desestruturação de dinâmicas territoriais e regionais levam muitos analistas a questionarem se as hidrelétricas devem ser incluídas no rol das energias limpas. 
  • O país continua sendo líder mundial na proporção do uso de fontes renováveis em sua matriz energética, com 47,3% de sua produção proveniente destas fontes (cana-de- -açúcar, hidrelétricas, lenha, carvão e outros), contra uma média mundial de 18,6%. 
Apesar de estar aumentando rapidamente, a contribuição do Brasil para o efeito estufa pela emissão de CO2 ainda é relativamente pequena, 1,4% pelo período de 2005 e 20085 . As mudanças na matriz energética brasileira vêm ocorrendo rapidamente e já há projeções de que nos próximos cinco anos ela passe a ser responsável por 40% de nossas emissões de carbono, acima das emissões relacionadas ao desmatamento ou agricultura. Hoje ela representa 32% do total das emissões brasileiras. 
  • O Brasil tem também um arcabouço institucional e legal e de políticas públicas na área de sustentabilidade avançado quando comparamos com outros países emergentes. Nossa Constituição assegura importantes direitos às populações tradicionais, determina que a proteção do meio ambiente recai sobre todos os entes federativos, estabelece a necessidade de licenciamento ambiental com a realização de estudos de impacto ambiental (também conhecido como EIA/RIMA) previamente à realização de empreendimentos, e possui um órgão federal fiscalizador com poderes concretos (IBAMA). 
Apesar da riqueza de nossos recursos naturais e de uma razoável legislação é necessário esmiuçar as enormes contradições do nosso modelo de desenvolvimento em relação à utilização destes recursos e, em particular, as mazelas que a visão de curto prazo adotada pode trazer para o país. 
  • Qualquer modelo econômico dependente da exploração intensiva de recursos naturais finitos é logicamente insustentável no médio e longo prazos. Apesar de ainda abundantes, estes valiosos ativos nacionais estão sendo explorados de maneira ineficiente, irracional e insustentável no médio e longo prazos. 
As terras, minérios, petróleo ou mesmo as águas doces dos rios brasileiros são recursos escassos e economicamente deveriam ser tratados como tal. O presente modelo de desenvolvimento parece ignorar a necessidade de um plano que assegure nossa competitividade no futuro próximo quando estes recursos terminarem ou considerando possíveis novos mercados que poderiam valorizar ainda mais nossos ativos naturais. 
  • Um modelo de desenvolvimento realmente inclusivo e sustentável no médio e longo prazos deve se calcar na premissa de que estes recursos naturais, embora disponíveis, não devem ser usados até a exaustão, sob a pena de reproduzir a lógica colonialista adotada no passado que esgotou tantos recursos na região e em outros continentes. 
Pensar um modelo de desenvolvimento que não dependa tanto destes recursos, mas sim de outros tipos de atividades econômicas menos intensivas em recursos naturais e concentradoras de renda deveria estar na pauta de todos aqueles que desejam combater a manutenção dos elevados níveis de desigualdade ainda característicos no país e na América Latina. 
  • Apesar de nossos grandes ativos naturais e ambientais, as escolhas que fazemos hoje em relação a nossa política industrial e energética estão nos aprisionando num modelo de desenvolvimento arcaico e não competitivo num cenário de uma economia global de baixo carbono. 
Um exemplo claro neste sentido é a política de incentivos fiscais à aquisição de automóveis no Brasil, que vem resultando em graves problemas de mobilidade para as cidades brasileiras e em aumento das emissões de gases de efeito estufa deste setor no Brasil. 
  • Devemos também questionar a justificativa comumente adotada de que a exploração intensiva de nossos recursos naturais no curto prazo é essencial para suprir necessidades sociais e econômicas imediatas. Infelizmente, a verdade é que a insustentabilidade ambiental do modelo desenvolvimentista brasileiro caminha de mãos dadas com a reprodução das desigualdades no Brasil, pois o mesmo favorece a acumulação de capital daqueles que possuem recursos naturais e não a distribuição da riqueza oriunda de sua exploração entre toda a população. Explorar estas contradições é fundamental para que possamos ultrapassar a polarização do debate social e ambiental no campo progressista. 
Segundo Guilherme Delgado, “dada a atual configuração da inserção do Brasil no comércio mundial, os recursos naturais passaram a figurar como vetor principal de competitividade externa. O pressuposto dessa competitividade, baseada em estoques finitos de recursos naturais, é preocupante por varias razões. 
  • As matérias-primas aí produzidas apresentam baixa agregação de trabalho humano; há forte pressão por super exploração dos recursos naturais em curto prazo; e a inovação técnica de ponta do sistema industrial fica relativamente relegada ao segundo plano, (exceto no caso do Petróleo – Pré-sal), porque os ganhos de produtividade do subsistema exportador estão muito mais ligados às chamadas vantagens comparativas naturais. Temos uma armadilha grave nesse quadro estratégico. 
Competitividade externa de “commodities” agrícolas e minerais, apoiada no argumento da produtividade da terra e das jazidas minerais disponíveis, sustenta um fluxo de transações correntes com o exterior dependente de capital estrangeiro. A resultante inevitável é super exploração de jazidas e terras novas e também intensificação do pacote técnico agroquímico nas zonas já exploradas, para obter maior fatia do mercado externo de produtos primários. Esse arranjo não é sustentável, em médio prazo, econômica e ecologicamente. 
  • Os tais ganhos de produtividade das exportações de minerais, petróleo, carnes, grãos, etanol etc., deixados a critério estritamente mercantil, tendem a se extinguir no tempo com a dilapidação paulatina dos recursos naturais não renováveis. 
Por outro lado, o perfil distributivo deste modelo não é menos perverso. Os ganhos de produtividade na fase expansiva das “commodities” viram renda da terra e do capital, capturadas privadamente pelos proprietários das terras, das jazidas e do capital; mas os custos sociais e ambientais da super exploração desses recursos e do trabalho precarizado aí envolvido são da sociedade como um todo. 
  • Compensações se tornam necessárias, mas não seriam remédio suficiente para suprir os custos sociais degradantes do trabalho e do meio ambiente. Este quadro econômico de produção e repartição do excedente econômico não se compraz com democracia política e social. 
Não está claro que o governo atual tenha clareza de sua não sustentabilidade em médio prazo. O sistema tributário e a política social provavelmente teriam que extrair e redistribuir uma parcela muito grande da renda da terra e do capital para suprir necessidades básicas; e ainda que o fizesse não resolveria o problema de fundo. 
  • Mas como fazê-lo se esse sistema estiver sob controle político dos donos da riqueza fundiária?” 6 . É importante notar que o contexto internacional de forte alta no preço de commodities permitiu que os amplos programas de inclusão social, elevação do valor do salário mínimo e redução nos índices de desigualdades pudessem ocorrer sem perdas para os setores que mais concentram renda. 
Ao contrário, ganharam: dados da PNAD 20127 demonstram que o ganho de renda do trabalho foi mais forte entre os 1% do topo da pirâmide. Apenas 93 mil pessoas concentram 12,5% de toda a renda do trabalho no Brasil. Os dados mostram também uma desaceleração do ritmo de queda da desigualdade. 
  • Ou seja, o Brasil segue sendo extremamente desigual e o enfrentamento da desigualdade em um contexto internacional desfavorável a um modelo dependente da exploração intensiva dos recursos naturais talvez abra a possibilidade de se incluir na agenda a necessidade de perdas aos que se situam no topo da pirâmide. Mudanças climáticas e energia: diagnóstico e políticas públicas no Brasil 
O discurso comum sobre desenvolvimento sustentável no Brasil é conceitualmente baseado em três pilares: crescimento econômico, inclusão social e proteção ao meio-ambiente. No entanto, a importância dada ao pilar ambiental é substancialmente limitada em relação aos eixos econômico e social. Isso se deve à percepção de que este está a serviço dos demais pilares, sendo instrumental ao crescimento econômico e/ou à inclusão social. 
  • Em outras palavras, sempre que as mudanças climáticas e a proteção ambiental são vistas como em contradição com as outras duas dimensões do desenvolvimento sustentável, estas terminam sendo “sacrificadas” a serviço das outras supostamente mais importantes e urgentes prioridades nacionais. Os últimos anos têm sido marcados por um processo de mudança na composição do perfil de emissões de gases de efeito estufa no Brasil. 
O declínio das emissões decorrentes do desmatamento, a expansão econômica que vem acarretando o rápido crescimento na demanda por energia e expansão da atividade agropecuária, aliados a não adoção de padrões sustentáveis na produção agrícola são fatores que impactaram o perfil das emissões de gases de efeito estufa brasileiro. 
  • Dados recentes, publicados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCT)8 evidenciam que enquanto em 2005 a agricultura e o uso da terra/desmatamento eram responsáveis por 20% e 57%9 das emissões de gases de efeito estufa, respectivamente, o agronegócio em 2010 superou o desmatamento e geração de energia na emissão de gases. 
Esse fato é explicado tanto pelo significativo declínio no desmatamento nos últimos anos que deve ser comemorado, como em função do aumento substancial das emissões de carbono em virtude da expansão do agronegócio. 
  • O poder político deste setor não é apenas imenso em função de sua importância econômica para o país (respondendo por mais de 40% das exportações brasileiras e em franco crescimento), como também em razão de sua histórica hegemonia como latifundiários e representantes das elites políticas dominantes. 
Assim, além da dependência do governo em relação ao agronegócio ser tanto política como econômica, eles representam o conceito do “Brasil que realizou”, ou seja, seriam modernos e competitivos e, portanto, celebrados e protegidos por serem considerados campeões do “novo” Brasil. 
  • Os dados do MCT sobre emissão de carbono mostram que o agronegócio se tornou o maior emissor de carbono no Brasil, representando 35% de todas as emissões do país. É crucial e urgente que seja dada prioridade e colocados esforços na redução das emissões deste setor que está em grande expansão. 
Nossa agro-industria é uma das mais poluidoras do mundo e a que mais emite CO2 na atmosfera. O próprio governo já percebeu que terá que mudar e por isto lançou recentemente o Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono)10 que tem como objetivo dar incentivos ao agronegócio para diminuir suas emissões de carbono.
  • Há que se comemorar que os índices de desmatamento tenham sido substancialmente reduzidos na última década; porém o desmatamento na Amazônia brasileira ainda é um grande problema nacional e uma importante fonte de emissões de carbono, representando mais de 22% das emissões decorrentes da destruição das florestas e uso da terra. 
O desmatamento em pequena escala ainda é significativo e embora tenham sido implantadas políticas efetivas no combate ao desmatamento, esta questão deve continuar sendo priorizada pelo governo brasileiro e pela sociedade civil, porque os índices de desmatamento ainda são elevados. 
  • Com relação à matriz energética, o Brasil mantém um equilíbrio entre fontes renováveis (44%) e não renováveis (56%). Fontes renováveis incluem hidrelétricas (15%), biomassa de cana de açúcar (16%) e carvão e lenha (10%). Entre as fontes não renováveis estão petróleo e derivados (39%), gás natural (10%), carvão mineral (6%) e urânio (1,5%). A matriz brasileira ainda é vista como limpa e entre as mais renováveis do mundo. Contudo, o crescimento na participação do setor energético nas emissões de carbono no país cresceu enormemente de 16% em 2005 para 32% em 2010. 
Fica claro que nos últimos anos o Brasil não investiu no uso mais eficiente de energia nem numa matriz energética limpa. Fica cada vez mais difícil o Brasil sustentar sua posição internacional de ter uma matriz energética limpa, como a perspectiva é de que a participação de fontes não renováveis continue crescendo, sobretudo com a exploração do Pré-Sal. 
  • Conforme foi mencionado acima os problemas relacionados com a construção de grandes hidrelétricas em terras indígenas e de outras populações tradicionais, como Belo Monte, também são ignorados quando se considera que a matriz brasileira é “limpa”.
O governo brasileiro não tem colocado muito esforço no apoio ao desenvolvimento de fontes alternativas de energias renováveis como eólica, biomassa e energia solar. Esta afirmação é particularmente verdadeira se for levado em conta o imenso potencial que o país possui na exploração destas fontes de energia. 
  • O governo vem sinalizando que pretende fazer uso progressivo de termoelétricas para complementar a geração de energia hidrelétrica. As perspectivas de aumento substancial na produção de petróleo na região do Pré-Sal levam a crer que as emissões de carbono no Brasil deverão mudar dramaticamente tanto em termos do perfil como em volume das emissões. 
A tendência é que as emissões não só aumentem substancialmente, como deixem de ser cada vez menos decorrentes do desmatamento para passar a derivar da geração de energia e do agronegócio. Em outras palavras, as fontes renováveis de energia não têm sido a prioridade do governo até agora. Historicamente, o grande ator nos debates sobre mudanças climáticas no Brasil tem sido o governo federal. 
  • O Ministério da Ciência e Tecnologia liderou esta agenda nos primeiros anos de debate sobre o tema. Apenas durante o governo Lula (2003-2010) o Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) assumiu o protagonismo no que diz respeito a este assunto. 
Desde então, as decisões e posicionamentos acerca das políticas globais sobre mudanças climáticas têm sido calcadas na política externa brasileira. Nem sempre elas refletem o equilíbrio de poder entre os diferentes setores da sociedade brasileira. Em 2009 o Brasil aprovou a Política Nacional sobre Mudança do Clima - PNMC (Lei 12.187/09). 
  • A aprovação desta lei foi vista como um ato de vanguarda pela comunidade internacional, pois ela estabeleceu uma meta voluntária de redução das emissões de carbono entre 36.1% e 38.9% até 2012. 
A lei também estabelece princípios, objetivos e diretrizes para a implantação da Política, além de prever a elaboração de dez planos setoriais para redução das emissões de gases de efeito estufa, entre eles: 
(a) o Plano Setorial de Mitigação e Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura, também conhecido como o “Plano ABC”;
(b) o Plano de prevenção e controle do desmatamento na Amazônia Legal; o Plano Decenal de Energia;
(c) Plano Setorial de Transporte e de Mobilidade Urbana para Mitigação da Mudança do Clima;
(d) Plano Setorial da Saúde para Mitigação e Adaptação à Mudança do Clima, dentre outros. 
Após a aprovação do novo Código Florestal em 2012, os próximos marcos legais que estão indiretamente relacionados às mudanças climáticas e que, se aprovados, afetarão negativamente o meio ambiente brasileiro são o novo Código de Mineração e a PEC 215. O Código de Minera- ção, atualmente em discussão dentro do governo e no Congresso Nacional, está previsto para ser votado nos próximos meses. 
  • O projeto de lei em questão visa ampliar as possibilidades de exploração dos recursos naturais minerais, aumentar o volume de recursos públicos estaduais decorrentes dos royalties da mineração e restringir os direitos das comunidades indígenas afetadas em opinar nas consultas relativas à exploração destes recursos em suas terras. 
A Proposta de Emenda Constitucional, PEC 215, propõe a transferência do poder decisório do Executivo Federal para o Congresso com relação à demarcação de terras indígenas, a titulação e direito sobre a terra pelas comunidades quilombolas e a criação de Unidades de Conservação Florestal. 
  • Esta proposta é interpretada pelos defensores dos direitos das populações tradicionais como uma estratégia para paralisar novos processos de demarcação de terras e ampliar ainda mais o poder dos grandes latifundiários. Este cenário revela que o modelo de desenvolvimento em curso possui méritos, em especial em relação a inclusão social, porém também traz contradições, principalmente com sua visão de curto prazo que se observa no país e também na região. 
Nossa inserção internacional reforça este modelo. Nossas escolhas no curto prazo podem nos levar ao aprisionamento de médio e longo prazos a um modelo de desenvolvimento insustentável ecologicamente, economicamente, socialmente e politicamente. Por isto é fundamental que o campo progressista se aproprie do debate sobre a sustentabilidade e formule alternativas de longo prazo viáveis para a população brasileira e latino-americana.
  • Perspectivas e bloqueios ao projeto de região A primeira década dos anos 2000 foi marcada por decisivas transformações políticas na América Sul que resultaram em um impulso a um novo regionalismo. 
Até 2003 a região encontrava-se prisioneira dos planos dos EUA de estender o NAFTA (North American Free Trade Agreement) por meio da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) para o restante do continente. Uma inflexão decisiva passou a ser feita a partir daquele ano, quando um conjunto de países sul-americanos passou a atuar de forma coordenada a favor do esvaziamento das negociações para a criação da ALCA. 
  • Ao mesmo tempo em que a região reduzia o peso do projeto dos EUA em sua agenda, os norte-americanos passaram a dar forte prioridade em sua política externa à chamada “Guerra ao Terror”. Este contexto contribuiu para a ampliação do espaço necessário ao fortalecimento da concertação política regional. 
A região criou novas instâncias, e ampliou e tentou dar novo sentido à institucionalidade criada no período anterior. A Unasul (União de Nações Sul-Americanas) avançou, o Mercosul adotou novas pautas e diretrizes, como a ampliação do FOCEM (Fundo Para a Convergência Estrutural do Mercosul), o fortalecimento da dimensão social e a inclusão de novos membros. Mais recentemente a CELAC (Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos) foi criada. 
  • Uma nova vontade política passou a vigorar, inaugurando uma identidade baseada em um sentido renovado para a integração regional e no chamado pós-neoliberalismo. Este novo ciclo, entretanto, apresenta bloqueios estruturais e limitada perspectiva de futuro. 
Ele combina duas frentes: crescimento econômico, redução das taxas de desemprego e amplos programas de inclusão social em diversos países, e ao mesmo tempo, forte intensificação da exploração dos recursos naturais – em especial nos setores de energia e mineração - favorecida pela demanda da China por matérias primas abundantes na região. 
  • Este modelo traz riscos tanto do ponto de vista do padrão de desenvolvimento adotado e de inserção internacional como também para a consolidação da concertação política regional e do novo regionalismo. 
A opção pela super exploração dos recursos naturais estimulada pela demanda chinesa por matérias primas está pressionando a região a vivenciar um race to the bottom em direção à flexibilização e rebaixamento da legislação sobre padrões de regulação socioambiental e de direitos de trabalhadores e de populações e comunidades tradicionais.
  • A falta de diálogo sobre os instrumentos normativos, legais e econômicos que possam vir a promover uma agenda regional de sustentabilidade pode levar em breve a uma competição injusta dentro da própria região. Isso já está ocorrendo, por exemplo, com empresas brasileiras que estão cruzando fronteiras e transferindo suas operações para países vizinhos a fim de evitar padrões mais altos de legislação de proteção social, trabalhista e ambiental e de se beneficiar de salários mais baixos. 
Outro exemplo é a priorização à importação de produtos chineses aos brasileiros pela Argentina, o que é ilustrativo de uma ação desfavorável à integração regional. O fator China está levando os países da região a responderem a demanda daquele país de forma individual e sem tentativa de coordenação que possa apontar alternativas coletivas como região. 
  • Eduardo Gudynas faz uma importante diferenciação entre o extrativismo adotado por governos conservadores da região, cuja marca é a associação com empresas multinacionais e a ausência de esquemas de redistribuição da renda, e o extrativismo levado a cabo por governos progressistas – que garantem ao Estado um papel chave na captação e redistribuição da renda da exploração extrativa (em alguns casos realizam inclusive nacionalizações), convertendo-a em importante fonte de financiamento de programas de combate a pobreza. 
Nestes países, portanto, a associação dos programas de inclusão social com a intensificação da exploração dos recursos naturais acaba se constituindo em forte base de legitimação das atividades extrativas, deixando os programas sociais reféns de um modelo extrativista que depende da exportação de matéria prima e da alta dos preços no mercado externo.
  • Os riscos da opção por um padrão de desenvolvimento fortemente ancorado na exploração dos recursos naturais há muito são conhecidos. O pensamento cepalino dedicou-se a analisá-los. Celso Furtado escreveu sobre o caso da Venezuela em “Subdesenvolvimento com Abundância de Divisas”, de 1947. 
Na atualidade o caso da Venezuela nos ensina que na última década o país fez uma distribuição muito significativa da renda do petróleo (tendo atingido em 2012 o menor índice de desigualdades na região), sem ter contudo alterado a persistente dependência que tem deste recurso em sua economia. 
  • A chamada maldição dos recursos naturais e do petróleo é avaliada como risco de que a abundância de recursos naturais possa ter um efeito adverso sobre o desenvolvimento, produzindo consequências negativas sobre a produtividade da economia, a deterioração dos termos de troca e especialização em bens primários intensivos em recursos naturais nos países subdesenvolvidos. 
Apesar da retórica de diversos países sobre a importância de se usar as oportunidades de exploração dos recursos naturais para fomentar inovação e novas tecnologias, este fenômeno vem estimulando na América Latina um processo de desindustrialização precoce, que ocorre quando há perda de participação do setor industrial na economia, antes mesmo do país ter alcançado um nível de desenvolvimento econômico em que a produção industrial ultrapassa a produção de bens primários em relação ao PIB. 
  • O que tem acontecido é que “pulamos etapas” e o deslocamento da mão de obra vem se dando diretamente do setor primário para o setor de serviços de baixo valor agregado, perpetuando o problema da exclusão social do campo na cidade. 
Na mesma linha recentemente Joseph Stiglitz escreveu sobre a maldição dos recursos naturais em países da África: “Os recursos naturais serão uma bênção que trará prosperidade e esperança ou uma maldição política e econômica, como tem sido o caso em tantas nações? Países ricos em recursos têm tido pior desempenho do que os carentes. Têm crescido mais vagarosamente e com maior desigualdade. 
  • A infraestrutura (rodovias, estradas de ferro e portos) foi construída com apenas um objetivo em mente: tirar os recursos do país ao menor preço possível, sem qualquer esforço para processá-los no lugar de origem, muito menos para desenvolver indústrias locais. 
Stiglitz, Joseph – “A ‘maldição’ dos recursos naturais”, O Globo, 20/08/2012. baseadas neles.” As evidências parecem indicar que a demanda da China por matérias primas tende a levar a América Latina e a África a adotarem padrões semelhantes no que se refere a tendência a primarização de suas exportações. Isso é precisamente o que está ocorrendo em nossa região. 
Os gráficos a seguir demonstram a forte tendência à elevação dos produtos oriundos de atividades extrativas minerais e agrícolas no volume exportado pela região; e a forte participação de produtos de baixa intensidade tecnológica – matérias primas e manufaturas baseadas em recursos naturais – nestas exportações.
  • Do ponto de vista dos desafios que este cenário coloca ao novo regionalismo, Marcelo Saguier argumenta que a integração guiada pelo modelo extrativista e pela intensiva exploração dos recursos naturais tem produzido bloqueios à coordenação política regional, à legitimidade do novo regionalismo junto a amplos setores dos movimentos sociais, e em especial a possibilidade de construção de uma perspectiva de transformação estrutural da região. 
A multiplicação de conflitos socioambientais e territoriais indica que a distribuição dos benefícios do extrativismo é muito assimétrica e é cada vez mais questionada por diversos setores sociais. Somado a isso as instâncias democráticas de governança do novo regionalismo não têm aberto espaço ao processamento de tais conflitos, fazendo com que as importantes conquistas no campo da participação social alcançadas no novo regionalismo não se traduzam na prática em espaços substantivos de processamento dos interesses e visões em conflito. Este cenário aponta portanto importantes limites inerentes ao ciclo construído na última década.

Sustentabilidade do Desenvolvimento no Brasil pós-Rio+20

Rio+20 e a trajetória multilateral: 
De formação da agenda de desenvolvimento pós-2015 a)
  • O Brasil e a agenda da sustentabilidade no âmbito multilateral O Brasil tem sido um ator central na trajetória de constituição de regimes e outros arranjos multilaterais relacionados à sustentabilidade. 
O país foi anfitrião da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Rio 92) – que aprovou tratados e convenções estruturantes para o sistema multilateral na agenda do desenvolvimento sustentável – e vinte anos depois sediou a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), cujos resultados foram o documento final “O Futuro que Queremos” e o estabelecimento de um processo que leva à definição dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – importante agenda que substituirá os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio a partir da ancoragem na chamada Agenda de Desenvolvimento Pós-2015. 
  • Ou seja, apesar das críticas de que a Rio+20 não teria gerado resultados, ela foi capaz de definir o processo que norteará o tema da sustentabilidade nas negociações multilaterais nos próximos anos. Na Rio+20, o Brasil apresentou uma posição inovadora em relação a um dos temas centrais da agenda – Economia Verde – propondo a abordagem dos três pilares.
Crescer- Incluir- Proteger (ou seja, o econômico/social/ambiental) que define o conceito de desenvolvimento sustentável para o país - e que se desdobrou, no caso da agenda da Rio+20, na tese da Economia Verde Inclusiva - e que tem sido a tônica da posição brasileira nos fóruns multilaterais sobre sustentabilidade. Apesar desta importante vitória diplomática, o Brasil não tem claro o que na prática é, ou propõe que seja, a economia verde e inclusiva, e como isto redireciona seu modelo de desenvolvimento. 
  • O Brasil também tem tido um importante papel em outros espaços multilaterais relacionados à sustentabilidade, como é o caso das negociações sobre mudanças climáticas no âmbito da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (sigla em inglês UNFCCC). 
Na COP 15, em especial, frente à incapacidade e/ou falta de vontade política de liderança por parte das potências tradicionais, o Brasil adotou postura pró-ativa, apresentou metas de redução de suas emissões voluntárias com o objetivo de tirar o processo negociador do estado de impasse no qual se encontrava. 
  • O enfraquecimento do Protocolo de Kyoto e a falta de metas para a redução de emissão de carbono pós-2015 podem não só enfraquecer o multilateralismo, mas também e principalmente afetar de maneira negativa a economia mundial. 
É importante ressaltar que de acordo com o último relatório do IPPC o Brasil, depois das regiões dos polos, foi o país mais foi afetado pelas mudanças climáticas. Neste sentido é importantíssimo para o Brasil, não só por questões de política externa, mas para sua sustentabilidade ambiental e econômica, encontrar maneiras de garantir um acordo eficaz nas negociações climáticas das Nações Unidas. 
  • Apesar de um consenso quase absoluto sobre a necessidade de todos os países, desenvolvidos e em desenvolvimento, caminharem para uma economia de baixo carbono há, entre os muitos impasses, duas grandes questões em jogo: 
  1. Como tratar as chamadas “responsabilidades comuns, porém diferenciadas” dos países em relação as mudanças climáticas? Como estabelecer as metas de cada país? Com base no perfil de emissões históricas, de emissões per capita ou de emissões por dólar gerado, ou uma combinação destes? 
  2. Quem e como se paga pela transição para uma economia de baixo carbono? Até o momento a posição brasileira, em conjunto com outros países em desenvolvimento, vem defendendo o critério da medição histórica, mas ainda estão considerando as vantagens e desvantagens de outras opções. 
Como o relatório evidencia, os efeitos das mudanças climáticas afetarão nossas regiões mais pobres e vulneráveis, aumentando as secas no Nordeste e elevando a intensidade das chuvas e inundações no Sul e Sudeste. Os níveis de produção agrícola brasileira também poderão ser substancialmente afetados, conforme mostra o mesmo relatório. 
  • Neste sentido, incluir a reflexão sobre como o modelo de desenvolvimento brasileiro está preparado para lidar com estas questões é fundamental não somente do ponto de vista da sustentabilidade econômica do modelo de crescimento baseado em exploração de recursos naturais, como no que diz respeito aos efeitos políticos e sociais que vêm se colocando em virtude dos efeitos negativos de eventos naturais extremos como secas e inundações. 
Apesar de muitos dos esforços brasileiros e da região estarem concentrados na mitigação das emissões de carbono - que se traduzem na grande vitória brasileira na diminuição de emissões de carbono decorrente da política de redução dos desmatamentos e o recente plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono) que visa adequar nossa agricultura à economia de baixo carbono - é fundamental que também tenhamos políticas robustas de adaptação, cujo custo envolvido é muito inferior ao custo de remediar os danos após eventuais catástrofes ambientais.
  • Embora o Brasil se apresente como um ator de peso na agenda da sustentabilidade no sistema multilateral, são frequentes as críticas sobre a inconsistência ou incompatibilidade entre as posições do país nos fóruns de caráter normativo e o comportamento observado em instâncias onde os interesses econômicos, financeiros e estratégicos do país estão em jogo. 
As posições negociadoras na OMC, por exemplo, são pautadas pela visão dominante entre os países emergentes de que a agenda ambiental seria meramente um artifício protecionista dos países do Norte contra as exportações agrícolas brasileiras. 
  • Já em coalizões como o G20 e os BRICS o Brasil se posiciona pelo bloqueio da pauta e por evitar a abordagem da sustentabilidade. Uma evidência disso é a ausência de qualquer proposta de inclusão da sustentabilidade entre as iniciativas dos BRICS. 
O Brasil e demais membros do bloco, exceto a China, parecem se sentir confortáveis com a adoção de uma postura defensiva que não os coloque frente a compromissos que possam limitar seus objetivos de perseguir altas taxas de crescimento econômico. 
  • O caso da China é interessante e merece ser estudado com mais profundidade, pois o país vem desenvolvendo mecanismos de inclusão da sustentabilidade em suas políticas públicas sem que isso imponha limitações a suas metas de crescimento econômico. 
Outra evidência no âmbito dos BRICS é a insustentabilidade estrutural das relações comerciais entre Brasil e China, que são condizentes com a opção pela especialização primária das exportações brasileiras. 
  • Segundo Marcio Pochmann“as relações comerciais Brasil-China, entre 2000 e 2010, tiveram crescimento superior à elevação do comércio entre o Brasil e o mundo. Entre 2000 e 2010, as exportações brasileiras para a China elevaram-se de US$ 1,1 bilhão – 2% do total das exportações do Brasil – para US$ 30,8 bilhões – 15% do total, ao passo que as importações brasileiras da China cresceram de US$ 1,2 bilhão – 2% do total – para U$ 25,6 bilhões – 14% do total. Ao longo desse período, o saldo foi positivo para o Brasil em seis anos. (...) Todavia, a pauta de exportações brasileiras vem se concentrando em produtos básicos. 
Entre 2000 e 2009, os produtos básicos passaram de 68% para 83% da pauta. Os produtos que apresentaram a maior participação nas exportações, em 2010, foram minérios (40%), oleaginosas (23%) e combustíveis minerais (13%), que juntos responderam por 76% das exportações brasileiras.” Em outras palavras, a dependência do Brasil em relação às demandas de produtos primá- rios daquele país é tão grande que a eventual perda dos mercados chineses pode comprometer seriamente a estratégia de crescimento brasileiro. 
  • Por fim, como é apontado por muitos quando se coteja as posições externas brasileiras nos fóruns normativos multilaterais, há grande inconsistência da posição do Brasil ao querer ser reconhecido como um líder internacional na agenda da sustentabilidade, mas que continua bloqueando ou sendo pouco propositivo em buscar soluções de como avançar na agenda multilateral nos temas de sustentabilidade. 
Sem uma consistência maior das políticas nacionais de sustentabilidade, o Brasil dificilmente conseguirá manter sua liderança internacional. Mais do que o tamanho de nossa economia ou nosso arsenal bélico, o protagonismo e autonomia internacional brasileira dependem dos nossos ativos de recursos naturais e sociais, nossos mais valiosos ativos e que precisam ser preservados.

O processo de construção da Agenda: 
De Desenvolvimento pós-2015
  • Frente a este cenário há que se perguntar se a trajetória de constituição da agenda multilateral sobre o desenvolvimento sustentável pode ou não contribuir para reforçar compromissos dos países com uma perspectiva de futuro ancorada na transição para a sustentabilidade e a economia de baixo carbono. 
A Conferência Rio+20 estabeleceu em seu documento final “O Futuro Que Queremos” que em 2015 os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs) serão sucedidos pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs). Diferentemente dos ODMs, os ODSs serão compromissos não só de países em desenvolvimento, mas também de países desenvolvidos. Para tal o documento final apontou a criação de duas instâncias: 
  • O Painel de Alto Nível Sobre a Agenda de Desenvolvimento Pós-2015, criado em julho de 2012 pelo Secretário Geral da ONU Ban Ki-moon. O Painel substitui a Comissão das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (CSD), que concluiu seus trabalhos desenvolvidos ao longo dos últimos vinte anos. O Painel possui 27 membros, entre eles a Ministra brasileira do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. Estão previstas reuniões dos chefes de Estado e de governo a cada quatro anos e reuniões ministeriais anuais com o apoio do ECOSOC. O painel assessorará o Secretário Geral da ONU sobre como os ODSs se relacionarão com a agenda mais ampla do desenvolvimento pós-2015. 
  • O Grupo Aberto de Trabalho Intergovernamental sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, cuja atribuição é elaborar uma proposta de ODSs, que por sua vez entrarão em vigor em 2015, no lugar dos ODMs. Alguns avaliam que esta foi uma saída encontrada para o fracasso no cumprimento dos ODMs cujo prazo expira em 2015. Um rascunho dos ODSs foi apresentado em maio de 2013, a saber: 
  1. Fim da pobreza extrema e da fome; 
  2. Alcançar o desenvolvimento global; 
  3. Garantir aprendizado eficaz às crianças e jovens; 
  4. Alcançar a igualdade de gêneros, inclusão social e direitos humanos; 
  5. Alcançar o bem-estar e garantir a saúde em todas as idades; 
  6. Melhorar os sistemas agrícolas e aumentar a prosperidade rural; 
  7.  Capacitar as cidades, tornando-as inclusivas, produtivas e resistentes; 
  8. Controlar as mudanças climáticas e garantir energia limpa a todos; 
  9. Assegurar serviços ambientais, biodiversidade e bom gerenciamento dos recursos naturais e 
  10. Transformar a governança para o desenvolvimento sustentável. 
Adicionalmente a ONU também desencadeou um processo de consultas nacionais e globais visando subsidiar a montagem da Agenda de Desenvolvimento Pós-2015. Está prevista a realização de uma cúpula em 2015 para adoção do conjunto de metas. 
  • Este processo toma como base o frágil documento “O Futuro Que Queremos”, criticado por muitos analistas por não ter a força necessária para alavancar uma nova vontade política. Por outro lado tem alguns méritos como a afirmação sobre a necessidade de indicadores de desenvolvimento mais amplos do que o PIB. No entanto, a erradicação da pobreza é a narrativa principal, deixando-se de lado o desafio da distribuição da riqueza e os problemas estruturais que asseguram a reprodução das desigualdades sociais, econômicas e de acesso a recursos naturais. 
Em sua abordagem sobre a governança global necessária ao desenvolvimento sustentável, o documento enfatiza a importância da participação dos atores não- -governamentais e o papel do setor privado como motor de inovação e geração de riqueza. Há ainda muita controvérsia e desconhecimento quanto ao que chamamos de Economia Verde, que foi uma das principais propostas da conferência oficial. 
  • De um lado do debate e apoiada principalmente pelos países europeus a ideia de que a economia mundial pode e deve seguir perseguindo altas taxas de crescimento, agora financiada por novas tecnologias ancoradas na eco-eficiência e em processos produtivos com baixa emissão de carbono.
A tese do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) mantém intocada toda a dinâmica do atual modelo, reiterando a manutenção dos atuais padrões de produção e consumo desde que sejam convertidos de tecnologias “marrons” em “verdes”. 
  • Não trata as crescentes desigualdades sociais, econômicas e de acesso aos recursos naturais vigentes no mundo. Este posicionamento foi objeto de forte crítica em especial pelos países em desenvolvimento, que viram na proposta a iminência de terem que pagar a conta da transição para as novas tecnologias “verdes” sob o risco de serem penalizados com medidas protecionistas e punitivas às suas exportações. 
Do outro lado da controvérsia, mas também contra a chamada Economia Verde, estão as empresas “sujas” e que exploram recursos naturais, como a agricultura extensiva, as mineradoras, as siderúrgicas, e as grandes empresas de energia. 
  • Estas empresas normalmente dependem de grandes subsídios públicos e não querem ter que incorporar os custos socioambientais de suas operações ou ter o recebimento de subsídios públicos vinculado a condicionantes socioambientais. Infelizmente o debate sobre a incorporação de custos socioambientais, inicialmente presente nas discussões de economia sustentável, foi totalmente sequestrado pelos interesses privados tanto dos países do Norte como das elites do Sul. 
Voltar a este debate podendo identificar as armadilhas de interesses privados e as necessidades de interesse público e comum é vital e, para isto, precisamos nos preparar para um debate onde as questões de equidade e sustentabilidade sejam priorizadas. 
  • A sustentabilidade é indissociável da luta contra as desigualdades “Temos uma configuração estrutural e macroeconômica voltada prioritariamente para a otimização das carteiras de ativos do setor financeiro e do setor exportador de commodities. 
Dado o enorme peso econômico e político desses setores, as decisões governamentais perdem autonomia e consolidam a complementaridade de nossa pauta “commoditizada” de exportações com a dos asiáticos, focada, sabiamente, em produtos de muito maior valor agregado. Trata-se do caminho politicamente mais fácil para garantir, no curto prazo, a governabilidade e adiar para um eterno longo prazo, o futuro como país desenvolvido.”.
  • Diante de um cenário de fortes desigualdades na apropriação da renda da exploração dos recursos naturais, a luta pela sustentabilidade é antes de tudo uma luta contra as desigualdades que são a principal marca da sociedade brasileira. 
Estas desigualdades estão presentes em diversos setores, apresentando para o campo progressista uma potencial agenda de atuação: 
O cenário relacionado a segurança alimentar e nutricional e a questão da terra é revelador das desigualdades no uso e apropriação dos recursos naturais Guilherme Delgado define o agronegócio como “associação do grande capital agroindustrial com a grande propriedade fundiária. Essa associação realiza uma estratégia econômica de capital financeiro, perseguindo o lucro e a renda da terra, sob patrocínio de políticas de Estado.”.
Por outro lado os dados evidenciam que a agricultura familiar e camponesa produz grande parte dos alimentos, gera muito mais empregos, utilizando menos terras e tendo muito menos acesso a crédito do que o agronegócio.
  • Os dados revelam que embora na última década o apoio para a agricultura familiar e camponesa tenha aumentado, ele continua em patamares muito inferiores aos do recebido pelo agronegócio: “Durante esse período houve um crescimento significativo no financiamento da agricultura familiar (como veremos mais detalhadamente no ponto seguinte).
Por exemplo, o governo federal acaba de destinar para a safra 2013/2014, 39 bilhões de reais - incluindo ações de financiamento da produção e inclusão produtiva-à agricultura familiar (a qual corresponde a mais de 84% dos estabelecimentos rurais brasileiros). 
  • Porem a prioridade continua sendo a agricultura patronal: o Plano Agrícola e Pecuário 2013/2014, destina ao financiamento dos produtores não familiares (15,6% dos estabelecimentos) R$ 136 bilhões (MAPA, 2013:3). 
Na safra anterior (2012/2013) o valor de financiamento da produção para agricultores não familiares foi seis vezes maior que o valor destinado ao financiamento da produção familiar. Os recursos destinados á Agricultura Familiar cresceram 233% de 2003 a 2012, enquanto os recursos para a agricultura patronal cresceram 325% no mesmo período (Junior et ali, 2012: 5).” 
As mudanças climáticas afetarão a todos no Brasil, e os mais pobres serão os mais afetados O Primeiro Relatório de Avaliação Nacional de Mudanças Climáticas do Brasil indica que todo o Brasil deverá ficar entre 3°C – 6°C mais quente até o fim do século. Chuvas podem aumentar 30% no Sul-Sudeste e diminuir em 40% no Norte-Nordeste. 
Os efeitos regionais das mudanças climáticas tendem a aumentar as disparidades e desigualdades regionais. As principais previsões e efeitos regionais são: Amazônia: Se como previsto o desmatamento atingir 40% na região isto poderá levar a uma redução de 40% na pluviometria nos meses de Junho a Novembro, prolongando a estação de seca e aumentando o aquecimento da superfície em 4 graus. 
  • Isso somado aos efeitos das mudanças climáticas globais pode gerar a prevalência da vegetação tipo cerrado e levar à savanização da Amazônia, sobretudo na porção oriental. Caatinga: As mudanças impactarão tornarão a região significativamente mais quente e agravando o déficit de água que poderá alcançar uma diminuição em praticamente 50% dos níveis atuais. Em outras palavras, pode virar praticamente um deserto. Cerrado: 
A produtividade primária da região pode potencialmente ser reduzida frente às previsões de mudanças climáticas. Mata Atlântica: Efeitos variados de acordo com a região (NE, S/SE), com aumento substancial do volume de chuvas na porção sul/sudeste e redução na porção nordeste. Pampas: 
A região sofrerá aumento substancial no volume de chuvas. A agricultura deve ser o setor da economia mais afetado pelas mudanças climáticas ao longo do século 21.
  • De acordo com o estudo do realizado pelo Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas o prejuízo do agronegócio pode chegar a R$ 7.4 bilhões em 2020 e R$ 14 bilhões em 2017. Até 2030, a produção de soja, por exemplo, pode ter perdas de até 24%.23 Um relatório da Associação de Epidemiologia e Serviços de Saúde indica que os principais grupos de doenças que podem ser afetados são as doenças transmitidas por vetores como malária e dengue e as doenças infecciosas como esquistossomose, hepatite A, leptospirose ou gastroenterites.
Doenças que afetam principalmente os mais pobres. Os efeitos climáticos ainda não estão sendo considerados no nosso planejamento de médio e longo prazos. Por exemplo, o nível de armazenamento de água nos reservatórios das hidrelétricas no Nordeste já está apresentando um redução significativa e com a diminuição das chuvas nas próximas décadas isto vai aumentar.
  • O projeto de construção de hidrelétricas nas regiões Norte e Nordeste deve levar isto em consideração. Os efeitos das mudanças climáticas vão, direta e indiretamente, afetar a matriz energética brasileira e precisamos nos preparar agora para assegurar nossa autonomia energética do futuro.
Se vamos continuar a acionar as térmicas ou se vamos investir numa matriz de energia limpa que prioriza energia eólica ou solar, é uma discussão que precisa do engajamento do campo progressista e principalmente da população.
A desigualdade também é a marca quando se observa a destinação da produção de eletricidade “Os processos de beneficiamento mineral são intensivos no consumo de energia. Para produzir 432 mil toneladas de 23. Agência Brasil, por Vinícius Lisboa. 24. http://scielo.iec.pa.gov.br/scielo.php?script+sci_arttext &pid=S1679-49742009000300 alumínio a Albrás, instalada em Barcarena, consumiu a mesma quantidade de energia elétrica das duas maiores cidades da Amazônia, Belém e Manaus.
A empresa responde por 1,5% do consumo de eletricidade do Brasil com seus quase 200 milhões de habitantes. A energia de Tucuruí, que entrou em operação na década de 1980 para atender a demanda elétrica do setor mineral, ainda hoje é consumida prioritariamente pela Albrás e pela Alumar, em São Luiz, no Maranhão. E ambas pagam tarifas subsidiadas. 
  • É assim que a ampliação da produção de alumínio – e de vários outros projetos de beneficiamento mineral que acompanham a expansão acelerada da mineração na Amazônia – guarda forte relação com a construção prevista para a região de 20 novas usinas hidrelétricas de grande e médio porte até 2020. 
A entrada da Vale, em abril de 2011, no consórcio responsável pela construção de Belo Monte aponta qual deve ser um dos destinos prioritários da energia a ser gerada pela usina. E mostra que, não por acaso, as novas fronteiras de produção de energia e de exploração mineral avançam de mãos dadas sobre os mesmos espaços.”  Conforme foi mencionado acima, a matriz elétrica brasileira é considerada limpa
  • No entanto, há que se examinar para onde se destina a produção de eletricidade. A tabela abaixo elaborada por Célio Bermann indica que a mineração, a indústria pesada e o setor energético consumiram em 2008 35,5% do total da energia elétrica. Por outro lado indica que o consumo residencial teve participação de 22,3% no mesmo ano (e com tendência de queda em relação ao ano 2000). 
Também segundo Célio Bermann “quase 8% da energia elétrica consumida no Brasil deixa o país incorporada no minério de ferro, em produtos siderúrgicos, nos lingotes de alumínio, nas ligas de ferro, e no papel e celulose que são exportados.” Em 2010, os setores eletrointensivos consumiram 27 milhões de tep enquanto que o setor residencial consumiu 23 milhões de tep. 
  • Frente a este cenário de concentração na destinação da produção e consumo, há que se examinar com mais detalhe se o atual sistema produção de energia elétrica seria de fato o mais adequado e de menor custo para fazer chegar eletricidade às populações de baixa renda por meio de programas fundamentais como o Luz Para Todos.
Este modelo também é insustentável do ponto de vista da baixa geração de empregos e da precarização do trabalho
A tabela a seguir é uma elaboração de Célio Bermann, cujos dados permitem constatar que os setores industriais mais intensivos em consumo de energia possuem níveis muito baixos de geração de empregos. 
“Tratam-se de processos produtivos que consomem energia de forma significativa, colaborando para a pressão sobre os recursos naturais, ao mesmo tempo que o número de postos de trabalho criados por unidade de energia consumida se contrapõe à retórica da “geração de empregos”, comumente utilizada por essas empresas.” 
O caso da soja é emblemático. Segundo Sergio Schlesinger “a crescente mecanização da cultura da soja e a produção em grandes propriedades são os principais motivos da contínua redução dos postos de trabalho neste setor”.
  • Guilherme Delgado afirma que “a taxa de salário, o emprego e a massa salarial geradas no processo de produção e exportação de bens primários não crescem ou até decrescem, enquanto que a produção e a exportação das principais cadeias agroindustriais se expandem a elevadas taxas de 8 a 10% .a.a. (...) 
Conquanto o trabalho humano venha sendo crescentemente mitigado nos processos produtivos tipicamente capitalistas ou de agronegócio, as relações de trabalho que se estabelecem na produção agropecuária parecem configurar um estilo de “super-exploração”, seja pela imposição de jornadas excessivas (corte de cana, por exemplo), seja pelo manejo de materiais agrotóxicos altamente nocivos à saúde humana, seja pelas relações de precária contratação de trabalhadores migrantes nos picos da demanda sazonal das safras agropecuárias. 
  • A super exploração do trabalho aqui referida, assim como a super exploração dos recursos naturais, se amalgamam na abordagem histórico-concreta do agronegócio brasileiro dos anos 2000 (grifo nosso). Neste sentido, é conceito útil e necessário para caracterizar o padrão de extração do excedente econômico que se realiza no quadro de relações internacionais fortemente assimétricas.”
A carga tributária e a destinação: 
Dos investimentos reproduzem as desigualdades e impactam negativamente o meio ambiente:
  • Em primeiro lugar há que se constatar que a estrutura tributária segue sendo extremamente injusta no país, conforme demonstra a tabela 5 na página seguinte. Somado a esse quadro de injustiça tributária, dados e perspectivas elaborados pelo BNDES apontam claramente qual é a prioridade dos crescentes investimentos no país, que são e seguirão concentrados nos setores de petróleo e gás, infraestrutura, logística e transporte visando elevar a competitividade do país dentro do lugar que hoje ocupa como primário exportador
Na tabela acima a indústria extrativa mineral aparece com tendência de queda, porém é preciso ressaltar que a mesma teve forte impulso nos últimos anos e segue ocupando o segundo lugar no ranking dos investimentos. A tabela abaixo demonstra o volume de investimentos realizados e previstos para o setor:

Impactos sobre a saúde pelo uso de agrotóxicos:
  • Segundo a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida “o Brasil é o líder do ranking mundial de consumo de agrotóxicos. O uso excessivo dos agrotóxicos está diretamente relacionado à atual política agrícola do país, adotada desde a década de 1960. 
Com o avanço do agronegócio, cresce um modelo de produção que concentra a terra e utiliza altas quantidades de venenos para garantir a produção em escala industrial. O campo passou por uma “modernização” que impulsionou o aumento da produção, no entanto de forma extremamente dependente do uso dos pacotes agroquímicos (adubos, sementes melhoradas e venenos).
  • Assim, mais de um milhão de toneladas de venenos foram jogados nas lavouras somente em 2010, segundo dados do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Agrícola. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), na última safra foram comercializados mais de 7 bilhões de dólares em agrotóxicos. 
Todo este mercado está concentrado em apenas seis grandes empresas transnacionais, que controlam mais de 80% do mercado dos venenos. São elas: Monsanto; Syngenta; Bayer; Dupont; DowAgrosciens e Basf. Nesse quadro, os agrotóxicos já ocupam o quarto lugar no ranking de intoxicações.”

Produz graves violações de direitos:
  • As violações de direitos territoriais de populações tradicionais, indígenas, camponeses, quilombolas, populações urbanas, entre muitos outros tem avançado graças a flexibilização da legislação e a perda de importantes conquistas de direitos garantidos pela Constituição de 1988.
Conforme mencionado acima o novo Código Florestal e o Código de Mineração, as PECs, projetos de lei e portarias da AGU em tramitação têm em seu conjunto o sentido da facilitação do avanço de um padrão insustentável de exploração dos recursos naturais em territórios onde vivem estas populações e para tal está em curso uma nítida fragilização e redução de direitos conquistados. 
  • A crescente importância e magnitude dos conflitos resultantes das violações de direitos – evidenciadas pela quantidade e abrangência em todas as regiões do país e que se alastram por toda a região – são um claro indicador de que o avanço do modelo aqui discutido coloca importantes desafios à consolidação da democracia no país e na região.
Ao contrário do que alguns alegam, não se tratam de conflitos residuais, ou que atingiriam ‘poucos grupos sociais se confrontado com o benefício que a exploração dos recursos naturais resultaria para as massas’. 
  • Os conflitos atingem setores sociais cada vez mais amplos, desestruturam formas de organização sócio-territoriais, economias locais, sistemas de produção tradicionais que garantem a segurança e soberania alimentar, expropriam grupos sociais de sua base de sustentação econômica, social e cultural. 
Ao fragilizar os sistemas locais que fazem a resistência produtiva, social e política nos territórios, abre-se o caminho para o avanço de grandes empresas nacionais e estrangeiras associadas ao capital financeiro. 
  • Por estes e outros motivos, a luta por sustentabilidade e justiça ambiental é uma luta do campo democrático e popular e não podemos deixar que ela seja capturada por interesses empresariais cujo objetivo é lucrar com o mercado de negócios ambientais e de financeirização dos recursos naturais.
Outas Considerações:
  • As forças sociais do campo popular e progressista têm o desafio e a responsabilidade de incluir a sustentabilidade com justiça e direitos em sua própria agenda e nas instâncias e fóruns onde atuam. No plano multilateral, a Agenda de Desenvolvimento Pós-2015 oferece um arcabouço em tese favorável, porém com riscos de ter pouca ou nenhuma efetividade no que diz respeito a compromissos de implementação por parte dos governos. 
A vasta experiência dos movimentos sociais em sua atuação em fóruns normativos ensina a necessidade de fazer deles uma alavanca para campanhas na opinião pública que visem produzir custo político para os governos e empresas que violam as normas e convenções. 
  • No caso da OMC é preciso analisar a potencial incompatibilidade entre algumas de suas regras e acordos com a agenda da sustentabilidade, já que a premissa que rege as negociações é a de que a liberalização do comércio seria benéfica a todos e inclusive ao meio ambiente e a mitigação das mudanças climáticas. 
No caso das coalizões Sul-Sul a ausência de marcos de sustentabilidade em casos como o dos BRICS aponta uma possível competição entre os próprios BRICS. Consequentemente há uma grande necessidade de se iniciar uma discussão mais profunda sobre o tema de sustentabilidade entre os BRICS que venha garantir e potencializar o seu importante papel político a nível internacional. 
  • No plano regional, como foi mencionado acima os mecanismos de governança existentes ainda não absorveram em seu funcionamento o necessário debate e processamento dos conflitos ambientais e violações de direitos resultantes da intensiva exploração dos recursos naturais. 
As instâncias de participação social no âmbito do Mercosul, da Unasul com a recente criação do Fórum de Participação Cidadã, e da CELAC precisam ser acionadas pelo campo progressista com vistas a incluir as questões aqui apresentadas, sem o que os esforços de aprimoramento dos mecanismos de governança regional, inovadores em potencial, terão excluído de sua agenda o que hoje se constitui como bloqueio central para o avanço de um novo regionalismo. 
  • A realização da COP 20 em 2014 no Peru poderá se constituir em uma grande oportunidade de rearticulação das forças sociais da região, desde que os diversos setores se proponham a debater a fundo os desafios aqui discutidos. 
No plano nacional há um novo elemento favorável. O ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, possui uma sólida trajetória como representante do Brasil à frente de negociações que envolvem a agenda do desenvolvimento sustentável, como foi o caso de sua atuação na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) e nas negociações sobre mudanças climáticas no âmbito das COPs. 
  • Sua presença à frente do Ministério das Relações Exteriores sinaliza a possibilidade da agenda da sustentabilidade ganhar um novo patamar no conjunto da agenda de política externa do país. Somado ao seu perfil, soma-se um momento no âmbito multilateral onde a agenda da sustentabilidade, por meio da Agenda do Desenvolvimento Pós-2015, pretende ganhar novo impulso (será inclusive o tema focal do segundo mandato do Secretário Geral das Nações Unidas Ban Ki-moon) e onde o Brasil é visto como liderança na criação de uma nova vontade política. 
No entanto, conforme demonstrou este texto, a consistência da liderança brasileira no âmbito multilateral em muito dependerá de sua capacidade de apontar um caminho de transição para um modelo de desenvolvimento verdadeiramente sustentável no plano interno. Infelizmente não há indicação até o momento de que o tratamento da agenda da sustentabilidade, do ponto de vista do campo popular e progressista, tenha condições de entrar numa disputa qualificada sobre sustentabilidade seja no âmbito nacional ou internacional.. Para tal um caminho de construção terá que ser percorrido dentro deste campo. Disto depende a continuidade e solidez da luta contra as desigualdades no Brasil e na região.
  • O texto procurou demonstrar que financiar a inclusão social com a super exploração dos recursos naturais pode levar os programas de inclusão ao colapso não só porque este ciclo de exploração se esgotará, ou porque ele nos deixa totalmente vulneráveis ao mercado externo, mas também porque o tema central da desigualdade continuará corroendo nossa sociedade. 
Diante do cenário aqui apresentado o campo democrático e popular deve se colocar o desafio de construir uma agenda para o futuro, que não se prenda exclusivamente as necessidades do curto prazo. 
  • Como construir uma agenda de sustentabilidade com direitos que ancore uma nova política industrial, agrícola, energética, macroeconômica, externa é um desafio central. O texto procurou demonstrar também que o modelo insustentável em curso reproduz e reforça as desigualdades e que portanto a sustentabilidade é antes de tudo uma luta contra as desigualdades. Esta é a tese central do conceito de Justiça Ambiental. 
Os mais vulneráveis e excluídos são os que sofrem os piores efeitos da crise ambiental e climática. Por isso a agenda ambiental, vista do ponto de vista do campo democrático e popular, é essencialmente uma agenda de desenvolvimento com justiça, cidadania e equidade no presente e no futuro.

Sustentabilidade do Desenvolvimento no Brasil pós-Rio+20