quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Tratamento de Águas Residuais Domésticas

Tratamento de Águas Residuais Domésticas

  • O tratamento de esgotos evoluiu com as sociedades humanas. Os cientistas sociais, sanitaristas e historiadores afirmam que os esgotos são uma fonte confiável de informações sobre o comportamento de uma sociedade. (LOFRANO; BROWN, 2010). 
O saneamento como o manejo das excretas humanas e outros resíduos produzidos sofreu, ao longo da história, consideráveis alterações tecnológicas. E nesse contexto, o gerenciamento de águas residuárias tem ainda apresentado aos governos e às pessoas um desafio contínuo.
  • Não obstante o desenvolvimento da engenharia de saúde pública, especialmente, a partir da revolução industrial com o desenvolvimento de tecnologias mais eficientes na remoção de matéria orgânica e organismos patogênicos, com posterior avanço para redução dos níveis de substâncias causadoras de eutrofização, não houve igual progresso nos métodos gerenciais aplicados ao processo de produção de efluentes qualitativamente adequados.
Assim, o desenvolvimento e o aprimoramento das tecnologias de processos de tratamento físico, biológico, químico e físico-químico de resíduos domésticos e industriais não têm sido capazes de realizar um trabalho completamente aplicável em virtude de falhas nas técnicas de gerenciamento de manejo das plantas de tratamento;
  • A literatura aponta pelo menos dois modelos de gestão de águas residuárias: os sistemas centralizados e descentralizados. Como será observado neste trabalho, o sistema centralizado de tratamento é caracterizado pela complexidade, robustez estrutural e operacional, custos elevados e relação custo-benefício muitas das vezes sofrível.
Nesse sentido, no final do século XX e início do século XXI, o tratamento descentralizado de esgotos é visto como alternativa a mais sustentável, especialmente, para países em desenvolvimento (PARASKEVAS et al., 2002) e em pequenas vilas isoladas ou assentamentos rurais com baixa densidade populacional em virtude de sua simplicidade e efetividade de custos (BUTLER; MACCORMICK, 1996; OTTERPOHL et al., 1997; HEDBERG, 1999; WILDERER; SCHREFF, 2000; PARASKEVAS et al., 2002; USEPA, 2005). 
  • Assim, o gerenciamento descentralizado é progressivamente considerado nas decisões de implantação de estruturas sanitárias urbanas e rurais pelo menor aporte de recursos, além da sustentabilidade ecológica (LENS ET AL., 2001; TCHOBANOGLOUS; CRITES, 2003; MASSOUD et al., 2009).
No Brasil, o Programa Habitacional Popular – Minha Casa Minha Vida do governo federal (BRASIL, 2009) objetiva garantir habitação à população de baixa renda nas áreas urbanas, pelo acesso à moradia digna com padrões mínimos de sustentabilidade, segurança e habitabilidade (sic).
  • O presente texto apresenta, no contexto do desenvolvimento urbano e da inclusão social pelo acesso de comunidades carentes a moradias com um mínimo de qualidade habitacional e ambiental, a proposta de introdução do conceito de tratamento descentralizado como alternativa técnica, ambiental, econômica e socialmente viável.
Breve histórico do saneamento:
  • Desde os períodos remotos da história até o início do século XXI, o saneamento sofreu alterações fundamentadas na evolução cultural, sociopolítica e tecnológica das sociedades. 
Enquanto nos períodos remotos, as comunidades viviam espalhadas em grandes áreas, tendo seus resíduos decompostos pelos ciclos naturais, com o desenvolvimento das civilizações antigas (indus, mesopotâmicos, gregos e romanos), foram necessárias soluções para minimizar a poluição gerada exigindo algum gerenciamento. 
  • Os gregos são considerados como precursores dos sistemas de saneamento (ANGELAKIS et al., 2005). À Grécia atribui-se o sistema centralizado de disposição de resíduos. A figura 1 mostra a evolução do saneamento através da história.
Ao longo da escala de evolução tecnológica dos sistemas de tratamento, muitas tecnologias, hoje utilizadas na gestão descentralizada de esgotamento sanitário, já se encontravam disponíveis. Fossas (1860) e tanques sépticos (1895), além de tanques Imhoff (1902) ainda hoje são utilizados em sistemas domésticos denominados On-Site em locais desprovidos de coleta e transporte de águas residuárias. Mais tarde, sistemas como Wetlands construídos (1950) e sistemas UASB (1970) foram introduzidos, melhorando a qualidade do efluente produzido a custos operacionais significativamente baixos. (ibid.).
  • O conceito de saneamento descentralizado floresceu mais rapidamente na Europa e nos Estados Unidos, espalhando-se mais facilmente em países africanos e asiáticos, chegando ao Brasil mais recentemente como conceito acadêmico (década de 1990).
A Norma Brasileira sobre projeto de sistemas de fossas sépticas e disposição no solo (típico de sistemas de tratamento On-Site domésticos) data de 1993 (ABNT/NBR 07229/93). Mesmo assim, desde 1970, em virtude do Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANASA), a centralização é aplicada no Brasil. (SEZERINO et al., 2000).

A exclusão social e o saneamento:
  • No Brasil, observa-se a tendência do desordenamento urbano. Infelizmente certos equipamentos de infraestrutura se constituem numa espécie de privilégio dos bairros centrais das cidades de grande e médio porte, com contínua redução de incidência dessas obras em cidades de pequeno porte e em bairros com população habitante de baixa renda.
Os índices nacionais de atendimento urbano e rural identificados pelo SNIS, em 2008, foram de 43,2% para a coleta de esgotos. Tomando apenas a população urbana, os dados mostram índice de coleta de esgotos de 50,6% apontando a inacessibilidade dos brasileiros ao saneamento. O Quadro 1 mostra o atendimento segundo a região geográfica.
  • A exclusão social é percebida aqui pela falta de acesso de uma parcela da população aos seus direitos mais básicos, afetando a população como um todo na maioria das cidades. Os dados do SNIS (2008) demonstram forte concentração de investimentos na região Sudeste, igual a 58,1% do total, contra 3,9 % na região Norte. Apesar de menor participação nos investimentos, a região Norte teve incremento de investimentos de 52,5 % em 2008 comparando a 2007. O Quadro 2 mostra os investimentos realizados 2008.
Ora, os entraves para a inclusão social em saneamento urbano e rural são relacionados tanto a questões políticas, quanto a aspectos fortemente influenciados por investimentos econômicos, o que justifica propor um modelo capaz de pulverizar o tratamento de esgotos a custo reduzido, apontando para a gestão descentralizada de esgotamento sanitário.
  • A literatura trata de alternativas sustentáveis desde a separação de águas à adoção de sistemas economicamente otimizados (OTTERPOHL, 1997; CHEN; BECK, 1997). Em comparação com os sistemas convencionais, os sistemas descentralizados apresentam-se bem mais simples na sua proposta. 
De fato, ainda que sejam necessárias etapas convencionais de tratamento em nível descentralizado, podem-se esperar custos totais menores na comparação com os sistemas centralizados ou convencionais de tratamento (MOUSSAVI ET AL., 2010; VAN LIER AND LETTINGA, 1999; ZEEMAN; LETTINGA, 1999; WILDERER; SCHREFF, 2000; LENS et al., 2001).

Sistemas de tratamento de esgotos:
Sistemas de tratamento centralizado
  • Os sistemas de tratamento conhecidos como Convencionais constituem o conjunto de equipamentos subdivididos em unidades de sistema destinadas a coletar, transportar, reunir, tratar e dispor, no ambiente, os efluentes residenciais, comerciais e industriais (NUVOLARI, 2003). 
A coleta dos esgotos se dá através de tubulações que recebem contribuições divididas por sub-bacias convergindo a pontos de reunião de cotas baixas, a partir das quais, Estações Elevatórias as recalcam até à área de tratamento, mais afastada do centro urbano.
  • A Estação de tratamento pode assumir características diferenciadas, em virtude da natureza do tratamento, volume e características das águas residuárias da cidade.
As estruturas de tratamento centralizado, ao se introduzir efluentes industriais, requerem um aumento significativo de sua complexidade, haja vista níveis de tratamento especiais para atender a padrões requeridos pela legislação (NHAPI, 2004).
  • O emprego dos níveis de tratamento dependerá das características do esgoto a tratar, volume e necessidades de qualidade final do efluente. Em função das restrições ambientais impostas pela legislação local, faz-se necessária a introdução de um tratamento terciário, envolvendo maior investimento e complexidade maior de implantação, operação e manutenção, além de demandar pessoal especializado. 
Em todo caso, a maioria das Estações das grandes cidades, com médio a elevado nível de industrialização, requer tratamento nos níveis primário, secundário e terciário, além de tratamento de lodo e disposição dos subprodutos sólidos do tratamento (lodo digerido, desidratado e/ou adensado).
  • De fato, os custos de implantação de uma malha de coleta e transporte dos esgotos da área urbana até a periferia onde estão implantadas as estruturas de recalque e, além daqueles normalmente requeridos em Estações centralizadas complexas, são os maiores responsáveis pelo incremento do aporte de capital. O Gráfico 1 demonstra o aumento do custo per capta de implantação de sistemas centralizados, em função da densidade populacional.
Sistemas descentralizados de tratamento de esgotos:
  • Conforme o manual de gerenciamento On-Site e em Clusters (blocos) de sistemas de tratamento de águas residuárias da USEPA (2005), o sistema descentralizado pode ser explicado como abrangente de uma gama de sistemas processadores de esgotos domésticos e comerciais. Observa-se a diferença fundamental na concepção desses sistemas. Os sistemas descentralizados requerem a separação dos efluentes industriais.
A maioria dos lançamentos nesses sistemas é enviada a tanques sépticos e dispostos no solo em valas, córregos, lagos entre outros corpos receptores. Alguns sistemas preveem evaporação em regiões áridas. Estes sistemas possuem inúmeros benefícios, dentre os quais se destacam:
  • Proteção de valor da propriedade: Podem prover tratamento equivalente ao de sistemas centralizados, frequentemente a um custo mais baixo (USEPA, 2005).
  • Conservação de água: Podem colaborar direta e indiretamente na recarga de aquíferos mantendo, no período de estiagem, o fluxo de riachos e rios dentro da microbacia hidrográfica. (NHAPI, 2004; USEPA, 2005; ICHINARI et al., 2008; WEISS et al., 2008);
  • Minimização de custos no ciclo de vida: O gerenciamento adequado resulta em menores custos de reposição e reparo, valoração da propriedade, desenvolvimento econômico e melhoria da qualidade de vida da população (USEPA, 2005).
  • Planejamento efetivo: Promovem flexibilidade no gerenciamento.
O saneamento descentralizado apresenta-se como uma alternativa intermediária entre os sistemas On-Site e centralizados (NHAPI, 2004). O emprego do tratamento comunitário ou de vizinhança tem recebido atenção cada vez maior, dadas as vantagens percebidas. 
  • Neste trabalho, os autores revisados defendem o modelo descentralizado de gerenciamento de águas residuárias domésticas e comerciais (OTTERPOHL et al., 2002; NHAPI, 2004; ROELEVELD; ZEEMAN, 2006; MAURER et al., 2006; MASSOUD et al., 2009; MOUSSAVI et al., 2010).
O modelo centralizado em zona rural mostra-se inviável pela falta de economia de escala pela baixa densidade populacional e elevado índice de rede de esgoto per capta. Entretanto, os sistemas de tratamento urbanos e rurais descentralizados não só podem figurar por sub-bacia, como também por Clusters, com lançamento em corpo receptor ou não, e disposição On-Site. 
  • Para a abordagem da sub-bacia, com ou sem a presença de corpo receptor para disposição, o reúso, a infiltração e a disposição são as vias de lançamento. Na abordagem por Clusters, com ou sem corpo receptor, figura-se o reúso, a infiltração, e a disposição em corpo receptor. Por último, os sistemas On-Site urbanos promovem disposição no solo como destino final, embora o reúso seja uma alternativa encorajada (ROELEVELD; ZEEMAN, 2006).
O tratamento, na zona rural, mostra-se factível e viável em sistemas descentralizados, onde o reúso é fortemente encorajado (OTTERPOHL et al., 2002; USEPA, 2005; MARA et al., 2007; LENS et al., 2001). 

Sistemas Household On-Site:
  • Os sistemas ‘Household On-Site’ ou sistemas residenciais são sistemas domésticos com ou sem separação de efluentes. Na separação de efluentes, as águas negras (excretas sólidas + água de descarga) são lançadas à parte para digestão anaeróbia e produção de biogás. A urina pode ser coletada para recuperação de nutrientes e aplicação na agricultura (ROELEVELD; ZEEMAN, 2006). 
Nem todos os sistemas ‘Houusehold On-Site’ demandam a separação de efluentes. De fato, esta prática tem sido difundida na Europa e é advogada em virtude do potencial de recuperação de recursos disponíveis no efluente de esgotos, na forma de energia do biogás entre outras justificativas. No Brasil, tratam-se os efluentes totais (end-of-pipe).
  • Os sistemas anaeróbios e estações compactas anaeróbias/aeróbias são amplamente pesquisados nas aplicações Household On-Site pelas suas características técnicas que aliam alta eficiência de remoção dos poluentes, somados à baixa produção de lodo e a custos reduzidos de implantação, operação e manutenção (IVERY, 1996; USEPA, 2005; ROELEVELD; ZEEMAN, 2006; ICHINARI et al. 2008; AL-JAMAL; MAHMOUD, 2009; SABRY, 2010; MOUSSSAVI et al., 2010; KASSAB et al., 2010).
Cada sistema possui suas características técnicas e operacionais, e a análise e discussão de suas principais características, relação custo x eficiência, aplicabilidade e outros elementos de avaliação fogem do propósito do presente texto.
No Brasil, embora não haja uma política de gestão do saneamento descentralizada, o uso de sistemas comumente utilizados mundialmente no tratamento simplificado descentralizado de esgotos é comum. Fossas Sépticas (septic tanks) seguidas de unidades de tratamento complementar ou simples disposição ao solo via sumidouros ou valos de infiltração são regulados pela norma NBR 13.969/1997. 

Tratamento de Águas Residuais Domésticas

Sistemas de tratamento Community On-Site:
  • Os sistemas de tratamento Community On-Site (tratamento comunitário ou local) tratam o efluente residencial e comercial (excluídos os efluentes industriais) em áreas próximas de sua geração, de um grupo de edificações.
Dentre os três componentes básicos de qualquer sistema de esgotos: a coleta, o tratamento e a disposição, a coleta é responsável por mais de 60 % do orçamento total, particularmente em pequenas comunidades com pequena densidade populacional (MASSOUD et al., 2009). 
  • Assim, os Sistemas Comunitários, dotados de ligações prediais, redes de esgotos, emissário de esgoto bruto, estação elevatória, de tratamento e emissário de efluentes ao destino final (NUVOLARI, 2003) buscam manter a coleta (rede) a menor possível, priorizando o tratamento necessário e disposição do efluente. (ibidem).
Os sistemas Comunitários (Community On-Site) ou em Clusters (blocos ou agrupamentos), centralizados ou descentralizados, servem desde uma única residência até 100 residências ou mais (USEPA, 2005; MASSOUND et al., 2009). Esses Sistemas Comunitários têm aplicação favorecida nas áreas mais densamente habitadas ou cujas condições de solo e topografia adversa impeçam a aplicação ‘Household On-Site’. Estudos mostram efetividade de custos avaliando sistemas centralizados e descentralizados em comunidades rurais hipotéticas (MASSOUD et al., 2009), sugerindo aplicação do saneamento na zona rural.
  • Assim, os sistemas de tratamento variarão em função das condições econômicas, sociais e ambientais de cada país. Há aplicações desde latrinas, banheiros comunitários, sanitários ecológicos (MARA, 2007) até decantadores primários, tanques sépticos, filtros anaeróbios, filtros de areia (ABNT, 1997; USEPA, 2005) e estações UASB e tanques sépticos UASB (ROELEVELD; ZEEMAN, 2006; MOUSSAVI et al., 2010) em combinações com filtros anaeróbios, filtros de areia, Wetland, valas e sumidouros.
A proposta atual predominante dos pesquisadores na descentralização é aplicar tecnologias anaeróbias por sua boa relação custo-benefício entre qualidade do efluente e características tais como: compacidade, energia elétrica desnecessária, baixa produção de lodo e reduzidos custos de implantação, operação e manutenção (ROELEVELD; ZEEMAN, 2006; AL-JAMAL; MAHMOUD, 2009; MASSOUD, et al., 2009; MOUSSAVI et al., 2010; SABRY, 2010; KASSAB et al., 2010;). Operando sistemas anaeróbios Vargas et al.,(2000), Barbosa (2006) e De Ávila (2005) encontraram eficiências de remoção de DBO e DQO da ordem de 68 % - 80 % e 73 a 87 % respectivamente. 
  • Baixo consumo de energia, usualmente associado a uma elevatória de chegada. Isso faz com que os sistemas tenham custos operacionais muito baixos;
  • Baixa demanda de área;
  • Baixos custos de implantação, da ordem de R$ 20 a 40 per capita;
  • Produção de metano, um gás combustível de elevado teor calorífico;
  • Possibilidade de preservação da biomassa, sem alimentação do reator, por vários meses;
  • Tolerância a elevadas cargas orgânicas;
  • Aplicabilidade em pequena e grande escala;
  • Baixo consumo de nutrientes.
  • As bactérias anaeróbias são susceptíveis à inibição por um grande número de compostos;
  • A partida do processo pode ser lenta, na ausência de lodo de semeadura adaptado;
  • Alguma forma de pós-tratamento é usualmente necessária;
  • A bioquímica e a microbiologia da digestão anaeróbia são complexas e ainda precisam ser mais estudadas;
  • Possibilidade de geração de maus odores, porém controláveis;
  • Possibilidade de geração de efluente com aspecto desagradável;
  • Remoção de nitrogênio, fósforo e patógenos insatisfatória.
Entretanto, há necessidade de pós-tratamento para lançamentos restritivos em corpos receptores, na aplicação de sistemas On-Site, especialmente em clusters comunitários.
  • Já na aplicação residencial On-Site, com disposição no solo, e desde que o aquífero não apresente distâncias verticais muito próximas do sistema de disposição, os sistemas anaeróbios mostram-se adequados. A norma brasileira para tanques sépticos e unidades complementares e de disposição final de efluentes (NBR 13.969: 1997) recomenda a distância mínima vertical do fundo da vala de infiltração e o nível máximo do aquífero de 1,50 m.
Mundialmente, pesquisas têm procurado soluções mais apropriadas tecnologicamente que substituam o tanque séptico. O tanque séptico UASB tem sido proposto.
  • Roeleveld et al. (2006) aplicando tanque séptico UASB, tratando água residuária doméstica a diferentes temperaturas, conseguiram remoções de DQO entre 58 e 77 % para faixa de 5ºC a 20ºC e sólidos totais suspensos entre 74 e 81 %. Lettinga (1993) apud Roeleveld et al. (2006) propõe o tanque séptico UASB (UASB septic tank) como processo de alta eficiência e mais ajustado e promissor para tratamento On-Site de águas residuárias (end-of-pipe), fazendo-o uma alternativa promissora para o tanque séptico convencional (BOGTE et al., 1993; LETTRINGA et al., 1993 apud ROELEVELD et al., 2006).
Com o desenvolvimento da engenharia de materiais, a fibra de vidro passou a ser amplamente utilizada na confecção de estações de tratamento agregando processos em uma única unidade compacta com alta eficiência e requerimento mínimo de área ‘On-Site’.
  • Assim, muitas empresas, no Brasil, já oferecem um portfólio variado de estações anaeróbias seguidas ou não por processos aeróbios, a exemplo de países como a Austrália, Estados Unidos e Japão, que utilizam esse tipo de ETE, inclusive com normatização (IVERY, 1996; USEPA, 2005; ICHINARI et al., 2008). 
Os resultados para estações compactas no Japão reportam efluentes com DBO e Sólidos suspensos (antes da desinfecção) da ordem de 16,0 e 6,3 mg/L a partir de um esgoto bruto com DBO de 206,90 mg/L e sólidos de 131.7 mg/L , ou eficiências de 92,26 % e 95,21 %, respectivamente.

O Tratamento descentralizado: 
Como estratégia de inclusão social:
  • Como já discutido, sem embargo, não parece ser exagero focalizar o tratamento de esgotos como uma espécie de privilégio de grandes cidades em bairros considerados prioritários, porque centrais, excluindo a população de baixa renda da periferia, bem como os habitantes de cidades de menor porte e menor importância econômica.
O saneamento centralizado impede a ‘pulverização’ ou universalização do atendimento por esgoto sanitário às comunidades menos favorecidas. Essas comunidades, muita vezes, já servidas de sistemas de abastecimento de água, veem suas condições sanitárias fortemente prejudicadas, com o aumento de doenças entéricas e aparecimento de vetores de doenças. De fato, comunidades servidas com abastecimento de água, sejam na zona urbana ou rural, criam uma poluição difusa cuja solução é difícil a partir da gestão centralizada.
  • Do ponto de vista dos custos de implantação, a centralização, conforme já descrito anteriormente, onera o investimento nas estruturas sanitárias, pela inversão de capital em ligações prediais, redes, interceptores, emissários e estações de bombeamento. Esse acréscimo dos custos, de até 60 %, prejudica o investimento em bairros periféricos e na zona rural.
Os estudos apresentados neste texto mostram a viabilidade técnica, operacional e econômica das tecnologias voltadas para a descentralização do tratamento. Tratando-se de tecnologias simples, além de redução no volume dos reatores, são esperados custos de implantação significativamente inferiores àqueles das Estações de Tratamento centralizadas.
  • Sistemas como o de Lodos Ativados possuem sistemas de aeração quer por agitação ou por injeção de ar comprimido com elevado custo de operação com energia elétrica e operadores treinados. Estações compactas requerem bem menor intervenção operacional.
Considerando a dificuldade brasileira em garantir recursos suficientes para cumprir metas quanto à universalização dos serviços de saneamento e considerando que até mesmo no bojo da Lei Nº. 11.977/2009, há limitações aceitáveis para a instalação de equipamentos públicos de saneamento nos loteamentos de interesse social, pode-se advogar pela descentralização do saneamento como incremento na qualidade de serviços sanitários prestados nesses loteamentos pela relação custo-benefício favorável à adoção desta política.
  • Para a zona rural, a descentralização mostra-se igualmente viável. Nos Estados Unidos, a USEPA (2005) possui know-how gerencial para dar suporte às associações comunitárias capazes de implantar e gerenciar seus sistemas de tratamento de esgotos. Em locais onde florescem comunidades não difusas, como vilas e cidades entre 1.000 e 5.000 habitantes, é possível implantar sistemas em clusters ou mesmo pequenos sistemas centralizados.
Já para a realidade descentralizada com dispersão das residências na área, pode-se lançar mão de sistemas compactos Household On-Site.

Outras Considerações:
  • Ao longo da história da humanidade, o aprimoramento de tecnologias de manejo das excretas humanas não foi capaz de efetivar o saneamento pelas falhas dos modelos de gestão.
Para a implantação de infraestrutura sanitária em áreas rurais e urbanas em países em desenvolvimento, os sistemas descentralizados de tratamento têm ganhado atenção cada vez maior nos últimos 20 anos por parte dos pesquisadores mundiais. 
  • Esse fato deve nos levar à reflexão no sentido de buscar a adoção destas propostas frente à exclusão social evidenciada, também, na inacessibilidade ao saneamento básico nos estados menos favorecidos já que os melhores índices de saneamento e a taxa de investimentos em infraestrutura sanitária estão ainda focalizados nos estados do Sul e Sudeste do Brasil.
O alto custo dos sistemas centralizados impede o Governo de investir em cidades de pequeno e médio porte. Por esta mesma razão, o saneamento rural tem sido um impeditivo para a solução da poluição difusa nas sub-bacias hidrográficas. A revisão da literatura atual mostrou que o gerenciamento de sistemas de esgotos nacionalmente carece arcabouço teórico-metodológico para normatização e políticas públicas para implantação e operação de sistemas de saneamento comunitários descentralizados seja na modalidade residencial (Household On-Site), ou por vizinhança (Community On-Site ou em Clusters).
  • Ainda, no contexto do tratamento descentralizado, as pesquisas têm demonstrado a robustez do tratamento anaeróbio quanto à sustentabilidade pelas características de qualidade de efluente versus os custos totais, além do potencial de recuperação de energia e nutrientes, baixa produção de lodo e tendência à compacidade da planta de tratamento. As Estações Compactas anaeróbias/ aeróbias propostas para sistemas On-Site apresentam boa eficiência aliada à compacidade para tratamento residencial On-Site e Comunitários Urbanos.
Dito tudo isso, entretanto, a sustentabilidade dos sistemas de tratamento comunitários ou em Clusters frente à aplicação de Estações Compactas Unifamiliares não pode ser confirmada apenas pela avaliação de custos, já que inúmeros fatores não os relacionados a estes devem ser vistos em cada caso e devem ser alvo de trabalhos envolvendo as dimensões econômicas estruturais ou conjunturais, os fatores sociais, culturais e ecossistêmicos das regiões ou comunidades onde serão implantados tais sistemas.

Tratamento de Águas Residuais Domésticas