segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Arrendamento e acesso a Terra.

Estrutura Fundiária é a forma como as propriedades de terra de uma área determinada se organizam, ou seja, a divisão de terras em um certo lugar.

  • A alta concentração da propriedade da terra continua sendo um traço marcante do meio rural e o maior problema agrário no Brasil. Sua origem remonta ao processo de ocupação territorial, já na formação histórica da Nação, o qual consolidou urna elevada desigualdade da distribuição da propriedade fundiária e alargou a relação latifúndio/minifúndio. 
A Lei de Terras (1850), ao definir a compra (em dinheiro) como principal mecanismo de acesso à terra, tomou mais difícil que os pequenos produtores independentes pudessem adquirir a mesma, os quais não tinham recursos financeiros para comprá-la. Apesar da promulgação do Estatuto do Trabalhador Rural (Lei 4.214/63) e, posteriormente, do Estatuto da Terra (Lei 4.504/64), ambos com objetivos distributivos, registra-se, desde a década de 70, uma significativa concentração da propriedade fundiária no país. 
  • A evolução do índice de Gini da distribuição da propriedade da terra no Brasil, entre 1950 e 1995, aumentou de 0,840 em 1950 para 0,856 em 1995. No nível regional, em 1995, os maiores e menores índices estão, respectivamente, na Região Nordeste (0,859) e na Região Sul (0,742) (Gasques e Conceição, 2000). Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) dos empreendimentos agrícolas com área de 1 a menos de 10.000 hectares, em 1999, esse índice cai para 0,836 (Brasil) e 0,815 (Nordeste), mas ainda continua acentuadamente concentrada a propriedade fundiária no país. No Sul, o Índice de Gini, inclusive, aumenta para 0,799 (Hoffmann, 2001). 
A análise da estrutura fundiária brasileira, segundo a classificação do INCRA , mostra que os minifúndios, em 1992, representavam 62,2% do total dos imóveis rurais e detinham apenas 7,9% da área total. As pequenas propriedades participavam com 26,9% no total de imóveis e, 15,5% na área total. A participação das médias propriedades no total de imóveis era de 8%, enquanto que a área alcançava 19,9%. Nas grandes propriedades os imóveis representavam somente 2,8% no total, porém, ocupavam uma área de 56,9% do total. 
  • No Brasil, 62,4% do total dos imóveis rurais são classificados como improdutivos e, apenas 28,3% são considerados produtivos. Em contraste à região Sul, onde a área improdutiva corresponde a 42,6% da área agricultável, 78,8% da área agrícola no Nordeste é classificada como improdutiva. A explicação para esse movimento é complexa, envolvendo fatores institucionais e de natureza puramente econômica. De um lado, no Brasil, o título de propriedade fundiária sempre foi sinônimo de poder e riqueza; de outro, num contexto macroeconômico, marcado pela instabilidade monetária e pelo baixo desenvolvimento do sistema financeiro, a terra assumiu o papel de importante ativo de reserva de valor (Saiad, 1982). 
A estratégia de desenvolvimento agropecuário adotada a partir dos anos 50 também . reforçou a concentração da propriedade fundiária. De acordo com vários autores (Saiad, 1984; Rezende, 1985; Banco Mundial, 1993), a política de crédito rural subsidiado liberou os recursos próprios dos mutuários para a compra de novas terras, fortalecendo o padrão de acumulação caracterizado, por Buainain (1998), como patrimonial. 
  • Uma vez que a propriedade da terra era dada como garantia para o acesso ao crédito barato, estabelecia-se uma forte relação entre crédito e propriedade, que não apenas facilitava como também incentivava a concentração da propriedade fundiária. Os incentivos fiscais e os programas de ocupação nas áreas de fronteira agrícola (POLOCENTRO e POLO AMAZÔNIA, por exemplo) também contribuíram para aumentar a concentração da terra, visto que davam as condições de infra-estrutura a futuros investimentos da iniciativa privada, no primeiro caso, e facilitavam a apropriação de extensas áreas nas Regiões Amazônica e Centro-Oeste para fins essencialmente especulativos e de reserva de valor, no caso dos programas regionais (Gasques e Villa Verde, 1990). 
Por fim, os diversos programas especiais, como o PRO ÁLCOOL, direcionados para produtos específicos, liberaram recursos baratos para proprietários, favorecendo novamente a concentração da propriedade da terra. Os mesmos fatores que explicam a desigualdade da distribuição fundiária determinaram a expulsão da população rural para as cidades e suas periferias, onde apenas uma parte logrou inserir-se de forma compatível com a superação da pobreza. 
  • A concentração da propriedade fundiária vem sendo tratada pelas políticas públicas através do Programa de Reforma Agrária via desapropriação de propriedades consideradas improdutivas e do assentamento de famílias sem ou com pouca terra para produzir. Os resultados alcançados ao longo das últimas décadas foram claramente incapazes de reverter o quadro da elevada desigualdade da distribuição fundiária e de exclusão social no meio rural brasileiro 
A partir de 1993, a Reforma Agrária ganhou novo ímpeto, e, desde então, passou a ser tratada como uma prioridade pelo Governo Federal. Foram introduzidas importantes mudanças que melhoraram a eficiência e o alcance das intervenções jurídicas, entre as quais a Lei do Rito Sumárío, o Programa Cédula da Terra, o Banco da Terra, o novo Imposto Territorial Rural (ITR) (Buainain et al, 2000). Reunindo os três principais tipos de assentamento - em terras desapropriadas por interesse social, em terras públicas estaduais ou compradas por governos estaduais e em terras destinadas à colonização - nos últimos trinta anos, foram realizadas aproximadamente 1400 operações. Entre 1979 e 2002, foram assentadas mais ou menos 403 mil famílias em 19.590.180,41 milhões de hectares. 
  • Em estudo recente, Gasques e Conceição (2000) analisam que mediante o critério arrendatários/parceiros/ocupantes, o público da Reforma Agrária no Brasil é de 1.143.632 famílias, sendo que os ocupantes representam 56,62% dos beneficiários, os parceiros 23,41% e os arrendatários 19,97%. É possível afirmar que a questão fundiária caracteriza-se, atualmente, pelo acentuado desajuste entre as demandas e expectativas dos novos setores sociais e a capacidade fiscal e institucional da União para atender a tais demandas. Paralelamente, a intervenção fundiária mediante desapropriação não satisfaz a crescente necessidade de terra de uma ampla camada de produtores. 
Disto resulta a relevância de outras formas de intervenção, seja via tributação (ITR), seja através de ordenamento agrário (sociedades de ordenamento fundiário), seja mediante acesso indireto (arrendamento e parceria). Em diversos países (Paquistão, Índia, por exemplo), a coexistência de terras ociosas e de famílias sem ou com pouca terra deu origem a várias formas de arrendamento e parceria que parecem ter reduzido a dimensão dos problemas econômicos e sociais associados à manutenção de terras ociosas. 
  • O parceiro, o meeiro, os moradores "de condição", o arrendamento "pela palha", os foreiros são alguns casos clássicos da forte relação latifúndio/minifúndio ainda presente em muitas regiões do Nordeste brasileiro e que marcam a estrutura fundiária do país. Atualmente, o arrendamento fundiário no Brasil é um fenômeno localizado geograficamente e, cada vez mais, restrito aos produtores mais capitalizados. 
Ou seja, à medida que as relações tradicionais de parceria e do pequeno arrendamento, características principalmente do Nordeste, mas presentes no passado em todas as regiões do país, registram substancial queda nos últimos anos', tanto o arrendamento como a parceria (esta especialmente para a criação bovina) vão se restringindo a contratos entre proprietários fundiários e produtores patronais. Por razões que serão objeto e justificam este trabalho, os chamados pequenos produtores ou produtores familiares têm dificuldades para utilizar o contrato de arrendamento fundiário como alternativa válida para o acesso à terra. Coloca-se, portanto, uma questão interessante e aparentemente paradoxal: a coexistência de terras ociosas e de demanda por terras que poderia ser, pelo menos parcialmente, atendida pela transferência do uso da terra através de contratos de parceria e/ou arrendamento não o é. 
  • Trata-se de um caso de falha de mercado com evidência de graves conseqüências para a eficiência do sistema econômico e do nível de bem-estar social. Como explicar essa falha? Pelo incipiente desenvolvimento do próprio mercado fundiário, por fatores puramente econômicos, por aspectos institucionais? Identificar e analisar a racionalidade que responde por essa falha do mercado é condição necessária para implementar políticas públicas visando estimular o arrendamento de terras ociosas e ou improdutivas para produtores familiares sem ou com pouca terra, e ampliar o alcance da intervenção pública. 
No âmago deste debate, essa dissertação tem o objetivo de estudar o funcionamento do mercado de arrendamento fundiário no Brasil. Especificamente, pretende-se analisar os fatores, institucionais e econômicos, que determinam e condicionam a inserção dos produtores familiares pobres neste mercado. Finalmente, deseja-se identificar experiências de políticas/programas no Brasil, descrevendo e interpretando seus resultados. Dar-se-á especial atenção aos Programas de Arrendamento de Terras no Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, particularmente, nos municípios de Uberaba e Uberlândia. Parte-se da hipótese que no Brasil o quadro institucional - passado e atual - coloca entraves ao funcionamento do mercado fundiário, especialmente, para a expansão dos contratos de arrendamento envolvendo produtores familiares mais pobres. 
  • De um lado, temos os proprietários que não se dispõem a correr os riscos envolvidos em contratos com baixas garantias'; de outro lado, algumas características destes produtores, como a descapitalização, a inserção precária nos mercados (notadamente, fundiário), associadas às restrições de crédito, dificultam a adoção de patamares tecnológicos e de escala de produção compatíveis com a geração de renda suficiente para manter a família e pagar o arrendamento. Este quadro seria agravado pelo acesso limitado dos arrendatários ao mercado de insumos e pela ausência ou ineficiência da assistência técnica e da infraestrutura social. Assim, o negócio tenderia a não interessar a nenhuma das partes. 
O desinteresse dos proprietários em disponibilizarem suas terras aos pequenos agricultores para a prática de arrendamento estaria relacionado também ao sério risco de virem a ter litígios com os arrendatários, frente a pressão exercida em favor do Programa de Reforma Agrária. Ainda que a presença de arrendatários não tenha repercutido em um abrangente processo de desapropriação, o risco persiste (FAO/INCRA, 1995). 
  • Neste contexto, as recentes experiências de Programas de Arrendamento de Terras, implementados em algumas regiões do país, indicam que, apesar dos esforços de criar e implementar instrumentos que viabilizem o uso mais eficiente dos recursos ociosos e ou improdutivos no meio rural, o mercado de arrendamento fundiário ainda apresenta um baixo nível de desenvolvimento. As normas contratuais, embora regulamentadas pela legislação para atender aos interesses das partes contratantes, nem são respeitadas nem parecem prover um marco institucional para o florescimento de contratos entre proprietários e produtores familiares pobres, sem ou com pouca terra para produzir. Em grande medida, o mercado reflete a assimetria existente entre os contratantes. 
De um lado, a desigualdade de riqueza entre as partes contratantes (pequeno agricultor arrendatário descapitalizado versus o proprietário fundiário) e; de outro, a assimetria de informações e da "falha institucional" que não impõe ou reduz as sanções devido ao não cumprimento da lei (F AO/INCRA, 1995). 
  • Assim, a hipótese básica deste estudo é que o funcionamento mais eficiente e dinâmico do mercado de arrendamento no Brasil envolvendo produtores familiares pobres não depende apenas da disponibilidade de terras improdutivas e ou ociosas e de trabalhadores agrícolas despossuídos de terra própria para produzir, mas, sobretudo, de um arcabouço institucional que legitime os contratos e viabilize a produção de tais agricultores. Com o propósito de atingir nossos objetivos e testar nossas hipóteses, essa dissertação está estruturada em cinco capítulos. 
O primeiro faz uma breve discussão teórica do mercado fundiário e da renda da terra. O segundo capítulo analisa o contrato de arrendamento a partir do marco teórico do Neo institucionalismo Econômico. Com base nesta teoria, procuramos identificar os condicionantes do arrendamento de terras. No terceiro capítulo tratamos da presença do arrendamento fundiário no Brasil. Para isso, consultamos os dados computados do Censo Agropecuário de 1995-6 e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), além de estudos realizados por outros autores sobre o tema. 
  • O quarto capítulo relata a evolução dos Programas Municipais de Arrendamentos de Terras na região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. Por fim, o quinto capítulo retrata, com base na análise dos dados e informações coletadas da pesquisa de campo, a atual situação do arrendamento nos municípios de Uberaba e Uberlândia. Desejamos, ao término deste trabalho, contextualizar o mercado de arrendamento de terras no Brasil ao ponto de delimitar o marco institucional que condiciona seu funcionamento e a racionalidade econômica que rege essa relação contratual.

Arrendamento rural agrícola é uma forma de locação de imóvel rural para cultivo de determinada cultura, por exemplo, para o plantio de cana-de-açúcar, amendoim, soja, entre outros.

Arrendamento e Mercado Fundiário:
  • A compreensão da moderna propriedade fundiária reporta-nos às transformações do modo de produção capitalista. Conforme Marx (1988), o capitalismo se desenvolveu a partir de uma estrutura econômico-social que o antecede historicamente.Ao longo deste processo, a propriedade fundiária e as relações feudais de produção que atavam os pequenos camponeses à terra foram, violenta e continuamente, metamorfoseadas, pela ação do capital, em propriedade capitalista da terra.
Um dos principais vestígios da desagregação da propriedade feudal foi a eliminação dos direitos superpostos. Com efeito, a sociedade no feudalismo era organizada sobre uma superposição de direitos sobre a terra, desde o direito a seu uso ao de exigir uma quantidade do produto nela obtido, como pagamento pela sua exploração. O direito sobre a terra, anteriormente reconhecido ao camponês (produtor direto), é substituído pelo direito sobre a propriedade privada da terra.
  • O camponês, perdendo o acesso à terra, condição essencial de seu trabalho, não tem outra escolha senão vender sua força de trabalho para assegurar sua reprodução. Assim, a expropriação fundiária dos camponeses abriu caminho para a consolidação e desenvolvimento do capitalismo. A propriedade privada, absoluta, legitima uma das condições fundamentais do capitalismo, a submissão da força de trabalho ao capital. A propriedade privada cria as condições necessárias para o capital produzir o trabalho assalariado, à proporção que está constantemente liberando força de trabalho.
Adicionalmente, no capitalismo a terra adquire um caráter jurídico, que é a expressão econômica do direito sobre a propriedade fundiária. Para Marx (1988), a penetração do capital na agricultura encontra sérios obstáculos, na medida que urna classe, por razões históricas (antigos modos de produção), dispõe do monopólio da terra. Essa classe, embora não participe do processo produtivo, impõe, pela sua condição de proprietária fundiária, certas exigências para que o capital seja investido na agricultura. Adernais, pelo fato de possuir o direito sobre a terra (expressão jurídica), essa classe detém parcela da mais-valia produzida durante o processo produtivo. A essa parcela de mais-valia advogada ao proprietário da terra, Marx chama de renda fundiária capitalista.
  • Desta maneira, a propriedade da terra passa a ser aceita corno capital e o título jurídico sobre ela garante a obtenção da renda fundiária. Sua existência, entretanto, é motivo de profundas contradições para o desenvolvimento do capitalismo. De um lado, os donos do principal meio de produção - a terra podem escolher entre três opções: I) utilizar a terra com seu próprio capital; II) arrendar a terceiros, e; III) mantê-la ociosa. 
No primeiro caso, proprietário fundiário e produtor capitalista são pessoas idênticas, ou seja, têm os recursos produtivos/financeiros e a força de trabalho. No segundo, o proprietário da terra e o arrendatário capitalista são pessoas distintas. O produtor arrendatário espera que os investimentos realizados durante o processo produtivo traga o lucro capitalista. Parte deste, contudo, é advogado ao proprietário corno renda fundiária capitalista. Finalmente, o proprietário fundiário, por razões diversas, pode preferir sua terra ociosa.
  • Por outro lado, urna ampla camada de produtores lutam pelo acesso à terra. A história é repleta de movimentos sociais e conflitos no campo de produtores reivindicando um pedaço de chão para plantar e melhores condições de vida. Além dos processos de redistribuição fundiária por meio de reformas agrárias, em vários países o desajuste entre a demanda e a disponibilidade de terras foi parcialmente reduzido via diversas formas de cessão do direito de uso da terra (notadamente, arrendamento e parceria).
O objetivo deste capítulo é examinar, teoricamente, os fatores que determinam o funcionamento do mercado de arrendamento. Procura, particularmente, descrever a contribuição de algumas correntes do pensamento econômico sobre a questão da renda fundiária e apontar os principais determinantes do preço da terra. Admite-se que Ricardo e Marx devem ser tomados como uma referência geral e histórica, necessária para a compreensão das relações entre proprietários fundiários e trabalhadores rurais sem ou com pouca terra para produzir. Enquanto que, o preço de mercado da terra constitui uma importante variável quando se analisa o uso deste recurso produtivo pelos agentes. Com esse propósito, dividiu-se o presente capítulo em basicamente duas seções. A primeira, faz um breve histórico do processo que originou o arrendamento. Aqui também cabe retomar a antiga discussão a respeito da renda fundiária. A segunda seção, caracteriza o mercado fundiário, tratando, em específico, do preço da terra.

Arrendamento de Terras:
  • Uma vez que a propriedade privada da terra permite a transferência para o proprietário de parcela da mais-valia que, sem sua existência, seria distribuída entre capitalistas e trabalhadores rurais, gesta-se um conflito pela apropriação da riqueza em cuja produção intervém a terra, bem de propriedade privada.
O elemento central desse conflito pela divisão da mais-valia produzida durante o processo produtivo, estruturada segundo uma "fórmula trinitária", com a participação de proprietários fundiários, capitalistas arrendatários e trabalhadores, na qual a renda fundiária capitalista constitui uma "forma particular" da mais-valia que é apoderada pelo proprietário, o lucro pelos capitalistas e o salário dos trabalhadores.
  • Em segundo lugar, a propriedade fundiária impede a livre repartição da mais-valia social entre os capitais individuais. A classe dos proprietários rurais possui um privilégio, representado pela propriedade privada da terra, a qual lhes dá o monopólio desse meio de produção, de modo que usufruem quase permanentemente de um rendimento (i.e., renda fundiária) proveniente da exploração de suas terras por terceiros.
Em terceiro lugar, o pagamento da renda fundiária ao proprietário tende a elevar o preço dos produtos agrícolas, pois estes são fixados a um nível superior ao preço de produção, a fim de incorporar o montante da renda da terra. Entre as inúmeras implicações que isto poderia acarretar sobre a reprodução global do capital sublinha-se, por exemplo, o aumento do custo de reprodução da força de trabalho e a redução da competitividade desses produtos no comércio exterior.
  • Finalmente, a apropriação pelos proprietários de terras das benfeitorias e melhorias feitas no imóvel rural pelos arrendatários capitalistas desestimula a realização de diversos tipos de investimentos. O arrendatário, assim, restringe-se a investimentos aos quais poderá recuperar durante o período do prazo do contrato de arrendamento. Esta ação compromete tanto a industrialização da agricultura quanto a viabilidade econômica e social do arrendamento.
A moderna propriedade fundiária distingue-se da antiga propriedade feudal em quatro aspectos: I) compra e venda de direitos de propriedade, i.e., a terra transforma-se em uma mercadoria; II) o dono da terra, enquanto proprietário, não participa diretamente na atividade produtiva e assegura seu rendimento com parcela do lucro do produtor capitalista a ele pago na forma de renda fundiária; III) a renda da terra passa a ser residual do lucro em relação ao lucro capitalista do produtor; IV) o monopólio da terra concede aos seus detentores um novo papel político e social perante à sociedade. A propriedade assume não somente um novo signo de poder (status) e influência política, mas interfere na própria reprodução do capital (Murray, 1977).
  • Além disso, a propriedade fundiária no capitalismo, sendo objeto de compra/venda e ativo patrimonial com características específicas, ganha outras formas e funções como ativo produtivo e ativo de reserva de valor. A utilização da terra enquanto ativo produtivo é a base para a produção do setor primário, seja dos alimentos seja das matérias-primas agropecuárias que ocupam lugar privilegiado no processo de reprodução ampliada do capital, inclusive na geração empregos no campo. Quanto ao lado financeiro, na atual fase de desenvolvimento do sistema capitalista, as distorções ocasionadas pelas políticas econômicas ou pelas falhas intrínsecas do mercado, os agentes demandam ativos de reserva de valor a fim de preservar sua riqueza no tempo, entre eles, a terra.
Pretendemos analisar minimamente a relação entre propriedade privada e renda fundiária na seção seguinte. Entendemos que o nível de desenvolvimento do arrendamento está associado ao menor ou maior acesso à terra e às condições de pagamento pelo uso da mesma por terceiros. A renda fundiária é regida pela lei do movimento do capital, especificamente, nas condições estabelecidas pela relação entre o capital e o monopólio da terra. Todavia, essa relação entre o capital e o monopólio desse recurso natural advém da forma de apropriação da terra durante o processo de produção capitalista, definindo, portanto, o monopólio capitalista da terra.

A Justiça Federal em Dourados determinou que a União demarque as terras indígenas em Mato Grosso do Sul e pague arrendamento aos fazendeiros que tenham áreas ocupadas por indígenas.